Trabalhadores da saúde antes, durante e depois da Covid-19
Trabalhadores da saúde antes, durante e depois da Covid-19
Maria Cecília de Souza Minayo, Editora-chefe da Revista Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Luiza Gualhano, Editora assistente da Revista Ciência & Saúde, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
No artigo Transformações no mundo do trabalho em saúde: os(as) trabalhadores(as) e os desafios futuros, escrito por Maria Helena Machado e colegas para o vol. 28, no. 10 (2023), do periódico Ciência & Saúde Coletiva, o leitor encontrará uma rica descrição e análise da vida desses profissionais da saúde, tomando como ponto de partida sua atuação durante a pandemia de COVID-19. Este artigo tem como base duas pesquisas de âmbito nacional, coordenadas pela primeira autora, “Condições de Trabalho dos Profissionais de Saúde no Contexto da Covid-19 no Brasil” (Machado et al., 2022a) e “Os trabalhadores invisíveis da saúde: condições de trabalho e saúde mental no contexto da Covid-19 no Brasil” (Machado et al., 2021).
A estimativa demográfica de 2020 apontava que o Brasil tinha uma população de 211,7 milhões de habitantes, e, para atendê-los, um complexo e estruturado sistema de saúde, com 329.854 estabelecimentos ambulatoriais e hospitalares, 447.510 leitos e 3,5 milhões de profissionais de nível superior, técnico, auxiliar e de apoio (Machado et al., 2022b). Desse conjunto, quase 2 milhões de trabalhadores de 14 profissões são reconhecidos pelo CNS. Esse conjunto constitui um contingente homogêneo quanto à escolaridade: todos com formação universitária, a maioria com pós-graduação stricto ou lato sensu, especializados, com autonomia e poder de direcionalidade técnica, prestígio, reconhecimento e status.
Esse grupo é majoritariamente feminino (77,6%); jovem (82,4% têm até 50 anos de idade); de cor predominantemente branca (57,7%), vindo em seguida, os 39,9% pretos e pardos e só 0,2% de indígenas. No enfrentamento da Covid-19, 46,2% desses profissionais queixaram-se da falta de treinamento; pouco mais da metade (55,9%) se sentiu protegida do vírus; 23,9% foram contaminados no local de trabalho e destes, 59,6% disseram que não receberam apoio institucional quando adoeceram.
Além do grupo mais ou menos homogêneo citado no parágrafo anterior, o artigo cita os mais de dois milhões de trabalhadores de 60 ocupações atuando quase sempre de forma silenciosa e invisibilizada tanto por parte dos gestores de saúde como pela população que busca atendimento e assistência. Ao contrário do primeiro grupo, este é um contingente heterogêneo quanto à escolaridade: 45,7% de nível técnico (2º grau incompleto e completo), 47,7% de nível superior completo e incompleto – evidenciando, no entanto, uma tendência de aumento de sua escolaridade.
Imagem: Raquel Portugal (Fiocruz Imagens).
Esse conjunto exerce atividades auxiliares e de apoio, cumprindo ordens dos que detêm a direcionalidade técnica do processo de trabalho em saúde. É igualmente um contingente feminino (72,5%); jovem (83,2% têm até 50 anos de idade), com predominância de pessoas de cor preta e parda (59%). A falta de treinamento para o enfrentamento da pandemia foi ainda mais evidente nesse grupo, assim como a hostilidade do ambiente de trabalho: 52,9% não se sentiram protegidos e 41% deles foram contaminados. Desses últimos, 66,8% disseram que não receberam apoio institucional quando adoeceram.
A pandemia de Covid-19 evidenciou diversos problemas estruturais quanto à regulação e à formação da força de trabalho em saúde no Brasil e no mundo, o que pode ser interpretado como mais um dos reflexos das desigualdades socioeconômicas existentes fora e dentro dos países (Offe, 1991): uberização, variados tipos de informalidade, precarização, desemprego estrutural, acidentes, assédios, excesso de mortes (Antunes, 2020).
Por sua vez, nesse período também ficou evidente a centralidade e a importância do trabalho humano, num setor onde as possibilidades tecnológicas e informacionais também são indiscutíveis, mas continuam a ocorrer também os efeitos perversos da precarização. Pode-se dizer que o mundo do trabalho em saúde é uma espécie de tipo ideal para o estudo da situação laboral hoje vigente no mundo. O artigo em questão, traz uma enorme riqueza de informações, impossíveis de serem aqui resumidas. E daí, um convite insistente para que o leiam e o apreciem.
Referências
- MACHADO, M.H. Condições de trabalho dos profissionais de saúde no contexto da Covid-19 no Brasil. Rio de Janeiro: ENSP/CEE-Fiocruz, 2020/2021.
- MACHADO, M.H. Os trabalhadores invisíveis da saúde: condições de trabalho e saúde mental no contexto da Covid-19 no Brasil. Rio de Janeiro: ENSP/CEE-Fiocruz, 2021/2022a.
- MACHADO, M.H., et al. Health Workforce: Situations and challenges in Latin America, the Caribbean and Brazil. Oxford Research Encyclopedia of Global Public Health [online]. 2022 [viewed 23 November 2023]. https://doi.org/10.1093/acrefore/9780190632366.013.332. Available from: https://oxfordre.com/publichealth/display/10.1093/acrefore/9780190632366.001.0001/acrefore-9780190632366-e-332?rskey=CyJzvK&result=44
- OFFE, C. Trabalho e Sociedade: problemas estruturais e perspectivas para o futuro da sociedade do trabalho. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1991.
- ANTUNES, R. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Boitempo, 2020.
Para ler o artigo, acesse:
MACHADO,, M. H., et al. Transformações no mundo do trabalho em saúde: os(as) trabalhadores(as) e desafios futuros. Ciência & Saúde Coletiva [online]. 2023, vol. 28, no. 10, pp. 2773–2784 [viewed 23 November 2023]. https://doi.org/10.1590/1413-812320232810.10702023. Available from: https://www.scielo.br/j/csc/a/TnLWQkSZfFh7ZhPJ3DyfDkK/
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Fonte: Scielo