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0424/2006 - A EDUCAÇÃO EM SAÚDE COMO AGENTE PROMOTOR DE QUALIDADE DE VIDA PARA O IDOSO
The education in health as a better life quality agent for elderly people

Autor:

• Herika de Arruda Mauricio - Mauricio, H.A. - Recife - Faculdade Maurício de Nassau - <herika.mauricio@upe.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6645-457X


Área Temática:

Não Categorizado

Resumo:

Este artigo tece considerações sobre a educação em saúde como agente promotor da qualidade de vida a fim de atingir ações e condições conducentes à saúde do idoso no contexto brasileiro. A partir de uma revisão da literatura na área, verificou-se que o trabalho educacional tem como desafio a integração de conhecimentos dispersos das áreas humanas e biológicas, aos saberes populares, pressupondo novas interfaces de atuação no modelo de assistência à saúde. A educação em saúde desponta como um elo entre os desejos e expectativas dessa população por uma vida melhor e as projeções e estimativas dos governantes ao oferecer programas de saúde mais eficientes.
Unitermos: Idoso, Educação em saúde, Qualidade de vida.

Abstract:

This article presents considerations on the education in health as a better life quality agent in order to reach actions and behavior conditions for the health of brazilian elderly community. From a literature review, has been noticed that the educational work has as challenge the integration of the huge knowledge in human and biological areas, to the common knowledge, improving new policies in the model of the health care system. The education in health reveals to be the link between the desires and expectations of the population for a better life and the projections and policies of the government to offer more efficient health care programs.

Uniterms: Elderly people, Education in health, Quality of life.


Conteúdo:

INTRODUÇÃO

A humanidade está passando por um processo de mudança populacional conhecido por “transição demográfica” em que as diferentes sociedades humanas estão deixando, por condições diferentes (redução da fecundidade, da mortalidade infantil e também da mortalidade em idades mais avançadas), de ser sociedades em que predominam as populações jovens e maduras para se transformarem em sociedades cada vez mais envelhecidas (Jordão Netto1; Fernandes et al.2; Lima-Costa3).
A Organização das Nações Unidas - ONU considera o período de 1975 a 2025 a Era do Envelhecimento. Nos países em desenvolvimento, esse envelhecimento populacional foi ainda mais significativo e acelerado, destaca a ONU: enquanto nas nações desenvolvidas, no período de 1970 a 2000, o crescimento observado foi de 54%, nos países em desenvolvimento atingiu 123%. No Brasil, segundo dados do IBGE, na década de 1970, cerca de 4,95% da população brasileira era de idosos, percentual que pulou para 8,47% na década de 1990, havendo a expectativa de alcançar 9,2% em 2010. O aumento do número de idosos também tem sido acompanhado por um acréscimo significativo nos anos de vida da população brasileira. A esperança de vida, que era em torno de 33,7 anos em 1950/1955, passou para 50,99 em 1990, chegou até 66,25 em 1995 e deverá alcançar 77,08 em 2020/2025 (Siqueira et al.4).
Do ponto de vista biológico, o envelhecimento é descrito como um estágio de degeneração do organismo, que se iniciaria após o período reprodutivo. Essa deterioração, que estaria associada à passagem do tempo, implicaria uma diminuição da capacidade do organismo para sobreviver. Entretanto, o problema começa quando se tenta marcar o início desse processo, ou medir o grau desse envelhecimento/degeneração. Por mais incrível que possa parecer, o critério mais comumente utilizado para a definição do envelhecimento – o cronológico (a idade) – é apontado como falho e arbitrário. Isso porque o envelhecimento seria vivenciado de forma heterogênea pela população. Pessoas da mesma idade cronológica poderiam estar em estágios completamente distintos de envelhecimento. Além disso, o próprio organismo de um indivíduo 'envelheceria' de maneira diferente entre os seus tecidos, ossos, órgãos, nervos e células. Desse modo, o envelhecimento não parece ser definido pela idade de uma pessoa, mas pelos efeitos que essa idade teria causado a seu organismo (Groisman5). Nessa perspectiva, a velhice é percebida como fenômeno natural e social que se desenrola sobre o ser humano, único, indivisível, que, na sua totalidade existencial, defronta-se com problemas e limitações de ordem biológica, econômica e sociocultural que singularizam seu processo de envelhecimento. Desse modo, somente uma descrição analítica dos diferentes aspectos da velhice não é considerada suficiente para explicá-la, visto que cada um desses aspectos interage com todos os outros e é por eles afetado (Siqueira et al.4; Diogo et al.6).

O envelhecimento populacional constitui um dos maiores desafios para a saúde pública contemporânea, especialmente em países em desenvolvimento, onde este fenômeno ocorre em ambiente de pobreza e grande desigualdade social (WHO7). Com o aumento da expectativa de vida dos indivíduos, modifica-se, também, o seu perfil de saúde; ao invés de processos agudos ou de óbito, tornam-se predominantes as doenças crônicas e suas complicações, como a perda da sua autonomia e independência funcional, que, além de demandarem maiores custos para os serviços de saúde, exigem um reordenamento das suas ações prioritárias. Mesmo sendo esse o cenário atual, observa-se, no geral, que os serviços de saúde não estão preparados para responder às necessidades múltiplas dos idosos (Fernandes et al.2). A maioria das doenças crônicas que acomete o indivíduo idoso tem, na própria idade, seu principal fator de risco (Gordilho et al.8).
Não obstante, conforme Lima-Costa3, os idosos são grandes usuários de serviços de saúde, sendo este fenômeno conseqüência da maior prevalência de doenças e de incapacidades nessa população. Em países desenvolvidos, o uso de serviços de saúde entre idosos é cerca de três a quatro vezes maior que o seu tamanho proporcional na população. No Brasil, o custo proporcional das internações hospitalares públicas entre idosos é três vezes maior do que o tamanho proporcional desta no conjunto da população brasileira. Apesar de a atenção à saúde ser um direito universal no Brasil, o acesso no uso de serviços pela população idosa são fortemente influenciados pela situação socioeconômica do idoso e/ou da sua família. Os idosos com menor renda domiciliar mensal apresentam piores condições de saúde em comparação com aqueles com melhor situação socioeconômica, mas visitam médicos com menos freqüência.
Mesmo com a extensão da atenção à saúde, ocorrida a partir dos anos 80, aborda-se o idoso, na maioria das vezes, de modo limitado às enfermidades crônicas e em consultas individuais esporádicas, sem continuidade, e desconsiderando o impacto desse quadro na qualidade de vida. A precária assistência ao idoso pode ser constatada pela elevada proporção de óbitos por causas mal definidas (que chega a 65%) e à subnotificação de problemas considerados esperados ou normais para a idade e não passíveis de intervenção. As enfermidades crônicas apresentam-se de modo simultâneo e múltiplo e seu caráter insidioso e, muitas vezes, subclínico, dificulta o diagnóstico e a aderência ao tratamento. Por tais razões, o acompanhamento do idoso requer o autoconhecimento das enfermidades, complicações e indicações terapêuticas, bem como a motivação e educação contínua e de modo compartilhado (Garcia et al.9).
Muitas vezes, na velhice, os problemas de saúde causados por patologias múltiplas são agravados pela solidão e pobreza (Veras et al.10). A inatividade e a falta de perspectivas na aposentadoria podem levar a um sentimento de depressão que conseqüentemente compromete a saúde do indivíduo (França11). Especificamente sob a presença de suportes sociais é esperado que pessoas idosas sintam-se amadas, seguras para lidar com problemas de saúde e tenham alta auto-estima, reduzindo os efeitos negativos do estresse na saúde mental, tendo uma influência positiva no bem-estar psicológico (Cicirelli in Ramos12).
No Estatuto do Idoso, é assegurada a atenção integral à saúde, por intermédio do Sistema Único de Saúde – SUS, garantindo-lhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para a prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos (Brasil13). O acesso a serviços de saúde de qualidade é um elemento central para a qualidade de vida relacionada à saúde do idoso (Lima-Costa3).
Para a Organização Mundial de Saúde – OMS, a qualidade de vida é definida como “percepção do indivíduo sobre a sua posição na vida, no contexto da cultura e dos sistemas de valores nos quais ele vive, e em relação a seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. Nessa definição incluem-se seis domínios principais: saúde física, estado psicológico, níveis de independência, relacionamento social, características ambientais e padrão espiritual. Nesse contexto, serviços que contribuem para promoção de uma qualidade de vida voltada para a sua população idosa tornam-se um desafio, tendo em vista que devem considerar uma valoração subjetiva que o próprio idoso faz de diferentes aspectos de sua vida em relação ao seu estado de saúde (WHO14; Seidl in Guiteras, Bayés15).





REVISÃO CRÍTICA
Qualidade de vida é uma expressão que vem se tornando corriqueira no dia-a-dia das pessoas, mas que se reveste de grande complexidade, dada a subjetividade que representa para cada pessoa ou grupo social (Queiroz et al.16). Por outro lado, em um nível abstrato, alguns autores têm considerado que existe um conceito ”universal cultural” de qualidade de vida, isto é, independente da nação, cultura ou época, é importante que as pessoas se sintam bem psicologicamente, possuam boas condições físicas e sintam-se socialmente integradas e funcionalmente competentes (Bullinger et al. in Fleck et al.17).
O termo qualidade de vida tem movido o interesse das Nações Unidas desde a década de 50. Uma boa parte das investigações, inicialmente, associava a qualidade de vida a um conceito quantitativo, relativo a recursos materiais disponíveis para determinado indivíduo ou sociedade. Atualmente, existe uma abordagem mais ampla e integradora que leva em consideração as necessidades básicas do ser humano em direção ao sentimento de bem-estar subjetivo e social (Souza, Carvalho18). As questões de qualidade de vida têm avançado em níveis consideráveis, sob o enfoque dos determinantes sociais de condição de vida e desenvolvimento (Rocha et al.19). Uma qualidade de vida boa ou excelente é aquela que oferece um mínimo de condições para que os indivíduos possam desenvolver o máximo de suas potencialidades, sejam estas: viver, sentir ou amar, trabalhar, produzindo bens e serviços, fazendo ciências ou artes. (Ruffino in Santos et al.20).
Rogerson in Rocha et al.19 desenvolve dois modelos conceituais sobre qualidade de vida: um relacionado à saúde e sua recuperação e outro relacionado às questões ambientais. O primeiro enfoque envolve a questão de recuperação da saúde após um evento de doença ou agravo. O segundo é o reflexo da realidade multifacetada de determinado grupo social, com ênfase nas distorções desse meio para enfrentamento das iniqüidades. O modelo incorpora aspectos comportamentais e perceptivos da comunidade acerca da qualidade de vida.
No campo da saúde, a relação entre saúde e qualidade de vida existe desde o nascimento da medicina social, nos séculos XVIII e XIX. A expressão qualidade de vida em saúde utilizada na área médica dentro do referencial da clínica possui, no entanto, uma visão medicalizada com indicadores fundamentados em uma lógica de custo-benefício. Redimensionada pelo pensamento sanitarista, a concepção atual considera como determinantes de saúde: estilo de vida; avanços da biologia humana; ambiente físico e social; serviços de saúde (Minayo et al.21).
Devido a essa ausência de definição consensual sobre qualidade de vida, torna-se difícil mensurá-la. Para medir qualidade de vida, um ponto sugere indagação: de quem é a melhor percepção, daqueles que a vivem ou daqueles que a observam? Possivelmente ambos, desde que os aspectos humanos e os do espaço urbano se fundam em um conceito agregado de desenvolvimento humano e sustentável (Rocha et al.19). Existem duas formas de mensuração: através de instrumentos genéricos e instrumentos específicos. Os genéricos abordam o perfil de saúde ou não, procuram englobar todos os aspectos importantes relacionados à saúde e refletem o impacto de uma doença sobre o indivíduo. Os específicos avaliam de maneira individual e específica determinados aspectos da qualidade de vida (Fayers in Dantas et al.22). A maioria dos instrumentos de avaliação foi desenvolvida nos Estados Unidos, com um crescente interesse em traduzi-los para aplicação em outras culturas. A aplicação transcultural através da tradução é um tema controverso. A busca de um instrumento que avaliasse a qualidade de vida dentro de uma perspectiva de saúde internacional fez com que a Organização Mundial de Saúde – OMS desenvolvesse o WHOQOL-100 e o WHOQOL – Bref. O primeiro é um instrumento de avaliação composto por 100 itens, e que já possui uma versão em português. O segundo é uma versão abreviada com 26 questões extraídas do anterior (Minayo et al.21; Fleck et al.17). Outro exemplo importante de análise de qualidade de vida é o Índice de Desenvolvimento Humano - IDH, que tem como sistemática a visão total do espaço considerado. O IDH utiliza três componentes de desenvolvimento humano: longevidade, grau de conhecimento e renda ou PIB per capita, por entender que estes indicadores refletem o todo da realidade em análise (Pólis in Rocha et al.19).
Os instrumentos utilizados para análise da qualidade de vida, de um modo geral não se adaptam aos idosos, seja por possuírem uma abordagem unidimensional ou por levarem em conta aspectos característicos que os idosos não consideram como promotores de qualidade de vida. A pesquisa realizada no município de Botucatu – São Paulo, comprovou que entre os idosos existem grupos com diferentes perfis, e cada grupo faz uma diferente interpretação sobre qualidade de vida (Vecchia et al.23). Avaliar a qualidade de vida do idoso implica a adoção de múltiplos critérios de natureza biológica, psicológica e socioestrutural, pois vários elementos são apontados como determinantes ou indicadores de bem-estar na velhice: longevidade, saúde biológica, saúde mental, satisfação, controle cognitivo, competência social, produtividade, atividade, eficácia cognitiva, status social, renda, continuidade de papéis familiares, ocupacionais e continuidade de relações informais com amigos (Neri in Santos et al.20). O EASYcare é um sistema de avaliação de idosos desenvolvido com o objetivo de caracterizar a qualidade de vida e bem-estar deste grupo. Trata-se de um sistema de avaliação multidimensional, mas apresenta limitações psicométricas, exigindo a revisão de alguns itens (Souza et al.24). Reveste-se de grande importância científica e social analisar as condições de vida na terceira idade, por permitir a implementação de alternativas válidas de intervenção, tanto em programas gerontogeriátricos, quanto em políticas sociais gerais, no intuito de promover o bem-estar das pessoas maduras (Veras in Santos et al.20). Mas a interpretação de indicadores deve ser apenas entendida como reflexo minoritário da realidade complexa do dia-a-dia (Rocha et al.19).
As estratégias de promoção de saúde devem voltar-se para estilos de vida e condições sociais, econômicas e ambientais que determinam a saúde e, de forma mais ampla, a qualidade de vida (Souza, Carvalho18). A promoção de saúde representa uma forma promissora para enfrentar os múltiplos problemas de saúde que afetam as populações humanas, propondo a articulação dos saberes técnico e popular, e a mobilização de recursos institucionais e comunitários, públicos e privados, para seu enfrentamento e resolução (Buss25).
A Carta de Ottawa foi um dos documentos fundadores do termo promoção de saúde, definindo-a como o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle desse processo (WHO in Buss25). Modernamente, a promoção de saúde caracteriza-se pelo entendimento que a saúde é produto de um amplo espectro de fatores relacionados com a qualidade de vida, incluindo um padrão adequado de alimentação e nutrição, e de habitação e saneamento; boas condições de trabalho; oportunidades de educação ao longo da vida; ambiente físico limpo, apoio social para famílias e indivíduos; estilo de vida responsável; e um espectro adequado de cuidados de saúde (Buss25).
Os mecanismos operacionais concretos para a implementação da estratégia da promoção da saúde e da qualidade de vida são políticas saudáveis, governabilidade, gestão social integrada, intersetorialidade, estratégias de municípios saudáveis e desenvolvimento local, com ênfase particular no contexto do nível local (Buss25). A existência de programas integrados é uma boa estratégia para atacar o ciclo de pobreza – doença - sofrimento (Mburu in Blaxter26). Isto implica em responsabilidades para os profissionais de saúde, para os movimentos sociais e organizações populares, políticos e autoridades públicas (Fernandes et al.2).
A promoção de saúde e a profilaxia primária e secundária de doenças, inclusive após os 65 anos, são as alternativas que apresentam o melhor custo benefício para que se alcance a compressão da morbidade. Sua importância deve ser enfatizada nos cursos de graduação e de educação continuada da área da saúde (Chaimowicz27). A realização de estudos que visem pesquisar concepções sobre o envelhecimento, ajudaria na construção de conteúdos para formação e capacitação de pessoal, instrumento para gestão, e como apoio na tomada de decisões, por meio da avaliação para gestão (Bezerra et al.28). A prestação de serviços para idosos deve ser precedida por um diagnóstico epidemiológico que possibilite um planejamento adequado à realidade socioeconômica das diversas regiões brasileiras, sendo que o enfoque sistemático em relação aos serviços para os idosos é, por definição, multidisciplinar e multisetorial (Guimarães29).
Segundo Silvestre e Costa Neto30 o trabalho na atenção básica sob a Estratégia de Saúde da Família é uma adequada abordagem da pessoa idosa. Entretanto, as equipes de saúde da família não podem perder de vista que o estresse de agravos físicos, emocionais e sociais, com o passar do tempo e, conseqüentemente, com o aumento da idade, representa uma efetiva e progressiva ameaça para saúde da pessoa idosa. Frente a tal realidade, o profissional de saúde enfrenta o desafio de traçar limites entre o que se pode considerar como envelhecimento normal com suas limitações fisiológicas gradativas e as características patológicas que podem instalar-se durante esse processo. Diversos fenômenos que eram tidos como normais com o avançar da idade, hoje são considerados como decorrentes da instalação de processos patológicos, e devem ser precocemente identificados e trabalhados de forma participativa e efetiva.
O envelhecimento da população é uma questão que extrapola a esfera familiar e, portanto, a responsabilidade individual, para alcançar o âmbito público, neste compreendido o Estado, as organizações não-governamentais e os diferentes segmentos sociais (Brasil31). Além disso, pela diversidade da abrangência e de localização geográfica, as entidades de mobilização comunitária podem se transformar em parceiras tanto para pequenos e específicos programas de educação em saúde, como para grandes campanhas nacionais de comunicação de massas (Levy et al. 32).
Seguindo este modelo, foram concebidos Grupos de Promoção à Saúde como instrumentos a serviço da autonomia e do desenvolvimento contínuo do nível de saúde e condições de vida do idoso. Entre eles, o Grupo de Atenção à Saúde do Idoso (GRASI) em Campinas, o Programa de Atenção à Saúde em João Pessoa, Grupo de Apoio Social oferecido a Idosos da Área Rural em Taquarituba. Ao atuarem no campo comunitário, os grupos abrem possibilidades para as ciências da saúde e do homem, horizontes que vão além do simples objetivo de combater as doenças dos indivíduos. Estes deverão acrescer à sua tarefa a preocupação com a própria identidade da pessoa humana na busca do grau mais elevado possível de saúde física, mental e social para si e para a sociedade em que vivem. Trata-se da aprendizagem cidadã destacada por Morin: “A educação deve contribuir para a autoformação da pessoa (ensinar a assumir a condição humana, ensinar a viver) e ensinar como se tornar cidadão” (Santos et al.33).
Mas é preciso fazer a diferenciação entre educação em saúde e promoção em saúde para que não existam distorções conceituais. Entende-se por educação em saúde quaisquer combinações de experiências de aprendizagem delineadas com vistas a facilitar ações voluntárias conducentes à saúde. Enquanto que, promoção em saúde é uma combinação de apoios educacionais e ambientais que visam atingir ações e condições de vida conducentes à saúde. Dessa forma, a educação em saúde procura desencadear mudanças de comportamento individual, enquanto que a promoção em saúde, muito embora inclua sempre a educação em saúde, visa provocar mudanças de comportamento organizacional, capazes de beneficiar a saúde de camadas mais amplas da população, particularmente, porém não exclusivamente, por meio da legislação (Candeias34).
Entende-se por educação em saúde um campo de práticas que se dão no nível das relações sociais normalmente estabelecidas pelos profissionais de saúde entre si, com a instituição e sobretudo com o usuário, no desenvolvimento cotidiano de suas atividades. Não se pode pensar os serviços de saúde sem refletir sobre as relações entre esses atores ou sujeitos, uma vez que qualquer atendimento à saúde envolve, no mínimo, a interação entre duas pessoas (L’abbate35). A Organização Mundial de Saúde – OMS pontua que “os objetivos da educação em saúde são de desenvolver nas pessoas o senso de responsabilidade pela sua própria saúde e pela saúde da comunidade a qual pertençam e a capacidade de participar da vida comunitária de uma maneira construtiva.” Estas assertivas fazem da educação em saúde um dos mais importantes elos entre os desejos e expectativas da população por uma vida melhor e as projeções e estimativas dos governantes ao oferecer programas de saúde mais eficientes (Levy et al. 32).
Em qualquer sistema de saúde, não se pode conceber o planejamento de ação, sem antes considerar as premissas do planejamento educativo. Se isso ocorrer, a prática subseqüente será equivocada e, portanto, ilógica no que diz respeito às necessidades da população-alvo que se pretende alcançar. Na prática, a educação em saúde constitui apenas uma fração das atividades técnicas voltadas para a saúde, prendendo-se especificamente à habilidade de organizar logicamente o componente educativo de programas que se desenvolvem em quatro diferentes ambientes: a escola, o local de trabalho, o ambiente clínico em seus diferentes níveis de atuação e a comunidade, compreendida aqui como contendo populações–alvo que não se encontram normalmente nas três outras dimensões (Candeias34).
Do ponto de vista biopsicológico, a educação tem por objetivo levar o indivíduo a realizar suas possibilidades intrínsecas, com vistas à formação e ao desenvolvimento de sua personalidade. Sociologicamente, a educação é um processo que tem por fim conservar e transmitir cultura, atuando como importante instrumento e técnica social. A aspiração do trabalho a ser desenvolvido na área de educação em saúde está voltada para a auto-educação (onde existe a participação intencional do educando em procurar influências capazes de lhe modificar o comportamento e submeter-se a elas), pois exprime a tomada de consciência por parte do indivíduo acerca da importância do processo educativo para a sua formação e desenvolvimento (Levy et al.32).
O programa educativo tem como premissa o envolvimento de todos os membros do grupo, por meio da integração e da interação dos profissionais com os idosos e seus familiares. A participação familiar ou de uma pessoa próxima do idoso no programa de educação à saúde é fundamental para a compreensão das implicações que o processo de envelhecimento traz na vida diária do indivíduo, bem como de seus desdobramentos no contexto familiar. Se a motivação e o interesse dos idosos e familiares não estiverem presentes, o trabalho estará destinado ao fracasso, mesmo com todos os esforços do educador (Diogo et al.6).
A maioria das instituições de ensino superior brasileiras ainda não está sintonizada com o atual processo de transição demográfica e suas conseqüências médico-sociais. Há uma escassez de recursos técnicos e humanos para enfrentar a explosão desse grupo populacional no terceiro milênio (Brasil31). A demanda dos profissionais pode ser dividida em duas direções: a instrumentalização em técnicas didático-pedagógicas e o desenvolvimento do papel profissional. Os profissionais devem ser capacitados para a busca constante das relações sociais que se desenvolvem no dia-a-dia dos serviços, numa perspectiva crítica de visualizar, com naturalidade, os problemas advindos da convivência humana, em qualquer situação na qual ela ocorra. Muito mais importante do que aprender técnicas é adquirir a postura de educador. As técnicas só devem ser buscadas como recurso auxiliar ao processo educativo, porque o principal “instrumento” da relação educativa é o próprio educador. O que se pretende com a educação em saúde é contribuir para o desenvolvimento de profissionais como sujeitos autônomos que constroem essa autonomia com base na imaginação de um futuro qualitativamente melhor (L’abbate35).
Outros aspectos a serem considerados nas atividades de ensino aos idosos são os fatores fisiológicos, sociais, econômicos e culturais, como alteração da memória, comprometimento sensorial, escolaridade e deficiência de sistemas de suporte à saúde e da rede social de apoio (Diogo et al.6).
A resistência popular às ações sanitárias é conhecida desde a implantação das primeiras políticas de saúde pública no início do século XX (Costa36). Esta resistência deve-se ao fato de que a política implementada baseia-se em uma visão tradicional de transmissão de conhecimento, limitando-se à prescrição de comportamentos individuais e organização social adequados à obtenção de boa saúde. Não é possível alcançar bons resultados na educação em saúde através de programas que pretendem apenas conscientizar, educar, despertar, sensibilizar a população ou identificar carências. É preciso valorizar os sujeitos naquilo que têm de melhor, sua história, seu tempo – a sua capacidade de criação. O que motiva as pessoas não é apenas a sua carência, mas principalmente o que se tem disponível (desejos, sonhos, projetos). Os esforços para a construção de novos conhecimentos, ao invés de se voltarem apenas para a busca incessante de acúmulo de informação que represente a verdade, devem se voltar para a melhoria das condições de convivência entre distintos saberes e sabedores, compartilhando saberes e a existência. A produção do conhecimento deve ter como ponto de partida a ação social e as informações que emergem dessa convivência têm um potencial de mobilização social. Apenas a tomada de consciência dos problemas não é suficiente para motivar os sujeitos, pois o limite de sua ação é dado pela sustentabilidade oferecida pelos grupos de convívio social. Na convivência não basta apontar “o que fazer”, é preciso estar disposto a construir junto “o como fazer”. A educação em saúde deve fortalecer a individualidade a partir da disponibilização de suportes coletivos, bens materiais e bens espirituais – compaixão, solidariedade e respeito, para o exercício de uma individualidade saudável (Oliveira37).
As ações coletivas podem ser desenvolvidas como estratégias eficientes para a melhoria da qualidade de vida da população, quando se fundamentam na intersetorialidade, na transdiciplinaridade e no desenvolvimento de autonomia dos sujeitos, já que permitem não somente a discussão dos problemas que afetam a comunidade como também possibilitam a construção coletiva de estratégias de intervenção (Wimmer, Figueiredo38). A cidadania representa a ligação entre qualidade de vida e políticas públicas, na medida em que a consciência de cidadania significa o fortalecimento do poder de participação (Queiroz et al.16).


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