0268/2024 - Saúde dos Povos Indígenas: Dimensões Ambientais, Sócio-Culturais e Epidemiológicas e os Cenários das Políticas Públicas
Health of Indigenous Peoples: Environmental, Socio-cultural, and Epidemiological Dimensions and Policy Scenarios
Autor:
• Ricardo Ventura Santos - Santos, R. V. - <ricardo.ventura@fiocruz.br>ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5071-443X
Coautor(es):
• Luiza Garnelo - Garnelo, Luiza - <malupereira2011@gmail.com>ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0263-7286
• Felipe Guimarães Tavares - Tavares, F. G. - <tavaresfelipeg@gmail.com, felipegt@id.uff.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8308-6203
• Inara do Nascimento Tavares - Tavares, I. N. - <inara.nascimento@ufrr.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4621-8246
• Ana Lucia de Moura Pontes - Pontes, A. L. M. - <analupontes64@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9162-5345
Resumo:
A configuração atual da saúde dos povos indígenas no Brasil reflete os impactos de uma história de cinco séculos de violência do processo colonial, que produziu depopulação, discriminação e vulnerabilidade social. Racismos e violências das mais diversas ordens, perda de territórios e degradação ambiental fazem parte do cotidiano dos povos indígenas. Este editorial apresenta o conteúdo de um fascículo temático de Ciência & Saúde Coletiva (C&SC), o primeiro do periódico dedicado ao tema, com reflexões e análises sobre os cenários e desafios contemporâneos do campo da saúde dos povos indígenas. No conjunto, são mais de duas dezenas de textos de autoras e autores, não indígenas e indígenas, de instituições de todo o país, além de pesquisadores estrangeiros, o que evidencia a diversidade de perspectivas metodológicas e temáticas. As contribuições apontam para a necessidade de articulações entre atividades de pesquisa e reflexão crítica na área da saúde coletiva, considerando os desafios na saúde indígena e a contínua necessidade de aprimoramento das políticas públicas.Abstract:
The current configuration of the field of Indigenous Health in Brazil reflects the impacts of a five-century history of colonial violence, which has resulted in depopulation, discrimination, and social vulnerability. Racisms and various forms of violence, along with the loss of territories and environmental degradation, are part of the daily life of Indigenous peoples. This editorial introduces the contents of a thematic issue of Ciência & Saúde Coletiva (C&SC), the journal\'s first dedicated to this topic, featuring reflections and analyses on the contemporary scenarios and challenges in the field of Indigenous Health. Altogether, there are over twenty contributionsauthors, both indigenous and non-indigenous,institutions across the country, as well as foreign researchers, highlighting the diversity of methodological and thematic perspectives. The contributions underscore the need for connections between research activities and critical reflection in the area of public health, considering the challenges in indigenous health and the ongoing need to enhance public policies.Conteúdo:
A configuração atual da saúde dos povos indígenas no Brasil reflete os impactos de uma história de cinco séculos de violência do processo colonial, que produziu depopulação, discriminação e vulnerabilidade social1. Racismos e violências das mais diversas ordens, perda de territórios e degradação ambiental fazem parte do cotidiano dos povos indígenas.
No final da década de 1990, foi implementada a “Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas” no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Embora tenha contribuído para melhorias importantes em alguns indicadores de saúde, depois de quase duas décadas a cobertura e os impactos do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASI-SUS) permanecem claramente insuficientes1.
Ao longo de décadas, o protagonismo e a participação indígena tem sido centrais na constituição das políticas públicas em saúde no Brasil2,3. Na contemporaneidade, esse protagonismo se manifesta de maneira inédita, com lideranças indígenas assumindo posições chaves no recentemente criado Ministério dos Povos Indígenas, na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (atual designação da FUNAI) e na Secretaria de Saúde Indígena (SESAI), do Ministério da Saúde, entre outras.
No âmbito acadêmico, os esforços das ações afirmativas têm resultado numa maior presença indígena, mas ainda incipiente nos eventos e instituições de saúde coletiva, o que demanda maior incentivo nos programas de pós-graduação e estratégias específicas para fortalecimento de sua participação na vida acadêmica3.
Se a partir da Constituição de 1988 houve o explícito reconhecimento da responsabilidade do Estado quanto à garantia dos direitos dos povos indígenas, o que se traduziu inclusive na proposição da “Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas”, graves crises humanitárias e sanitárias persistem em várias regiões do país, como exemplificado pela situação Yanomami2. De uma forma aguda e crítica, é uma situação que amalgama e potencializa problemas como invasão de territórios indígenas, destruição do meio ambiente, mineração e contaminação ambiental, crise alimentar e nutricional, assim como exposição à violência e uma atenção à saúde muito aquém das efetivas necessidades.
Vivemos tempos extremamente desafiadores. Após os importantes avanços na garantia dos direitos indígenas na Constituição de 1988, que se seguiram a mais de duas décadas de regime militar, e depois de uma fase significativa de construção e implementação de políticas públicas em diversas áreas, incluindo a saúde, sobretudo nos anos 1990 e na primeira década do século XXI, o cenário atual apresenta riscos de retrocesso na garantia de direitos em muitas frentes2.
Esse número temático de Ciência & Saúde Coletiva (C&SC), o primeiro do periódico dedicado ao tema, reúne reflexões e análises sobre os cenários e desafios contemporâneos do campo da saúde dos povos indígenas. No conjunto, são mais de duas dezenas de textos de autoras e autores, não indígenas e indígenas, de instituições de todo o país, além de pesquisadores estrangeiros, o que evidencia a diversidade de perspectivas metodológicas e temáticas.
No Brasil, esse campo começou a se estabelecer de forma mais sistemática na década de 1990, com a criação do SASI-SUS, inicialmente com poucos grupos de pesquisa voltados para a questão. Hoje, é uma vertente consolidada na saúde coletiva, com grupos de diferentes perfis. Observamos que as temáticas de interesse dessa área têm se transformado ao longo das décadas, influenciada pelas mudanças de perfil epidemiológico, desafios da implementação do Subsistema e questões como a segurança alimentar, os sistemas médicos indígenas, saúde mental entre outros1. A atuação dos pesquisadores indígenas também tem impulsionado novas perspectivas metodológicas e teóricas3.
As contribuições aqui reunidas apontam para a necessidade de articulações entre atividades de pesquisa e reflexão crítica na área da saúde coletiva, considerando os desafios na saúde indígena e a contínua necessidade de aprimoramento das políticas públicas.
Referências
1 Santos RV, Welch JR, Pontes AL, Garnelo L, Cardoso AM, Coimbra Jr. CEA. Health of indigenous peoples in Brazil: inequities and the uneven trajectory of public policies. In: McQueen D, organizador. Oxford Research Encyclopedias of Global Public Health. Oxford: Oxford University Press; 2022. p. 1-33.
2 Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB). Retrospectiva 2023: Direitos indígenas não se negociam [Internet]. 2023 [acessado 2024 jul 01]. Disponível em: https://apiboficial.org/2023/12/27/retrospectiva-2023-direitos-indigenas-nao-se-negociam/
3 Coletivo Vozes Indígenas na Saúde Coletiva, organizador. Vozes indígenas na produção do conhecimento: para um diálogo com a saúde coletiva. São Paulo: Hucitec Editora; 2022.