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0296/2006 - A DEFICIÊNCIA DE VITAMINA A EM CRIANÇAS NO BRASIL E NO MUNDO
VITAMIN A DEFICIENCY IN CHILDREN IN BRAZIL AND IN THE WORLD

Autor:

• Regina Célia Rodrigues de Miranda Milagres - Regina Célia Rodrigues de Miranda Milagres - Viçosa, Minas Gerais - Universidade Federal de Viçosa - <reginamilagres@ufv.br>


Área Temática:

Não Categorizado

Resumo:

O presente artigo expõe, com base em uma revisão de literatura dos últimos 10 anos, aspectos relevantes da Deficiência de Vitamina A (DVA) em crianças no Brasil e no mundo. Apresenta a DVA no contexto da deficiência clínica e subclínica, com ênfase na caracterização desta como problema de saúde pública. A DVA foi diagnosticada em crianças de várias regiões do Brasil, principalmente no Sudeste e Nordeste, entretanto, não foram encontrados estudos relativos a sinais clínicos. Mundialmente, as maiores prevalências de DVA foram registradas em regiões dos EUA, Índia, Mali, Nigéria e Etiópia, sendo que os sinais clínicos estiveram presentes, principalmente, em regiões da Ásia e África. Os estudos apontam a DVA como problema de saúde pública em crianças, principalmente nas regiões mais pobres do globo.
Palavras-chave: deficiência de vitamina A, crianças, sinais clínicos, sinais subclínicos, problema de saúde pública.

Abstract:

This article is based on a 10-year literature review and describes relevant aspects of vitamin A deficiency (VAD) in children in Brazil and in the world. It presents VAD within a clinical and subclinical deficiency context, emphasizing it as a public health issue. VAD was diagnosed in children from several areas in Brazil, especially the southeastern and northeastern regions. Worldwide, the highest VAD prevalence was found in areas of the United States, India, Mali, Nigeria and Ethiopia, and clinical signs were found especially in areas in Asia and Africa. However, studies related to clinical signs were not found. Studies point to VAD as a public health issue in children, especially in the poorest regions of the globe.
Key-words: vitamin A deficiency, children, clinical signs, subclinical signs, public health issues.

Conteúdo:

Introdução
A deficiência de vitamina A (DVA) é considerada um problema grave em mais de sessenta países1. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, cerca de 2,8 milhões de crianças em idade pré-escolar no mundo são clinicamente afetadas pela hipovitaminose A. Estima-se que 250 a 500 mil crianças tornem-se cegas todos os anos, sendo que cerca da metade morrem antes de completar um ano de vida 2.
Esta deficiência pode ser causada por dois fatores principais. O primeiro por uma ingestão inadequada de vitamina A para satisfazer as necessidades orgânicas, como o consumo insuficiente de produtos de origem animal e de frutas e hortaliças ricas em pró-vitamina A, levando a uma ineficiente absorção deste micronutriente. O segundo está relacionado ao sinergismo entre episódios infecciosos e a carência de vitamina A (adaptado de Ramalho e Saunders, 2003)3.
Em crianças em idade pré-escolar, este distúrbio nutricional pode causar aumento do risco de mortalidade, morbidade e cegueira. As conseqüências para crianças em idade escolar e adolescentes têm sido menos estudadas e são provavelmente menos intensas 4.
Diante da magnitude desta deficiência, percebe-se a importância de conhecer os indicadores do estado nutricional de vitamina A que podem ser utilizados no diagnóstico desta deficiência. De acordo com a UNICEF (2005)5, o uso dos indicadores como sinais clínicos (xeroftalmia, manchas de Bitot e cegueira noturna) e avaliação bioquímica fornecida pelos níveis de retinol no sangue, podem determinar a DVA como problema de saúde pública. Os indicadores citológicos (impressão conjuntival) e os dietéticos (inquéritos qualitativos e quantitativos) também têm sido comumente empregados para detectar a carência de vitamina A 6.
A classificação da xeroftalmia e as prevalências mínimas para definir a deficiência de vitamina A como importante problema de saúde pública em crianças menores de seis anos, de acordo com a World Health Organization (WHO) 7, estão descritas na Tabela 1.

TABELA 1

Em relação aos níveis séricos de retinol, a WHO 7 sugere os seguintes critérios (Tabela 2):

TABELA 2

A prevalência de níveis séricos de retinol <0,70 µmol/L em 2% a 10% da população infantil de 6 a 71 meses de idade indica problema de saúde pública leve, de 10% a 20%, problema moderado e >20%, grave7.
Ainda que inquéritos nacionais sejam escassos, no Brasil, a prevalência de DVA está estimada entre 16 e 74% em crianças menores de seis anos8. De acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) e a Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil é considerado como área de carência subclínica grave 9.
Diante desses dados, o presente estudo traça um perfil de informações relacionadas com a distribuição da DVA em crianças, de acordo com dados clínicos e subclínicos no Brasil e no mundo. Assim, foi realizado um levantamento bibliográfico de artigos encontrados nas bases de dados Medline, Lilacs, PubMed, Scielo e Science Direct e publicações de organizações governamentais, que abordam dados de prevalência da DVA em crianças, totalizando 100 referências pesquisadas. Deste total, 70 foram selecionados por apresentarem maior ligação com o tema estudado. Foi feita uma seleção de artigos publicados nos últimos 10 anos, de forma a priorizar dados mais recentes e atualizados sobre o tema.

A Deficiência de Vitamina A no Brasil
Os dados dos últimos 20 anos indicam que a DVA é um problema de saúde pública no Brasil10, principalmente nas regiões do Norte, Nordeste e Sudeste, sendo possível identificar a população infantil do Nordeste como a mais vulnerável ao problema, uma vez que entre 16% a 55% das crianças apresentaram níveis séricos de retinol abaixo de 20µg/dL, o que caracteriza uma carência endêmica 11. De acordo com Ramalho et al. 8, os inquéritos bioquímicos disponíveis no Brasil confirmam que a DVA é um problema de saúde pública nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Paraíba, Bahia e Amazonas.
Gonçalves-Carvalho et al. 12 estudaram 131 crianças de 3 a 10 anos, da periferia do município de Campinas-SP. A prevalência de hipovitaminose A foi observada em 17,6% das crianças, com níveis de retinol sérico entre 0,35 e 0,70µmol/L, distribuídos em 6,9% para pré-escolares e 10,7% para escolares. Outro estudo de prevalência realizado em crianças usuárias da rede básica de saúde de 7 municípios de São Paulo com idades entre 6 e 23 meses mostrou que 30% das crianças apresentaram níveis séricos de retinol abaixo de 0,70µmol/L e 7% abaixo de 0,35µmol/L 13.
Em Ribeirão Preto (SP), níveis de retinol sérico considerados baixos foram detectados em 21,4% das 103 crianças de 6 a 24 meses estudadas. A freqüência foi maior entre crianças que nasceram com baixo peso e que tiveram aleitamento materno por um menor período de tempo 14. Em uma avaliação prospectiva de 47 pacientes com déficit estatural de um ambulatório da capital paulista, crianças com idade variando entre 4 e 14 anos foram avaliadas quanto ao nível sérico de retinol. A freqüência de níveis de retinol <1,05µmol/L foi encontrada em 21% dos pacientes, mas não houve relação dos níveis séricos de retinol com a velocidade de crescimento 15. Vítolo et al.16 investigaram os níveis séricos de retinol de 218 crianças e adolescentes com idades entre 10 e 19 anos, matriculados em escola particular também da capital paulista. Os resultados mostraram que 10% dos investigados apresentaram valores abaixo de 0,70µmol/L e 30% abaixo de 1,05µmol/L.
No que se refere ao estado de Minas Gerais, apenas o estudo de Santos et al. 17 foi encontrado neste período. Os resultados revelaram que 29% dos 241 escolares de 6 a 14 anos, da zona rural de Novo Cruzeiro, tinham níveis de retinol abaixo de 20µg/dL.
A DVA também foi pesquisada por Ramalho et al.18, em um estudo realizado em 253 recém-nascidos assistidos em duas maternidades públicas do município do Rio de Janeiro. Os autores constataram que a maioria (55,7%) dos recém-nascidos apresentou valores de retinol sérico abaixo de 1,05 µmol/L, sendo que 1,23% tiveram valores abaixo de 0,35 µmol/L. Os recém-nascidos com baixo peso ao nascer apresentaram tendência a uma maior prevalência de hipovitaminose A (68,7%) em comparação àqueles com peso adequado (54%).
Ainda no município do Rio de Janeiro, 175 pré-escolares atendidos em uma Unidade de Saúde foram avaliados quanto à prevalência de DVA, revelando níveis séricos <1,05 µmol/L em 34,3% das crianças atendidas 19. Outro estudo realizado no Rio de Janeiro por Ramalho et al. 20 em 574 escolares de 7 a 17 anos de uma rede municipal de ensino, constatou níveis baixos de retinol sérico em 10,28% das crianças, sendo que houve uma tendência a maiores percentuais de inadequação sérica de retinol entre escolares mais jovens (11,98% na faixa etária de 7 a 10 anos e 7,92% na faixa etária de 10 a 17 anos).
Consideração importante deve ser direcionada aos estados do Nordeste. De acordo com Ferraz et al. 14, a DVA, principalmente a forma subclínica é endêmica em várias áreas do Nordeste brasileiro. Na Bahia, uma pesquisa realizada na cidade de Cansanção, com 61 crianças de 6 a 72 meses de idade, demonstrou a ocorrência de níveis inadequados de retinol sérico (deficientes <10µg/dL e baixos <20µg/dL) em 44,7% das crianças, principalmente entre crianças menores de 24 meses, caracterizando a deficiência como problema de saúde pública21.
Uma pesquisa ampla envolvendo sete municípios do semi-árido baiano, contou com a participação de 563 pré-escolares. Os resultados revelaram que a prevalência de níveis deficientes de retinol sérico (<10µg/dL) foi de 15,3%, sendo que a maior prevalência foi detectada em Valente (31,9%) e a menor em Serrinha (7,8%). Em relação à faixa etária, a maior prevalência de níveis de retinol sérico deficientes foi registrada na faixa de 24 a 35 meses (22,9%) e a menor na faixa de 48 a 59 meses (7,8%)22. Assis et al. 23 pesquisaram crianças de 6 a 72 meses dessa mesma região da Bahia e encontraram prevalência de 40,4% de crianças com níveis séricos de retinol considerados baixos (0,35 a 0,69µmol/L) e 4,3% com níveis deficientes (<0,35µmol/L).
Em 20 conglomerados do estado de Sergipe, Martins et al. 24 demonstraram que dos 607 pré-escolares de 6 a 60 meses, 22,5% das crianças tiveram níveis séricos de retinol considerados baixos, enquanto que os níveis considerados deficientes foram detectados em 9,6% dos casos. No total, a prevalência DVA foi de 32,1% em todas as crianças pesquisadas. A prevalência de níveis inadequados de vitamina A detectada nessa população classifica a DVA como um importante problema de saúde pública.
Diniz 25, ao estudar crianças menores de cinco anos na Paraíba, encontrou prevalência de 16,0% de DVA. Essa faixa etária também foi avaliada no estado de Pernambuco em um estudo realizado pelo INAN/MS-IMIP26 que encontrou 19,3% das crianças com níveis séricos de retinol abaixo de 0,70 µmol/L e 3% com níveis abaixo de 0,35µmol/L, constituindo, portanto, um problema de saúde pública.
No estado de Pernambuco, 311 crianças menores de cinco anos de creches públicas da cidade de Recife foram pesquisadas quanto a DVA em relação aos indicadores bioquímicos (retinol sérico), dietéticos (inquérito de consumos alimentar) e antropométricos (peso/altura, altura/idade e peso/altura). Os resultados revelaram a prevalência de níveis séricos de retinol baixos em 7% das crianças, caracterizando a DVA como problema de saúde pública leve27.
O diagnóstico do estado nutricional no estado do Amazonas em relação a hipovitaminose A foi realizado por Alencar et al. 28. Os autores fizeram uma investigação clínico-oftalmológica envolvendo 487 crianças de 2 a 5 anos de idade e a dosagem de retinol sérico de 48 crianças do município de Nhamundá. A investigação clínica não evidenciou sinal e ou sintoma pertinentes à carência de vitamina A. Níveis de retinol sérico considerados altos (>50,0µg/dL) foram detectados em 25% das crianças e níveis considerados aceitáveis (20,0 a 29,9µg/dL) foram encontrados em 75% das crianças. Assim, não se pode afirmar a existência de hipovitaminose A como problema de saúde pública nesta região.
Apesar de não terem caráter nacional, dados levantados no presente estudo sugerem que a DVA é um problema de saúde publica em várias regiões do Brasil. A Tabela 3 descreve o resumo dos inquéritos pesquisados sobre a prevalência de DVA no Brasil.

TABELA 3

Programas de correção da DVA por órgãos governamentais no Brasil
Como forma de atenção à correção da DVA no Brasil, destacam-se programas como o de Combate à Deficiência de Vitamina A, instituído pela Portaria do Ministério da Saúde, n° 2.160 de 29 de dezembro de 1994 29. Recentemente foi instituído o Programa Nacional de Suplementação de Vitamina A, através da Portaria do Ministério da Saúde n° 729, de 13 de maio de 2005. Esse Programa destina-se a prevenir e, ou controlar essa deficiência nutricional mediante a suplementação com megadoses de vitamina A, em crianças de seis a cinqüenta e nove meses de idade e puérperas no pós-parto imediato, pertencentes à Região Nordeste, ao Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais e ao Vale do Ribeira, São Paulo30.


A Deficiência de Vitamina A no Mundo
A DVA é uma das mais importantes e prevalentes deficiências e tem sido considerada um problema de saúde pública entre crianças pré-escolares, em países em desenvolvimento 31, 32. Estimativas recentes indicam que mundialmente mais de dois milhões de pessoas possuem risco de desenvolver DVA, iodo ou ferro, apesar de recentes esforços na prevenção e controle dessas deficiências. A prevalência é especialmente alta no Sudeste da Ásia e na região do Saara, na África32, 33. Gestantes e crianças jovens representam o maior grupo de risco33, 35.
Dados levantados por West Jr33 revelaram maiores prevalências de crianças pré-escolares com DVA na Etiópia (61,2%), no Kênia (40,6%) e na Indonésia (57%). Outra análise demonstrou que a prevalência de DVA entre pré-escolares, utilizando ponto de corte de < 0,70µmol/L foi maior em Ghana (73,3%), Papua Nova Guiné (60,2%), Sul da África (48,2%), Nepal (37,2%) e Paquistão (31,8%)36.
Poucos são os dados disponíveis sobre a prevalência da DVA entre crianças em todas as regiões do mundo37, entretanto, o presente trabalho procurou identificar estudos da ocorrência desta doença em alguns continentes.

América
A DVA na América Latina e no Caribe foi estudada por Mora et al.38. Os resultados da pesquisa revelaram que a DVA nessa região é predominantemente subclinica e que a prevalência nacional de níveis de retinol sérico <20 µg/dL em crianças menores de cinco anos oscila de 6,1% no Panamá a 36% em El Salvador. O problema é grave em cinco países, moderado em seis e leve em quatro. A população afetada é de aproximadamente 14,5 milhões de crianças menores de cinco anos (25%). De acordo com esses autores, as medidas para controlar a DVA incluem suplementação, fortificação do açúcar e algumas atividades de diversificação alimentar.
Na Colômbia, De Navarro et al39 pesquisaram a deficiência de ferro, vitamina A e prevalência de parasitismo intestinal, constatando 13,2% de níveis séricos de retinol sérico <70µmol/L entre 2187 pré-escolares. Para descrever os níveis de vitamina A, C e folato em uma amostra de 1966 crianças de até 12 anos, no México. Os resultados revelaram que níveis de retinol sérico <10 µg/dL foram raros entre as crianças pesquisadas; entretanto, a deficiência subclínica (retinol entre >10 µg/dL e <20 µg/dL) esteve presente em 25% das crianças de 1 a 8 anos. A alta prevalência de DVA indica problema de saúde pública40.
Estudo realizado com 590 crianças menores de 15 anos em Valência, na Venezuela, demonstrou que 0,7% tinham níveis baixos de retinol sérico (<20 µg/dL) e 25,1% tinham níveis aceitáveis de retinol (entre 20 e 30 µg/dL)41. Os resultados dos sinais clínicos de impressão citológica conjuntival revelaram que 11,1% das crianças estavam deficientes. Ainda na Venezuela, Castejon et al.42 pesquisaram a coexistência de anemia, DVA e retardo no crescimento entre 202 crianças de 24 a 84 meses em Maracaibo, demonstrando a ocorrência de 21,78% de DVA (retinol sérico <20µg/dL), 38,11% de anemia e 14,36% de déficit no crescimento. Em outro estudo realizado em Maracaibo, em 157 crianças de 2 a 6 anos das zonas rural e urbana, não foram evidenciados sinais clínicos ou oftalmológicos de DVA. A prevalência de DVA subclínica foi de 35,4%, sendo maior em crianças do meio rural (48,3%). Esses dados indicam que a DVA é um problema de saúde pública em algumas regiões da Venezuela. Assim, a implementação de um programa nutricional integral que inclui suplementação, fortificação de alimentos, diversificação dietética, melhora das condições sócio-econômicas e sanitárias e também do nível educacional, com ênfase na educação em saúde e nutrição são recomendados por esses autores43.
Stephens et al.44, chamaram a atenção para a subestimação do número de casos de carência subclínica de vitamina A inclusive em países desenvolvidos, como os Estados Unidos, onde a ingestão inadequada de retinol e carotenóides é o principal fator etiológico da DVA.

Ásia
A DVA existe como problema nutricional de saúde pública entre crianças em idade pré-escolar em 118 países em desenvolvimento, como a região do Sudeste da Ásia (Bangladesh, Bhutan, Índia, Indonésia, República Democrática Popular da Coréia, Maldivas, Myanmar, Nepal, Sri Lanka e Tailândia), que abrange o maior número de casos32.
A deficiência subclínica de vitamina A (retinol sérico <20µg/dL) tem sido registrada mundialmente como um aumento no risco de morbidades e mortalidades em crianças45. Entretanto, o impacto da DVA durante a gravidez na saúde fetal não tem sido documentado31. Estudos realizados por estes autores revelaram que níveis de retinol sérico <20µg/dL em mulheres podem estar associados com aumento do risco de transferência para o feto e anemia na mãe. Feungpean et al.46, demonstraram que 16% de 19 crianças prematuras de Bangkok, na Tailândia, tinham níveis plasmáticos de vitamina A abaixo de 20µg/dL após 7 dias de nascidas e que, após 14 e 30 dias, todos os prematuros tinham níveis normais. Resultados semelhantes foram evidenciados em Israel, onde a deficiência subclínica de vitamina A (retinol sérico <0,7µmol/L) foi encontrada em mais de 15% das 117 das crianças nômades, entre 0 e 18 meses estudadas, utilizando esse mesmo ponto de corte47.
Uma revisão de literatura sobre a ocorrência de DVA e a xeroftalmia no sudeste da Ásia, foi realizada por Singh & West, Jr.37. A prevalência estimada de DVA entre crianças em idade escolar foi de 23,4% e a de xeroftalmia branda (cegueira noturna ou mancha de Bitot) foi de 2,6%, concluindo que a DVA entre escolares pode ser considerada um importante problema de saúde pública no sudeste da Ásia.
No caso particular da Índia, estudos têm evidenciado a DVA como um problema importante em crianças. Em uma tribo da Índia, crianças em idade pré-escolar foram pesquisadas quanto ao estado nutricional. Um total de 1022 crianças de 27 vilas foi pesquisado e a DVA em forma de manchas de Bitot foi encontrada em 1,6% das crianças48. De acordo com Singh & West Jr.37, a prevalência de xeroftalmia entre crianças em idade escolar na Índia é de 2,8%.
Um estudo multicêntrico, que avaliou a prevalência de outros sinais clínicos presentes na DVA, como mancha de Bitot e cicatriz corneal (em 164.512 crianças menores de 6 anos) e cegueira noturna (entre 113.202 crianças de 24 a 71 meses), foi conduzido durante os anos de 1997 a 2000, em crianças de 16 regiões de 11 estados da Índia. A maior prevalência foi constatada em Gaya, onde 4,71% das crianças apresentaram mancha de Bitot, 0,5% cicatriz corneal e 5,17% cegueira noturna49.
Sinais clínicos também foram estudados por Bhattacharya et al.50 em 331 estudantes primários de uma região de Naxalbari em West Bengal, na India. Os resultados revelaram que 3,65% das crianças tinham acuidade visual anormal; 8,16% apresentaram DVA e 3,63% estavam com mancha de Bitot. Em pesquisa baseada em impressão citológica conjuntival realizada em Nagpur na Índia, foi demonstrado que a prevalência de DVA foi estimada em 35,7% de 308 crianças de área urbana, abaixo de 6 anos51. Pesquisa envolvendo sinais clínicos da DVA entre 700 crianças Iraquianas menores de 6 anos revelou que a xeroftalmia foi prevalente em 29% das crianças, sendo maior entre 1 e 3 anos52.
Na China a deficiência subclínica de vitamina A foi pesquisada por Tan et al.53. Os autores identificaram em uma amostra de 8669 crianças abaixo de 6 anos de 14 províncias chinesas a prevalência de 11,7% de DVA utilizando o ponto de corte de &#8804;0,70µmol/L. A prevalência foi maior em crianças do meio rural (15%) em comparação com crianças do meio urbano (5,2%). Khatib54, ao pesquisar um grupo de 1023 crianças de 5,5 a 9,9 anos quanto à deficiência subclínica de vitamina A em sete regiões semi-rurais da Jordânia, encontrou prevalência superior (21,8%).
A idade e a estação do ano parecem influenciar na prevalência de DVA em crianças. No Paquistão, 154 crianças de 0 a 15 anos que apresentavam DVA foram pesquisadas. Os resultados demonstraram que crianças abaixo de 6 anos são mais vulneráveis e que a ocorrência da deficiência é maior no verão (39%)55.
A DVA foi considerada por Mihora et al.,56 como um moderado problema de saúde pública em crianças e nutrizes na cidade de Kabul, no Afeganistão. Algumas medidas vêm sendo bastante positivas na diminuição da prevalência de DVA, tais como programas de suplementação de vitamina A. Dados da Filipinas demonstraram que a prevalência de DVA em crianças de 1 a 5 anos estava em torno de 38% (níveis de retinol sérico <20µg/dL) em 1998. Este percentual foi reduzido para 32% após 1 a 4 meses de suplementação com vitamina A56. De acordo com Khan et al.58 a DVA é uma das maiores deficiências no Vietnã e um programa de suplementação de vitamina A pode ser implementado com sucesso na prevenção da DVA.

África
Estimativas da WHO2 revelaram que a DVA é considerada um problema de saúde pública em 44 países da África. O problema é particularmente grave no Mali59. Estudos conduzidos com 1510 pré-escolares nesse país mostraram que 43,8% das crianças tinham níveis séricos de retinol abaixo de 0,35 µmol/L e 92,7% tinham níveis abaixo de 0,70µmol/L. Em relação aos sinais clínicos 4,3% das crianças apresentaram cegueira noturna e 2% tinham manchas de Bitot. A xeroftalmia foi prevalente em 77,1% das crianças pesquisadas. Esses dados sugerem que a DVA é um grave problema de saúde pública na área de Bandiagra, no Mali60.
Poucas pesquisas sobre a DVA têm sido conduzidas na Nigéria61. Estudos realizados nesse país por estes autores, em 213 crianças entre seis meses e seis anos, revelaram que 26,8% tinham níveis séricos de retinol deficientes (<10µg/dL), enquanto 47,9% tinham níveis entre 10 e 19 µg/dL. Os autores sugerem que medidas de combate a DVA sejam tomadas, incluindo suplementação de vitamina A, em curto prazo e educação nutricional ressaltando a importância do consumo de fontes de pró-vitamina A e vitamina A pré-formada em alimentos, em longo prazo. Uma revisão sobre a importância da xeroftalmia como causa de cegueira em crianças, portanto, como um significante problema de saúde pública na Nigéria, foi realizada por Rabiu & Kyari62, revelando que a xeroftalmia causada pela DVA é um problema predominante entre as crianças, e que 34 a 69% da cegueira infantil na Nigéria é causada pela opacidade corneal.
Em Moçambique, estima-se que 2,3 milhões de crianças abaixo de 5 anos tenham DVA. Na ausência de políticas apropriadas e programas de ação, a DVA pode ser atribuída como causa de mais de 30.000 mortes anualmente entre crianças menores de 5 anos, o que representa 34,8% de todas as causas de mortalidade neste grupo de idade. A suplementação de vitamina A tem sido adotada como estratégia a médio e curto prazo para controle da DVA em crianças63.
Para determinar a prevalência de DVA entre crianças de 6 a 9 anos no norte da Etiópia64, foram pesquisadas 824 das 1339 crianças para as quais existia informação completa dos níveis bioquímicos de vitamina A, exame ocular para xeroftalmia e dados antropométricos. A prevalência de xeroftalmia foi de 5,8%. Níveis séricos de retinol abaixo de 0,35µmol/L foram encontrados em 8,4% das crianças e níveis entre 0,35 e 0,70µmol/L foram encontrados em 51,1% das crianças.
Estudo com crianças em idade pré-escolar e escolar em Arssi na Etiópia concluiu que a DVA é um problema de saúde nessa região, pois foram encontradas prevalências de 7,2% de cegueira noturna; 2,2% de mancha de Bitot; 0,2% de xerose corneal; 0,5% de ulceração corneal e 0,5% de cicatriz corneal65. A alta prevalência de DVA entre crianças de 6 a 9 anos remete a necessidade de programas de suplementação de vitamina A em áreas onde a DVA é endêmica. Isso é confirmado por Kello & Gilbert66, que encontraram em um estudo com 360 escolares da Etiópia a DVA e o sarampo como as maiores causas de diminuição da visão e cegueira nessas crianças.

Europa
Esse continente não é considerado como área de risco, por este motivo, trabalhos que abordam a DVA em criança, em países da Europa são escassos. Apesar disso, Gregory Jr et al.67 encontraram em 1003 pré-escolares do Reino Unido a prevalência de 8,1% de níveis séricos de retinol <0,70µmol/L, demonstrando que a DVA nesta região é considerada um problema de saúde pública.

Oceania
Na República das Ilhas Marshall, a DVA, deficiência de ferro e anemia foram pesquisadas em 20% (919) das crianças de 10 pequenas ilhas, com idades entre 1 e 5 anos. Os resultados demonstraram que a proporção de crianças com DVA (retinol sérico <0,70 µmol/L) foi de 59,9%68. De acordo com informações da XXII Reunião do “International Vitamin A Consultative Group” (IVACG)69, em Phonpei, na Micronésia, existe um sério problema de DVA relacionado ao aumento do consumo de arroz e alimentos importados, em substituição aos alimentos tradicionalmente consumidos na região.
Com objetivo de facilitar a análise dos dados, os estudos acima foram compilados nas Tabelas 4 e 5, que descrevem os resultados de sete investigações da América, doze da Ásia, sete da África, uma da Europa e uma da Oceania.

TABELA 4

TABELA 5

Programas de correção da DVA por órgãos governamentais no mundo
Como medida de controle a curto prazo para a DVA, a UNICEF em parceria com a WHO e outros órgãos internacionais, tem implementado programas de suplementação de vitamina A para crianças de 6 a 59 meses de idade e puérperas no pós-parto imediato. Antes da implantação do programa em um determinado país, é feita uma avaliação de indicadores de DVA para certificar se a área é de risco5.
Por muitos anos, diversos países foram relutantes em iniciar a suplementação de vitamina A devido a dúvidas sobre a segurança desta iniciativa. Mas os estudos mostraram que os benefícios da suplementação da vitamina A compensam todos os efeitos colaterais, que são muito raros70. A Tanzânia, Nepal e Vietnam são exemplos de países onde os programas foram bem-sucedidos5.
A UNICEF adota outras estratégias a longo prazo, como apontar a diversificação e fortificação dos alimentos. Muitos países na América Central, como Guatemala e Honduras, tiveram grande sucesso com a fortificação do açúcar5. O IVACG, também enfatiza a fortificação de alimentos, como um método de combate a DVA, assim como a educação nutricional, e estudos relativos ao aumento da biodisponinilidade da vitamina A em alimentos69.


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Como

Citar

Regina Célia Rodrigues de Miranda Milagres. A DEFICIÊNCIA DE VITAMINA A EM CRIANÇAS NO BRASIL E NO MUNDO. Cien Saude Colet [periódico na internet] (2006/set). [Citado em 07/05/2025]. Está disponível em: http://cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/a-deficiencia-de-vitamina-a-em-criancas-no-brasil-e-no-mundo/259?id=259

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