0372/2024 - IDEAÇÃO SUICIDA ENTRE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA EM MINAS GERAIS, BRASIL
SUICIDAL IDEATION AMONG SCHOOLTEACHERS IN MINAS GERAIS, BRAZIL
Autor:
• Rose Elizabeth Cabral Barbosa - Barbosa, R.E.C - <rosebarbosa.moc@gmail.com>ORCID: http://orcid.org/0000-0001-5383-0102
Coautor(es):
• Elke Oliveira Santos - Santos,E.O - <elkeoliveira010@gmail.com>ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6926-9567
• Giovanni Campos Fonseca - Fonseca, G.C - <giovannifonseca@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2503-1199
• Nayra Suze Souza e Silva - Souza e Silva, N.S - <nayrasusy@hotmail.com>
ORCID: http://orcid.org/0000-0002-8420-0821
• Rosângela Ramos Veloso Silva - Silva, R.R.V - <rosaveloso9@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3329-8133
• Cristina Andrade Sampaio - Sampaio, C.A - <cristina.sampaio@unimontes.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9067-4425
• Desirée Sant’Ana Haikal - Haikal, D.S - <desireehaikal@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0331-0747
Resumo:
O objetivo foi estimar a prevalência de ideação suicida e fatores associados entre professores da educação básica da rede pública estadual de Minas Gerais, no momento de retomada das atividades presenciais de ensino pós-pandemia da Covid-19. Trata-se de um estudo transversal que analisou dados do baseline de um inquérito do tipo websurvey denominado Projeto ProfSMinas. A variável dependente – ideação suicida – foi avaliada por meio da resposta a uma das questões do Self Reporting Questionnaire-20. As variáveis independentes incluíram características sociodemográficas, características do trabalho e emprego, situação de saúde e hábitos/comportamentos. Associações brutas e ajustadas entre as variáveis foram estimadas por meio de regressão logística. Participaram 1.907 professores e a prevalência de ideação suicida foi de 5,6%. O modelo final ajustado evidenciou maiores chances de ideação suicida entre os homens, aqueles sem companheiro(a), com diagnóstico prévio de depressão, aqueles com alterações do sono e os professores que utilizavam em excesso os smartphones. Os resultados indicam a importância de ampliar estratégias voltadas à comunidade escolar para prevenção do comportamento suicida, considerando os riscos aos quais os professores estão expostos.Palavras-chave:
Professores Escolares; Saúde do Trabalhador; Suicídio; Saúde Mental; Inquéritos EpidemiológicosAbstract:
The objective was to estimate the prevalence of suicidal ideation and associated factors among schoolteachers of public schools in the state of Minas Gerais, Brazil, at the time of resumption of in-person teaching activities post-Covid-19 pandemic. This is a cross-sectional study that analyzed datathe baseline of a web survey named ProfSMinas Project. The dependent variable – suicidal ideation – was assessed through the answer to one of the questions in the Self Reporting Questionnaire-20. Independent variables included sociodemographic characteristics, work and employment characteristics, health status and habits/behaviors. Crude and adjusted associations between variables were estimated using logistic regression, in bivariate and multiple analyses. A total of 1,907 teachers participated and the prevalence of suicidal ideation was 5.6%. The final adjusted model showed a higher chance of suicidal ideation among male, those who lived alone, with a previous diagnosis of depression, those with sleep changes and schoolteachers who used smartphones excessively. The results indicate the importance of expanding strategies aimed at the school community to prevent suicidal behavior, considering the risks to which teachers are exposed.Keywords:
School Teachers; Occupational Health; Suicide; Mental Health; Health SurveysConteúdo:
INTRODUÇÃO
O suicídio é designado como um fenômeno social alicerçado no grau de coesão entre os indivíduos e a sociedade, e na forma como os indivíduos são afetados pelas coletividades nas quais vivem1-4. Portanto, mesmo definido como um ato realizado pela própria vítima, o suicídio não seria resultado de uma motivação meramente individual, mas originado de causas sociais1,3,4 em interação com fatores biológicos, psicológicos, ambientais e culturais5. Denomina-se ‘comportamento suicida’ o conjunto de ações voluntárias relacionadas ao autoextermínio5-7, sendo classificado como fatal – o suicídio propriamente dito – e não fatal, sob as formas de tentativas e ideações suicidas2. A ideação suicida é a sensação de estar cansado da vida ou de que a vida não vale a pena, o que leva o indivíduo a pensar no autoextermínio. Tais pensamentos apresentam-se em diferentes graus de intensidade e podem se tornar mais graves se houver a elaboração de um plano para a consecução do objetivo de pôr fim à própria vida2,7.
Estudos epidemiológicos têm auxiliado na estimativa da prevalência de ideação suicida e na identificação de fatores de risco que indicam vulnerabilidades de grupos específicos. Na população em geral, observaram-se prevalências de 5,3% de ideação nos 12 meses anteriores à pesquisa e 17,1% ao longo da vida em uma cidade do interior de São Paulo8. Estudo realizado com aproximadamente 85 mil pessoas de dezessete diferentes países indicou prevalência de 9,2%9, enquanto a taxa entre moradores de assentamentos rurais do estado do Piauí foi de 13,4%10. Estudo realizado na Irlanda identificou diferenças nas prevalências de ideação suicida entre mulheres e homens: 10,6 e 7,0%, respectivamente11. No período de isolamento social devido à pandemia da Covid-19, foi observada prevalência de 5,2% entre 5.116 adultos na Grécia12.
Entre adolescentes de 82 países, a prevalência geral foi de 14,0%, variando entre 8,0% nos países asiáticos e 21,0% nos países da África13; e entre adolescentes chilenos, a prevalência foi ainda mais alta, registrando-se 65,6%14. Pesquisa realizada com estudantes dos ensinos médio e superior de Montes Claros, Minas Gerais, identificou prevalência de ideação suicida de 11,6% e 9,8%, respectivamente15. É possível observar que os registros de prevalência variam de acordo com a população investigada, contudo, os diferentes grupos compartilham características que se associam ao desfecho.
Dentre os fatores mais frequentemente associados à ideação suicida destacam-se ser do sexo feminino8-11,13-16, ser adulto jovem8,9, estar solteiro(a) ou viver só9,12,15, apresentar distúrbios do sono15,16, haver histórico de distúrbios mentais9,10-12,15,16 e utilizar substâncias11,15. Entre adolescentes, há, ainda, associação com uso excessivo de internet15, conflitos interpessoais e agressividade13,14, episódios de bullying14, ausência de amizades próximas ou sentimentos de isolamento e solidão13.
Estudos que investigaram ideação suicida entre professores indicaram prevalências de 4,7% entre professores da rede municipal no interior do Rio Grande do Sul17; 5,5% entre professores do ensino fundamental no interior de Alagoas18 e 14,0% entre professores universitários franceses19. Os fatores associados observados foram: diagnóstico de doença crônica, ter sofrido assédio, impossibilidade de discutir problemas do trabalho com colegas, baixa qualidade do sono e sentir-se desvalorizado por colegas e pela família19.
Diante desse cenário, impõe-se a relevância de se investigar a ideação suicida entre professores por diferentes razões. A categoria docente, em especial na educação básica, é composta – em sua maioria – por mulheres. De acordo com Censo Escolar, em 2021, professoras representavam 96,3% do total de profissionais da educação infantil; 88,1% do ensino fundamental e 57,7% do ensino médio. E a faixa etária com maior concentração, entre mulheres e homens, era de 30 a 49 anos20. Os distúrbios mentais representam a terceira causa mais frequente de afastamentos do trabalho entre professores no Brasil21, situação que foi agravada pela pandemia da Covid-1922. Estudo realizado entre 15.641 professores da educação básica de escolas estaduais de Minas Gerais identificou que 25,9% receberam diagnóstico médico de depressão e/ou ansiedade durante a pandemia; 30,4% estavam utilizando medicamentos para dormir, antidepressivos ou calmantes; 33,4% passaram a ter problemas de sono no período e 7,1% estavam consumindo bebidas alcoólicas em maior quantidade e com maior frequência do que o usual23.
São inúmeras as pesquisas que abordaram a saúde mental de professores nas diferentes etapas de ensino. Porém, quando se trata de questões envolvendo o comportamento suicida no ambiente escolar, em geral o foco está nos estudantes, o que se justifica pelo fato de que adolescentes e jovens têm apresentado aumentos expressivos nas taxas de tal comportamento24. Nesse particular, diversos estudos e iniciativas reconhecem os professores e as professoras como agentes privilegiados na promoção de ambientes saudáveis, capazes de identificar estudantes em risco25-27, sem, contudo, considerar o risco ao qual eles e elas estão expostos na atividade docente. Portanto, o presente estudo teve por objetivo estimar a prevalência de ideação suicida e os fatores a ela associados entre professores da educação básica da rede pública estadual de Minas Gerais, no momento de retomada das atividades presenciais de ensino pós-pandemia da Covid-19.
?
MÉTODOS
Trata-se de um estudo epidemiológico transversal que analisou dados da primeira fase (baseline) de um inquérito do tipo websurvey denominado ‘Condições de saúde e trabalho de professores(as) da rede pública estadual de Minas Gerais: estudo longitudinal – Projeto ProfSMinas’.
A população do estudo totaliza cerca de 90.000 professores da educação básica – educação infantil, anos iniciais e finais do ensino fundamental e ensino médio – atuantes nas cerca de 3.500 escolas públicas estaduais de Minas Gerais (dados fornecidos pela Secretaria de Estado de Educação mediante folha de pagamento de julho/2021). O critério de inclusão foi possuir cargo de professor(a) da educação básica em escola estadual de Minas Gerais no momento da coleta dos dados.
Para estimativa da amostra mínima necessária, foi utilizada fórmula considerando população infinita, prevalência de 50% com o objetivo de alcançar maior tamanho amostral e, consequentemente, maior poder de inferência para diferentes desfechos, erro tolerável de 3% e acréscimo de 20% a fim de compensar possíveis perdas por taxa de não resposta. De acordo com o cálculo baseado nos critérios mencionados, era necessária uma amostra de 1.282 professores para garantir a representatividade da categoria no estado de Minas Gerais.
A coleta de dados ocorreu entre 26 de outubro e 31 de dezembro de 2021 (período em que estavam sendo retomadas as atividades presenciais de ensino nas escolas do estado) por meio de formulário on-line utilizando a plataforma Google Forms. O convite para participar da pesquisa, juntamente com o link do formulário, foi enviado pela Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) a todas as 47 Superintendências Regionais de Ensino, solicitando o encaminhamento para os e-mails institucionais de todos os professores vinculados às escolas públicas estaduais.
A variável dependente – ideação suicida – foi avaliada por meio da resposta (não; sim) a uma das questões do Self Reporting Questionnaire (SRQ-20): Você tem tido ideia de acabar com a própria vida?
O SRQ-20 é um instrumento elaborado pela Organização Mundial de Saúde com o objetivo de avaliar a suspeição diagnóstica de transtornos mentais comuns, caracterizados pela presença de insônia, fadiga, esquecimento, irritabilidade e dificuldade de concentração. São 20 questões distribuídas em quatro grupos de sintomas: humor depressivo-ansioso, sintomas somáticos, decréscimo de energia vital e pensamentos depressivos28.
As variáveis independentes incluíram:
• Características sociodemográficas: sexo (feminino; masculino), idade (21 a 35 anos; 36 a 45 anos; 46 a 55 anos; 56 anos ou mais), cor da pele autodeclarada (branca; negra, parda, amarela e indígena), situação conjugal (com companheiro(a); sem companheiro(a)), renda familiar (1 a 3 salários-mínimos; 4 a 6 salários-mínimos; 7 salários-mínimos ou mais) e principal provedor(a) financeiro(a) da família (não; sim).
• Características do trabalho e emprego: vínculo de emprego (contratado/designado; concursado/efetivo), tempo de trabalho como professor (até 10 anos; 11 a 20 anos; 21 anos ou mais), jornada semanal (até 39 horas; 40 horas ou mais), outro emprego remunerado (não; sim, na docência em outra escola; sim, em outra atividade), demanda psicológica do trabalho (baixa; alta), controle sobre o trabalho (alto; baixo) e apoio social no trabalho (alto; baixo).
O estresse ocupacional foi avaliado por meio das respostas ao Job Stress Scale (JSS). Utilizou-se a versão resumida e validada para o português29 que contém 17 questões que tratam das dimensões demanda psicológica, controle e apoio social no trabalho. Cinco questões avaliam a demanda de natureza psicológica, incluindo aspectos quantitativos, como tempo, níveis de concentração e velocidade de realização das atividades de trabalho, e qualitativos, como interrupções das tarefas e contradições. Seis questões tratam do controle que o trabalhador tem sobre o próprio trabalho, ou seja, autonomia na decisão sobre a realização do trabalho e a possibilidade de mobilização e desenvolvimento de habilidades. Outras seis questões avaliam a terceira dimensão, o apoio social, que indica o nível de interação social entre o trabalhador e seus colegas, além da relação com seus superiores. As opções de resposta para cada uma das dimensões são apresentadas em escala Likert (1-4) e a média da somatória de cada uma foi utilizada para definir os grupos de alta/baixa demanda, alto/baixo controle, assim como alto/baixo apoio social29.
• Situação de saúde e hábitos/comportamentos: diagnóstico médico de depressão nos 12 meses anteriores à pesquisa (não; sim), diagnóstico médico de ansiedade nos 12 meses anteriores à pesquisa (não; sim), fumante atual (não; sim), consumo de álcool (não; sim), alteração do sono (não; sim) e uso excessivo de smartphone (não; sim).
A variável ‘alteração do sono’ foi obtida através das respostas a duas questões: 1) Ultimamente, você tem perdido muito sono por preocupação? (de jeito nenhum; não mais que de costume; um pouco mais que de costume; bem mais que de costume); e 2) Durante o último mês, como você classificaria a qualidade do seu sono de uma maneira geral? (muito boa; boa; ruim; muito ruim). Os professores que responderam ‘um pouco mais que de costume’ ou ‘bem mais que de costume’ na primeira questão e que classificaram a qualidade do sono como ruim ou muito ruim na segunda questão foram considerados ‘sim’ para alteração do sono.
O uso excessivo do smartphone foi avaliado por meio das respostas ao Inventário de Adicção em Smartphones (SPAI-BR), um instrumento composto por 26 itens com opções de resposta sim e não. O escore total obtido pela somatória dos itens varia de 0 a 26 pontos e foi utilizado o ponto de corte em 9 ou mais respostas positivas para identificar uso excessivo30.
A análise de dados foi conduzida utilizando-se o programa estatístico STATA, versão 13.0. Inicialmente, foi realizada a análise descritiva da população, estimando-se as frequências relativas de acordo com as categorias das variáveis do estudo e foi calculada a prevalência de ideação suicida na amostra. O próximo passo foi estimar a prevalência de ideação suicida de acordo com as categorias de cada uma das variáveis independentes e, por meio de regressão logística, foi realizada a análise bivariada com a finalidade de verificar a existência de associações brutas entre o desfecho investigado e as variáveis independentes. As variáveis que apresentaram valor de p ? 0,20 nas análises bivariadas foram selecionadas para compor o modelo múltiplo ajustado e foram retiradas, uma a uma, até que permanecessem no modelo final apenas as variáveis associadas à ideação suicida ao nível de p ? 0,05.
O teste de Hosmer-Lemeshow foi utilizado para avaliar a qualidade do ajuste do modelo final. Um p-valor alto indica que não existem diferenças significativas entre as probabilidades previstas pelo modelo e os valores observados no banco de dados em análise, caracterizando um bom ajuste do modelo aos dados.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual de Montes Claros (Parecer nº 4.964.125, 10/09/2021) e todos os participantes – professoras e professores – receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ao acessarem o formulário de pesquisa.
?
RESULTADOS
Do total de 1.982 formulários recebidos, foram excluídos 57 respondentes que não possuíam cargo de professor(a) da educação básica em escola estadual de Minas Gerais e 18 indivíduos não aceitaram participar da pesquisa. Portanto, foram analisadas as respostas de 1.907 formulários válidos, diante da amostra de 1.282 indivíduos necessária para garantir a representatividade da categoria no estado de Minas Gerais, conforme detalhado na seção anterior.
Entre os respondentes, 77,2% eram mulheres; a idade variou entre 21 e 72 anos (média 44,4 anos, DP ± 9,4); 54,4% se autodeclaram de pele branca; 60,8% viviam com companheiro(a); metade deles tinha renda familiar de 1 a 3 salários-mínimos e 59,9% eram os principais provedores do sustento de suas famílias (TABELA 1).
Em relação às características do trabalho e emprego, 57,5% eram concursados ou efetivos na escola estadual; 59,2% atuavam como professor havia 15 anos ou menos; 65,7% cumpriam jornada semanal de até 39 horas e 67,0% não possuíam outro emprego remunerado. Cerca de metade dos professores estava sob estresse ocupacional: alta demanda psicológica (51,5%), baixo controle sobre o trabalho (53,0%) e baixo apoio social por parte dos colegas e de seus superiores (53,2%) (TABELA 1).
Quanto à situação de saúde dos professores investigados, 13,1% e 38,6% relataram diagnóstico médico de depressão e ansiedade, respectivamente, nos 12 meses anteriores à pesquisa. Em relação a hábitos e comportamentos, 6,0% eram fumantes atuais e 12,0% relataram consumir, pelo menos, 4 doses de bebidas alcoólicas nas ocasiões em que bebiam; 34,6% tinham alterações do sono e 18,5% utilizavam o smartphone em excesso (TABELA 1).
A prevalência de ideação suicida entre os professores investigados foi de 5,6% (IC95% = 4,6-6,6) (n = 107). As análises bivariadas evidenciaram maiores chances de ideação suicida entre pessoas mais jovens, solteiras, divorciadas ou viúvas, que eram as principais provedoras financeiras de suas famílias, com vínculo estável de emprego, que atuavam na docência entre 11 e 20 anos, estavam sob estresse ocupacional, haviam recebido diagnóstico médico prévio de depressão e/ou ansiedade, eram fumantes atuais, consumiam álcool, estavam experimentando alterações do sono e com uso excessivo dos smartphones (TABELA 2).
O modelo final ajustado evidenciou maiores chances de ideação suicida entre os professores do sexo masculino (OR = 1,73; IC95%: 1,07-2,80); aqueles que viviam sem companhia (OR = 1,86; IC95%: 1,21-2,86); com diagnóstico prévio de depressão (OR = 8,14; IC95%: 5,25-12,63); aqueles que estavam enfrentando alterações do sono (OR = 3,57; IC95%: 2,18-5,84); e os professores que utilizavam em excesso os smartphones (OR = 2,12, IC95%: 1,34-3,34) (TABELA 3).
?
DISCUSSÃO
Este estudo investigou a ideação suicida entre professores da educação básica de escolas públicas estaduais de Minas Gerais. Os resultados revelaram associação com características individuais e importante associação com aspectos relacionados à saúde mental dos professores.
A prevalência de ideação suicida estimada no presente estudo (5,6%) é semelhante à observada na população adulta de uma cidade do interior de São Paulo (5,3%)8 e entre professores do ensino fundamental de uma cidade do interior de Alagoas (5,5%)18. E ligeiramente superior à prevalência de ideação suicida encontrada entre professores da rede municipal no interior do Rio Grande do Sul (4,7%)17 e em uma amostra de médicos belgas (4,3%)31. Contudo, em comparação com estudos realizados em outros momentos da pandemia de Covid-19, a prevalência obtida neste estudo é inferior. Entre professores e técnicos administrativos de uma universidade do interior de Minas Gerais foi observada prevalência de 15,6% – coleta de dados realizada entre 20 de julho e 27 de agosto de 202032. Estudo realizado entre 1.674 indivíduos com idades entre 18 e 75 anos, cuja coleta ocorreu entre junho e julho de 2020, identificou prevalência de 20,3% de ideação suicida33.
As diferenças observadas podem ser devidas ao momento em que os dados foram coletados nos diferentes estudos, uma vez que maiores ou menores conhecimentos e incertezas em relação ao desenrolar da pandemia de Covid-19 e as consequências advindas dela causaram impactos negativos na saúde física e mental das populações. Além disso, tais diferenças podem ser explicadas pelas especificidades metodológicas de cada estudo. Embora o SRQ-20 não seja um instrumento específico para rastreamento de ideação suicida e, para este estudo, foi considerado apenas um de seus itens como preditor do desfecho, os resultados merecem atenção. Há evidências de associação entre presença de transtornos mentais comuns – avaliada pelo SRQ-20 –, ideação suicida e risco de suicídio10,34. E é reconhecido que professoras e professores tendem a apresentar níveis superiores de sofrimento mental em comparação à população em geral35.
Diferentemente de outras pesquisas e levantamentos epidemiológicos, observou-se maior chance de ideação suicida entre os homens. Em geral, as mulheres apresentam maiores taxas de ideação e tentativas de suicídio ou lesões autoprovocadas e os homens apresentam maiores taxas de mortalidade por suicídio5,8-10,36. Esse fenômeno, denominado de ‘paradoxo do gênero no comportamento suicida’, parece ser determinado pelos papéis sociais atribuídos a homens e mulheres. Por um lado, espera-se do homem mais agressividade, uso de meios mais letais nas tentativas de suicídio e dificuldade em pedir ajuda quando necessita. Por outro, a mulher, apesar de apresentar maiores prevalências de adoecimento mental, compõe redes de apoio e suporte social, tem mais facilidade em falar de seus problemas e pedir ajuda, além de usar meios de atentar contra a própria vida que oferecem maiores possibilidades de salvamento nas tentativas de suicídio37-39. Porém, esse fenômeno não deve ser naturalizado, pois pode representar subnotificação de ideação e tentativas entre os homens e de mortes entre as mulheres37. No presente estudo, o anonimato das respostas e o fato de ser uma informação autopreenchida pode ter encorajado os(as) participantes a externarem tal pensamento. Além disso, a prevalência de depressão – em geral maior no sexo feminino – foi semelhante entre homens e mulheres (12,4% e 13,2%, respectivamente; teste ?2 de Pearson = 0,1871; p = 0,665); e os homens, com maior frequência, relataram baixo apoio social por parte de colegas e superiores (62,4% em comparação com 50,4% das mulheres; teste ?2 de Pearson = 19,390; p = 0,000). Registra-se que esses dados estratificados por sexo não foram apresentados na seção anterior, que abordou os resultados desta pesquisa.
A variável situação conjugal permaneceu associada à ideação suicida e os professores que viviam sozinhos (solteiros, viúvos ou separados) apresentaram maior chance do desfecho. Resultado esse que está em consonância com outros estudos9,12,15. A vida em conjunto e as interações pessoais positivas contribuem para a motivação do indivíduo em seguir a vida e atuam como barreiras a comportamentos de risco, incluindo a ideação suicida. Da mesma forma, relações conflitantes e assimétricas, especialmente aquelas atravessadas por episódios de violência, potencializam estratégias negativas de enfrentamento aos problemas vivenciados37,40,41.
Professores que relataram diagnóstico médico de depressão nos 12 meses anteriores à pesquisa apresentaram chance expressivamente mais elevada de ideação suicida. O diagnóstico médico de distúrbios mentais configura o maior fator de risco para o comportamento suicida42. Estudos indicam que, em sua maioria, indivíduos que tentam ou cometem o suicídio possuem algum transtorno mental previamente diagnosticado42,43; sendo a depressão o de maior prevalência36, uma vez que tal condição proporciona redução dos níveis de serotonina, ocasionando a impulsividade da ideação suicida e o prosseguimento da ação43. Ademais, abusos, traumas, maus tratos, divórcio, morte de parente ou amigo: promovem o aumento de estresse emocional, geram gatilho para a depressão44 e, possivelmente, agravam a vulnerabilidade para a ideação suicida.
A alteração do sono manteve-se associada a maior chance de ideação suicida. Episódios de insônia frequente, pesadelos, sono de curta duração e baixa qualidade do sono podem provocar alterações cognitivas, no comportamento e de humor, aumento do estresse, cansaço excessivo, e se associarem à depressão e à ideação suicida45,46.
O uso excessivo de smartphones permaneceu associado à maior chance de ideação suicida. Não há dúvidas de que esse dispositivo representa uma ferramenta para a comunicação, relações sociais, entretenimento e adequações da vida cotidiana; contudo, o uso em excesso pode ocasionar impactos negativos à saúde física e mental. Estudos evidenciam a associação entre o uso excessivo de smartphones e estresse, baixa qualidade do sono, depressão e ansiedade47-49. Os mecanismos causais incluiriam alterações nos níveis de melatonina e exposição a campos magnéticos que poderiam afetar a atividade cerebral, além de desconfortos físicos como dores de cabeça e musculares, situações capazes de levar à má qualidade do sono, o que, por sua vez, poderia resultar em alterações de humor, estresse, depressão e ansiedade49. Somam-se a isso exigências de permanecer conectado por causa do trabalho, o que poderia ocasionar maior esgotamento emocional e tempo insuficiente para a prática de atividades relacionadas à saúde e bem-estar, como exercícios físicos e interações sociais49.
A exposição aos estressores ocupacionais não alcançou significância estatística no presente estudo, diferentemente de estudo realizado entre trabalhadores franceses que indicou associação entre ideação suicida e aspectos psicossociais do trabalho50. Esse resultado não significa a ausência de tal exposição, uma vez que aproximadamente metade dos professores e professoras relatou alta demanda psicológica, baixo controle sobre o trabalho e baixo apoio social por parte de colegas e superiores. Sabe-se que o adoecimento mental é associado a estressores ocupacionais51. Assim, há que se considerar que o adoecimento mental possa ter ofuscado, por ser mais proximal e forte, o efeito da exposição a tais estressores, que pode ter influenciado o desfecho de forma mais distal.
Os resultados devem ser analisados levando em conta algumas limitações do estudo. Em relação ao desfecho, há a limitação de se investigar ideação suicida isoladamente, sem avaliar antecedentes de planejamento ou tentativas de suicídio. Em estudos futuros, sugere-se considerar a utilização de instrumentos adicionais. O delineamento transversal demanda interpretação cautelosa, em especial por se tratar de um desfecho multidimensional, devendo-se ressaltar, portanto, a impossibilidade de indicar relações de causalidade. Além disso, pesquisas realizadas pela web não permitem controle sobre a amostra investigada e, dessa forma, não é possível garantir amostragem equiprobabilística entre os elementos da população do estudo e nem conhecer a real taxa de resposta. Há, ainda, a possibilidade de viés de seleção, por depender de acesso à internet e viés de memória, por utilizar autorrelatos.
Todavia, pontos fortes também podem ser destacados: as características sociodemográficas dos professores investigados mostraram-se coerentes com as observadas no conjunto de professores brasileiros em atividade na educação básica; alcançou-se amostra robusta e distribuída por todo o estado de Minas Gerais – incluindo áreas rurais – a baixo custo, com metodologia rigorosa e utilização de instrumentos validados; além do apoio da SEE/MG na divulgação da pesquisa e envio do formulário. Destarte, considera-se que a pesquisa apresenta informações originais importantes acerca dos fatores associados à ideação suicida entre professores.
Este artigo investigou a ideação suicida entre professores e identificou os fatores associados, com destaque para o sexo masculino, presença de depressão, distúrbios do sono e o abuso no uso do smartphone. Os resultados indicam a necessidade da ampliação de políticas de prevenção de agravos e de promoção da saúde física e mental voltadas mais especificamente para a categoria docente. Ações que integram o Programa Saúde na Escola, implantadas no Brasil pelos Ministérios da Saúde e da Educação junto a estabelecimentos da rede pública, por exemplo, focalizam crianças, adolescentes e jovens em idade escolar52. Em Minas Gerais, a SEE disponibiliza psicólogos para atuarem nas escolas estaduais com atribuições de contribuírem para a resolução de conflitos, melhoria dos relacionamentos interpessoais e da qualidade do ensino. Embora relevantes, essas atribuições parecem contemplar apenas lateralmente aspectos determinantes para o adoecimento de professores.
Em relação à ideação suicida, a justificativa para a ampliação de políticas de prevenção de agravos e de promoção da saúde física e mental de professores deve se apoiar nas evidências de que a ideação representa risco elevado de tentativa de suicídio no futuro e, ainda, de que as tentativas são o principal fator de risco para o suicídio consumado. Portanto, o acolhimento do indivíduo em risco e o cuidado com a saúde mental tornam-se estratégias de prevenção do autoextermínio e proteção do trabalhador.
?
REFERÊNCIAS
1. Almeida FM. Suicídio: contribuições de Émile Durkheim e Karl Marx para a compreensão desse fenômeno na contemporaneidade. Aurora 2018; 11(1):119-138.
2. Dantas ESO, Meira KC, Bredemeier J, Amorim KPC. Suicídio de mulheres no Brasil: necessária discussão sob a perspectiva de gênero. Cien Saude Colet 2023; 28(5):1469-1477.
3. Queiroz JB. O suicídio na sociologia brasileira. Contemporânea 2020; 10(3):1453-1480.
4. Rodrigues MMA. Suicídio e sociedade: um estudo comparativo de Durkheim e Marx. Rev Latinoam Psicopat Fund 2009; 12(4):698-713.
5. World Health Organization (WHO). Preventing suicide: a global imperative. Genebra: WHO, 2014.
6. Davila-Cervantes CA, Luna-Contreras M. Suicide attempts in the adult Mexican population: an analysis of sociodemographic characteristics and associated factors. Rev Bras Epidemiol 2024; 27:e240014.
7. Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JÁ, Zwi AB, Lozano R. (Eds). World report on violence and health. Geneva, World Health Organization, 2002.
8. Botega NJ, Marín-León L, Oliveira HB, Barros MBA, Silva VF, Dalgalarrondo P. Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: um inquérito de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2009; 25(12):2632-2638.
9. Nock MK et al. Cross-national prevalence and risk factors for suicidal ideation, plans, and attempts. Br J Psychiatry 2008; 192:98-105.
10. Macedo JP, Silva BM, Bezerra LLS. Ideação suicida em assentamentos rurais no Piauí. Psicol Pesq 2018; 12(3):1-10.
11. O’Neill S et al. Patterns of suicidal ideation and behavior in Northern Ireland and associations with conflict related trauma. PLOS One 2014; 9(3):e91532.
12. Papadopoulou A et al. Suicidal ideation during COVID-19 lockdown in Greece: Prevalence in the community, risk and protective factors. Psychiatry Res 2021; 297:113713.
13. Biswas T et al. Global variation in the prevalence of suicidal ideation, anxiety and their correlates among adolescents: a population based study of 82 countries. E Clin Med 2020; 24:100395.
14. Veloso-Besio C et al. The prevalence of suicide attempt and suicidal ideation and its relationship with aggression and bullying in Chilean adolescents. Front Psychol 2023; 14:1133916.
15. Lima CA et al. Ideação suicida e fatores associados entre estudantes de ensino médio e superior: uma análise hierarquizada. J Bras Psiquiatr 2021; 70(3):211-223.
16. Turecki G, Brent DA. Suicide and suicidal behaviour. Lancet 2016; 387(10024):1227-1239.
17. Rocha LM, Behlau M, Souza LDM. Behavioral dysphonia and depression in elementar school teachers. J Voice 2015; 29(6):712-717.
18. Alves VM, Rocha MGDL, Silva JA, Silva JK., Santos RTS, Francisco LCFL. Qualidade de vida e risco de depressão e suicídio em professores. Res Soc Dev 2022; 11(4):e54711427565.
19. Dres M. Job strain, burnout, and suicidal ideation in tenured university hospital faculty staff in France in 2021. JAMA Netw Open 2023; 6(3):e233652.
20. Brasil. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Resumo Técnico: Censo Escolar da Educação Básica 2021. Brasília, DF: Inep,
2022.
21. Maia EG, Claro RM Assunção AA. Múltiplas exposições ao risco de faltar ao trabalho nas escolas da Educação Básica no Brasil. Cad Saude Publica 2019; 35(Supl.1): e00166517.
22. Silva DF, Cobucci RN, Lima SC, Andrade FB. Prevalence of anxiety, depression, and stress among teachers during the Covid-19 pandemic: a PRISMA-compliant systematic review. Medicine 2021; 100(44):e27684.
23. Souza e Silva NS et al. Working conditions, lifestyle and mental health of Brazilian public-school teachers during the Covid-19 pandemic. Psychiatriki 2021; 32:282-289.
24. Ribeiro JM, Moreira MR. Uma abordagem sobre o suicídio de adolescentes e jovens no Brasil. Cien Saude Colet 2018; 23(9):2821-2834.
25. Brito MDLS, Silva Júnior FJG, Costa APC, Sales JCS, Gonçalves AMS, Monteiro CFS. Suicidal behavior and prevention strategies from teachers’ perspective. Esc Anna Nery 2020; 24(4):1-7.
26. Haugen JS, Sutter CC, Jones JLT, Campbell LO. Teachers as youth suicide prevention gatekeepers: an examination of suicide prevention training and exposure to students at risk of suicide. Child Youth Care Forum 2023; 52:583-601.
27. Madjara N, Walsh SD, Harel-Fischa Y. Suicidal ideation and behaviors within the school context: Perceived teacher, peer and parental support. Psychiatry Res 2018; 269:185-190.
28. Santos KOB, Araújo TM, Oliveira NF. Estrutura fatorial e consistência interna do Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) em população urbana. Cad Saude Publica 2009; 25(1):214-222.
29. Alves MGM, Chor D, Faerstein E, Lopes CS, Werneck GL. Versão resumida da “job stress scale”: adaptação para o português. Rev Saude Publica 2004; 38(2):164-171.
30. Khoury JM, Freitas AAC, Roque MAV, Albuquerque MR, Neves MCL, Garcia FD. Assessment of the accuracy of a new tool for the screening of smartphone addiction. PloS ONE 2017; 12(5):e0176924.
31. Loas G, Lefebvre G, Rotsaert M, Englert Y. Relationships between anhedonia, suicidal ideation and suicide attempts in a large sample of physicians. PLoS ONE 2018; 13(3):e0193619.
32. De Paula W, Oliveira WC, Meireles AL, Nascimento RC, Silva GN. Effects and implications of the COVID-19 pandemic on medicine use by employees of a Brazilian public university: a cross-sectional study. Sao Paulo M J 2022; 140(2):250-260.
33. Antonelli ST et al. Loneliness, but not social distancing, is associated with the incidence of suicidal ideation during the COVID-19 outbreak: a longitudinal study. J Affect Disord 2021; 290:52-60.
34. Silveira LB, Kroeff CR, Teixeira MAP, Bandeira DR. Uso do Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) para identificação de grupo clínico e predição de risco de suicídio. Rev Psicol Saude 2021; 13(4):49-61.
35. Tostes MV, Albuquerque GSC, Silva MJS, Peterle RR. Sofrimento mental de professores do ensino público. Saude Debate 2018; 42(116):87-99.
36. Brasil. Boletim Epidemiológico. Mortalidade por suicídio e notificações de lesões autoprovocadas no Brasil [Internet]. 2021 [acessado em 11 abr. 2024]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/epidemiologicos/edicoes/2021/boletim_epidemiologico_svs_33_final.pdf
37. Baére F, Zanello V. O gênero no comportamento suicida: uma leitura epidemiológica dos dados do Distrito Federal. Estud Psicol 2018; 23(2):168-178.
38. Griffin L, Hosking W, Gill PR, Shearson K, Ivey G, Sharples J. The gender paradox: understanding the role of masculinity in suicidal ideation. Am J Mens Health 2022; 16(5):1-12.
39. Moore F, Taylor S, Beaumont J, Gibson R, Starkey C. The gender suicide paradox under gender role reversal during industrialisation. PLoS ONE 2018; 13(8):e0202487.
40. Pedrosa NFC, Barreira DA, Rocha DQC, Barreira MA. Análise dos principais fatores epidemiológicos relacionados ao suicídio em uma cidade no interior do Ceará, Brasil. J Health Biol S 2018; 6(4):399-404.
41. Silva DA, Marcolan JF. O impacto das relações familiares no comportamento suicida. Res Soc Dev 2021; 10(2):e17310212349.
42. Botega NJ. Comportamento suicida: epidemiologia. Psicol USP 2014; 25(3):231-236.
43. Gusmão ROM, Santos NHF, Silva DVA, Moreira DFN, Vieira MA, De Araújo DD. Depressão em pacientes atendidos em serviço de saúde mental: fatores associados e diagnósticos de enfermagem. Rev Eletronica Saude Mental Alcool Drog 2021; 17(2):44-53.
44. Motta GC, Aguiar WM, Dunningham WA. Suicídio no Brasil: um retrato de 2004 a 2014. Rev Bras Neurol Psiquiatr 2021; 25(1):4-17.
45. Littlewood DL, Kyle SD, Carter L, Peters S, Pratt D, Gooding P. Short sleep duration and poor sleep quality predict next-day suicidal ideation: an ecological momentary assessment study. Psychol Med 2018; 49:403-411.
46. Littlewood DL, Kyle SD, Pratt D, Peters S, Gooding P. Examining the role of psychological factors in the relationship between sleep problems and suicide. Clin Psychol Rev 2017; 54:1-16.
47. Elhai JD, Dvorak RD, Levine JC, Hall BJ. Problematic smartphone use: a conceptual overview and systematic review of relations with anxiety and depression psychopathology. J Affect Disord 2017; 207:251-259.
48. Alhassan AA, Alqadhib EM, Taha NW, Alahmari RA, Salam M, Almutairi A. The relationship between addiction to smartphone usage and depression among adults: a cross sectional study. BMC Psychiatry 2018; 18(148):1-8.
49. Yang J, Fu X, Liao X, Li Y. Association of problematic smartphone use with poor sleep quality, depression, and anxiety: a systematic review and meta-analysis. Psychiatry Res 2020; 284:112686.
50. Niedhammer I, Bèque M, Chastang J, Bertrais S. Psychosocial work exposures and suicide ideation: a study of multiple exposures using the French national working conditions survey. BMC Public Health 2020; 20:895.
51. Gomes NR, De-Assis-Santos CC, Rezende BA, Medeiros AM. Fatores psicossociais do trabalho e o adoecimento de professores: uma revisão sistemática. Rev Bras Med Trab 2023; 21(3):e20221014.
52. Fernandes LA et al. Trajetória dos 15 anos de implementação do Programa Saúde na Escola no Brasil. Saude Debate 2022; 46(3):13-28.
?
O suicídio é designado como um fenômeno social alicerçado no grau de coesão entre os indivíduos e a sociedade, e na forma como os indivíduos são afetados pelas coletividades nas quais vivem1-4. Portanto, mesmo definido como um ato realizado pela própria vítima, o suicídio não seria resultado de uma motivação meramente individual, mas originado de causas sociais1,3,4 em interação com fatores biológicos, psicológicos, ambientais e culturais5. Denomina-se ‘comportamento suicida’ o conjunto de ações voluntárias relacionadas ao autoextermínio5-7, sendo classificado como fatal – o suicídio propriamente dito – e não fatal, sob as formas de tentativas e ideações suicidas2. A ideação suicida é a sensação de estar cansado da vida ou de que a vida não vale a pena, o que leva o indivíduo a pensar no autoextermínio. Tais pensamentos apresentam-se em diferentes graus de intensidade e podem se tornar mais graves se houver a elaboração de um plano para a consecução do objetivo de pôr fim à própria vida2,7.
Estudos epidemiológicos têm auxiliado na estimativa da prevalência de ideação suicida e na identificação de fatores de risco que indicam vulnerabilidades de grupos específicos. Na população em geral, observaram-se prevalências de 5,3% de ideação nos 12 meses anteriores à pesquisa e 17,1% ao longo da vida em uma cidade do interior de São Paulo8. Estudo realizado com aproximadamente 85 mil pessoas de dezessete diferentes países indicou prevalência de 9,2%9, enquanto a taxa entre moradores de assentamentos rurais do estado do Piauí foi de 13,4%10. Estudo realizado na Irlanda identificou diferenças nas prevalências de ideação suicida entre mulheres e homens: 10,6 e 7,0%, respectivamente11. No período de isolamento social devido à pandemia da Covid-19, foi observada prevalência de 5,2% entre 5.116 adultos na Grécia12.
Entre adolescentes de 82 países, a prevalência geral foi de 14,0%, variando entre 8,0% nos países asiáticos e 21,0% nos países da África13; e entre adolescentes chilenos, a prevalência foi ainda mais alta, registrando-se 65,6%14. Pesquisa realizada com estudantes dos ensinos médio e superior de Montes Claros, Minas Gerais, identificou prevalência de ideação suicida de 11,6% e 9,8%, respectivamente15. É possível observar que os registros de prevalência variam de acordo com a população investigada, contudo, os diferentes grupos compartilham características que se associam ao desfecho.
Dentre os fatores mais frequentemente associados à ideação suicida destacam-se ser do sexo feminino8-11,13-16, ser adulto jovem8,9, estar solteiro(a) ou viver só9,12,15, apresentar distúrbios do sono15,16, haver histórico de distúrbios mentais9,10-12,15,16 e utilizar substâncias11,15. Entre adolescentes, há, ainda, associação com uso excessivo de internet15, conflitos interpessoais e agressividade13,14, episódios de bullying14, ausência de amizades próximas ou sentimentos de isolamento e solidão13.
Estudos que investigaram ideação suicida entre professores indicaram prevalências de 4,7% entre professores da rede municipal no interior do Rio Grande do Sul17; 5,5% entre professores do ensino fundamental no interior de Alagoas18 e 14,0% entre professores universitários franceses19. Os fatores associados observados foram: diagnóstico de doença crônica, ter sofrido assédio, impossibilidade de discutir problemas do trabalho com colegas, baixa qualidade do sono e sentir-se desvalorizado por colegas e pela família19.
Diante desse cenário, impõe-se a relevância de se investigar a ideação suicida entre professores por diferentes razões. A categoria docente, em especial na educação básica, é composta – em sua maioria – por mulheres. De acordo com Censo Escolar, em 2021, professoras representavam 96,3% do total de profissionais da educação infantil; 88,1% do ensino fundamental e 57,7% do ensino médio. E a faixa etária com maior concentração, entre mulheres e homens, era de 30 a 49 anos20. Os distúrbios mentais representam a terceira causa mais frequente de afastamentos do trabalho entre professores no Brasil21, situação que foi agravada pela pandemia da Covid-1922. Estudo realizado entre 15.641 professores da educação básica de escolas estaduais de Minas Gerais identificou que 25,9% receberam diagnóstico médico de depressão e/ou ansiedade durante a pandemia; 30,4% estavam utilizando medicamentos para dormir, antidepressivos ou calmantes; 33,4% passaram a ter problemas de sono no período e 7,1% estavam consumindo bebidas alcoólicas em maior quantidade e com maior frequência do que o usual23.
São inúmeras as pesquisas que abordaram a saúde mental de professores nas diferentes etapas de ensino. Porém, quando se trata de questões envolvendo o comportamento suicida no ambiente escolar, em geral o foco está nos estudantes, o que se justifica pelo fato de que adolescentes e jovens têm apresentado aumentos expressivos nas taxas de tal comportamento24. Nesse particular, diversos estudos e iniciativas reconhecem os professores e as professoras como agentes privilegiados na promoção de ambientes saudáveis, capazes de identificar estudantes em risco25-27, sem, contudo, considerar o risco ao qual eles e elas estão expostos na atividade docente. Portanto, o presente estudo teve por objetivo estimar a prevalência de ideação suicida e os fatores a ela associados entre professores da educação básica da rede pública estadual de Minas Gerais, no momento de retomada das atividades presenciais de ensino pós-pandemia da Covid-19.
?
MÉTODOS
Trata-se de um estudo epidemiológico transversal que analisou dados da primeira fase (baseline) de um inquérito do tipo websurvey denominado ‘Condições de saúde e trabalho de professores(as) da rede pública estadual de Minas Gerais: estudo longitudinal – Projeto ProfSMinas’.
A população do estudo totaliza cerca de 90.000 professores da educação básica – educação infantil, anos iniciais e finais do ensino fundamental e ensino médio – atuantes nas cerca de 3.500 escolas públicas estaduais de Minas Gerais (dados fornecidos pela Secretaria de Estado de Educação mediante folha de pagamento de julho/2021). O critério de inclusão foi possuir cargo de professor(a) da educação básica em escola estadual de Minas Gerais no momento da coleta dos dados.
Para estimativa da amostra mínima necessária, foi utilizada fórmula considerando população infinita, prevalência de 50% com o objetivo de alcançar maior tamanho amostral e, consequentemente, maior poder de inferência para diferentes desfechos, erro tolerável de 3% e acréscimo de 20% a fim de compensar possíveis perdas por taxa de não resposta. De acordo com o cálculo baseado nos critérios mencionados, era necessária uma amostra de 1.282 professores para garantir a representatividade da categoria no estado de Minas Gerais.
A coleta de dados ocorreu entre 26 de outubro e 31 de dezembro de 2021 (período em que estavam sendo retomadas as atividades presenciais de ensino nas escolas do estado) por meio de formulário on-line utilizando a plataforma Google Forms. O convite para participar da pesquisa, juntamente com o link do formulário, foi enviado pela Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) a todas as 47 Superintendências Regionais de Ensino, solicitando o encaminhamento para os e-mails institucionais de todos os professores vinculados às escolas públicas estaduais.
A variável dependente – ideação suicida – foi avaliada por meio da resposta (não; sim) a uma das questões do Self Reporting Questionnaire (SRQ-20): Você tem tido ideia de acabar com a própria vida?
O SRQ-20 é um instrumento elaborado pela Organização Mundial de Saúde com o objetivo de avaliar a suspeição diagnóstica de transtornos mentais comuns, caracterizados pela presença de insônia, fadiga, esquecimento, irritabilidade e dificuldade de concentração. São 20 questões distribuídas em quatro grupos de sintomas: humor depressivo-ansioso, sintomas somáticos, decréscimo de energia vital e pensamentos depressivos28.
As variáveis independentes incluíram:
• Características sociodemográficas: sexo (feminino; masculino), idade (21 a 35 anos; 36 a 45 anos; 46 a 55 anos; 56 anos ou mais), cor da pele autodeclarada (branca; negra, parda, amarela e indígena), situação conjugal (com companheiro(a); sem companheiro(a)), renda familiar (1 a 3 salários-mínimos; 4 a 6 salários-mínimos; 7 salários-mínimos ou mais) e principal provedor(a) financeiro(a) da família (não; sim).
• Características do trabalho e emprego: vínculo de emprego (contratado/designado; concursado/efetivo), tempo de trabalho como professor (até 10 anos; 11 a 20 anos; 21 anos ou mais), jornada semanal (até 39 horas; 40 horas ou mais), outro emprego remunerado (não; sim, na docência em outra escola; sim, em outra atividade), demanda psicológica do trabalho (baixa; alta), controle sobre o trabalho (alto; baixo) e apoio social no trabalho (alto; baixo).
O estresse ocupacional foi avaliado por meio das respostas ao Job Stress Scale (JSS). Utilizou-se a versão resumida e validada para o português29 que contém 17 questões que tratam das dimensões demanda psicológica, controle e apoio social no trabalho. Cinco questões avaliam a demanda de natureza psicológica, incluindo aspectos quantitativos, como tempo, níveis de concentração e velocidade de realização das atividades de trabalho, e qualitativos, como interrupções das tarefas e contradições. Seis questões tratam do controle que o trabalhador tem sobre o próprio trabalho, ou seja, autonomia na decisão sobre a realização do trabalho e a possibilidade de mobilização e desenvolvimento de habilidades. Outras seis questões avaliam a terceira dimensão, o apoio social, que indica o nível de interação social entre o trabalhador e seus colegas, além da relação com seus superiores. As opções de resposta para cada uma das dimensões são apresentadas em escala Likert (1-4) e a média da somatória de cada uma foi utilizada para definir os grupos de alta/baixa demanda, alto/baixo controle, assim como alto/baixo apoio social29.
• Situação de saúde e hábitos/comportamentos: diagnóstico médico de depressão nos 12 meses anteriores à pesquisa (não; sim), diagnóstico médico de ansiedade nos 12 meses anteriores à pesquisa (não; sim), fumante atual (não; sim), consumo de álcool (não; sim), alteração do sono (não; sim) e uso excessivo de smartphone (não; sim).
A variável ‘alteração do sono’ foi obtida através das respostas a duas questões: 1) Ultimamente, você tem perdido muito sono por preocupação? (de jeito nenhum; não mais que de costume; um pouco mais que de costume; bem mais que de costume); e 2) Durante o último mês, como você classificaria a qualidade do seu sono de uma maneira geral? (muito boa; boa; ruim; muito ruim). Os professores que responderam ‘um pouco mais que de costume’ ou ‘bem mais que de costume’ na primeira questão e que classificaram a qualidade do sono como ruim ou muito ruim na segunda questão foram considerados ‘sim’ para alteração do sono.
O uso excessivo do smartphone foi avaliado por meio das respostas ao Inventário de Adicção em Smartphones (SPAI-BR), um instrumento composto por 26 itens com opções de resposta sim e não. O escore total obtido pela somatória dos itens varia de 0 a 26 pontos e foi utilizado o ponto de corte em 9 ou mais respostas positivas para identificar uso excessivo30.
A análise de dados foi conduzida utilizando-se o programa estatístico STATA, versão 13.0. Inicialmente, foi realizada a análise descritiva da população, estimando-se as frequências relativas de acordo com as categorias das variáveis do estudo e foi calculada a prevalência de ideação suicida na amostra. O próximo passo foi estimar a prevalência de ideação suicida de acordo com as categorias de cada uma das variáveis independentes e, por meio de regressão logística, foi realizada a análise bivariada com a finalidade de verificar a existência de associações brutas entre o desfecho investigado e as variáveis independentes. As variáveis que apresentaram valor de p ? 0,20 nas análises bivariadas foram selecionadas para compor o modelo múltiplo ajustado e foram retiradas, uma a uma, até que permanecessem no modelo final apenas as variáveis associadas à ideação suicida ao nível de p ? 0,05.
O teste de Hosmer-Lemeshow foi utilizado para avaliar a qualidade do ajuste do modelo final. Um p-valor alto indica que não existem diferenças significativas entre as probabilidades previstas pelo modelo e os valores observados no banco de dados em análise, caracterizando um bom ajuste do modelo aos dados.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual de Montes Claros (Parecer nº 4.964.125, 10/09/2021) e todos os participantes – professoras e professores – receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ao acessarem o formulário de pesquisa.
?
RESULTADOS
Do total de 1.982 formulários recebidos, foram excluídos 57 respondentes que não possuíam cargo de professor(a) da educação básica em escola estadual de Minas Gerais e 18 indivíduos não aceitaram participar da pesquisa. Portanto, foram analisadas as respostas de 1.907 formulários válidos, diante da amostra de 1.282 indivíduos necessária para garantir a representatividade da categoria no estado de Minas Gerais, conforme detalhado na seção anterior.
Entre os respondentes, 77,2% eram mulheres; a idade variou entre 21 e 72 anos (média 44,4 anos, DP ± 9,4); 54,4% se autodeclaram de pele branca; 60,8% viviam com companheiro(a); metade deles tinha renda familiar de 1 a 3 salários-mínimos e 59,9% eram os principais provedores do sustento de suas famílias (TABELA 1).
Em relação às características do trabalho e emprego, 57,5% eram concursados ou efetivos na escola estadual; 59,2% atuavam como professor havia 15 anos ou menos; 65,7% cumpriam jornada semanal de até 39 horas e 67,0% não possuíam outro emprego remunerado. Cerca de metade dos professores estava sob estresse ocupacional: alta demanda psicológica (51,5%), baixo controle sobre o trabalho (53,0%) e baixo apoio social por parte dos colegas e de seus superiores (53,2%) (TABELA 1).
Quanto à situação de saúde dos professores investigados, 13,1% e 38,6% relataram diagnóstico médico de depressão e ansiedade, respectivamente, nos 12 meses anteriores à pesquisa. Em relação a hábitos e comportamentos, 6,0% eram fumantes atuais e 12,0% relataram consumir, pelo menos, 4 doses de bebidas alcoólicas nas ocasiões em que bebiam; 34,6% tinham alterações do sono e 18,5% utilizavam o smartphone em excesso (TABELA 1).
A prevalência de ideação suicida entre os professores investigados foi de 5,6% (IC95% = 4,6-6,6) (n = 107). As análises bivariadas evidenciaram maiores chances de ideação suicida entre pessoas mais jovens, solteiras, divorciadas ou viúvas, que eram as principais provedoras financeiras de suas famílias, com vínculo estável de emprego, que atuavam na docência entre 11 e 20 anos, estavam sob estresse ocupacional, haviam recebido diagnóstico médico prévio de depressão e/ou ansiedade, eram fumantes atuais, consumiam álcool, estavam experimentando alterações do sono e com uso excessivo dos smartphones (TABELA 2).
O modelo final ajustado evidenciou maiores chances de ideação suicida entre os professores do sexo masculino (OR = 1,73; IC95%: 1,07-2,80); aqueles que viviam sem companhia (OR = 1,86; IC95%: 1,21-2,86); com diagnóstico prévio de depressão (OR = 8,14; IC95%: 5,25-12,63); aqueles que estavam enfrentando alterações do sono (OR = 3,57; IC95%: 2,18-5,84); e os professores que utilizavam em excesso os smartphones (OR = 2,12, IC95%: 1,34-3,34) (TABELA 3).
?
DISCUSSÃO
Este estudo investigou a ideação suicida entre professores da educação básica de escolas públicas estaduais de Minas Gerais. Os resultados revelaram associação com características individuais e importante associação com aspectos relacionados à saúde mental dos professores.
A prevalência de ideação suicida estimada no presente estudo (5,6%) é semelhante à observada na população adulta de uma cidade do interior de São Paulo (5,3%)8 e entre professores do ensino fundamental de uma cidade do interior de Alagoas (5,5%)18. E ligeiramente superior à prevalência de ideação suicida encontrada entre professores da rede municipal no interior do Rio Grande do Sul (4,7%)17 e em uma amostra de médicos belgas (4,3%)31. Contudo, em comparação com estudos realizados em outros momentos da pandemia de Covid-19, a prevalência obtida neste estudo é inferior. Entre professores e técnicos administrativos de uma universidade do interior de Minas Gerais foi observada prevalência de 15,6% – coleta de dados realizada entre 20 de julho e 27 de agosto de 202032. Estudo realizado entre 1.674 indivíduos com idades entre 18 e 75 anos, cuja coleta ocorreu entre junho e julho de 2020, identificou prevalência de 20,3% de ideação suicida33.
As diferenças observadas podem ser devidas ao momento em que os dados foram coletados nos diferentes estudos, uma vez que maiores ou menores conhecimentos e incertezas em relação ao desenrolar da pandemia de Covid-19 e as consequências advindas dela causaram impactos negativos na saúde física e mental das populações. Além disso, tais diferenças podem ser explicadas pelas especificidades metodológicas de cada estudo. Embora o SRQ-20 não seja um instrumento específico para rastreamento de ideação suicida e, para este estudo, foi considerado apenas um de seus itens como preditor do desfecho, os resultados merecem atenção. Há evidências de associação entre presença de transtornos mentais comuns – avaliada pelo SRQ-20 –, ideação suicida e risco de suicídio10,34. E é reconhecido que professoras e professores tendem a apresentar níveis superiores de sofrimento mental em comparação à população em geral35.
Diferentemente de outras pesquisas e levantamentos epidemiológicos, observou-se maior chance de ideação suicida entre os homens. Em geral, as mulheres apresentam maiores taxas de ideação e tentativas de suicídio ou lesões autoprovocadas e os homens apresentam maiores taxas de mortalidade por suicídio5,8-10,36. Esse fenômeno, denominado de ‘paradoxo do gênero no comportamento suicida’, parece ser determinado pelos papéis sociais atribuídos a homens e mulheres. Por um lado, espera-se do homem mais agressividade, uso de meios mais letais nas tentativas de suicídio e dificuldade em pedir ajuda quando necessita. Por outro, a mulher, apesar de apresentar maiores prevalências de adoecimento mental, compõe redes de apoio e suporte social, tem mais facilidade em falar de seus problemas e pedir ajuda, além de usar meios de atentar contra a própria vida que oferecem maiores possibilidades de salvamento nas tentativas de suicídio37-39. Porém, esse fenômeno não deve ser naturalizado, pois pode representar subnotificação de ideação e tentativas entre os homens e de mortes entre as mulheres37. No presente estudo, o anonimato das respostas e o fato de ser uma informação autopreenchida pode ter encorajado os(as) participantes a externarem tal pensamento. Além disso, a prevalência de depressão – em geral maior no sexo feminino – foi semelhante entre homens e mulheres (12,4% e 13,2%, respectivamente; teste ?2 de Pearson = 0,1871; p = 0,665); e os homens, com maior frequência, relataram baixo apoio social por parte de colegas e superiores (62,4% em comparação com 50,4% das mulheres; teste ?2 de Pearson = 19,390; p = 0,000). Registra-se que esses dados estratificados por sexo não foram apresentados na seção anterior, que abordou os resultados desta pesquisa.
A variável situação conjugal permaneceu associada à ideação suicida e os professores que viviam sozinhos (solteiros, viúvos ou separados) apresentaram maior chance do desfecho. Resultado esse que está em consonância com outros estudos9,12,15. A vida em conjunto e as interações pessoais positivas contribuem para a motivação do indivíduo em seguir a vida e atuam como barreiras a comportamentos de risco, incluindo a ideação suicida. Da mesma forma, relações conflitantes e assimétricas, especialmente aquelas atravessadas por episódios de violência, potencializam estratégias negativas de enfrentamento aos problemas vivenciados37,40,41.
Professores que relataram diagnóstico médico de depressão nos 12 meses anteriores à pesquisa apresentaram chance expressivamente mais elevada de ideação suicida. O diagnóstico médico de distúrbios mentais configura o maior fator de risco para o comportamento suicida42. Estudos indicam que, em sua maioria, indivíduos que tentam ou cometem o suicídio possuem algum transtorno mental previamente diagnosticado42,43; sendo a depressão o de maior prevalência36, uma vez que tal condição proporciona redução dos níveis de serotonina, ocasionando a impulsividade da ideação suicida e o prosseguimento da ação43. Ademais, abusos, traumas, maus tratos, divórcio, morte de parente ou amigo: promovem o aumento de estresse emocional, geram gatilho para a depressão44 e, possivelmente, agravam a vulnerabilidade para a ideação suicida.
A alteração do sono manteve-se associada a maior chance de ideação suicida. Episódios de insônia frequente, pesadelos, sono de curta duração e baixa qualidade do sono podem provocar alterações cognitivas, no comportamento e de humor, aumento do estresse, cansaço excessivo, e se associarem à depressão e à ideação suicida45,46.
O uso excessivo de smartphones permaneceu associado à maior chance de ideação suicida. Não há dúvidas de que esse dispositivo representa uma ferramenta para a comunicação, relações sociais, entretenimento e adequações da vida cotidiana; contudo, o uso em excesso pode ocasionar impactos negativos à saúde física e mental. Estudos evidenciam a associação entre o uso excessivo de smartphones e estresse, baixa qualidade do sono, depressão e ansiedade47-49. Os mecanismos causais incluiriam alterações nos níveis de melatonina e exposição a campos magnéticos que poderiam afetar a atividade cerebral, além de desconfortos físicos como dores de cabeça e musculares, situações capazes de levar à má qualidade do sono, o que, por sua vez, poderia resultar em alterações de humor, estresse, depressão e ansiedade49. Somam-se a isso exigências de permanecer conectado por causa do trabalho, o que poderia ocasionar maior esgotamento emocional e tempo insuficiente para a prática de atividades relacionadas à saúde e bem-estar, como exercícios físicos e interações sociais49.
A exposição aos estressores ocupacionais não alcançou significância estatística no presente estudo, diferentemente de estudo realizado entre trabalhadores franceses que indicou associação entre ideação suicida e aspectos psicossociais do trabalho50. Esse resultado não significa a ausência de tal exposição, uma vez que aproximadamente metade dos professores e professoras relatou alta demanda psicológica, baixo controle sobre o trabalho e baixo apoio social por parte de colegas e superiores. Sabe-se que o adoecimento mental é associado a estressores ocupacionais51. Assim, há que se considerar que o adoecimento mental possa ter ofuscado, por ser mais proximal e forte, o efeito da exposição a tais estressores, que pode ter influenciado o desfecho de forma mais distal.
Os resultados devem ser analisados levando em conta algumas limitações do estudo. Em relação ao desfecho, há a limitação de se investigar ideação suicida isoladamente, sem avaliar antecedentes de planejamento ou tentativas de suicídio. Em estudos futuros, sugere-se considerar a utilização de instrumentos adicionais. O delineamento transversal demanda interpretação cautelosa, em especial por se tratar de um desfecho multidimensional, devendo-se ressaltar, portanto, a impossibilidade de indicar relações de causalidade. Além disso, pesquisas realizadas pela web não permitem controle sobre a amostra investigada e, dessa forma, não é possível garantir amostragem equiprobabilística entre os elementos da população do estudo e nem conhecer a real taxa de resposta. Há, ainda, a possibilidade de viés de seleção, por depender de acesso à internet e viés de memória, por utilizar autorrelatos.
Todavia, pontos fortes também podem ser destacados: as características sociodemográficas dos professores investigados mostraram-se coerentes com as observadas no conjunto de professores brasileiros em atividade na educação básica; alcançou-se amostra robusta e distribuída por todo o estado de Minas Gerais – incluindo áreas rurais – a baixo custo, com metodologia rigorosa e utilização de instrumentos validados; além do apoio da SEE/MG na divulgação da pesquisa e envio do formulário. Destarte, considera-se que a pesquisa apresenta informações originais importantes acerca dos fatores associados à ideação suicida entre professores.
Este artigo investigou a ideação suicida entre professores e identificou os fatores associados, com destaque para o sexo masculino, presença de depressão, distúrbios do sono e o abuso no uso do smartphone. Os resultados indicam a necessidade da ampliação de políticas de prevenção de agravos e de promoção da saúde física e mental voltadas mais especificamente para a categoria docente. Ações que integram o Programa Saúde na Escola, implantadas no Brasil pelos Ministérios da Saúde e da Educação junto a estabelecimentos da rede pública, por exemplo, focalizam crianças, adolescentes e jovens em idade escolar52. Em Minas Gerais, a SEE disponibiliza psicólogos para atuarem nas escolas estaduais com atribuições de contribuírem para a resolução de conflitos, melhoria dos relacionamentos interpessoais e da qualidade do ensino. Embora relevantes, essas atribuições parecem contemplar apenas lateralmente aspectos determinantes para o adoecimento de professores.
Em relação à ideação suicida, a justificativa para a ampliação de políticas de prevenção de agravos e de promoção da saúde física e mental de professores deve se apoiar nas evidências de que a ideação representa risco elevado de tentativa de suicídio no futuro e, ainda, de que as tentativas são o principal fator de risco para o suicídio consumado. Portanto, o acolhimento do indivíduo em risco e o cuidado com a saúde mental tornam-se estratégias de prevenção do autoextermínio e proteção do trabalhador.
?
REFERÊNCIAS
1. Almeida FM. Suicídio: contribuições de Émile Durkheim e Karl Marx para a compreensão desse fenômeno na contemporaneidade. Aurora 2018; 11(1):119-138.
2. Dantas ESO, Meira KC, Bredemeier J, Amorim KPC. Suicídio de mulheres no Brasil: necessária discussão sob a perspectiva de gênero. Cien Saude Colet 2023; 28(5):1469-1477.
3. Queiroz JB. O suicídio na sociologia brasileira. Contemporânea 2020; 10(3):1453-1480.
4. Rodrigues MMA. Suicídio e sociedade: um estudo comparativo de Durkheim e Marx. Rev Latinoam Psicopat Fund 2009; 12(4):698-713.
5. World Health Organization (WHO). Preventing suicide: a global imperative. Genebra: WHO, 2014.
6. Davila-Cervantes CA, Luna-Contreras M. Suicide attempts in the adult Mexican population: an analysis of sociodemographic characteristics and associated factors. Rev Bras Epidemiol 2024; 27:e240014.
7. Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JÁ, Zwi AB, Lozano R. (Eds). World report on violence and health. Geneva, World Health Organization, 2002.
8. Botega NJ, Marín-León L, Oliveira HB, Barros MBA, Silva VF, Dalgalarrondo P. Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: um inquérito de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2009; 25(12):2632-2638.
9. Nock MK et al. Cross-national prevalence and risk factors for suicidal ideation, plans, and attempts. Br J Psychiatry 2008; 192:98-105.
10. Macedo JP, Silva BM, Bezerra LLS. Ideação suicida em assentamentos rurais no Piauí. Psicol Pesq 2018; 12(3):1-10.
11. O’Neill S et al. Patterns of suicidal ideation and behavior in Northern Ireland and associations with conflict related trauma. PLOS One 2014; 9(3):e91532.
12. Papadopoulou A et al. Suicidal ideation during COVID-19 lockdown in Greece: Prevalence in the community, risk and protective factors. Psychiatry Res 2021; 297:113713.
13. Biswas T et al. Global variation in the prevalence of suicidal ideation, anxiety and their correlates among adolescents: a population based study of 82 countries. E Clin Med 2020; 24:100395.
14. Veloso-Besio C et al. The prevalence of suicide attempt and suicidal ideation and its relationship with aggression and bullying in Chilean adolescents. Front Psychol 2023; 14:1133916.
15. Lima CA et al. Ideação suicida e fatores associados entre estudantes de ensino médio e superior: uma análise hierarquizada. J Bras Psiquiatr 2021; 70(3):211-223.
16. Turecki G, Brent DA. Suicide and suicidal behaviour. Lancet 2016; 387(10024):1227-1239.
17. Rocha LM, Behlau M, Souza LDM. Behavioral dysphonia and depression in elementar school teachers. J Voice 2015; 29(6):712-717.
18. Alves VM, Rocha MGDL, Silva JA, Silva JK., Santos RTS, Francisco LCFL. Qualidade de vida e risco de depressão e suicídio em professores. Res Soc Dev 2022; 11(4):e54711427565.
19. Dres M. Job strain, burnout, and suicidal ideation in tenured university hospital faculty staff in France in 2021. JAMA Netw Open 2023; 6(3):e233652.
20. Brasil. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Resumo Técnico: Censo Escolar da Educação Básica 2021. Brasília, DF: Inep,
2022.
21. Maia EG, Claro RM Assunção AA. Múltiplas exposições ao risco de faltar ao trabalho nas escolas da Educação Básica no Brasil. Cad Saude Publica 2019; 35(Supl.1): e00166517.
22. Silva DF, Cobucci RN, Lima SC, Andrade FB. Prevalence of anxiety, depression, and stress among teachers during the Covid-19 pandemic: a PRISMA-compliant systematic review. Medicine 2021; 100(44):e27684.
23. Souza e Silva NS et al. Working conditions, lifestyle and mental health of Brazilian public-school teachers during the Covid-19 pandemic. Psychiatriki 2021; 32:282-289.
24. Ribeiro JM, Moreira MR. Uma abordagem sobre o suicídio de adolescentes e jovens no Brasil. Cien Saude Colet 2018; 23(9):2821-2834.
25. Brito MDLS, Silva Júnior FJG, Costa APC, Sales JCS, Gonçalves AMS, Monteiro CFS. Suicidal behavior and prevention strategies from teachers’ perspective. Esc Anna Nery 2020; 24(4):1-7.
26. Haugen JS, Sutter CC, Jones JLT, Campbell LO. Teachers as youth suicide prevention gatekeepers: an examination of suicide prevention training and exposure to students at risk of suicide. Child Youth Care Forum 2023; 52:583-601.
27. Madjara N, Walsh SD, Harel-Fischa Y. Suicidal ideation and behaviors within the school context: Perceived teacher, peer and parental support. Psychiatry Res 2018; 269:185-190.
28. Santos KOB, Araújo TM, Oliveira NF. Estrutura fatorial e consistência interna do Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) em população urbana. Cad Saude Publica 2009; 25(1):214-222.
29. Alves MGM, Chor D, Faerstein E, Lopes CS, Werneck GL. Versão resumida da “job stress scale”: adaptação para o português. Rev Saude Publica 2004; 38(2):164-171.
30. Khoury JM, Freitas AAC, Roque MAV, Albuquerque MR, Neves MCL, Garcia FD. Assessment of the accuracy of a new tool for the screening of smartphone addiction. PloS ONE 2017; 12(5):e0176924.
31. Loas G, Lefebvre G, Rotsaert M, Englert Y. Relationships between anhedonia, suicidal ideation and suicide attempts in a large sample of physicians. PLoS ONE 2018; 13(3):e0193619.
32. De Paula W, Oliveira WC, Meireles AL, Nascimento RC, Silva GN. Effects and implications of the COVID-19 pandemic on medicine use by employees of a Brazilian public university: a cross-sectional study. Sao Paulo M J 2022; 140(2):250-260.
33. Antonelli ST et al. Loneliness, but not social distancing, is associated with the incidence of suicidal ideation during the COVID-19 outbreak: a longitudinal study. J Affect Disord 2021; 290:52-60.
34. Silveira LB, Kroeff CR, Teixeira MAP, Bandeira DR. Uso do Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) para identificação de grupo clínico e predição de risco de suicídio. Rev Psicol Saude 2021; 13(4):49-61.
35. Tostes MV, Albuquerque GSC, Silva MJS, Peterle RR. Sofrimento mental de professores do ensino público. Saude Debate 2018; 42(116):87-99.
36. Brasil. Boletim Epidemiológico. Mortalidade por suicídio e notificações de lesões autoprovocadas no Brasil [Internet]. 2021 [acessado em 11 abr. 2024]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/epidemiologicos/edicoes/2021/boletim_epidemiologico_svs_33_final.pdf
37. Baére F, Zanello V. O gênero no comportamento suicida: uma leitura epidemiológica dos dados do Distrito Federal. Estud Psicol 2018; 23(2):168-178.
38. Griffin L, Hosking W, Gill PR, Shearson K, Ivey G, Sharples J. The gender paradox: understanding the role of masculinity in suicidal ideation. Am J Mens Health 2022; 16(5):1-12.
39. Moore F, Taylor S, Beaumont J, Gibson R, Starkey C. The gender suicide paradox under gender role reversal during industrialisation. PLoS ONE 2018; 13(8):e0202487.
40. Pedrosa NFC, Barreira DA, Rocha DQC, Barreira MA. Análise dos principais fatores epidemiológicos relacionados ao suicídio em uma cidade no interior do Ceará, Brasil. J Health Biol S 2018; 6(4):399-404.
41. Silva DA, Marcolan JF. O impacto das relações familiares no comportamento suicida. Res Soc Dev 2021; 10(2):e17310212349.
42. Botega NJ. Comportamento suicida: epidemiologia. Psicol USP 2014; 25(3):231-236.
43. Gusmão ROM, Santos NHF, Silva DVA, Moreira DFN, Vieira MA, De Araújo DD. Depressão em pacientes atendidos em serviço de saúde mental: fatores associados e diagnósticos de enfermagem. Rev Eletronica Saude Mental Alcool Drog 2021; 17(2):44-53.
44. Motta GC, Aguiar WM, Dunningham WA. Suicídio no Brasil: um retrato de 2004 a 2014. Rev Bras Neurol Psiquiatr 2021; 25(1):4-17.
45. Littlewood DL, Kyle SD, Carter L, Peters S, Pratt D, Gooding P. Short sleep duration and poor sleep quality predict next-day suicidal ideation: an ecological momentary assessment study. Psychol Med 2018; 49:403-411.
46. Littlewood DL, Kyle SD, Pratt D, Peters S, Gooding P. Examining the role of psychological factors in the relationship between sleep problems and suicide. Clin Psychol Rev 2017; 54:1-16.
47. Elhai JD, Dvorak RD, Levine JC, Hall BJ. Problematic smartphone use: a conceptual overview and systematic review of relations with anxiety and depression psychopathology. J Affect Disord 2017; 207:251-259.
48. Alhassan AA, Alqadhib EM, Taha NW, Alahmari RA, Salam M, Almutairi A. The relationship between addiction to smartphone usage and depression among adults: a cross sectional study. BMC Psychiatry 2018; 18(148):1-8.
49. Yang J, Fu X, Liao X, Li Y. Association of problematic smartphone use with poor sleep quality, depression, and anxiety: a systematic review and meta-analysis. Psychiatry Res 2020; 284:112686.
50. Niedhammer I, Bèque M, Chastang J, Bertrais S. Psychosocial work exposures and suicide ideation: a study of multiple exposures using the French national working conditions survey. BMC Public Health 2020; 20:895.
51. Gomes NR, De-Assis-Santos CC, Rezende BA, Medeiros AM. Fatores psicossociais do trabalho e o adoecimento de professores: uma revisão sistemática. Rev Bras Med Trab 2023; 21(3):e20221014.
52. Fernandes LA et al. Trajetória dos 15 anos de implementação do Programa Saúde na Escola no Brasil. Saude Debate 2022; 46(3):13-28.
?