0288/2008 - A IMPORTÂNCIA DA SAÚDE BUCAL NA ÓTICA DE PACIENTES HOSPITALIZADOS.
THE IMPORTANCE OF BUCAL HEALTH IN THE VIEW OF INPATIENTS.
Autor:
• Leandro Araújo Fernandes - Fernandes, L.F. - Araçatuba, S.P. - Faculdade de Odontologia de Araçatuba - Unesp - <leandroataunesp@ig.com.br>Área Temática:
Não CategorizadoResumo:
A percepção da condição bucal é um importante indicador de saúde, pois sintetiza a condição real de saúde, as respostas subjetivas, os valores e as expectativas culturais. O estudo avaliou a importância da Saúde Bucal segundo a percepção de pacientes internados em um hospital da cidade de Araçatuba/SP. Foi aplicado um questionário semi-estruturado para a coleta de dados e utilizado para análise estatística o programa Epi-Info 2000. Os resultados mostraram que metade dos pacientes haviam realizado a última visita ao cirurgião-dentista em um período compreendido entre 6 a 12 meses devido a problemas periodontais (35%) e cárie dentária (20%). Observou-se que embora todos os pacientes considerassem ter uma “boa” higiene bucal, o tratamento periodontal foi identificado como o de maior necessidade entre os pacientes (67,93%). A presença do cirurgião-dentista no corpo clínico hospitalar foi considerada por todos os entrevistados como fundamental para contribuir no cuidado integral à saúde dos pacientes hospitalizados. Quanto ao papel do dentista em um hospital a grande maioria dos pacientes (90,63%) afirmou ser o “cuidar dos dentes”. Assim, conclui-se que todos pacientes tem conhecimento do quão é importante a manutenção das condições adequadas de Saúde Bucal principalmente em pacientes hospitalizados.Palavras-chaves: saúde bucal, hospitalização, assistência à saúde, humanização.
Abstract:
The perception of bucal condition is an important health indicator because it synthesize the condition of objective health, subjective answers, cultural values and expectative. The valuated the importance of bucal health according to perception of patients hospitalized on a hospital unity of Araçatuba City, São Paulo State, Brazil. A questioner partially structured was used to collect data and after, the program Epi-Info 2000 was used to statistic analyze. The results show that half of patients affirmed to have visited dental surgeon on a period between 6 and 12 months due periodontal problems (35%) and dental carie (20%). It was observed that although every patients consider to have a good bucal hygiene, the periodontal treatment was identified like the more necessary among them (67,93%). The presence of dental surgeon on hospital clinical group was considered by all the patients essential to collaborate with the integral care at health of hospitalized patients. About role of dental surgeon in hospital unity, the majority of patients (90,63%) affirmed to be the act “to care on the teeth”. So, it’s possible to conclude that all the patients know the importance of maintenance of Bucal Health appropriated conditions principally with hospitalized patients.Key words: bucal health, hospitalization, delivery of health care, humanization
Conteúdo:
Introdução
A assistência à saúde no país se depara hoje com inúmeros obstáculos, sejam de ordem financeira, política, organizativa ou ética, tornando-se fundamental o debate sobre a qualidade da atenção prestada. Essa é indissociável do emprego de tecnologias, saberes, recursos adequados e disponibilizados, do contexto singular, encontro entre quem sofre; indivíduos ou populações; e aqueles que se dedicam a mitigar este sofrimento; profissionais de saúde, gestores ou técnicos1.
A importância da higiene bucal para o bem-estar, a prevenção de doenças sistêmicas e a melhor recuperação do paciente hospitalizado não é algo bem difundido no Brasil2. O indivíduo hospitalizado, preocupado mais com a doença atual, motivo pelo qual ele encontra-se internado, não se atém aos cuidados com sua saúde bucal. Por isso, é de grande importância que haja a inclusão do cirurgião-dentista à equipe multidisciplinar na realização de atividades curativas, preventivas e educativas para integração no contexto da promoção de saúde bucal e conseqüentemente na melhoria do quadro clínico geral do paciente 3, 4, 5.
O conceito de Atendimento Odontológico Hospitalar surgiu em 1901, no hospital geral da Philadelphia que organizou o 1° Departamento de Odontologia por um Comitê de Serviço Dentário da Associação Dentária Americana. Em 1969, essa mesma entidade constatou que 34,8% dos hospitais de todo o território norte-americano tinham condições e necessidade de instalar um serviço de tratamento odontológico a nível hospitalar6. Além do mais a inclusão do cirurgião-dentista a equipe hospitalar é profícua para todos os profissionais, uma vez que estimula uma mútua troca de informações e experiências de casos clínicos5, 7.
Quando se refere à Odontologia Hospitalar associa-se de imediato ao tratamento curativo-reabilitador realizado exclusivamente pelo cirurgião dentista. Entretanto, suas atividades também envolvem ações educativo-preventivas em unidades hospitalocêntricas. Diante desses preceitos o odontólogo pode e deve trabalhar sempre integrado a outros profissionais como equipe de enfermagem (auxiliar e técnico de enfermagem e enfermeiro), técnicos de higiene dental (THD) e auxiliar de consultório odontológico (ACD) treinados e orientados sobre métodos de higiene bucal adequados aos pacientes2. A prevenção e educação em saúde por meio da higiene bucal e realizações de bochechos semanais com colutórios também são ações que devem ser realizadas8, 9. Por isso é de extrema importância que os cirurgiões-dentistas orientem a equipe auxiliar a desenvolver ações de práticas de higiene bucal, eliminação de hábitos nocivos a saúde e cuidados com a alimentação10. Além disso, é fundamental que haja a colaboração do paciente para o sucesso do tratamento odontológico11. Silversin e Kornacki12 realizaram um estudo sobre a aceitação de medidas preventivas por indivíduos, instituições e comunidades e verificaram que a adoção de comportamentos de saúde por parte do indivíduo depende de suas crenças em saúde, medos e do tipo de lócus de controle adotado. Dessa forma, há necessidade de se buscar maneiras de influenciar o indivíduo a mudar seu comportamento de saúde e de estimular as instituições hospitalares a adotar programas preventivos efetivos.
Atualmente a população vivencia uma era de mudanças na odontologia, na qual deve-se olhar o paciente como um todo, avaliando não apenas a boca e os dentes, mas seu estado de saúde geral, que muitas vezes pode estar em risco pelo despreparo de alguns profissionais para lidar em determinadas situações no ambiente hospitalar13. Devido a este fato, no Brasil, em fevereiro de 2008 foi apresentado à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº. 2776/2008, que estabelece como obrigatória a presença do cirurgião-dentista nas equipes multiprofissionais das Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), para cuidar da saúde bucal dos pacientes. Além disso, determina que os internados em outras unidades hospitalares e clínicas também devem receber os cuidados do cirugião-dentista. A inserção imprescindível desse profissional na equipe médica enfatiza a manutenção da integralidade do paciente, a qual requer cuidados especiais não só para tratar o problema que os levou à internação, mas também para cuidar dos demais órgãos e sistemas que podem sofrer alguma deterioração prejudicial para sua recuperação e prognóstico, dentre eles o tratamento odontológico.
Considerando tais deficiências e problematizações elucidadas anteriormente, o presente estudo teve como objetivo avaliar a importância da Saúde Bucal segundo a percepção de pacientes hospitalizados em uma unidade hospitalar da cidade de Araçatuba/SP.
Metodologia
Este estudo descritivo e transversal realizado com 64 pacientes hospitalizados (68,75% homens e 31,25% mulheres) foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Humanos da Faculdade de Odontologia de Araçatuba/SP (Unesp). As entrevistas foram realizadas propriamente no leito hospitalar após o Consentimento Livre e Esclarecido dos participantes da pesquisa.
Para a coleta de dados foi aplicado um questionário semi-estruturado, com questões abertas e fechadas, a fim de abranger inúmeras informações abordando características pessoais, dados sobre o motivo e o período de internação, questionamentos relacionados ao tratamento odontológico prévio ao momento da internação e avaliação sobre a importância da presença do odontólogo no ambiente hospitalar.
O perfil da população estudada está evidenciado na tabela 1.
Tabela 1 – Distribuição dos pacientes internados na Unidade Hospitalar Santana segundo suas características pessoais. [ANEXO]
Foram desenvolvidas inúmeras atividades como, visita aos leitos, entrevista com os pacientes, exame clínico com espátula de madeira e espelho clínico, orientação de higiene bucal individualizada, higiene bucal supervisionada e reforço motivacional para a realização de uma higiene bucal adequada.
O exame clínico intra-bucal foi realizado para averiguar as condições de saúde bucal dos pacientes, a fim de orientá-los sobre suas necessidades de tratamento odontológico. Durante a realização do exame clínico também foi avaliado a presença ou ausência de lesões em tecidos moles13.
Também foram realizadas orientações aos familiares e responsáveis, presentes no momento das visitas dos pesquisadores, quanto à necessidade rigorosa no controle de higiene bucal visto que isso ajuda na preservação da saúde bucal dos pacientes14.
Após a coleta dos dados foi utilizado o programa estatístico Epi-info 2000 versão 6.0415 tanto para a entrada das informações e montagem do banco de dados, quanto para o processamento e análise estatística dos dados.
Resultados
Dos 64 pacientes entrevistados, 68,75% eram do sexo masculino e 31,25% do feminino, sendo a faixa etária compreendida entre 7 a 68 anos e a idade média de 28,94 anos.
Quanto ao grau de escolaridade dos entrevistados, 34,37% possui o ensino médio completo e apenas 9,37% apresentavam o ensino superior completo. Em relação ao estado civil 53,13% eram solteiros e 40,63% casados. Além disso, a grande maioria dos entrevistados apresentava cor da pele branca (87,50%).
Ao se investigar as causas pelas quais os pacientes estavam internados, constatou-se que 59,37% eram devido a acidentes de moto, 28,13% pela prática de esportes e outras atividades e 12,50% por acidentes de carro.
Pôde-se observar que 100% dos pacientes recebiam medicações (analgésicos) no momento da entrevista para atenuar a presença de dor.
Ao serem questionados sobre o período decorrido da última consulta odontológica, anteriormente ao momento da entrevista, observou-se que metade da população estudada compareceu ao cirurgião-dentista no período compreendido entre 6 e 12 meses, sendo os valores ilustrados na tabela 2.
Tabela 2 – Distribuição numérica e percentual dos pacientes, segundo o período, em meses, referente à última consulta ao cirurgião-dentista, anteriormente ao momento da entrevista. [ANEXO]
Ao serem questionados sobre o motivo da última consulta odontológica, metade dos entrevistados afirmou estar vinculada a problemas periodontais (35%) e cárie dentária (20%). As demais causas apresentam-se ilustradas no gráfico 1.
Gráfico 1 – Distribuição percentual dos pacientes, segundo o motivo da última consulta ao cirurgião-dentista, anteriormente ao momento da entrevista. [ANEXO]
Quanto ao tipo de serviço odontológico utilizado, na última consulta, 63,33% afirmaram ser o privado e 36,67% o público.
A maioria dos entrevistados (81%) estava internada na unidade hospitalar há 15 dias e afirmou realizar a higiene bucal somente duas vezes por semana, geralmente nos finais de semana, quando o fluxo de visitas era maior. Somente 19% dos entrevistados afirmaram realizar a escovação dentária todos os dias com a ajuda dos acompanhantes. Todos os pacientes relataram incômodo com a presença do “mau hálito” (halitose) e com a sensação de “boca seca” (xerostomia).
Entre as maiores dificuldades enfrentadas pelos pacientes entrevistados para a realização da higiene bucal foram citadas a dependência do profissional ou acompanhante, gerando constrangimento e desconforto, a falta de informação, gerando insegurança e principalmente a presença de dor.
Todos os pacientes hospitalizados consideraram ter uma boa higiene bucal embora 67,93% deles afirmassem necessitar de tratamento periodontal. Os demais tratamentos citados encontram-se representados no gráfico 2.
Gráfico 2 – Distribuição percentual dos pacientes, segundo a necessidade de tratamento odontológico, quanto à opinião dos entrevistados. [ANEXO]
Quanto à análise sobre a importância dada aos elementos dentários, 50% citaram a estética, 34,38% elegeram a mastigação e alimentação, 6,25% a função e 9,37% afirmaram ser os dentes “o equilíbrio da vida” (gráfico 3).
Gráfico 3 – Distribuição percentual dos pacientes, segundo a importância dos elementos dentários, quanto a opinião dos entrevistados. [ANEXO]
Ao se avaliar os pacientes que utilizavam prótese (13,33%) observou-se uma mudança de valores quanto à importância dos dentes, pois 50% desses classificaram a mastigação, 25% a função e 25% a estética.
No exame intra-bucal não foi verificada a presença de lesões bucais em nenhum paciente. Durante as ações de educação e saúde, todos os pacientes e acompanhantes, apresentaram-se receptivos e interessados nos conceitos e práticas ensinados.
Todos os pacientes consideraram importante a presença do cirurgião-dentista em uma unidade hospitalar, e os mesmos enfatizaram como pontos positivos dessa inserção, a multidisciplinariedade das ações, integralidade do atendimento, melhoria da atenção à saúde bucal e maior atenção ao paciente.
E por fim, ao serem questionados sobre o papel do cirurgião-dentista em uma unidade hospitalar, a grande maioria dos pacientes (90,63%), afirmou ser o “cuidar dos dentes”.
Discussão
A odontologia tem evoluído e direcionado seus estudos na busca de comprovar a influência de doenças bucais sobre a etiopatogenia de diversas enfermidades sistêmicas, tais como, doenças cardíacas coronárias, acidentes vasculares cerebrais, endorcardite bacteriana, diabetes mellitus e infecção respiratória. Dentre as doenças bucais existentes, destaca-se a doença periodontal, onde a presença de microrganismos gram-negativos é semelhante aos encontrados nas diversas infecções crônicas e respiratórias 16. De acordo com os pacientes entrevistados em nosso estudo, a doença periodontal foi o principal problema bucal que os acometiam, sendo o tratamento periodontal o de maior necessidade. O mesmo foi descrito por Ragon et al.17, que evidenciaram uma grande prevalência de tratamento odontológico devido à presença de gengivites em pacientes institucionalizados com disfunção neuromotora. Limeback, 199818 verificou que pacientes hospitalizados apresentavam uma higiene bucal precária, o que facilitava o desenvolvimento da doença periodontal. Além disso, segundo esse mesmo autor os pacientes apresentavam predisposição a adquirir patógenos respiratórios advindos do biofilme dental.
Segundo os dados do Ministério da Saúde em 200319 entre a população adulta brasileira estudada quase 3% das pessoas nunca foram ao dentista. Esses dados corroboram com os resultados do presente estudo, o qual demonstrou que uma pequena parcela dos entrevistados nunca foi ao cirurgião-dentista (6,25%). Quanto ao período decorrido da última consulta odontológica, anteriormente ao momento da entrevista, observou-se que metade da população entrevistada estava compreendido entre 6 e 12 meses.
Todos os pacientes relataram incômodo com a presença do “mau hálito”, porém, somente 19% dos entrevistados afirmaram realizar a escovação dentária todos os dias com a ajuda dos acompanhantes. Os entrevistados também se queixaram de uma sensação de “boca seca”, e este fato seria provavelmente pela medicação administrada durante a internação. Segundo Egbert et al.20 alguns medicamentos utilizados podem constituir fatores de risco para a doença periodontal a e a cárie dental, como anticonvulsivantes, antidepressivos e vários fármacos, uma vez que reduzem o fluxo salivar. Uma alternativa para esses pacientes seria a utilização tópica de saliva artificial, para maior conforto, juntamente com a prática de higiene bucal.
Nesse estudo, 81% dos pacientes estavam internados há mais de duas semanas sendo a causa mais freqüentes da hospitalização os acidentes automobilísticos (71,87%). O mesmo foi mencionado por Panzarini et al.21 que observaram uma grande ocorrência de lesões faciais e dentárias, em conseqüência de acidentes automotores (automóveis e motocicletas) na cidade de Araçatuba/SP.
Grande parte dos pacientes entrevistados apresentou uma baixa capacidade funcional devido à maioria das fraturas, causadas pelos acidentes, localizarem-se nos membros superiores, dificultando a sua higiene bucal e inferiores, impossibilitando deslocamento para a realização de suas necessidades e higiene pessoal. O mesmo foi observado por Ciochetti et al.22, Elgelhardt et al.23e Siqueira et al.24 os quais demonstraram em seus estudos um elevado grau de dependência funcional na população internada. Esses estudos corroboram com a necessidade de maiores cuidados por parte da equipe que assiste o doente, com medidas de intervenções clínicas e ambientais que beneficiam os pacientes no período da hospitalização. Isso evidencia a importância da presença do cirurgião-dentista e de sua equipe auxiliar no ambiente hospitalar que poderia minimizar os problemas buco-dentais ocasionados pela falta de higiene bucal.
Segundo relatos dos pacientes, pôde-se observar que a dor foi um dos principais motivos para a não realização da higiene bucal. Segundo Canellas et al.25 e Padrol et al.26, a presença de dor na maioria dos pacientes entrevistados é o principal motivo pelo quais os indivíduos buscam atendimento hospitalar. Outra causa de grande impacto, relatada pelos pacientes, foi à dificuldade ou incapacidade temporária de locomoção como relatado anteriormente. Assim quando os pacientes foram questionados sobre o motivo de não realização da higiene bucal, a resposta mais encontrada foi de que se sentiam constrangidos de pedir apoio, aos acompanhantes ou enfermeiros, para realizar tal atividade, provavelmente por não existir dentro do ambiente hospitalar profissionais capacitados (cirurgião-dentista e equipe odontológica) para a execução dessa atividade. De acordo com Sant’Anna et al.27 isso ocorre porque o paciente experimenta situações semelhantes à fragmentação do tempo, do corpo e das atividades.
Nakayama et al.28 e Tebet et al.29, obtiveram percentuais significativos de pacientes hospitalizados que apresentaram dificuldades na realização de atividades de vida diária como, por exemplo, alimentar-se, vestir-se e cuidar de sua higiene pessoal. Esses declínios funcionais durante as internações hospitalares são decorrentes, não apenas das doenças propriamente ditas, mas também de ações iatrogênicas, imobilidade e descondicionamento físico. Isso faz com que as hospitalizações aumentem o grau de dependência e prolongue o período de reabilitação4, 23, 27.
Medeiros Júnior et al.30, em um estudo realizado em uma enfermaria pediátrica, demonstrou que, após a realização de um trabalho educativo-preventivo odontológico, cerca de 85% dos pacientes passaram a incorporar esse procedimento na sua rotina de higiene diária. Baseados neste estudo foram realizadas orientações sobre saúde bucal no próprio leito hospitalar de maneira individual e específica para cada caso.
Em uma pesquisa realizada por Weinstein et al.31 observaram que apesar de muitos pacientes concordarem em seguir os princípios de uma boa higiene bucal a maioria não conseguia realizá-la como uma rotina, devido às limitações das ações e falta de estímulo. A presença de acompanhantes e/ou profissional de saúde, no momento da entrevista e durante as demais atividades realizadas no presente estudo, proporcionou uma maior integração das ações referentes à saúde bucal, o que poderia ajudar tanto na assistência quanto na motivação dos pacientes. Além disso, esses expectadores poderiam funcionar como preciosas fontes de disseminação de conhecimento teórico-prático sobre saúde bucal e da inter-relação dessa com a saúde geral, haja visto que uma não existe sem a outra30.
Doro et al.13, realizaram um estudo semelhante a esse no Hospital de Caridade e Beneficência de Cachoeira Paulista e verificaram que o cirurgião-dentista deve ser preparado desde a sua formação acadêmica para inserção na equipe hospitalar, haja visto a grande carência na realização das atividades odontológicas e diagnóstico de patologias bucais. Em outro estudo realizado em uma unidade hospitalar em pacientes sob tratamento de câncer, observou-se que mais da metade dos casos de septicemia estavam aparentemente relacionados com doenças bucais. Baseados nesta informação, foi realizado em nosso estudo um exame intra-bucal, no qual não se verificou a presença de lesões em tecidos moles em nenhum paciente32.
Todos os pacientes entrevistados relataram que a presença do cirurgião-dentista na equipe hospitalar é condição sine qua non na formação do corpo clínico hospitalar, para a realização de atividades curativas e preventivas relacionados à saúde bucal. Dessa forma, partindo do princípio que “a saúde bucal é parte integrante e inseparável da saúde geral do indivíduo”, segundo a I Conferência Nacional de Saúde Bucal (1986)35, e de acordo com o artigo 196 da Constituição da República de 1988, que reconhece ser a saúde um direito de todos e dever do Estado, inserir a Odontologia à equipe hospitalar é um direito do cidadão.
De acordo com Lupton33, deve-se adotar como meta primordial a mudança de comportamentos no âmbito da à saúde, por meio de “informações” e/ou “conhecimentos”. Além disso, ele afirma que a maior ênfase da retórica promocional da saúde está em estimular a ‘saúde positiva’, prevenindo doenças, desenvolvendo indicadores de desempenho baseados em objetivos específicos, estimulando comportamentos e atitudes (estilos de vida) saudáveis, focando no trabalho com comunidades para desenvolver ambientes saudáveis e, também, diminuir os crescentes gastos na assistência à saúde34. Por esse motivo e pelos demais citados anteriormente, é necessário que haja a integração da promoção de saúde bucal aos programas de saúde pública hospitalar a fim de que dessa forma busquem uma melhor qualidade de vida e saúde geral aos pacientes.
Conclusão
Podemos concluir de acordo com os resultados obtidos que todos os pacientes hospitalizados relataram ser importante à manutenção da saúde bucal e para isto afirmaram ser essencial à presença do cirurgião-dentista no corpo clínico das instituições de saúde.
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Agradecimentos
Agradecemos à direção do Hospital Santana da cidade de Araçatuba/SP, aos pacientes e a toda equipe médica que acompanhou e colaborou com o desenvolvimento do presente estudo.
Colaboradores:
* Cléa Adas Saliba GARBIN – trabalhou no delineamento da pesquisa, análise e interpretação dos dados.
* Daniela Coelho de LIMA – trabalhou no delineamento da pesquisa, coleta de dados, análise dos mesmos e redação do artigo.
* Nemre Adas SALIBA – trabalhou na orientação teórico-metodológica.
* Artênio José Isper GARBIN – trabalhou nas correções metodológicas e na revisão final do artigo.
* Leandro Araújo FERNANDES – trabalhou na revisão bibliográfica do artigo.
A assistência à saúde no país se depara hoje com inúmeros obstáculos, sejam de ordem financeira, política, organizativa ou ética, tornando-se fundamental o debate sobre a qualidade da atenção prestada. Essa é indissociável do emprego de tecnologias, saberes, recursos adequados e disponibilizados, do contexto singular, encontro entre quem sofre; indivíduos ou populações; e aqueles que se dedicam a mitigar este sofrimento; profissionais de saúde, gestores ou técnicos1.
A importância da higiene bucal para o bem-estar, a prevenção de doenças sistêmicas e a melhor recuperação do paciente hospitalizado não é algo bem difundido no Brasil2. O indivíduo hospitalizado, preocupado mais com a doença atual, motivo pelo qual ele encontra-se internado, não se atém aos cuidados com sua saúde bucal. Por isso, é de grande importância que haja a inclusão do cirurgião-dentista à equipe multidisciplinar na realização de atividades curativas, preventivas e educativas para integração no contexto da promoção de saúde bucal e conseqüentemente na melhoria do quadro clínico geral do paciente 3, 4, 5.
O conceito de Atendimento Odontológico Hospitalar surgiu em 1901, no hospital geral da Philadelphia que organizou o 1° Departamento de Odontologia por um Comitê de Serviço Dentário da Associação Dentária Americana. Em 1969, essa mesma entidade constatou que 34,8% dos hospitais de todo o território norte-americano tinham condições e necessidade de instalar um serviço de tratamento odontológico a nível hospitalar6. Além do mais a inclusão do cirurgião-dentista a equipe hospitalar é profícua para todos os profissionais, uma vez que estimula uma mútua troca de informações e experiências de casos clínicos5, 7.
Quando se refere à Odontologia Hospitalar associa-se de imediato ao tratamento curativo-reabilitador realizado exclusivamente pelo cirurgião dentista. Entretanto, suas atividades também envolvem ações educativo-preventivas em unidades hospitalocêntricas. Diante desses preceitos o odontólogo pode e deve trabalhar sempre integrado a outros profissionais como equipe de enfermagem (auxiliar e técnico de enfermagem e enfermeiro), técnicos de higiene dental (THD) e auxiliar de consultório odontológico (ACD) treinados e orientados sobre métodos de higiene bucal adequados aos pacientes2. A prevenção e educação em saúde por meio da higiene bucal e realizações de bochechos semanais com colutórios também são ações que devem ser realizadas8, 9. Por isso é de extrema importância que os cirurgiões-dentistas orientem a equipe auxiliar a desenvolver ações de práticas de higiene bucal, eliminação de hábitos nocivos a saúde e cuidados com a alimentação10. Além disso, é fundamental que haja a colaboração do paciente para o sucesso do tratamento odontológico11. Silversin e Kornacki12 realizaram um estudo sobre a aceitação de medidas preventivas por indivíduos, instituições e comunidades e verificaram que a adoção de comportamentos de saúde por parte do indivíduo depende de suas crenças em saúde, medos e do tipo de lócus de controle adotado. Dessa forma, há necessidade de se buscar maneiras de influenciar o indivíduo a mudar seu comportamento de saúde e de estimular as instituições hospitalares a adotar programas preventivos efetivos.
Atualmente a população vivencia uma era de mudanças na odontologia, na qual deve-se olhar o paciente como um todo, avaliando não apenas a boca e os dentes, mas seu estado de saúde geral, que muitas vezes pode estar em risco pelo despreparo de alguns profissionais para lidar em determinadas situações no ambiente hospitalar13. Devido a este fato, no Brasil, em fevereiro de 2008 foi apresentado à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº. 2776/2008, que estabelece como obrigatória a presença do cirurgião-dentista nas equipes multiprofissionais das Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), para cuidar da saúde bucal dos pacientes. Além disso, determina que os internados em outras unidades hospitalares e clínicas também devem receber os cuidados do cirugião-dentista. A inserção imprescindível desse profissional na equipe médica enfatiza a manutenção da integralidade do paciente, a qual requer cuidados especiais não só para tratar o problema que os levou à internação, mas também para cuidar dos demais órgãos e sistemas que podem sofrer alguma deterioração prejudicial para sua recuperação e prognóstico, dentre eles o tratamento odontológico.
Considerando tais deficiências e problematizações elucidadas anteriormente, o presente estudo teve como objetivo avaliar a importância da Saúde Bucal segundo a percepção de pacientes hospitalizados em uma unidade hospitalar da cidade de Araçatuba/SP.
Metodologia
Este estudo descritivo e transversal realizado com 64 pacientes hospitalizados (68,75% homens e 31,25% mulheres) foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Humanos da Faculdade de Odontologia de Araçatuba/SP (Unesp). As entrevistas foram realizadas propriamente no leito hospitalar após o Consentimento Livre e Esclarecido dos participantes da pesquisa.
Para a coleta de dados foi aplicado um questionário semi-estruturado, com questões abertas e fechadas, a fim de abranger inúmeras informações abordando características pessoais, dados sobre o motivo e o período de internação, questionamentos relacionados ao tratamento odontológico prévio ao momento da internação e avaliação sobre a importância da presença do odontólogo no ambiente hospitalar.
O perfil da população estudada está evidenciado na tabela 1.
Tabela 1 – Distribuição dos pacientes internados na Unidade Hospitalar Santana segundo suas características pessoais. [ANEXO]
Foram desenvolvidas inúmeras atividades como, visita aos leitos, entrevista com os pacientes, exame clínico com espátula de madeira e espelho clínico, orientação de higiene bucal individualizada, higiene bucal supervisionada e reforço motivacional para a realização de uma higiene bucal adequada.
O exame clínico intra-bucal foi realizado para averiguar as condições de saúde bucal dos pacientes, a fim de orientá-los sobre suas necessidades de tratamento odontológico. Durante a realização do exame clínico também foi avaliado a presença ou ausência de lesões em tecidos moles13.
Também foram realizadas orientações aos familiares e responsáveis, presentes no momento das visitas dos pesquisadores, quanto à necessidade rigorosa no controle de higiene bucal visto que isso ajuda na preservação da saúde bucal dos pacientes14.
Após a coleta dos dados foi utilizado o programa estatístico Epi-info 2000 versão 6.0415 tanto para a entrada das informações e montagem do banco de dados, quanto para o processamento e análise estatística dos dados.
Resultados
Dos 64 pacientes entrevistados, 68,75% eram do sexo masculino e 31,25% do feminino, sendo a faixa etária compreendida entre 7 a 68 anos e a idade média de 28,94 anos.
Quanto ao grau de escolaridade dos entrevistados, 34,37% possui o ensino médio completo e apenas 9,37% apresentavam o ensino superior completo. Em relação ao estado civil 53,13% eram solteiros e 40,63% casados. Além disso, a grande maioria dos entrevistados apresentava cor da pele branca (87,50%).
Ao se investigar as causas pelas quais os pacientes estavam internados, constatou-se que 59,37% eram devido a acidentes de moto, 28,13% pela prática de esportes e outras atividades e 12,50% por acidentes de carro.
Pôde-se observar que 100% dos pacientes recebiam medicações (analgésicos) no momento da entrevista para atenuar a presença de dor.
Ao serem questionados sobre o período decorrido da última consulta odontológica, anteriormente ao momento da entrevista, observou-se que metade da população estudada compareceu ao cirurgião-dentista no período compreendido entre 6 e 12 meses, sendo os valores ilustrados na tabela 2.
Tabela 2 – Distribuição numérica e percentual dos pacientes, segundo o período, em meses, referente à última consulta ao cirurgião-dentista, anteriormente ao momento da entrevista. [ANEXO]
Ao serem questionados sobre o motivo da última consulta odontológica, metade dos entrevistados afirmou estar vinculada a problemas periodontais (35%) e cárie dentária (20%). As demais causas apresentam-se ilustradas no gráfico 1.
Gráfico 1 – Distribuição percentual dos pacientes, segundo o motivo da última consulta ao cirurgião-dentista, anteriormente ao momento da entrevista. [ANEXO]
Quanto ao tipo de serviço odontológico utilizado, na última consulta, 63,33% afirmaram ser o privado e 36,67% o público.
A maioria dos entrevistados (81%) estava internada na unidade hospitalar há 15 dias e afirmou realizar a higiene bucal somente duas vezes por semana, geralmente nos finais de semana, quando o fluxo de visitas era maior. Somente 19% dos entrevistados afirmaram realizar a escovação dentária todos os dias com a ajuda dos acompanhantes. Todos os pacientes relataram incômodo com a presença do “mau hálito” (halitose) e com a sensação de “boca seca” (xerostomia).
Entre as maiores dificuldades enfrentadas pelos pacientes entrevistados para a realização da higiene bucal foram citadas a dependência do profissional ou acompanhante, gerando constrangimento e desconforto, a falta de informação, gerando insegurança e principalmente a presença de dor.
Todos os pacientes hospitalizados consideraram ter uma boa higiene bucal embora 67,93% deles afirmassem necessitar de tratamento periodontal. Os demais tratamentos citados encontram-se representados no gráfico 2.
Gráfico 2 – Distribuição percentual dos pacientes, segundo a necessidade de tratamento odontológico, quanto à opinião dos entrevistados. [ANEXO]
Quanto à análise sobre a importância dada aos elementos dentários, 50% citaram a estética, 34,38% elegeram a mastigação e alimentação, 6,25% a função e 9,37% afirmaram ser os dentes “o equilíbrio da vida” (gráfico 3).
Gráfico 3 – Distribuição percentual dos pacientes, segundo a importância dos elementos dentários, quanto a opinião dos entrevistados. [ANEXO]
Ao se avaliar os pacientes que utilizavam prótese (13,33%) observou-se uma mudança de valores quanto à importância dos dentes, pois 50% desses classificaram a mastigação, 25% a função e 25% a estética.
No exame intra-bucal não foi verificada a presença de lesões bucais em nenhum paciente. Durante as ações de educação e saúde, todos os pacientes e acompanhantes, apresentaram-se receptivos e interessados nos conceitos e práticas ensinados.
Todos os pacientes consideraram importante a presença do cirurgião-dentista em uma unidade hospitalar, e os mesmos enfatizaram como pontos positivos dessa inserção, a multidisciplinariedade das ações, integralidade do atendimento, melhoria da atenção à saúde bucal e maior atenção ao paciente.
E por fim, ao serem questionados sobre o papel do cirurgião-dentista em uma unidade hospitalar, a grande maioria dos pacientes (90,63%), afirmou ser o “cuidar dos dentes”.
Discussão
A odontologia tem evoluído e direcionado seus estudos na busca de comprovar a influência de doenças bucais sobre a etiopatogenia de diversas enfermidades sistêmicas, tais como, doenças cardíacas coronárias, acidentes vasculares cerebrais, endorcardite bacteriana, diabetes mellitus e infecção respiratória. Dentre as doenças bucais existentes, destaca-se a doença periodontal, onde a presença de microrganismos gram-negativos é semelhante aos encontrados nas diversas infecções crônicas e respiratórias 16. De acordo com os pacientes entrevistados em nosso estudo, a doença periodontal foi o principal problema bucal que os acometiam, sendo o tratamento periodontal o de maior necessidade. O mesmo foi descrito por Ragon et al.17, que evidenciaram uma grande prevalência de tratamento odontológico devido à presença de gengivites em pacientes institucionalizados com disfunção neuromotora. Limeback, 199818 verificou que pacientes hospitalizados apresentavam uma higiene bucal precária, o que facilitava o desenvolvimento da doença periodontal. Além disso, segundo esse mesmo autor os pacientes apresentavam predisposição a adquirir patógenos respiratórios advindos do biofilme dental.
Segundo os dados do Ministério da Saúde em 200319 entre a população adulta brasileira estudada quase 3% das pessoas nunca foram ao dentista. Esses dados corroboram com os resultados do presente estudo, o qual demonstrou que uma pequena parcela dos entrevistados nunca foi ao cirurgião-dentista (6,25%). Quanto ao período decorrido da última consulta odontológica, anteriormente ao momento da entrevista, observou-se que metade da população entrevistada estava compreendido entre 6 e 12 meses.
Todos os pacientes relataram incômodo com a presença do “mau hálito”, porém, somente 19% dos entrevistados afirmaram realizar a escovação dentária todos os dias com a ajuda dos acompanhantes. Os entrevistados também se queixaram de uma sensação de “boca seca”, e este fato seria provavelmente pela medicação administrada durante a internação. Segundo Egbert et al.20 alguns medicamentos utilizados podem constituir fatores de risco para a doença periodontal a e a cárie dental, como anticonvulsivantes, antidepressivos e vários fármacos, uma vez que reduzem o fluxo salivar. Uma alternativa para esses pacientes seria a utilização tópica de saliva artificial, para maior conforto, juntamente com a prática de higiene bucal.
Nesse estudo, 81% dos pacientes estavam internados há mais de duas semanas sendo a causa mais freqüentes da hospitalização os acidentes automobilísticos (71,87%). O mesmo foi mencionado por Panzarini et al.21 que observaram uma grande ocorrência de lesões faciais e dentárias, em conseqüência de acidentes automotores (automóveis e motocicletas) na cidade de Araçatuba/SP.
Grande parte dos pacientes entrevistados apresentou uma baixa capacidade funcional devido à maioria das fraturas, causadas pelos acidentes, localizarem-se nos membros superiores, dificultando a sua higiene bucal e inferiores, impossibilitando deslocamento para a realização de suas necessidades e higiene pessoal. O mesmo foi observado por Ciochetti et al.22, Elgelhardt et al.23e Siqueira et al.24 os quais demonstraram em seus estudos um elevado grau de dependência funcional na população internada. Esses estudos corroboram com a necessidade de maiores cuidados por parte da equipe que assiste o doente, com medidas de intervenções clínicas e ambientais que beneficiam os pacientes no período da hospitalização. Isso evidencia a importância da presença do cirurgião-dentista e de sua equipe auxiliar no ambiente hospitalar que poderia minimizar os problemas buco-dentais ocasionados pela falta de higiene bucal.
Segundo relatos dos pacientes, pôde-se observar que a dor foi um dos principais motivos para a não realização da higiene bucal. Segundo Canellas et al.25 e Padrol et al.26, a presença de dor na maioria dos pacientes entrevistados é o principal motivo pelo quais os indivíduos buscam atendimento hospitalar. Outra causa de grande impacto, relatada pelos pacientes, foi à dificuldade ou incapacidade temporária de locomoção como relatado anteriormente. Assim quando os pacientes foram questionados sobre o motivo de não realização da higiene bucal, a resposta mais encontrada foi de que se sentiam constrangidos de pedir apoio, aos acompanhantes ou enfermeiros, para realizar tal atividade, provavelmente por não existir dentro do ambiente hospitalar profissionais capacitados (cirurgião-dentista e equipe odontológica) para a execução dessa atividade. De acordo com Sant’Anna et al.27 isso ocorre porque o paciente experimenta situações semelhantes à fragmentação do tempo, do corpo e das atividades.
Nakayama et al.28 e Tebet et al.29, obtiveram percentuais significativos de pacientes hospitalizados que apresentaram dificuldades na realização de atividades de vida diária como, por exemplo, alimentar-se, vestir-se e cuidar de sua higiene pessoal. Esses declínios funcionais durante as internações hospitalares são decorrentes, não apenas das doenças propriamente ditas, mas também de ações iatrogênicas, imobilidade e descondicionamento físico. Isso faz com que as hospitalizações aumentem o grau de dependência e prolongue o período de reabilitação4, 23, 27.
Medeiros Júnior et al.30, em um estudo realizado em uma enfermaria pediátrica, demonstrou que, após a realização de um trabalho educativo-preventivo odontológico, cerca de 85% dos pacientes passaram a incorporar esse procedimento na sua rotina de higiene diária. Baseados neste estudo foram realizadas orientações sobre saúde bucal no próprio leito hospitalar de maneira individual e específica para cada caso.
Em uma pesquisa realizada por Weinstein et al.31 observaram que apesar de muitos pacientes concordarem em seguir os princípios de uma boa higiene bucal a maioria não conseguia realizá-la como uma rotina, devido às limitações das ações e falta de estímulo. A presença de acompanhantes e/ou profissional de saúde, no momento da entrevista e durante as demais atividades realizadas no presente estudo, proporcionou uma maior integração das ações referentes à saúde bucal, o que poderia ajudar tanto na assistência quanto na motivação dos pacientes. Além disso, esses expectadores poderiam funcionar como preciosas fontes de disseminação de conhecimento teórico-prático sobre saúde bucal e da inter-relação dessa com a saúde geral, haja visto que uma não existe sem a outra30.
Doro et al.13, realizaram um estudo semelhante a esse no Hospital de Caridade e Beneficência de Cachoeira Paulista e verificaram que o cirurgião-dentista deve ser preparado desde a sua formação acadêmica para inserção na equipe hospitalar, haja visto a grande carência na realização das atividades odontológicas e diagnóstico de patologias bucais. Em outro estudo realizado em uma unidade hospitalar em pacientes sob tratamento de câncer, observou-se que mais da metade dos casos de septicemia estavam aparentemente relacionados com doenças bucais. Baseados nesta informação, foi realizado em nosso estudo um exame intra-bucal, no qual não se verificou a presença de lesões em tecidos moles em nenhum paciente32.
Todos os pacientes entrevistados relataram que a presença do cirurgião-dentista na equipe hospitalar é condição sine qua non na formação do corpo clínico hospitalar, para a realização de atividades curativas e preventivas relacionados à saúde bucal. Dessa forma, partindo do princípio que “a saúde bucal é parte integrante e inseparável da saúde geral do indivíduo”, segundo a I Conferência Nacional de Saúde Bucal (1986)35, e de acordo com o artigo 196 da Constituição da República de 1988, que reconhece ser a saúde um direito de todos e dever do Estado, inserir a Odontologia à equipe hospitalar é um direito do cidadão.
De acordo com Lupton33, deve-se adotar como meta primordial a mudança de comportamentos no âmbito da à saúde, por meio de “informações” e/ou “conhecimentos”. Além disso, ele afirma que a maior ênfase da retórica promocional da saúde está em estimular a ‘saúde positiva’, prevenindo doenças, desenvolvendo indicadores de desempenho baseados em objetivos específicos, estimulando comportamentos e atitudes (estilos de vida) saudáveis, focando no trabalho com comunidades para desenvolver ambientes saudáveis e, também, diminuir os crescentes gastos na assistência à saúde34. Por esse motivo e pelos demais citados anteriormente, é necessário que haja a integração da promoção de saúde bucal aos programas de saúde pública hospitalar a fim de que dessa forma busquem uma melhor qualidade de vida e saúde geral aos pacientes.
Conclusão
Podemos concluir de acordo com os resultados obtidos que todos os pacientes hospitalizados relataram ser importante à manutenção da saúde bucal e para isto afirmaram ser essencial à presença do cirurgião-dentista no corpo clínico das instituições de saúde.
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Agradecimentos
Agradecemos à direção do Hospital Santana da cidade de Araçatuba/SP, aos pacientes e a toda equipe médica que acompanhou e colaborou com o desenvolvimento do presente estudo.
Colaboradores:
* Cléa Adas Saliba GARBIN – trabalhou no delineamento da pesquisa, análise e interpretação dos dados.
* Daniela Coelho de LIMA – trabalhou no delineamento da pesquisa, coleta de dados, análise dos mesmos e redação do artigo.
* Nemre Adas SALIBA – trabalhou na orientação teórico-metodológica.
* Artênio José Isper GARBIN – trabalhou nas correções metodológicas e na revisão final do artigo.
* Leandro Araújo FERNANDES – trabalhou na revisão bibliográfica do artigo.