0265/2006 - Informação estratégica para ações de intervenção social na saúde
Strategic information for social intervention actions in health
Autor:
• Alice Ferry de Moraes - Moraes, A. F. - Rio de Janeiro, Rio de Janeiro - Fundação Oswaldo Cruz - Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde - <aliceferry@terra.com.br>Área Temática:
Não CategorizadoResumo:
Na saúde pública são comuns as ações de intervenção social para promover a saúde e prevenir doenças. Essas ações oferecem informação sobre saúde às comunidades, de maneira clara e acessível para gerar mudança de comportamento e para proporcionar a transferência da informação. Pesquisas bibliográficas, realizadas na área da Saúde e na Ciência da Informação, mostraram que o uso da informação de forma estratégica tem base no poder, no saber e na ética. Este trabalho quer demonstrar a importância de um tipo de informação usada nessas ações. É a informação como elemento de mudança na estrutura cognitiva do indivíduo da comunidade onde essas ações se desenrolam e, para tanto, foram criadas estratégias informacionais, a partir de conceitos extraídos da Comunicação, Lingüística, Cognição, Sociologia, Antropologia e Educação. Essas estratégias atuam no momento da transferência da informação; empregam a forma discursiva adequada; facilitam a percepção da informação pelo indivíduo; contextualizam a informação; atuam na imposição ou legitimação da informação; atuam na formação do indivíduo pela informação. A informação, empregada de forma estratégica, servirá como um elo entre os profissionais da saúde e as comunidades onde eles pretendem atuar.Palavras-chaves: Ações de intervenção social, Informação em Saúde, Estratégias informacionais, Ciência da Informação.
Abstract:
In public health, social intervention actions are usual in order to promote health and to prevent disease. Bibliographical research, in Health and Information Science, showed that actions and the strategic use of information are based on power, knowledge and ethics. This paper shows the importance of information as element of change in the cognitive structure of individuals, members of the community where these actions take place, so that they succeed in accomplishing their goals. For that matter, informational strategies were created from concepts of areas such as Communication, Linguistics, Cognition, Sociology, Anthropology and Education. The latter are active when information is transferred; they use an appropriate speech pattern; facilitate one’s information perception; put information in context; act on imposition and legitimacy of information; and take part on one’s background through information. Taking all the above points into consideration, there we will be a sort of information applied in a strategic way, which will work as a link between health professionals and the communities they intend to alter.Key words: Social intervention actions, Informational intervention actions, Health information, Informational strategies, Information Science.
Conteúdo:
INTRODUÇÃO
A Ciência da Informação, com sua interdisciplinaridade é a base deste artigo. A transferência da informação tem sido ao longo dos anos um tema de destaque para a Ciência da Informação. Uma busca teórica foi feita nessa área do conhecimento, mas não foi encontrado, formalmente, um conceito de estratégia que é, para este trabalho, um dispositivo que facilita ou torna ágil o processo de transferência de informação entre indivíduos. Para estabelecer uma tipologia de estratégias informacionais, foi necessário, portanto, buscar autores das áreas que abordassem em suas teorias ações semelhantes as das estratégias, tal como são vistas aqui. Sobre isso falaremos mais tarde, ao mencionarmos as estratégias informacionais.
O objetivo da criação das estratégias informacionais está diretamente ligado às ações de intervenção social na área da saúde. Informação em saúde, quando bem assimilada pode até mesmo salvar vidas. Ela tem despertado um interesse cada vez maior em nossa sociedade. Um manancial de informações sobre esse tema, é divulgado pela mídia, todos os dias.
De acordo com Bruno 1, o sujeito contemporâneo é constantemente informado sobre as causas possíveis das doenças que pode contrair, sobre os alimentos que podem evitar enfermidades futuras, sobre exercícios e hábitos que garantem um corpo belo e saudável [...] Os homens se percebem possibilidades capacitados para programarem suas vidas com o fim de evitarem virtuais possibilidades de adoecer.
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), saúde é um completo estado de bem-estar físico, mental e social e não a mera ausência de moléstia ou doença. Para que isso ocorra, muitas vezes, é necessário desenvolver ações de intervenção em um grupo social e seu habitat e essas ações têm como objetivos, na maioria dos casos, prevenirem doenças e promover a saúde.
O conceito de intervenção social idealizado por este trabalho assemelha-se ao conceito utilizado pelo Centro de Investigação e de Intervenção Social (CIS) 2 de Portugal. Essa instituição não tem fins lucrativos e, desde 1989, ocupa-se em promover e desenvolver pesquisas em intervenção social, treinamento em psicologia social e estudos em cognição social. Os membros do CIS desenvolvem pesquisas aplicadas e teorias básicas orientadas para a exclusão social, meio ambiente, educação, saúde, mídia, comportamento, cultura e resolução de conflitos sociais, temas de interesse também para o nosso país. Essas pesquisas são baseadas em ações de instituições públicas e privadas, escolas e ONGs. Ratificando a preocupação do CIS ao desenvolver pesquisas sobre esses temas, Dr. Paulo Buss 3, atual presidente da FIOCRUZ, afirma que, particularmente em países como o Brasil e outros da América Latina, a péssima distribuição de renda, o analfabetismo e o baixo grau de escolaridade, assim como as condições precárias de habitação e ambiente têm um papel muito importante nas condições de vida e saúde.
Essas preocupações não se restringem às regiões acima citadas, nem tampouco são recentes. Um resumo histórico, aqui apresentado, mostra que essas preocupações existem há algum tempo e são objetos de um movimento internacional no campo da saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) realizaram, em 1978, a I Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, em Alma-Ata, na URSS. Nela a saúde foi reafirmada como direito humano fundamental; as desigualdades sociais foram consideradas inaceitáveis; os governos foram responsabilizados pela saúde dos cidadãos e foi dado a estes o direito de participar das decisões sobre saúde. Essas conclusões e recomendações foram utilizadas pelos defensores da promoção da saúde, na reunião de 1986 em Ottawa.
Nas duas últimas décadas, países desenvolvidos como o Canadá, os Estados Unidos e os da Europa Ocidental estão empenhados em conceituar e praticar a promoção da saúde. Conferências internacionais sobre o tema têm sido realizadas, sendo uma das mais importantes a conferência realizada em Ottawa , no Canadá (1986), a de Adelaide, na Austrália (1988) e a de Sundsval, na Suécia (1991). Outras foram realizadas em Jacarta, na Indonésia (1997) e na capital do México (2000). A América do Sul foi palco da Conferência Internacional de Promoção da Saúde, em 1992, na cidade de Santa Fé de Bogotá, na Colômbia.
Para entendermos melhor os objetos dessas reuniões será dado destaque a duas importantes metas: promoção da saúde e prevenção de doenças.
A PROMOÇÃO DA SAÚDE
A promoção da saúde apresenta um caráter histórico. Rodrigues 4, em suas pesquisas sobre os cuidados corporais, necessários para promover a boa saúde, verificou que esses foram transmitidos, aos poucos e com o tempo, das classes superiores para as classes médias da sociedade e, posteriormente, das áreas urbanas para as áreas do campo. Os padrões ocidentais foram disseminando-se, ao longo da história, de cima para baixo, ou seja, mantendo a visão específica de grupos e culturas.
Estes movimentos, normalmente têm como objetivo “aburguesar” a sensibilidade operária, popular ou nativa, dentro do que for possível, fazendo recursos à modulação dos seus ímpetos de transbordamento, visando ao refinamento de seus sentimentos e à disciplinarização de suas formas de conduta. Esta vontade de aburguesar é compreensível, na medida em que acompanha quase sempre a expansão do sistema capitalista e industrial.
Sobre promoção da saúde, que requer diferentes saberes para seu estudo e aplicação, nos dias de hoje, Buss 5 afirma que partindo de uma concepção ampla do processo saúde-doença e de seus determinantes, a promoção da saúde propõe a articulação de saberes técnicos e populares e a mobilização de recursos institucionais e comunitários, públicos e privados para seu enfrentamento e resolução.
A saúde é tida como fundamental para o desenvolvimento humano. Segundo a Carta de Ottawa, 6 tanto indivíduos quanto comunidades devem poder conhecer e controlar sua saúde. Entre os principais meios de capacitação para a promoção da saúde estão: ambientes favoráveis, habilidade para viver melhor e acesso à informação sobre saúde.
Percebe-se que a promoção da saúde amplia seu escopo e, segundo Buss 7 passa a relacionar vida, saúde, solidariedade, eqüidade, democracia, cidadania, desenvolvimento, participação e parceria.
Essa visão de promoção da saúde refere-se a ações do Estado, da comunidade, de indivíduos, do sistema de saúde e de parcerias intersetoriais, trabalhando com a idéia de “responsabilização múltipla” para problemas e suas soluções.
Para Queiroz et al. 8, os usuários e as coletividades devem ser participantes, com liberdade e direito de tomar decisões conscientes sobre sua saúde.
Portanto, a promoção da saúde extrapola seu campo específico e atinge o campo político e social. Para Czeresnia et al. 9 o movimento sanitário associa a conquista da saúde ao próprio processo de democratização da sociedade brasileira, tendo por base a compreensão de que a saúde da população resulta da forma como se organiza a sociedade.
O documento de Lalonde 10, ex-Ministro da Saúde do Canadá, propõe, como meio para a promoção da saúde, informar, influenciar e assistir a indivíduos e organizações para que assumam maiores responsabilidades e sejam mais ativos em matéria de saúde.
No entanto, afirma Czeresnia et al. 11, é necessário observar que não há como trabalhar devidamente e de modo prático a construção da idéia de promoção da saúde sem enfrentar duas questões fundamentais e interligadas: a necessidade da reflexão filosófica e a conseqüente reconfiguração da educação (comunicação) nas práticas de saúde.
Sobre as intervenções educacionais concretas, elas não estão se desenvolvendo no mesmo ritmo dos estudos da Antropologia da Saúde e das Ciências Sociais. De acordo com Gazzinelli et al. 12, elas continuam utilizando métodos e estratégias dos modelos teóricos da psicologia comportamental, acarretando, em decorrência, um profundo hiato entre a teoria e a prática.
Enfatizando o que foi dito acima, Ayres et al. 13 afirmam que: Por esta mesma razão, o enfoque educacional, tão fundamental nos processos de promoção da saúde e prevenção de agravos, não pode ficar preso às tendências modeladoras, fortemente difundidas a partir do paradigma comportamentalista. A atitude construtivista é aquela que melhor parece concorrer para que as pessoas possam de fato buscar e se apropriar de informações que façam sentido para elas, se mobilizar autenticamente e achar as alternativas práticas que permitam superar as situações que as vulnerabilizam.
Promoção da saúde, hoje, engloba mudanças de estilo de vida com abordagens educacional e comportamental quanto à redução de alguns riscos relacionados ao fumo, álcool, drogas, erros de nutrição, falta de exercícios, obesidade e estresse, em outras palavras, visam um comportamento saudável. Há uma mediação entre as questões de saúde e as questões ambientais e sociais. Os resultados dessas mudanças são previstos para o médio e longo prazo e são também de difícil aferição, isto é, tem uma avaliação complexa de custo/benefício.
Resumindo as opiniões acima expostas, é possível dizer que a promoção da saúde busca:
- Modificar condições de vida dos indivíduos tornando-a digna;
- Transformar os processos individuais na tomada de decisão no que se refere à
saúde e qualidade de vida;
- Melhorar as condições de bem estar físico e social.
Conclui-se que a promoção da saúde tem caráter social, político e cultural, sendo contínua e dinâmica.
Wallerstein et al. 14 afirmam que a promoção de saúde é um processo de preparo de indivíduos e comunidades para aumentar o controle sobre determinantes de doenças e assim proporcionar saúde. Tal processo requer envolvimento direto dos indivíduos e comunidades na obtenção de troca, combinando-se com a ação política dirigida para a criação de meio condutor para a saúde.
Promoção da saúde tem um foco mais abrangente do que prevenção, pois faz referência a medidas que não são específicas para uma determinada doença, mas servem para aumentar a saúde e o bem estar, de um modo geral.
A PREVENÇÃO DE DOENÇAS
A redução de vulnerabilidade está na base das ações de prevenção de doenças. Há uma intrínseca responsabilidade, tanto das autoridades da área da saúde quanto dos indivíduos, que vai mais além do que a tarefa de alertar sobre um problema de saúde. Todos devem colaborar na superação de obstáculos materiais, culturais e políticos para proteger e promover mobilizações contra doenças.
Uma tal ampliação de objetos e estratégias torna claro que as ações de redução de vulnerabilidade não podem se tornar efetivas e operacionais se as mantivermos restritas à esfera institucional da saúde. A ação intersetorial é fundamental. No mínimo saúde e educação, mas, quando conseguimos articular também as áreas de trabalho, bem-estar social, jurídica e cultural, as chances de melhores resultados se expandem proporcionalment, declaram Ayres et al.15
As ações preventivas são de caráter intervencional para evitar o surgimento de doenças específicas e/ou reduzir suas incidências.
Czeresnia 16 considera que a base do discurso preventivo é o conhecimento epidemiológico moderno; seu objetivo é o controle da transmissão de doenças infecciosas e a redução de riscos de doenças degenerativas ou outros agravos específicos. Os projetos de prevenção e de educação em saúde estruturam-se mediante a divulgação de informação científica e de recomendações normativas de mudanças de hábitos.
O conhecimento epidemiológico se desenvolve por meio do cruzamento de dados informacionais existentes em bases de dados produzidas, na maioria dos casos, por instituições governamentais de saúde no âmbito federal, estadual e municipal.
Uma intervenção preventiva, geralmente, possui metas específicas e espera alcançar resultados dentro de um curto prazo. Tem uma avaliação boa sobre custo/benefício, pode ser medida por meio dos eventos (incidentes, mortalidade etc.) e é baseada na participação da população e dos técnicos da saúde.
Parece igualmente claro que a busca de resposta social coloca no centro da arena das práticas preventivas não mais o sujeito técnico, com seu saber e recursos especializados, mas sim aqueles capazes de melhor apreender e lidar com os obstáculos à sua saúde, os próprios sujeitos sociais afetados. É bom que se repita que isso não esvazia o papel do técnico, apenas o reposiciona e complexifica suas tarefas na concepção, desenvolvimento e monitoramento das estratégias. O técnico da saúde, e nisso ele será insubstituível, deve ser agora um mediador do encontro que deve se dar entre a população e o conjunto de recursos de que uma sociedade dispõe (informações, serviços, insumos, etc.) para construir sua saúde, de acordo com Ayres et al. 17
De forma resumida é possível dizer que a prevenção de doenças visa:
- Dar foco à doença;
- Dar foco aos mecanismos de combate à doença;
- Agir para deter, controlar e enfraquecer fatores de risco ou causas de enfermidades ou enfermidade específica.
A ação de prevenção, que necessita de conhecimento específico, visa o controle ou fim da doença, tendo duração estabelecida.
A INFORMAÇÃO NAS AÇÕES DE SAÚDE
Para trabalhar a questão da informação, mesmo sendo na área da saúde, foram utilizados como base teórica autores clássicos da Ciência da Informação.
Os textos citados, primeiramente, são de autores da visão cognitivista da Ciência da Informação, cujos conceitos permanecem vigentes até hoje. Eles recomendam que o reconhecimento da informação seja feito pelo usuário, de maneira a possibilitar a validade de uma informação por esse mesmo usuário. No entanto, no momento do acesso à informação, os teóricos clássicos reconhecem que podem ocorrer barreiras, que impossibilitam a assimilação plena da informação pelo usuário. Pensando numa forma de ultrapassar essas barreiras, à autora deste artigo ocorreu a idéia da construção de estratégias. Elas teriam o papel de minimizar esses entraves informacionais. Como estamos tratando de informação em saúde, a importância dessa assimilação aumenta, pois ela contribui para a melhoria das condições de vida e para o exercício da cidadania de seus usuários.
A informação em saúde colabora na prevenção de doenças e na promoção da saúde, na medida em que proporciona uma mudança no comportamento dos indivíduos. Portanto, trata-se de uma informação que altera a estrutura cognitiva dos indivíduos e desencadeia ações que podem ser, entre outras, a mudança de comportamento.
A informação, com esse objetivo, vem sendo estudada pelos teóricos da visão cognitivista da Ciência da Informação há muito tempo. Brookes 18 afirmava que a informação perpassa todas as atividades humanas, sendo difícil separar seus efeitos objetivos e subjetivos. A informação não é apenas lingüística, segundo ele. A linguagem, incluindo a imagética, é empregada em apenas parte da totalidade das informações potencialmente acessíveis no nosso meio ambiente atual. As informações objetivas que nos atingem tornam-se subjetivas para cada um de nós.
A informação depende de uma observação sensorial, mas o dado sensível, assim percebido, tem que ser interpretado subjetivamente por uma estrutura de conhecimento para se tornar informação. [...] A absorção da informação pela estrutura do conhecimento pode ocasionar não uma simples adição, mas algum ajuste na estrutura, uma espécie mudança nas relações entre conceitos já existentes e aceitos, ainda de acordo com estudos de Brookes. 19
Como elemento facilitador do processo de transferência da informação, Belkin 20, outro autor clássico da Ciência da Informação, aponta a relação do usuário/receptor com o discurso por meio de sua forma, idioma, estrutura lógica, narrativa e vocabulário. Ressalta, porém, que a capacidade persuasiva da fonte pode levar o usuário/receptor a respostas diferenciadas.
A intenção do emissor da informação, segundo Wersig 21, também autor clássico da Ciência da Informação, deve ser a de aperfeiçoar a comunicação de forma a transferir as informações da melhor forma possível e de maneira simples. Mas, o ideal é conhecer as necessidades informacionais daqueles que receberão as informações.
Ao falar sobre o treinamento de usuários, Wersig 22, aponta barreiras informacionais que são, para nós, antíteses das estratégias. Ele cita, por exemplo: a barreira terminológica, a barreira de capacidade de leitura ou de nível de entendimento, a barreira do tempo etc.
Roberts 23, aqui citado também como autor clássico da Ciência da Informação, afirma que a informação é adquirida no meio ambiente, mas nem sempre em formas estruturadas, por indivíduos que já possuem seus próprios estoques de informações e uma série de atitudes associadas a eles. As mudanças informacionais podem estar associadas a inputs informacionais que não são simplesmente adquiridos. Eles são avaliados, aceitos ou rejeitados, relacionados, manipulados e, possivelmente, exercem influência nas variadas maneiras de informar.
Essa afirmação leva a uma ligação entre os teóricos da visão cognitivista e os teóricos clássicos da visão social da Ciência da Informação, que chamam a atenção sobre a necessidade de contextualização da informação. Sobre essa visão social passaremos a falar agora.
Capurro 24, filósofo e teórico da Ciência da informação, diz que é preciso ressaltar a condição contextual da informação, isto é, as dimensões históricas, culturais, econômicas e políticas da informação, dimensões que são essenciais para sua compreensão.
Barreto 25, teórico brasileiro da Ciência da Informação, completa, afirmando que os produtores de informação estão limitados pelas competências contextuais e cognitivas dos habitantes de realidades diferenciadas; necessitam, pois, adotar estratégias de distribuição, que viabilizem a aceitação de seu produto.
Observa-se, conseqüentemente, que o valor da informação está localizado em uma realidade específica e potencializado na transferência. Esse valor é relativo e específico para cada indivíduo e depende da preferência por uma informação em detrimento de outra e da competência cognitiva para compreender as informações e estabelecer possível comparação.
Para González de Gómez 26, teórica argentina da Ciência da Informação, atuando no Brasil, o valor da informação é considerado como fruto de uma seleção individual e social, que pode incluir fatores de caráter emocional, cultural, prático e gnoseológico. Também é importante ressaltar que González de Gómez 27 considera o “interesse” como o princípio de vinculação e de diferenciação informacional. As estratégias informacionais podem colaborar na construção deste “interesse”.
O uso das estratégias informacionais, aqui propostas, pode fornecer valor agregado à informação.
No caso da Saúde, as estratégias empregadas nas ações de intervenção social são éticas, pois visam salvar vidas ou melhorar suas condições. As intervenções informacionais constituídas pelas estratégias também são éticas por adequarem a informação ao indivíduo e seu grupo e, dessa maneira, promoverem a inclusão social.
AS ESTRATÉGIAS INFORMACIONAIS
Tanto na promoção da saúde quanto na prevenção de doenças, faz-se necessário o uso de estratégias, entre as quais podem ser incluídas as informacionais.
Usar estratégias, para captar a atenção dos indivíduos de um grupo e assim facilitar a transferência de informações, utilizando elementos culturais dessa sociedade, é legítimo. É preciso, no entanto, conhecer predisposições e processos internos como, por exemplo, mudança de atitude, dissonância cognitiva ou expectativas sociais ou culturais complexas.
As estratégias resultantes desta pesquisa se encontram em um plano micro. Elas estão internalizadas no discurso informacional e podem ser observadas no momento da seleção de informações a serem repassadas, assim como podem ser inseridas em produtos informacionais tais como: vídeos, folhetos, cartilhas, hipertextos e sites, empregados nas ações de intervenção social na saúde. As estratégias informacionais, de acordo com sua atuação, podem ser de diferentes tipos, conforme as estratégias abaixo citadas.
Elas foram construídas a partir de teorias de outras áreas do conhecimento tais como a Comunicação, Lingüística, Cognição, Sociologia, Antropologia e Educação uma vez que elas não existiam, conceitualmente, na Ciência da Informação.
ESTRATÉGIAS COMUNICACIONAIS
As estratégias informacionais comunicacionais são construídas a partir de conceitos e modelos teóricos da Comunicação e atuam no momento da transferência da informação do emissor para o receptor da informação.
Entre as estratégias desse tipo, uma sobressai-se por ser largamente empregada, em projetos de intervenção social: é a persuasão, que visa mudar o comportamento de seus espectadores. A persuasão aponta o tempo todo, que há necessidade do indivíduo se cuidar.
ESTRATÉGIAS DISCURSIVAS
As estratégias informacionais discursivas são construídas a partir de conceitos e modelos teóricos extraídos da Comunicação e da Lingüística. Elas são empregadas na formatação dos diversos tipos de discursos, inclusive os imagéticos.
Alguns conceitos da Lingüística, trabalhados para textos por Koch e Travaglia 28, são aqui oferecidos. Por exemplo: a intencionalidade (ela vai desde a intenção de estabelecer contato com o espectador até a de compartilhar opiniões ou a de provocar ações no indivíduo) e a coerência (ela oferece a possibilidade de estabelecimento de sentido ao conteúdo do produto informacional por parte do indivíduo).
ESTRATÉGIAS COGNITIVAS
As estratégias informacionais cognitivas, em sua criação e uso, observam conceitos e modelos da Cognição e atuam na percepção da informação pelo indivíduo.
A percepção, de acordo com a teoria cognitivista baseada no construtivismo, é uma construção elaborada a partir de esquemas mentais com dados obtidos pelos órgãos dos sentidos. Ela também é baseada no saber, nos sentimentos e nas crenças do indivíduo que, por sua vez, tem uma ligação com uma classe social, época ou cultura.
ESTRATÉGIAS SOCIOCULTURAIS
As estratégias informacionais socioculturais são construídas a partir de conceitos e modelos extraídos da Sociologia e da Antropologia e atuam na contextualização da informação.
Esse tipo de estratégia que atua a partir do conhecimento da realidade, da vida cotidiana do indivíduo, de suas necessidades, comportamento, interação e expectativa social, auxiliando a transferência da informação.
Nas intervenções ocorridas na área da saúde, pode ocorrer resistência ao conteúdo dos produtos informacionais. Pode acontecer uma não aceitação do que é comunicado por conta da diversidade de valores culturais do indivíduo ou pela descontextualização desse conteúdo. A resistência é parte do processo político e cultural dessa forma de comunicar.
ESTRATÉGIAS DE PODER
As estratégias informacionais de poder são estabelecidas a partir do lugar de fala de quem transfere a informação. Elas se constituem por meio do próprio discurso, da imagem, do contexto social dentro de um tempo e um espaço histórico. Elas atuam na imposição ou legitimação da informação.
O discurso científico, caso do discurso da saúde, é tido como competente e como uma forma de poder.
Discurso competente é a ciência como saber separado e como coisa privada, como instrumento de dominação no mundo contemporâneo. O discurso competente se instala e se conserva [declarando que] não é qualquer um que pode dizer qualquer coisa a qualquer outro em qualquer ocasião e em qualquer lugar, afirma Chauí. 29
Uma relação de poder é imediatamente estabelecida no momento em que alguém (instituição, governo, pesquisador etc.) resolve elaborar um produto informacional (discurso competente) a ser empregado em ações de intervenção social para aqueles que necessitam (presumivelmente os que não conhecem) da informação nele veiculada.
ESTRATÉGIAS EDUCACIONAIS
As estratégias informacionais educacionais são construídas a partir de conceitos e modelos obtidos da Educação e atuam na formação e renovação dos indivíduos pela informação, para a vida individual, estando fortemente ligada à Comunicação. Ela mune o indivíduo com informações, proporcionando-lhe senso crítico e desenvolvendo capacidades para resolver problemas. Aprender significa saber como agir.
Os projetos de intervenção social da área da saúde, em sua maioria, visam reduzir os índices de infestações de doenças nas áreas urbanas e rurais, impedindo que se transformem em epidemias. Também visam melhorar a qualidade de vida e educar o indivíduo e seu grupo.
Mas nem sempre isso ocorre, porque é necessário que a população tenha um nível educacional suficiente para assimilar as informações que, por sua vez, devem ser transmitidas da maneira adequada a essa população.
A Ciência da Informação, com sua interdisciplinaridade é a base deste artigo. A transferência da informação tem sido ao longo dos anos um tema de destaque para a Ciência da Informação. Uma busca teórica foi feita nessa área do conhecimento, mas não foi encontrado, formalmente, um conceito de estratégia que é, para este trabalho, um dispositivo que facilita ou torna ágil o processo de transferência de informação entre indivíduos. Para estabelecer uma tipologia de estratégias informacionais, foi necessário, portanto, buscar autores das áreas que abordassem em suas teorias ações semelhantes as das estratégias, tal como são vistas aqui. Sobre isso falaremos mais tarde, ao mencionarmos as estratégias informacionais.
O objetivo da criação das estratégias informacionais está diretamente ligado às ações de intervenção social na área da saúde. Informação em saúde, quando bem assimilada pode até mesmo salvar vidas. Ela tem despertado um interesse cada vez maior em nossa sociedade. Um manancial de informações sobre esse tema, é divulgado pela mídia, todos os dias.
De acordo com Bruno 1, o sujeito contemporâneo é constantemente informado sobre as causas possíveis das doenças que pode contrair, sobre os alimentos que podem evitar enfermidades futuras, sobre exercícios e hábitos que garantem um corpo belo e saudável [...] Os homens se percebem possibilidades capacitados para programarem suas vidas com o fim de evitarem virtuais possibilidades de adoecer.
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), saúde é um completo estado de bem-estar físico, mental e social e não a mera ausência de moléstia ou doença. Para que isso ocorra, muitas vezes, é necessário desenvolver ações de intervenção em um grupo social e seu habitat e essas ações têm como objetivos, na maioria dos casos, prevenirem doenças e promover a saúde.
O conceito de intervenção social idealizado por este trabalho assemelha-se ao conceito utilizado pelo Centro de Investigação e de Intervenção Social (CIS) 2 de Portugal. Essa instituição não tem fins lucrativos e, desde 1989, ocupa-se em promover e desenvolver pesquisas em intervenção social, treinamento em psicologia social e estudos em cognição social. Os membros do CIS desenvolvem pesquisas aplicadas e teorias básicas orientadas para a exclusão social, meio ambiente, educação, saúde, mídia, comportamento, cultura e resolução de conflitos sociais, temas de interesse também para o nosso país. Essas pesquisas são baseadas em ações de instituições públicas e privadas, escolas e ONGs. Ratificando a preocupação do CIS ao desenvolver pesquisas sobre esses temas, Dr. Paulo Buss 3, atual presidente da FIOCRUZ, afirma que, particularmente em países como o Brasil e outros da América Latina, a péssima distribuição de renda, o analfabetismo e o baixo grau de escolaridade, assim como as condições precárias de habitação e ambiente têm um papel muito importante nas condições de vida e saúde.
Essas preocupações não se restringem às regiões acima citadas, nem tampouco são recentes. Um resumo histórico, aqui apresentado, mostra que essas preocupações existem há algum tempo e são objetos de um movimento internacional no campo da saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) realizaram, em 1978, a I Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, em Alma-Ata, na URSS. Nela a saúde foi reafirmada como direito humano fundamental; as desigualdades sociais foram consideradas inaceitáveis; os governos foram responsabilizados pela saúde dos cidadãos e foi dado a estes o direito de participar das decisões sobre saúde. Essas conclusões e recomendações foram utilizadas pelos defensores da promoção da saúde, na reunião de 1986 em Ottawa.
Nas duas últimas décadas, países desenvolvidos como o Canadá, os Estados Unidos e os da Europa Ocidental estão empenhados em conceituar e praticar a promoção da saúde. Conferências internacionais sobre o tema têm sido realizadas, sendo uma das mais importantes a conferência realizada em Ottawa , no Canadá (1986), a de Adelaide, na Austrália (1988) e a de Sundsval, na Suécia (1991). Outras foram realizadas em Jacarta, na Indonésia (1997) e na capital do México (2000). A América do Sul foi palco da Conferência Internacional de Promoção da Saúde, em 1992, na cidade de Santa Fé de Bogotá, na Colômbia.
Para entendermos melhor os objetos dessas reuniões será dado destaque a duas importantes metas: promoção da saúde e prevenção de doenças.
A PROMOÇÃO DA SAÚDE
A promoção da saúde apresenta um caráter histórico. Rodrigues 4, em suas pesquisas sobre os cuidados corporais, necessários para promover a boa saúde, verificou que esses foram transmitidos, aos poucos e com o tempo, das classes superiores para as classes médias da sociedade e, posteriormente, das áreas urbanas para as áreas do campo. Os padrões ocidentais foram disseminando-se, ao longo da história, de cima para baixo, ou seja, mantendo a visão específica de grupos e culturas.
Estes movimentos, normalmente têm como objetivo “aburguesar” a sensibilidade operária, popular ou nativa, dentro do que for possível, fazendo recursos à modulação dos seus ímpetos de transbordamento, visando ao refinamento de seus sentimentos e à disciplinarização de suas formas de conduta. Esta vontade de aburguesar é compreensível, na medida em que acompanha quase sempre a expansão do sistema capitalista e industrial.
Sobre promoção da saúde, que requer diferentes saberes para seu estudo e aplicação, nos dias de hoje, Buss 5 afirma que partindo de uma concepção ampla do processo saúde-doença e de seus determinantes, a promoção da saúde propõe a articulação de saberes técnicos e populares e a mobilização de recursos institucionais e comunitários, públicos e privados para seu enfrentamento e resolução.
A saúde é tida como fundamental para o desenvolvimento humano. Segundo a Carta de Ottawa, 6 tanto indivíduos quanto comunidades devem poder conhecer e controlar sua saúde. Entre os principais meios de capacitação para a promoção da saúde estão: ambientes favoráveis, habilidade para viver melhor e acesso à informação sobre saúde.
Percebe-se que a promoção da saúde amplia seu escopo e, segundo Buss 7 passa a relacionar vida, saúde, solidariedade, eqüidade, democracia, cidadania, desenvolvimento, participação e parceria.
Essa visão de promoção da saúde refere-se a ações do Estado, da comunidade, de indivíduos, do sistema de saúde e de parcerias intersetoriais, trabalhando com a idéia de “responsabilização múltipla” para problemas e suas soluções.
Para Queiroz et al. 8, os usuários e as coletividades devem ser participantes, com liberdade e direito de tomar decisões conscientes sobre sua saúde.
Portanto, a promoção da saúde extrapola seu campo específico e atinge o campo político e social. Para Czeresnia et al. 9 o movimento sanitário associa a conquista da saúde ao próprio processo de democratização da sociedade brasileira, tendo por base a compreensão de que a saúde da população resulta da forma como se organiza a sociedade.
O documento de Lalonde 10, ex-Ministro da Saúde do Canadá, propõe, como meio para a promoção da saúde, informar, influenciar e assistir a indivíduos e organizações para que assumam maiores responsabilidades e sejam mais ativos em matéria de saúde.
No entanto, afirma Czeresnia et al. 11, é necessário observar que não há como trabalhar devidamente e de modo prático a construção da idéia de promoção da saúde sem enfrentar duas questões fundamentais e interligadas: a necessidade da reflexão filosófica e a conseqüente reconfiguração da educação (comunicação) nas práticas de saúde.
Sobre as intervenções educacionais concretas, elas não estão se desenvolvendo no mesmo ritmo dos estudos da Antropologia da Saúde e das Ciências Sociais. De acordo com Gazzinelli et al. 12, elas continuam utilizando métodos e estratégias dos modelos teóricos da psicologia comportamental, acarretando, em decorrência, um profundo hiato entre a teoria e a prática.
Enfatizando o que foi dito acima, Ayres et al. 13 afirmam que: Por esta mesma razão, o enfoque educacional, tão fundamental nos processos de promoção da saúde e prevenção de agravos, não pode ficar preso às tendências modeladoras, fortemente difundidas a partir do paradigma comportamentalista. A atitude construtivista é aquela que melhor parece concorrer para que as pessoas possam de fato buscar e se apropriar de informações que façam sentido para elas, se mobilizar autenticamente e achar as alternativas práticas que permitam superar as situações que as vulnerabilizam.
Promoção da saúde, hoje, engloba mudanças de estilo de vida com abordagens educacional e comportamental quanto à redução de alguns riscos relacionados ao fumo, álcool, drogas, erros de nutrição, falta de exercícios, obesidade e estresse, em outras palavras, visam um comportamento saudável. Há uma mediação entre as questões de saúde e as questões ambientais e sociais. Os resultados dessas mudanças são previstos para o médio e longo prazo e são também de difícil aferição, isto é, tem uma avaliação complexa de custo/benefício.
Resumindo as opiniões acima expostas, é possível dizer que a promoção da saúde busca:
- Modificar condições de vida dos indivíduos tornando-a digna;
- Transformar os processos individuais na tomada de decisão no que se refere à
saúde e qualidade de vida;
- Melhorar as condições de bem estar físico e social.
Conclui-se que a promoção da saúde tem caráter social, político e cultural, sendo contínua e dinâmica.
Wallerstein et al. 14 afirmam que a promoção de saúde é um processo de preparo de indivíduos e comunidades para aumentar o controle sobre determinantes de doenças e assim proporcionar saúde. Tal processo requer envolvimento direto dos indivíduos e comunidades na obtenção de troca, combinando-se com a ação política dirigida para a criação de meio condutor para a saúde.
Promoção da saúde tem um foco mais abrangente do que prevenção, pois faz referência a medidas que não são específicas para uma determinada doença, mas servem para aumentar a saúde e o bem estar, de um modo geral.
A PREVENÇÃO DE DOENÇAS
A redução de vulnerabilidade está na base das ações de prevenção de doenças. Há uma intrínseca responsabilidade, tanto das autoridades da área da saúde quanto dos indivíduos, que vai mais além do que a tarefa de alertar sobre um problema de saúde. Todos devem colaborar na superação de obstáculos materiais, culturais e políticos para proteger e promover mobilizações contra doenças.
Uma tal ampliação de objetos e estratégias torna claro que as ações de redução de vulnerabilidade não podem se tornar efetivas e operacionais se as mantivermos restritas à esfera institucional da saúde. A ação intersetorial é fundamental. No mínimo saúde e educação, mas, quando conseguimos articular também as áreas de trabalho, bem-estar social, jurídica e cultural, as chances de melhores resultados se expandem proporcionalment, declaram Ayres et al.15
As ações preventivas são de caráter intervencional para evitar o surgimento de doenças específicas e/ou reduzir suas incidências.
Czeresnia 16 considera que a base do discurso preventivo é o conhecimento epidemiológico moderno; seu objetivo é o controle da transmissão de doenças infecciosas e a redução de riscos de doenças degenerativas ou outros agravos específicos. Os projetos de prevenção e de educação em saúde estruturam-se mediante a divulgação de informação científica e de recomendações normativas de mudanças de hábitos.
O conhecimento epidemiológico se desenvolve por meio do cruzamento de dados informacionais existentes em bases de dados produzidas, na maioria dos casos, por instituições governamentais de saúde no âmbito federal, estadual e municipal.
Uma intervenção preventiva, geralmente, possui metas específicas e espera alcançar resultados dentro de um curto prazo. Tem uma avaliação boa sobre custo/benefício, pode ser medida por meio dos eventos (incidentes, mortalidade etc.) e é baseada na participação da população e dos técnicos da saúde.
Parece igualmente claro que a busca de resposta social coloca no centro da arena das práticas preventivas não mais o sujeito técnico, com seu saber e recursos especializados, mas sim aqueles capazes de melhor apreender e lidar com os obstáculos à sua saúde, os próprios sujeitos sociais afetados. É bom que se repita que isso não esvazia o papel do técnico, apenas o reposiciona e complexifica suas tarefas na concepção, desenvolvimento e monitoramento das estratégias. O técnico da saúde, e nisso ele será insubstituível, deve ser agora um mediador do encontro que deve se dar entre a população e o conjunto de recursos de que uma sociedade dispõe (informações, serviços, insumos, etc.) para construir sua saúde, de acordo com Ayres et al. 17
De forma resumida é possível dizer que a prevenção de doenças visa:
- Dar foco à doença;
- Dar foco aos mecanismos de combate à doença;
- Agir para deter, controlar e enfraquecer fatores de risco ou causas de enfermidades ou enfermidade específica.
A ação de prevenção, que necessita de conhecimento específico, visa o controle ou fim da doença, tendo duração estabelecida.
A INFORMAÇÃO NAS AÇÕES DE SAÚDE
Para trabalhar a questão da informação, mesmo sendo na área da saúde, foram utilizados como base teórica autores clássicos da Ciência da Informação.
Os textos citados, primeiramente, são de autores da visão cognitivista da Ciência da Informação, cujos conceitos permanecem vigentes até hoje. Eles recomendam que o reconhecimento da informação seja feito pelo usuário, de maneira a possibilitar a validade de uma informação por esse mesmo usuário. No entanto, no momento do acesso à informação, os teóricos clássicos reconhecem que podem ocorrer barreiras, que impossibilitam a assimilação plena da informação pelo usuário. Pensando numa forma de ultrapassar essas barreiras, à autora deste artigo ocorreu a idéia da construção de estratégias. Elas teriam o papel de minimizar esses entraves informacionais. Como estamos tratando de informação em saúde, a importância dessa assimilação aumenta, pois ela contribui para a melhoria das condições de vida e para o exercício da cidadania de seus usuários.
A informação em saúde colabora na prevenção de doenças e na promoção da saúde, na medida em que proporciona uma mudança no comportamento dos indivíduos. Portanto, trata-se de uma informação que altera a estrutura cognitiva dos indivíduos e desencadeia ações que podem ser, entre outras, a mudança de comportamento.
A informação, com esse objetivo, vem sendo estudada pelos teóricos da visão cognitivista da Ciência da Informação há muito tempo. Brookes 18 afirmava que a informação perpassa todas as atividades humanas, sendo difícil separar seus efeitos objetivos e subjetivos. A informação não é apenas lingüística, segundo ele. A linguagem, incluindo a imagética, é empregada em apenas parte da totalidade das informações potencialmente acessíveis no nosso meio ambiente atual. As informações objetivas que nos atingem tornam-se subjetivas para cada um de nós.
A informação depende de uma observação sensorial, mas o dado sensível, assim percebido, tem que ser interpretado subjetivamente por uma estrutura de conhecimento para se tornar informação. [...] A absorção da informação pela estrutura do conhecimento pode ocasionar não uma simples adição, mas algum ajuste na estrutura, uma espécie mudança nas relações entre conceitos já existentes e aceitos, ainda de acordo com estudos de Brookes. 19
Como elemento facilitador do processo de transferência da informação, Belkin 20, outro autor clássico da Ciência da Informação, aponta a relação do usuário/receptor com o discurso por meio de sua forma, idioma, estrutura lógica, narrativa e vocabulário. Ressalta, porém, que a capacidade persuasiva da fonte pode levar o usuário/receptor a respostas diferenciadas.
A intenção do emissor da informação, segundo Wersig 21, também autor clássico da Ciência da Informação, deve ser a de aperfeiçoar a comunicação de forma a transferir as informações da melhor forma possível e de maneira simples. Mas, o ideal é conhecer as necessidades informacionais daqueles que receberão as informações.
Ao falar sobre o treinamento de usuários, Wersig 22, aponta barreiras informacionais que são, para nós, antíteses das estratégias. Ele cita, por exemplo: a barreira terminológica, a barreira de capacidade de leitura ou de nível de entendimento, a barreira do tempo etc.
Roberts 23, aqui citado também como autor clássico da Ciência da Informação, afirma que a informação é adquirida no meio ambiente, mas nem sempre em formas estruturadas, por indivíduos que já possuem seus próprios estoques de informações e uma série de atitudes associadas a eles. As mudanças informacionais podem estar associadas a inputs informacionais que não são simplesmente adquiridos. Eles são avaliados, aceitos ou rejeitados, relacionados, manipulados e, possivelmente, exercem influência nas variadas maneiras de informar.
Essa afirmação leva a uma ligação entre os teóricos da visão cognitivista e os teóricos clássicos da visão social da Ciência da Informação, que chamam a atenção sobre a necessidade de contextualização da informação. Sobre essa visão social passaremos a falar agora.
Capurro 24, filósofo e teórico da Ciência da informação, diz que é preciso ressaltar a condição contextual da informação, isto é, as dimensões históricas, culturais, econômicas e políticas da informação, dimensões que são essenciais para sua compreensão.
Barreto 25, teórico brasileiro da Ciência da Informação, completa, afirmando que os produtores de informação estão limitados pelas competências contextuais e cognitivas dos habitantes de realidades diferenciadas; necessitam, pois, adotar estratégias de distribuição, que viabilizem a aceitação de seu produto.
Observa-se, conseqüentemente, que o valor da informação está localizado em uma realidade específica e potencializado na transferência. Esse valor é relativo e específico para cada indivíduo e depende da preferência por uma informação em detrimento de outra e da competência cognitiva para compreender as informações e estabelecer possível comparação.
Para González de Gómez 26, teórica argentina da Ciência da Informação, atuando no Brasil, o valor da informação é considerado como fruto de uma seleção individual e social, que pode incluir fatores de caráter emocional, cultural, prático e gnoseológico. Também é importante ressaltar que González de Gómez 27 considera o “interesse” como o princípio de vinculação e de diferenciação informacional. As estratégias informacionais podem colaborar na construção deste “interesse”.
O uso das estratégias informacionais, aqui propostas, pode fornecer valor agregado à informação.
No caso da Saúde, as estratégias empregadas nas ações de intervenção social são éticas, pois visam salvar vidas ou melhorar suas condições. As intervenções informacionais constituídas pelas estratégias também são éticas por adequarem a informação ao indivíduo e seu grupo e, dessa maneira, promoverem a inclusão social.
AS ESTRATÉGIAS INFORMACIONAIS
Tanto na promoção da saúde quanto na prevenção de doenças, faz-se necessário o uso de estratégias, entre as quais podem ser incluídas as informacionais.
Usar estratégias, para captar a atenção dos indivíduos de um grupo e assim facilitar a transferência de informações, utilizando elementos culturais dessa sociedade, é legítimo. É preciso, no entanto, conhecer predisposições e processos internos como, por exemplo, mudança de atitude, dissonância cognitiva ou expectativas sociais ou culturais complexas.
As estratégias resultantes desta pesquisa se encontram em um plano micro. Elas estão internalizadas no discurso informacional e podem ser observadas no momento da seleção de informações a serem repassadas, assim como podem ser inseridas em produtos informacionais tais como: vídeos, folhetos, cartilhas, hipertextos e sites, empregados nas ações de intervenção social na saúde. As estratégias informacionais, de acordo com sua atuação, podem ser de diferentes tipos, conforme as estratégias abaixo citadas.
Elas foram construídas a partir de teorias de outras áreas do conhecimento tais como a Comunicação, Lingüística, Cognição, Sociologia, Antropologia e Educação uma vez que elas não existiam, conceitualmente, na Ciência da Informação.
ESTRATÉGIAS COMUNICACIONAIS
As estratégias informacionais comunicacionais são construídas a partir de conceitos e modelos teóricos da Comunicação e atuam no momento da transferência da informação do emissor para o receptor da informação.
Entre as estratégias desse tipo, uma sobressai-se por ser largamente empregada, em projetos de intervenção social: é a persuasão, que visa mudar o comportamento de seus espectadores. A persuasão aponta o tempo todo, que há necessidade do indivíduo se cuidar.
ESTRATÉGIAS DISCURSIVAS
As estratégias informacionais discursivas são construídas a partir de conceitos e modelos teóricos extraídos da Comunicação e da Lingüística. Elas são empregadas na formatação dos diversos tipos de discursos, inclusive os imagéticos.
Alguns conceitos da Lingüística, trabalhados para textos por Koch e Travaglia 28, são aqui oferecidos. Por exemplo: a intencionalidade (ela vai desde a intenção de estabelecer contato com o espectador até a de compartilhar opiniões ou a de provocar ações no indivíduo) e a coerência (ela oferece a possibilidade de estabelecimento de sentido ao conteúdo do produto informacional por parte do indivíduo).
ESTRATÉGIAS COGNITIVAS
As estratégias informacionais cognitivas, em sua criação e uso, observam conceitos e modelos da Cognição e atuam na percepção da informação pelo indivíduo.
A percepção, de acordo com a teoria cognitivista baseada no construtivismo, é uma construção elaborada a partir de esquemas mentais com dados obtidos pelos órgãos dos sentidos. Ela também é baseada no saber, nos sentimentos e nas crenças do indivíduo que, por sua vez, tem uma ligação com uma classe social, época ou cultura.
ESTRATÉGIAS SOCIOCULTURAIS
As estratégias informacionais socioculturais são construídas a partir de conceitos e modelos extraídos da Sociologia e da Antropologia e atuam na contextualização da informação.
Esse tipo de estratégia que atua a partir do conhecimento da realidade, da vida cotidiana do indivíduo, de suas necessidades, comportamento, interação e expectativa social, auxiliando a transferência da informação.
Nas intervenções ocorridas na área da saúde, pode ocorrer resistência ao conteúdo dos produtos informacionais. Pode acontecer uma não aceitação do que é comunicado por conta da diversidade de valores culturais do indivíduo ou pela descontextualização desse conteúdo. A resistência é parte do processo político e cultural dessa forma de comunicar.
ESTRATÉGIAS DE PODER
As estratégias informacionais de poder são estabelecidas a partir do lugar de fala de quem transfere a informação. Elas se constituem por meio do próprio discurso, da imagem, do contexto social dentro de um tempo e um espaço histórico. Elas atuam na imposição ou legitimação da informação.
O discurso científico, caso do discurso da saúde, é tido como competente e como uma forma de poder.
Discurso competente é a ciência como saber separado e como coisa privada, como instrumento de dominação no mundo contemporâneo. O discurso competente se instala e se conserva [declarando que] não é qualquer um que pode dizer qualquer coisa a qualquer outro em qualquer ocasião e em qualquer lugar, afirma Chauí. 29
Uma relação de poder é imediatamente estabelecida no momento em que alguém (instituição, governo, pesquisador etc.) resolve elaborar um produto informacional (discurso competente) a ser empregado em ações de intervenção social para aqueles que necessitam (presumivelmente os que não conhecem) da informação nele veiculada.
ESTRATÉGIAS EDUCACIONAIS
As estratégias informacionais educacionais são construídas a partir de conceitos e modelos obtidos da Educação e atuam na formação e renovação dos indivíduos pela informação, para a vida individual, estando fortemente ligada à Comunicação. Ela mune o indivíduo com informações, proporcionando-lhe senso crítico e desenvolvendo capacidades para resolver problemas. Aprender significa saber como agir.
Os projetos de intervenção social da área da saúde, em sua maioria, visam reduzir os índices de infestações de doenças nas áreas urbanas e rurais, impedindo que se transformem em epidemias. Também visam melhorar a qualidade de vida e educar o indivíduo e seu grupo.
Mas nem sempre isso ocorre, porque é necessário que a população tenha um nível educacional suficiente para assimilar as informações que, por sua vez, devem ser transmitidas da maneira adequada a essa população.