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0213/2024 - Análise espaço-temporal dos óbitos por pré-eclâmpsia no cenário nacional (2009-2020)
Spatio-temporal analysis of deaths due to pre-eclampsia in the national scenario (2009-2020)

Autor:

• Bárbara Gomes Santos Freire - Freire, B. G. S. - <barbaragmss@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8892-2293

Coautor(es):

• Maria Luziene de Sousa Gomes - Gomes, M. L. S. - <luziene-94@hotmail.com, luzienegomes94@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8583-0959

• Ivana Rios Rodrigues - Rodrigues, I.R. - <ivana_rius@hotmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6558-6407

• Rebeca Silveira Rocha - Rocha, R. S. - <rebecarochac@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9825-6298

• Jader de Oliveira Santos - Santos, J. O. - <jadersantos@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2977-7086

• Ana Carolina Maria Araújo Chagas Costa Lima - Lima, A. C. M. A. C. C. - <anacarolinamaccl@gmail.com>

• Mônica Oliveira Batista Oriá - Oriá, M. O. B - <oriaremon@hotmail.com>



Resumo:

Há escassez de estudos de base populacional relacionados a Pré-eclâmpsia. O objetivo do estudo foi analisar a distribuição espacial e temporal dos óbitos por Pré-eclâmpsia no Brasil de 2009 a 2020, incluindo o perfil sociodemográfico, padrão de distribuição e presença de aglomerados espaço-temporais. Estudo ecológico, de base populacional, tendo o território brasileiro como unidade de análise. A população foi composta pelos óbitos de gestantes e puérperas notificados de 2009 a 2020, tendo a Pré-eclâmpsia como causa básica e/ou associada. Os dados foram obtidos no Sistema de Informação sobre Mortalidade. A tendência temporal dos indicadores de mortalidade foi calculada por meio de modelos de regressão joinpoint e padronizados pela idade. Para analisar a distribuição espacial e padrão espaço-temporal do desfecho, foram utilizadas técnicas de geoprocessamento. Os resultados apontam 4.095 óbitos associados à PE em 8,9% dos municípios brasileiros. Foram identificados clusters espaciais de alto risco em maior magnitude no Nordeste (31 municípios), frente a clusters de baixo risco na região sudeste e sul. Os resultados encontrados indicam tendência predominante de ascensão do desfecho no território brasileiro com associação a variáveis relacionadas a vulnerabilidade social.

Palavras-chave:

Mortalidade materna; Pré-eclâmpsia; Estudos ecológicos; Análise espacial

Abstract:

Population-based studies related to Pre-eclampsia are scarce. The aim was to analyze the spatial and temporal distribution of deaths due to Pre-eclampsia in Brazil2009 to 2020, characterizing the sociodemographic profile, distribution pattern, and presence of spatio-temporal clusters. Ecological, population-based study, using the Brazilian territory as the unit of analysis. The population was made up of all deaths of pregnant and postpartum women reported in Brazil,2009 to 2020, with pre-eclampsia as the underlying and/or associated cause. The data were obtainedthe Mortality Information System. The temporal trend of mortality indicators was calculated using joinpoint regression models and standardized by age. To analyze the spatial distribution and spatio-temporal pattern of the outcome, geoprocessing techniques were used. The results point to the registration of 4,095 deaths associated with PE in 8.9% of Brazilian municipalities. High-risk spatial clusters of greater magnitude were identified in the Northeast, in 31 municipalities, compared to low-risk clusters in the Southeast and South regions. The results indicate a predominant upward trend in the outcome in Brazilian territory, associated with variables related to social vulnerability.

Keywords:

Maternal mortality; Gestational hypertensive syndromes; Preeclampsia; Ecological studies; Spatial analysis

Conteúdo:

Introdução
As Síndromes Hipertensivas da Gestação (SHG) são a principal causa de morte materna e neonatal no cenário mundial. Dentre estas, a pré-eclâmpsia (PE) é responsável por altos índices de morbimortalidade, afetando de 5% a 7% de todas as gestações, com desfechos associados a cerca de 70.000 mortes maternas e 500.000 mortes fetais por ano em todo o mundo1.
Desta feita, a PE confere um relevante fator de risco a desfechos maternos e neonatais desfavoráveis, ao passo que o risco de morte perinatal entre mulheres com PE e eclâmpsia é elevado entre três e cinco vezes, respectivamente, estando associada a quadros como descolamento prematuro da placenta, hemorragia pós-parto, complicações de múltiplos órgãos e retardo do crescimento fetal2.
No cenário nacional, os números da PE são subestimados em decorrência da escassez de estudos de base populacional. Nesse contexto, faz-se relevante considerar que a gravidez se desenvolve em um contexto sociocultural, para além dos critérios clínicos de pré-natal, o qual determina sua evolução e trajetória, cabendo o destaque de variáveis como antecedentes obstétricos, conjuntura socioeconômica e demográfica enquanto fatores de risco preditores de desigualdades sociais em saúde3.
Mediante o cenário de complexidade dos fatores que envolvem o contexto gestacional, estratégias de vigilância em saúde podem ser úteis à compreensão, análise e previsão do comportamento do agravo no cenário espacial e temporal, corroborando ao conhecimento acerca da associação entre determinantes e condicionantes sociais na saúde materno-infantil, nesse cenário a identificação de áreas prioritárias de atuação, refletindo na formulação de estratégias direcionadas ao enfrentamento da problemática, sejam no âmbito das políticas públicas, rotinas e serviços de saúde e/ou auxílio social4.
Nesse sentido, as técnicas de geoprocessamento constituem importante ferramentas de avaliação do panorama de agravos e/ou impacto de políticas públicas direcionadas a estratos da população, atuando de maneira eficiente na monitoração da saúde de cada território, visto que possibilita a identificação de grupos populacionais vulneráveis, áreas de risco e hierarquização de prioridades5.
Dado o exposto, o estudo objetiva analisar a distribuição espacial e temporal dos óbitos por PE no Brasil no período de 2009 a 2020, mediante caracterização do perfil sociodemográfico, padrão de distribuição e presença de aglomerados espaço-temporais que concentram os óbitos por PE nos municípios brasileiros.

Método
Estudo ecológico, de base populacional, utilizando o território brasileiro como unidade de análise.
O Brasil, localizado na América do Sul, possui uma área territorial de aproximadamente 8,5 milhões de km² e população estimada de 209,5 milhões de habitantes, dos quais 83,8 milhões são de mulheres em idade reprodutiva. O país é dividido em cinco regiões geográficas (Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste), 27 unidades federativas (26 estados e um Distrito Federal) e 5570 municípios6.
A população do estudo foi composta por todos os registros de óbitos de gestantes e puérperas notificados no Brasil, no período de 2009 a 2020, correspondentes às categorias incluídas no grupamento O14.0 (PE moderada), O14.1(PE grave) e O14.9 (PE não especificada), segundo as disposições da Classificação Estatística Internacional de Doenças (CID-10).
O período de coleta de dados justifica-se ao passo que, 2009 representa o marco inicial das notificações de óbitos de maneira integral no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS).
Os dados foram obtidos no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), vinculado ao DATASUS. O documento padrão do SIM é a Declaração de Óbito (DO), documento padronizado, preenchido por profissionais médicos, contemplando informações demográficas (sexo, idade, escolaridade, estado civil, raça/cor, local de residência, local e ano de ocorrência do óbito) e clínicas referentes às causas múltiplas de morte.
Desta feita, foram identificadas todas as DO em que a PE foi registrada em qualquer linha como causa básica ou associada à morte. Vale ressaltar que, na DO, pode haver mais de uma causa em uma mesma linha e que nem todas as linhas são necessariamente preenchidas. Para melhor identificação foram separadas as categorias. Nos casos onde houvesse mais de um registro de causa morte na mesma linha, estas foram individualizadas, para isso, foram separadas as categorias, caso uma mesma linha na DO estivesse preenchida com mais de uma causa (exemplo: linha a1, linha a2, linha b1 etc.).
O processo de obtenção dos dados envolveu a busca dos arquivos de cada unidade da federação referente ao desfecho em cada ano da série temporal (2009-2020) para então concluir a etapa de consolidação do banco de dados no âmbito nacional. Os dados populacionais referentes ao período, tais como idade, raça/cor, situação conjugal, escolaridade, município de residência, local e ano de ocorrência do óbito utilizados para o cálculo dos indicadores foram obtidos no DATASUS na cessão de estatísticas vitais.
Inicialmente, foi realizada análise descritiva dos dados, no que concerne as características sociodemográficas e causa da morte (básica e associada) notificadas nas DO, mediante estabelecimento das frequências absolutas, relativas e seus respectivos intervalos de confiança, fixados em 95% (IC95%). Ademais, foram calculados os coeficientes brutos de mortalidade materna por PE por faixa etária e município de residência para o território nacional pelo coeficiente de 100.000 habitantes.
A tendência temporal dos indicadores de mortalidade foi calculada por meio de modelos de regressão joinpoint e padronizados pela idade, considerando os indicadores de mortalidade como variáveis dependentes e o ano de ocorrência do óbito como variável independente. A regressão joinpont considera pontos de inflexão, através de um modelo log-linear em que a direção/magnitude das linhas das tendências muda significativamente. No modelo final, cada joinpoint indica uma mudança significativa na redução ou aumento da tendência.
A significância estatística da série temporal foi avaliada por meio do teste de permutação de Monte Carlo, que escolhe o melhor segmento para cada modelo. Uma vez que o modelo foi escolhido, foi calculada a variação percentual anual (do inglês, annual percent change – APC).
Considerou-se o IC 95% para cada segmento, com a função de descrever e quantificar a tendência, bem como avaliar se esta tendência é significativa. Para simplificar a comparação das tendências para os indicadores com mais de uma inclinação significativa no período, foi calculada também a variação percentual anual média (do inglês, average annual percent change – AAPC) para o período completo. As tendências foram consideradas significativas quando a APC e AAPC apresentaram p <0,05.
Para analisar a distribuição espacial e padrão espaço-temporal do desfecho, foram utilizadas técnicas de geoprocessamento, permitindo a criação de mapas temáticos de distribuição e sobreposição geográfica dos óbitos por municípios de residência. O Índice de Moran Local foi utilizado para avaliar a autocorrelação local, permitindo identificar padrões de associação espacial e ocorrência de clusters. Para identificação de áreas críticas ou de risco, foi utilizado o diagrama de Moran, com base no índice de Moran local, que permite comparar o valor de cada um dos municípios vizinhos.
Os quadrantes gerados neste último são interpretados da seguinte forma: “hotspots” – Alto/Alto (valores positivos, médias positivas) e “coldspots” – Baixo/Baixo (valores negativos, médias negativas), referindo-se a pontos de associação espacial positiva ou semelhante a seus vizinhos, ou seja, representam municípios com altos e baixos valores cercados por municípios com elevados e baixos valores, respectivamente. Os “outliers” – Alto/Baixo (valores positivos, médias negativas) e Baixo/Alto (valores negativos, médias positivas), por sua vez, indicam pontos de associação espacial negativa, ou seja, municípios com baixos e altos valores cercados por municípios com altos e baixos valores, respectivamente.
Para a representação espacial do diagrama de espalhamento de Moran, foram utilizados os mapas de Moran (Moran Maps). Desta feita, foram consideradas áreas de alto risco ou crítica para o desfecho aquelas formadas por municípios abrangidos pelo grupo “Alto/Alto” e “Baixo/Baixo” do Moran Map.
A organização dos dados, cálculo dos indicadores e análises estatísticas foram realizadas utilizando planilhas do Microsoft Office Excel 2010 e no software Stata versão 11.2 (StataCorp LP, College Station, TX, EUA). As análises de regressão Joinpoint foram realizadas utilizando o Joinpoint Regression Program versão 4.0.4 (US National Cancer Institute, Bethesda, MD, EUA).
Os dados coletados são de domínio público, sendo disponibilizados de maneira aberta no SIM, no site do DATASUS. Outrossim, estes não apresentam variáveis relacionadas à identificação das mulheres, dispensando apreciação pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP).

Resultados
Foram registrados 6.600.987 óbitos maternos no Brasil no período de 2009 a 2020. Destes, 4.095 (0,0620%) estiveram associados à PE, sendo 1.444 (0,0218%) a PE como causa básica e 2.026 (0,0307%) como causa associada. No que se refere a caracterização sociodemográfica, o desfecho apresentou maior prevalência na faixa etária de 20 a 29 anos (42,8%), cor da pele parda (43,9%), estado civil solteiro (37,8%) e com ensino superior (42,4%), tendo como principal local de ocorrência o ambiente hospitalar (89,1%).
A tendência temporal do desfecho evidenciou queda dos coeficientes padronizados de mortalidade na população de 10 a 49 anos ao longo do período de 2009 a 2012 (APC: -4,2; IC 95%: -0,5 a -3,1; p<0,038), seguido de aumento no período de 2018 a 2020 (APC: 12,6; IC 95%: 2,8 a 23,2; p<0,022). Na análise temporal por faixa etária, verificou-se elevação dos coeficientes nacionais de mortalidade por PE em mulheres de 30 a 39 anos no período 2009 a 2020 (APC: 0,8; IC 95%: -2,3 a 4,1; p=0,578), em contraste à queda do coeficiente nas demais faixas etárias (Tabela 1).

Tab.1

A tendência temporal do desfecho é marcada por redução no período de 2009 a 2012, seguida de aumento progressivo, como elevação significativa nos anos de 2018 a 2020. À análise das regiões brasileiras, visualizou-se ascensão do desfecho nas regiões Centro-Oeste e Nordeste durante o período (2009-2020), bem como da região Sudeste nos anos de 2012 a 2020 e Sul nos anos de 2014 a 2020. Adicionalmente, na região Norte, foi verificada queda significante do desfecho ao longo do período (Tabela 2).

Tab.2
Para análise espacial, 625 óbitos foram descartados, ao passo que a informação de município constava como ignorada ou não foi preenchida a causa. Dos municípios brasileiros, 14,7% (n = 820) notificaram, pelo menos, um óbito relacionado à PE como causa básica. Quando considerada PE como causa básica e/ou associada, este número sobe para 18,09% (n = 1054).
No período total (2009-2020), foram verificados de 0 a 479,5/100.000 óbitos por PE nos municípios brasileiros. Exibindo tendência progressiva de crescimento, variando de 0 a 1080,30/100.000 nos períodos de 2009 a 2012 e 2013 a 2016, para 0 a 1438,59 /100.00 no período de 2017 e 2020 (Figura 1).
Quando analisados os óbitos por PE como causa básica, os estados de Minas Gerais, São Paulo e Bahia apresentaram coeficientes elevados no período geral (2009-2020). No que concerne aos municípios, se sobressai, no período de 2009 a 2012, o município de Itaú (RN), seguido por Ruy Barbosa (RN), no período de 2013 a 2016, e Corumbataí (SP), em 2017 a 2020.

Fig.1

Quando considerado os óbitos por PE como causa básica e/ou associada, os coeficientes de mortalidade variaram de 0 a 504,20/100.000 no período geral (2009-2020), com tendência de redução do período de 2009-2012 a 2013-2016, variando de 0 a 1260,40/100.000 para 1080,30/100.000, seguido de crescimento nos anos de 2017 a 2020, alçando valores de 0 a 1438,59 /100.000 (Figura 2).
Sobressaíram-se, no período geral, os coeficientes de mortalidade dos estados de Minas Gerais, São Paulo e Bahia, com destaque para o município de São Gonçalo do Gurgéia (PI). Nas respectivas séries temporais, visualizam-se coeficientes elevados nos municípios de São José do Peixe (PI) no período de 2009 a 2012, Ruy Barbosa (RN) nos anos de 2013 a 2016 e Corumbataí (SP) em 2017 a 2020.

Fig.2

A seguir, na análise espaço-temporal, foram identificados clusters, de acordo com o índice de Moran local, em relação aos coeficientes municipais de mortalidade por PE como causa básica e/ou associada.
Foram identificados clusters tanto de alto risco (Alto/Alto), quanto baixo risco (Baixo/Baixo) nas regiões Nordeste, Centro-Oeste e Sul no período de 2009 a 2012. Nesse ínterim, a região Nordeste destaca-se pelo elevado número de municípios com proporção alto/alto (n = 31), distribuídos no estado da Paraíba, Rio grande do Norte, Ceará e Pernambuco. Acerca dos padrões baixo/baixo, estes foram distribuídos ao longo de todas as regiões brasileiras, em maior volume nos municípios estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo (Figura 3).

Fig.3

Figura 3. Moran Map dos coeficientes de mortalidade relacionados à pré-eclâmpsia (2009-2020). Fortaleza, Ceará, Brasil, 2023


Discussão
A frequência geral de pré-eclâmpsia no Brasil varia de 1,7% a 6,2%. Um estudo multicêntrico realizado em 27 unidades de saúde brasileiras traça associações entre a morbidade clínica e acesso à saúde por mulheres com PE, revelando a prevalência e desfecho de óbito em cerca de 0,8% e 22%, respectivamente7. Outrossim, evidências sugerem que, cerca de 60% das mortes maternas relacionadas a PE são evitáveis8.
A evitabilidade dos óbitos maternos está associada à qualidade e acurácia dos sistemas de saúde em prover oportunamente cuidados integrais e interdisciplinares em suas diferentes complexidades, perpassando o planejamento familiar, pré-natal, parto e puerpério, mediante assistência e gestão com enfoque humanizado, especializado e qualificado para identificação e manejo de emergências9. Em vista disso, a Organização das Nações Unidas10 pactua metas para reduzir a mortalidade materna, em consonância aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, até o ano de 203011.
Desta forma, o indicador de mortalidade materna atua como um referencial acerca da atenção à saúde materno-infantil, apontando para a urgência na readequação do modelo nacional de assistência à mulher no ciclo gravídico-puerperal, mediante estabelecimento de vínculos sólidos, corresponsabilização e humanização, pautados na valorização da queixa das mulheres, com enfoque no rastreio, captação precoce e encaminhamento, em tempo hábil, ao pré-natal de alto risco12 .
Acerca da característica da população, o perfil dos óbitos por PE demonstra associação direta a características de disparidade social, a exemplo, à raça/cor parda e preta. Os resultados mostraram similaridade com estudo realizado nos Estados Unidos, que inferiu taxas de mortalidade materna por PE até quatro vezes nestas populações, estando associadas a dificuldade no acesso aos serviços de saúde8.
Um estudo ecológico realizado no estado de Alagoas envolvendo óbitos maternos, revelou, de maneira semelhante, tendência de crescimento do desfecho (2,8%), com distribuição predominante em mulheres jovens, pretas/pardas e de baixa escolaridade, exibindo, ainda, correlação espacial com o Índice de Vulnerabilidade Social e de desigualdade de renda13. De modo consoante, um estudo de base populacional realizado em São Luís do Maranhão correlacionou piores desfechos maternos à baixa escolaridade, ausência de companheiro, menos de seis consultas de pré-natal, gravidez múltipla, presença de malformações congênitas, nascimento pré-termo e baixo peso ao nascer14. Desta feita, gestantes solteiras e divorciadas, tendem a constituir um grupo vulnerabilizado, dada fragilidade no suporte afetivo, emocional, social, financeiro e de estímulo ao autocuidado15.
A dificuldade de acesso aos serviços nessa população é um fator chave para desfechos negativos à saúde materna e neonatal, incluindo, nesse contexto, aspectos associados ao espaço, transporte, infraestrutura física, social e econômica16. No Brasil, a regionalização é um princípio norteador do Sistema Único de Saúde, sendo imprescindível o oferecimento de acesso equitativo aos cuidados de saúde. Entretanto, a desigualdade na distribuição dos recursos (hospitais, centros especializados, tecnologia, profissionais) é uma realidade antiga e comum aos contextos sociais e demográficos nacionais, constituindo uma barreira à qualidade e desfechos assistenciais17.
A exemplo, o estado do Piauí contabiliza 17 maternidades, 49 hospitais gerais com leitos obstétricos, 10 leitos de cuidados intensivos maternos, 20 leitos de cuidados intensivos neonatais e 52 leitos de cuidados intermediários, concentrados nas cidades mais populosas e com maior Índice de Desenvolvimento Humano18. Adicionalmente, de acordo com dados da pesquisa Nascer no Brasil, reforça-se a prevalência de desigualdades entre as regiões geográficas e deficiências na estrutura dos serviços que compõem a rede hospitalar de atenção ao parto nas regiões Norte e Nordeste em comparação aos serviços estruturados nas regiões Sul e Sudeste do país19.
Assim, identificar as desigualdades em saúde e avaliar sua magnitude ao âmbito nacional faz-se essencial para garantir o acesso, qualidade de vida, bem-estar e desenvolvimento de estratégias para redução das disparidades com enfoque prioritário a essas populações, ao passo que os aspectos socioeconômicos parecem influenciar em fatores de risco para a mortalidade materna20.
Destarte, os resultados apresentados substanciam que os óbitos por PE no Brasil representam uma problemática urgente e que merece destaque, ademais, ressalta-se, que os estudos relacionados a doença ainda são incipientes no país, contudo, essa pesquisa estabelece possibilidades para que mais estudos sejam realizados, especialmente estudos primários nas áreas com maiores coeficientes de mortalidade, assim como em áreas que apresentaram alto risco em relação a doença, a fim de entender com maior precisão quais fatores levaram a esses resultados, e, consequentemente evitar que esses coeficientes elevados se perpetuem, contribuindo com a melhoria da saúde materna em todo o país.
Quanto as limitações do estudo, reitera-se que pesquisas com base em dados secundários são passíveis de falhas, dada a possibilidade de inconsistências e fragilidade dos dados, mediante subnotificação, incompletudes e erros no preenchimento das fichas de investigação e óbito materno.

Conclusão
Os achados apontaram para tendência de aumento dos coeficientes de mortalidade por PE como causa básica e/ou associada no território brasileiro. Foram identificados clusters espaciais de alto risco em maior magnitude no Nordeste, com destaque para 31 municípios distribuídos no estado do Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba e Pernambuco, frente a clusters de baixo risco na região sudeste (Minas Gerais e São Paulo) e no Sul (Rio Grande do Sul).
O perfil de óbitos por PE evidencia associação com variáveis associadas a vulnerabilidade social, tais como raça/cor parda, baixa escolaridade e estado civil solteiro, refletindo desigualdades no acesso e qualidade da assistência em saúde, com implicações em piores desfechos maternos e neonatais. Assim, os resultados apontam a urgência nos avanços em pesquisas e estratégias com enfoque na qualificação e resolutividade da rede materno-infantil, com enfoque especial em populações menos favorecidas.

Referências
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Freire, B. G. S., Gomes, M. L. S., Rodrigues, I.R., Rocha, R. S., Santos, J. O., Lima, A. C. M. A. C. C., Oriá, M. O. B. Análise espaço-temporal dos óbitos por pré-eclâmpsia no cenário nacional (2009-2020). Cien Saude Colet [periódico na internet] (2024/mai). [Citado em 22/12/2024]. Está disponível em: http://cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/analise-espacotemporal-dos-obitos-por-preeclampsia-no-cenario-nacional-20092020/19261?id=19261

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