Ciências, Democracia e Saúde Coletiva: interfaces, resistências e perspectivas para as políticas públicas e o SUS
Abertura: 04 de janeiro de 2023
Encerramento: 04 de abril de 2023 - ATENÇÃO: Prazo prorrogado até 05 de maio de 2023
Título: Ciências, Democracia e Saúde Coletiva: interfaces, resistências e perspectivas para as políticas públicas e o SUS
Termo de referência:
São várias e profundas as mudanças do mundo atual, que se expressam em diversos campos e dimensões, afetando de modo desigual os países, as populações e também os sistemas e serviços de saúde.
Em primeiro lugar, ressaltam-se as transformações demográficas e epidemiológicas, que se expressam em nosso país por um processo intenso de envelhecimento da população, de aumento das condições crônicas, de doenças relacionadas ao padrão alimentar, das violências, da insegurança alimentar e das situações de sofrimento mental. Além disso, vivemos um aumento do surgimento de emergências sanitárias, desastres e pandemias. Tudo isso repercute sobre o SUS, que deve ser capaz de organizar ações e serviços e prover o cuidado à saúde, de forma coordenada e articulada com outras áreas das políticas públicas, e em tempo oportuno, para responder de forma satisfatória às necessidades sociais decorrentes dessas mudanças. Discussões sobre intersetorialidade das políticas públicas, do modelo de atenção (que envolve a atenção primária à saúde nas redes de cuidado, a integração entre a assistência e a vigilância) e resiliência (que abarca a capacidade do sistema de se adequar às novas demandas e necessidades sociais e de saúde) são temas que ganham importância renovada nesse contexto.
Um segundo grupo de transformações está relacionado ao desenvolvimento científico, tecnológico e à inovação, que repercutem na área da saúde dado sua importância central para a geração de novos conhecimentos e tecnologias para diferentes setores. O conhecimento biomédico e as tecnologias preventivas e terapêuticas, incluindo os medicamentos e as vacinas, representam recursos-chave que estão no centro do poder da geopolítica internacional. Entretanto, em grande parte, as pesquisas científicas e a produção de tecnologias na área biomédica são produzidas nos países centrais e protegidas por patentes, o que eleva os custos e agrava situações de desigualdade de acesso. Além disso, no Brasil, os efeitos de políticas de austeridade fiscal sobre os orçamentos vinculados às atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação em saúde, contribuem para fragilizar ainda mais a base produtiva e tecnológica nacional e acentuar a dependência de produtos e insumos importados. Tanto a literatura especializada como a experiência internacional já demonstraram o fracasso das políticas de austeridade, que não permitem “aproximar a lógica produtiva da lógica social”, o que evidencia a necessidade de superá-las em um novo projeto de desenvolvimento.
Um terceiro conjunto de mudanças está associado ao uso crescente de novas tecnologias de informação e comunicação social. Esse é um tema complexo, com aspectos positivos e também negativos, principalmente considerando as desigualdades de acesso à Internet no Brasil. Sobre esse aspecto, ressalta-se a importância do SUS lidar adequadamente com novos meios tecnológicos para prover de forma adequada e com qualidade o cuidado à saúde das populações, mas também para construir uma consciência crítica e política dos cidadãos para o uso adequado das informações. Questões como regulação do mercado, segurança de informações, uso de algoritmos e da chamada inteligência artificial nas práticas de saúde, por exemplo, requerem cada vez mais atenção. Mas além dos desafios, cabe ressaltar as oportunidades trazidas por essas mudanças, como a incorporação definitiva da tecnologia digital no fazer pesquisa, no ensino remoto/misto e no teleatendimento em saúde, por exemplo.
Um quarto grupo de transformações é de ordem climática e ambiental. As relações entre saúde, ambiente e sustentabilidade são fundamentais e constituem um dos grandes desafios do século XXI. A degradação socioambiental nos espaços urbanos e rurais compromete os sistemas de suporte à vida e à saúde. Nesse contexto, os riscos e as ameaças provenientes dos efeitos negativos causados pela atividade humana sobre os diversos ecossistemas do planeta necessitam ser objeto de proteção; o que exige que temas relacionados às interações recíprocas entre o econômico, o social e o ambiental tenham maior destaque no âmbito das políticas públicas e de saúde.
Um quinto está relacionado ao mundo do trabalho. Na área da saúde, composta por diferentes e importantes segmentos da esfera produtiva, a prestação de serviços tem se colocado como um espaço onde estas mudanças vêm ocorrendo de forma intensa, com consequências diretas sobre os trabalhadores do mercado de trabalho em geral e no mercado de trabalho do setor público. Isso traz novos temas para estudos relacionados à formação, qualificação profissional, e gestão do trabalho em saúde.
Um sexto conjunto de transformações está relacionado à concentração da riqueza e ao agravamento das desigualdades sociais e de saúde no mundo, e de forma particular em nosso país. No Brasil, a pandemia afetou de maneira mais intensa grupos historicamente vulnerabilizados e sistematicamente excluídos (por diferenças de classe, gênero, raça, etnia e condições de acessibilidade), que vivem em regiões desassistidas, que estão em situação de rua e habitam moradias precárias. A piora das condições de vida e saúde da população vem corroendo ainda mais a frágil base de solidariedade em nosso país e exacerbando conflitos entre diferentes grupos sociais. Isso reforça a importância da conjugação de políticas abrangentes e voltadas para populações em maior vulnerabilidade social, com respeito a diversidade e singularidade das trajetórias de vida das pessoas, para superar a perversidade da desigualdade estrutural, que foi reforçada e potencializada pela pandemia.
Um sétimo, e não menos importante, que se expressa de forma marcante no Brasil, está relacionado à expansão do setor privado (com ou sem fins lucrativos) na gestão da prestação de serviços públicos e na oferta de tecnologias médicas (principalmente na área de serviços laboratoriais e especializados), e à reconfiguração do segmento suplementar com incremento dos mecanismos de intermediação financeira e estímulo à conformação de grandes grupos capitalistas na área. Isso reforça a emergência de atores privados com poder de influência na governança da política de saúde e do SUS em um contexto de fragmentação da gestão e fragilização da capacidade de intervenção pública do Estado, nas diferentes esferas de governo. Essa fragilização se deve à adoção de políticas neoliberais e ao sucateamento das instituições públicas, em meio ao agravamento do subfinanciamento do SUS e desconstrução da institucionalidade conferida pela CF 88, pelos sucessivos atos normativos e legislativos e reformas administrativas instituídas ao longo dos últimos anos.
Nesse cenário de crescente perda de direitos e de fortes ameaças à democracia, somado ao negacionismo das ciências e um crescente ódio a grupos sociais excluídos, ódio este que se manifesta de diversas formas, como o feminicídio, a violência armada contra populações de favela/periferia, urge pensar quais as tramas históricas que produziram este cenário e quais os enfrentamentos necessários, seja para resistir, seja para reconstruir o ensino, a pesquisa, a saúde e o SUS. Trazer esses elementos para discussão, de uma perspectiva que associa saberes, saúde - tanto como um direito fundamental de pleno bem-estar, quanto no que tange ao SUS - e democracia social, permite incorporar ao campo da Saúde Coletiva e se deixar instigar por novos olhares sobre o fazer ciência e seus/suas sujeitos/as, tão em voga entre os/as intelectuais decoloniais, por exemplo, e sobre as políticas de saúde tensionadas por agendas de inclusão e representação. Como construir um SUS para todos e todas quando cisheteronormativas próprias da branquitude atravessam fundamentos científicos e alicerçam políticas públicas construídas por representantes de grupos sociais hegemônicos? Como produzir conhecimento e práticas de saúde emancipatórias em um campo historicamente alicerçado em moralidades excludentes? Como construir um sistema de saúde efetivo e inclusivo em uma realidade de profunda escassez de recursos? Como lidar com os antigos e novos desafios sanitários, técnicos e políticos que se apresentam para os sistemas de saúde? Essas são apenas algumas das questões sobre as quais o contexto atual exige debate e esta publicação pretende estimular a reflexão. Nesse sentido, serão priorizadas as seguintes temáticas:
- Inclusão social, promoção e valorização da diversidade e equidade
- Moralidades, desinformação, negacionismos e comunicação em Saúde
- Violências e Saúde
- Retrocessos e perspectivas para as políticas públicase o SUS
- Mudanças climáticas e justiça sócio-ambiental na agenda da Saúde
- Desafios para o SUS a partir da pandemia do Covid-19: Legitimidade/reconhecimento social, cuidados adiados, gestão e novas (re)emergências sanitárias.
- Transformação digital em Saúde.
- Democracia e saúde
- Desenvolvimento tecnológico, modelos de produção e efeitos nas relações de trabalho e saúde
Normas para a publicação na Revista:
As orientações e normas para envio de artigos constam na página Web da Revista Ciência & Saúde Coletiva – www.cienciaesaudecoletiva.com.br.
Esta chamada pública estará aberta de 04 de janeiro a 04 de abril de 2023. - ATENÇÃO: Prazo prorrogado até 05 de maio de 2023
O número temático tem como uma de suas principais finalidades a divulgação do conhecimento gerado no âmbito de programas de pós-graduação stricto sensu. Serão valorizados os artigos em colaboração docente-discente.
Os artigos deverão ser encaminhados em Word para o e-mail tematicosaudecoletiva@gmail.com, junto com uma Carta de Apresentação em que as/os autoras/es situem o contexto de sua elaboração e explicitem a sua inserção em Programas de Pós-Graduação stricto sensu.
Editoras/es Convidadas/os:
Eduardo Alves Melo
Departamento de Administração e Planejamento em Saúde
Luciana Dias de Lima
Departamento de Administração e Planejamento em Saúde
Patrícia Constantino
Departamento de Estudos sobre Violência e Saúde Jorge Careli – ENSP/Fiocruz
Rondineli Mendes da Silva
Departamento de Política de Medicamentos e Assistência Farmacêutica (NAF)
Simone Santos S. Oliveira
Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana
Vera Lucia Marques da Silva
Departamento de Estudos sobre Violência e Saúde Jorge Careli – ENSP/Fiocruz