0100/2006 - A proposta da redução de danos do uso indevido de drogas no contexto da escola promotora de saúde.
Autor:
• Fernanda Gonçalves Moreira - Fernanda Gonçalves Moreira - São Paulo, SP - <femor@terra.com.br>Área Temática:
Não CategorizadoResumo:
Este trabalho tem por objetivo revisar os modelos de prevenção do uso indevido de drogas em ambiente escolar, relacionando-os aos conceitos de (1)Promoção de Saúde e (2)Escola Promotora de Saúde, e propor um modelo de intervenção. Os modelos de intervenção são múltiplos, os resultados provenientes das avaliações de impacto são modestos. Dentre as abordagens preventivas mais promissoras, encontramos: (1)Oferecimento de Alternativas; (2) Educação para a Saúde e a (3)Modificação das Condições de Ensino. Estas ampliam o campo de intervenções para o ambiente físico e social, enfocando a saúde como um todo, se aproximando do conceito de Promoção de Saúde. A aplicação deste no âmbito escolar resultou no conceito de Escola Promotora de Saúde. Esta pode ser definida como a escola com políticas, procedimentos, atividades e estrutura que resultem na proteção e promoção à saúde e ao bem-estar de todos os membros da comunidade escolar.A proposta da Redução de Danos, pensada como estratégia de prevenção, converge para a da Escola Promotora de Saúde e neste sentido propomos ações de promoção de saúde pautadas por: objetivos amplos e escalonados; ruptura com o maniqueísmo; ações inclusivas; parcerias intersetoriais; incentivo à autonomia dos alunos; abordagem do indivíduo em toda a sua complexidade. Esta proposta amplia a abrangência da intervenção para todos os alunos, independentemente se estes já experimentaram, já fizeram ou fazem algum uso de substâncias psicoativas.
Descritores
Drogas, educação, prevenção, redução de danos, escola promotora de saúde.
Abstract:
The goal of this paper is to review the school-based drugs misuse prevention programs, and to establish a connection with the Health Promotion and Health Promoting School concepts, in an attempt to create a new proposal. There are several models of preventive intervention, but the results of its evaluations show little improvement. Among the most hopeful programs, we can describe: alternatives programs; comprehensive health education programs and programs addressing school performance and environment. These ever growing proposals of intervention imply in giving up the restrict focus of prevention (of a specific disease) to adopt the Health Promotion concept. The application of the Health Promotion concept in the school environment resulted in the Health Promoting School concept, which can be defined as a school which has an organized set of policies, procedures, activities, and structures, designed to protect and promote the health and well-being of all school community members.The Harm Reduction proposal, as an prevention strategy, come together the Health Promoting School proposal, and in this way our proposal is a set of health promotion actions that includes: wider and progressive goals; breaking the Manichaeism; inclusive actions; community partnerships including many sectors of society; youth autonomy; and the focus on the person in all its complexity, not only on the substance use or misuse. This proposal aims all students, regardless if they had or not already tried or they still are using any psychoactive substance.
Key-words
Education, prevention, harm reduction, substance-related disorders, and health promoting school.
Conteúdo:
Método
Numa primeira etapa foi realizada revisão bibliográfica sistematizada com estratégias de busca eletrônica no MEDLINE, LILACS e Cokcrane Institute, incluindo as palavras-chave: cocaína, heroína, álcool, prevenção, educação e redução de danos. Na Biblioteca de Educação da Fundação Carlos Chagas forma utilizadas as palavras-chave: drogas e prevenção. Também foi feita busca manual nas listas de referências dos artigos recuperados nas bibliotecas. Os limites foram: publicações entre 1990 e 2001, em português, inglês, francês, italiano ou espanhol.
Os artigos foram selecionados por leitura de título ou resumo, quando disponível, e separados em: estudos de avaliação de impacto de intervenção, ou seja, estudos longitudinais prospectivos experimentais ou quasi-experimentais. Outros estudos relacionados também foram selecionados para auxiliar a discussão dos resultados, tais como, pesquisas de detecção de fatores relacionados à proteção e ao risco para o uso indevido de psicoativos, em geral, coortes e cortes transversais, além de reflexões teóricas sobre o tema. Entre as avaliações de impacto, foram selecionadas aquelas realizadas exclusivamente em escolas, com programas preventivos voltados ao uso indevido de drogas. Não foram incluídos trabalhos que tratavam exclusivamente de intervenção de prevenção ao uso de tabaco. As avaliações que não continham método apropriado foram consideradas com reservas. Ou seja: foram priorizados os estudos com pré e pós-teste da avaliação de uso de substâncias, grupo controle e análise estatística das perdas nas reavaliações.
Foram encontrados 160 artigos. Destes, 76 disponíveis no Brasil, sendo 44 avaliações de impacto, incluindo 6 metanálises, e 32 estudos relacionados. Além destes, um artigo, metanálise,, foi encomendado do exterior, devido à sua importância. Foram excluídas 21 avaliações de intervenções por tratarem exclusivamente de uso de tabaco, AIDS e DST ou estarem centradas na comunidade ou em faculdades/universidades. Foram analisados os 24 estudos de intervenções realizadas exclusivamente em escolas, com programas preventivos voltados ao álcool associado ou não a outras drogas, incluindo quatro metanálises.
Numa segunda etapa foram examinadas publicações sobre os conceitos de Promoção de Saúde, Escola Promotora de Saúde e Redução de Danos, além publicações clássicas sobre prevenção do uso indevido de drogas. Três metanálise publicadas após o ano de 2001 foram incluídas.
Sobre a Prevenção do Uso Indevido de Drogas
Considerando a relação entre o indivíduo e a droga é possível pensar em três estratégias preventivas: (1) Diminuir a oferta do produto; (2) Diminuir a demanda por parte do usuário e (3) Influir sobre as circunstâncias favorecedoras da oferta e da procura1.
A primeira estratégia implica principalmente em ações de repressão, voltadas para a redução da disponibilidade dessas substâncias nas ruas. A segunda concentra-se na ação educativa por meio de intervenções de caráter pedagógico junto a familiares e educadores. A terceira estratégia é chamada atualmente de intervenção estrutural, realizada por meio de intervenções visando minimizar ou neutralizar o impacto dos fatores relacionados ao risco ou à proteção, agindo predominantemente na interface oferta/demanda. Segundo Blankenship et al.2, o termo “estrutural” se refere a intervenções que visam à alteração do contexto no qual a saúde é produzida ou reproduzida.
Neste artigo, vamos nos concentrar nas intervenções no ambiente escolar, que incluem estratégias de redução de demanda (2) e/ou ações na interface oferta/demanda (3).
Prevenção do Uso Indevido de Drogas em Ambiente Escolar
A estratégia de diminuir a demanda por parte do usuário ganha força a partir de 1970, quando a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) convocou, pela primeira vez, especialistas de vários países para discutirem a abordagem preventiva do uso de drogas. Em seguida, vários encontros internacionais foram realizados e a educação destinada a prevenir o abuso de drogas foi considerada uma necessidade mundial e premente3. Aqui, considera-se que a necessidade de alguma intervenção educativa visando à prevenção do uso indevido de drogas é mundial, porém, uma intervenção educativa deve sempre ser planejada levando-se em conta a população-alvo e seu contexto sócio-econômico-cultural, tanto no que diz respeito aos objetivos da intervenção, como na forma e conteúdo do programa a ser desenvolvido. Sendo assim, a escola passou a ser o espaço privilegiado para o desenvolvimento de atividades preventivas, visando a uma educação para a saúde, visto que uma parcela significativa da população passa por ela numa idade e em circunstâncias altamente favoráveis4.
Sobre as Avaliações das Intervenções de Prevenção do Uso Indevido de Drogas em Ambiente Escolar
Se a importância, o público-alvo e o local preferencial das ações preventivas são consenso, o modo de intervenção e o seus resultados permanecem controversos. Os modelos de intervenção são múltiplos, derivados de diferentes posturas frente ao problema, o que torna mais complexo o processo de avaliação. Entre os modelos avaliados os resultados provenientes de metanálises mostram pequenos avanços5, mas alguns autores explicam estes resultados modestos por problemas metodológicos. Tobler6 aponta o problema da avaliação conjunta e indevida de modelos preventivos diversos. Cuijpers7 e Faggiano et al.8 criticam a qualidade geral das avaliações das intervenções preventivas.
Em sua metanálise, Tobler6 agrupa como “programas interativos” intervenções que teriam em comum a utilização de técnicas didáticas que estimulam a participação ativa dos alunos como discussões em grupo, trabalhos para casa, jogos e o treinamento de habilidades para diferentes situações sociais além da questão das drogas. Muitas vezes são treinados alunos, denominados “agentes multiplicadores”, para conduzirem as discussões ou até o próprio programa. Tobler aponta resultados duas a três vezes superiores na redução do uso de substâncias com este grupo em relação aos modelos de intervenção que utilizam o aprendizado passivo.
Cuijpers7 compara os programas executados por pares e os programas executados por adultos. Encontra que os programas liderados por pares, de forma geral, são mais efetivos. Porém, pondera que a efetividade dos programas se deve a múltiplas características, entre elas, a liderança por pares.
Gottfredson et al.9 também encontra que os programas liderados por pares, de forma geral, são mais efetivos. Além disto, os programas voltados para jovens que apresentam fatores relacionados ao risco apresentam melhores resultados que aqueles direcionados para a população geral, os chamados “programas universais”.
Faggiano et al.8 encontram que os programas voltados para o desenvolvimento de habilidades sociais são mais efetivos que os baseados na transmissão de informações e os voltados para o treinamento de tomadas de decisão.
Muitos dos problemas relacionados às avaliações, entretanto, são decorrentes da definição insuficiente ou pouco detalhada do modelo adotado, da discussão de suas propostas, e da postura frente o problema10.
Posturas e Modelos de Intervenção de Prevenção do Uso Indevido de Drogas em Ambiente Escolar
Existem duas posturas básicas diante do problema do uso e abuso das substâncias psicoativas: a tradicional, ou “Guerra às Drogas” (postura I) e a “Redução de Danos” (postura II).
Na abordagem tradicional (postura I), a conhecida “Política de Guerra às Drogas”, a maior concentração de esforços se dá na redução da oferta, ou seja, redução da disponibilidade dos produtos, utilizando-se de mecanismos de repressão.
No campo da redução de demanda, enfatiza-se a transmissão de informações pautadas pelo amedrontamento (modelo A) e apelo moral (modelo B), utilizando técnicas que poderiam ser resumidas à persuasão dos indivíduos para a abstinência, o tradicional slogan: “Diga não às drogas”. Não há uma preocupação com as diferentes formas de uso ou com a abordagem dos fatores facilitadores do abuso de psicotrópicos11, 12.
As ações de transmissão de informações seguem, em geral, o modelo educativo clássico de aprendizado passivo. Muitas vezes, e isto também se refere especialmente às escolas brasileiras: as intervenções são pontuais, na forma de palestras 11, 13.
Outros modelos de intervenção mais elaborados, ainda na abordagem tradicional (postura I), propõem aulas semanais curriculares destinadas aos alunos dos últimos anos da escola elementar. É o caso do Modelo de Treinamento para Resistir (modelo C). O seu representante clássico é o Projeto “Drug Abuse Resistence Education” (DARE), adotado por cerca de 50% das escolas locais nos distritos em todo o território dos Estados Unidos. Este tem por objetivo o treinamento para resistir às pressões de envolvimento com drogas, exercida por grupo de pares, mídia e até de pais. Inclui uma série de exercícios e atividades em sala de aula que ensinam ao estudante: recusar, se esquivar, não ceder perante a oferta de drogas. Este programa é aplicado por membros do próprio projeto, que, muitas vezes, são policiais. Os resultados das avaliações apontam para algum ganho significativo imediato tanto no conhecimento como na redução do padrão de uso de drogas, mas ao contrário da aquisição de conhecimento, não há redução do uso de drogas nas avaliações após um ano ou mais. Em alguns subgrupos, por exemplo, os de indivíduos masculinos negros e hispânicos, houve aumento do uso de substâncias14.
Além do projeto DARE, os outros projetos que se encaixam no Modelo de Treinamento para Resistir (modelo C), também foram bastante avaliados, contando com duas metanálises. Uma teve como objetivo avaliar somente o uso de álcool, o qual ocupa boa parte de todo os programas, na outra foram incluídos artigos de avaliação de programas preventivos voltados ao uso de álcool associado ou não a outras drogas15, 16. Os resultados apontam para algum ganho significativo imediato tanto no conhecimento como no padrão de uso de drogas, mas ao contrário da aquisição de conhecimento, a redução do uso de drogas não se mantém nas avaliações após um ano ou mais tempo do término das aulas15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23. Os resultados foram melhores para as meninas24 e piores para os meninos, em alguns aspectos, por vezes, contra-producentes15, 16, 17.
O projeto DARE começou a ser aplicado no Brasil com o nome de Programa Educacional de Resistência às Drogas (PROERD) e, assim como nos EUA, foi aplicado principalmente por policiais. Além de poder enfrentar os mesmos problemas quando de sua aplicação nos EUA, aqui encontramos um problema a mais, pois a figura do policial pode carregar representações simbólicas diversas em diferentes países ou diferentes contextos sócio-econômico-culturais. A falta de adaptação cultural tanto do conteúdo como da estratégia didática compromete ainda mais a aplicação deste modelo no Brasil11, 25.
Após décadas de existência, acumulam-se críticas à política de “Guerra às Drogas”. Escohotado26 constata que: “O (slogan) ‘diga não às drogas’ entra por um ouvido e sai por outro, funcionando como estímulo indireto” (p. 16). Por outro lado, a menor disponibilidade das drogas pode levar a formas de consumo mais perigosas ou promover o aumento do consumo de outras drogas. Por exemplo: para abordar o problema do uso de solventes por crianças de rua na cidade de São Paulo, no início da década de 90, intensificou-se o controle da venda de cola de sapateiro. Esta ação reduziu o acesso das crianças ao produto. Entretanto, houve um aumento em 500% do uso de esmalte logo em seguida1. Além disso, mesmo com o implemento dos recursos repressivos, nem sempre a redução da disponibilidade de tais substâncias é alcançada. Buning27 já relatava que a “guerra às drogas” já durava mais de uma década, tendo despendido bilhões de dólares em todo o mundo e, no entanto, nunca existiram tantas drogas nas ruas como na atualidade. Quase uma década depois desta afirmação, a “guerra às drogas” permanece hegemônica em muitos países, e a disponibilidade de substâncias psicoativas permanece crescente.
Outras abordagens, menos relacionadas à postura tradicional, têm sido propostas: Oferecimento de Alternativas (modelo D); Educação para a Saúde (modelo E) e a Modificação das Condições de Ensino (modelo F), que inclui: (F.1) Modificação das práticas institucionais; (F.2) Melhoria do ambiente escolar; (F.3) Incentivo ao desenvolvimento social; (F.4) Oferecimento de serviços de saúde; (F.5) Envolvimento dos pais em atividades curriculares10, 28.
O Modelo de Oferecimento de Alternativas (modelo D): procura proporcionar aos jovens sensações de expansão da mente, crescimento pessoal, excitação, desafio e alívio do tédio, através de outros meios que não o consumo de drogas. É importante que tais atividades variem conforme os interesses e gostos da população a que se destinam. Podem se constituir em atividades esportivas ou artísticas, programas de recuperação da identidade e orgulho étnico de minorias como a formação de grupos de Hip Hop, grafitagem, oficinas de capoeira, de dança, entre outros10, 11, 28. A ênfase se dá no sentido de orientar o desenvolvimento do potencial sócio-afetivo em direção a um estilo saudável de vida, em que o uso de drogas não desperte sequer interesse, ou então, que este interesse ou curiosidade tenha um menor potencial de prejudicar a pessoa ou a sociedade29. Este modelo foi aplicado nas escolas públicas do Estado de São Paulo (Programa Permanente de Prevenção ao Uso Indevido de Drogas), entre 1991 e 1994, com bons resultados iniciais. Infelizmente, após mudanças de governo, não foi dada continuidade às avaliações dos resultados, e, gradativamente, o programa foi extinto29. No cenário internacional, este modelo também foi pouco avaliado, os bons resultados iniciais nas raras avaliações examinadas por Tobler6, necessitam de mais estudos e confirmação25.
O Modelo de Educação para a Saúde (modelo E): apresenta a educação para uma vida saudável como proposta central10, 28. Assim, orientar para uma alimentação adequada, atividades não estressantes, uma vida sexual segura e até na escolha correta da pessoa que dirigirá o carro num passeio de grupo, compõem um currículo em que a orientação sobre os riscos do uso de tabaco, álcool e outras drogas também se faz presente10, 11. É preciso que a escola introduza a questão das drogas dentro de um contexto amplo4, visando à responsabilização do indivíduo perante a sua vida e a sua saúde. Por isso deverá abordar questões tais como: a poluição, a solidão e o isolamento urbano, o modelo de vida competitiva e imediatista, e outros temas que provocarão uma reflexão sobre os padrões de comportamento adotados pela sociedade em que vivemos.
O modelo de educação para a saúde também foi pouco avaliado. Entretanto, esse modelo, bem como o de oferecimento de alternativas, parecem promissores por serem coerentes com o papel da escola: um lugar de formação e inclusão social, e não apenas um espaço de transmissão de informações.
O Modelo de modificação das condições de ensino (modelo F): defende que a vivência escolar, particularmente a da pré-escola e do ensino fundamental, vai ser importante para um desenvolvimento sadio do adolescente e do adulto. É uma proposta de intervenção intensiva, precoce e duradoura, que precisa do envolvimento de pais e comunidade. O modelo tem 5 vertentes: (F.1) modificação das práticas institucionais; (F.2) melhoria do ambiente escolar; (F.3) incentivo ao desenvolvimento social; (F.4) oferecimento de serviços de saúde e (F.5) envolvimento dos pais em atividades curriculares10, 11, 28. Este modelo pode englobar os modelos de Oferecimento de Alternativas, na vertente F.3 – incentivo ao desenvolvimento social; e Educação para a Saúde, na vertente F.4 – oferecimento de serviços de saúde11.
Ao aceitar a necessidade de intervenção no ambiente, muitas vezes desfavorável, e não apenas no estudante, admite-se que uma escola inadequada e injusta pode se constituir num fator propiciador do abuso de drogas. Tal premissa desloca a discussão da prevenção para o campo da política educacional e do questionamento pedagógico13. Neste modelo, a questão do uso de drogas deixa de ser visto de forma dissociada da vida dos alunos, ao mesmo tempo em que se conclama a escola a assumir seu papel social, de forma integrada à comunidade. Desta forma, desviamos nossas atenções do uso das substâncias psicoativas sem, entretanto, perdê-lo de vista, para nos preocuparmos com a melhoria das condições de desenvolvimento das crianças e adolescentes visando à formação de cidadãos aptos para tomarem suas próprias decisões.
A ampliação do campo de intervenções, incluindo ambiente escolar, comunidade escolar ampliada, desenvolvimento social e relações intersetoriais (educação e atenção à saúde), implica no abandono do escopo restrito da prevenção (de uma determinada doença) para entrar no conceito de Promoção de Saúde.
Diferença entre Prevenção e Promoção
O conjunto de propostas acima, descrito como Modelo de Modificação das Condições de Ensino, se aproxima do paradigma da Promoção de Saúde, que possui definição bem mais ampla do que a prevenção por referir-se a medidas orientadas ao aumento da saúde e bem-estar gerais, e não apenas a evitar uma determinada doença30.
Tradicionalmente, a educação em saúde mantinha o foco na transmissão de informações ou no desenvolvimento de habilidades e atitudes para ajudar os indivíduos a fazerem escolhas saudáveis com relação ao estilo de vida ou comportamento31, 32. Porém, esta estratégia mostrou-se falha, em sua meta de mudança de comportamento4, 31, 32.
Na década de 1980, a Organização Mundial de Saúde - OMS mudou seu foco do comportamento de indivíduos para o desenvolvimento de ambientes saudáveis32. Isto resultou no conceito de Promoção de Saúde definido na carta de Ottawa33:
“Promoção de Saúde é o processo que consiste na capacitação de pessoas com o objetivo de aumentar o controle sobre e melhorar a saúde. Para alcançar o estado de completo bem-estar físico, mental e social, um indivíduo ou um grupo de indivíduos precisa ser capaz de identificar e realizar aspirações, satisfazer necessidades, e mudar ou lidar com o ambiente. A saúde é vista como um recurso para a vida cotidiana, não como o objetivo da vida. A saúde é um conceito positivo, enfatizando os recursos sociais e pessoais, assim como as capacidades físicas. Então, Promoção de Saúde não é apenas responsabilidade do setor da saúde, mas inclui estilos de vida saudáveis e bem-estar” (P.1).
Neste paradigma, as intervenções derivam da participação ativa da comunidade, não sendo impostas pelos profissionais da saúde. Para tanto, são preconizados cinco campos de ação: (1) elaboração e implementação de políticas públicas saudáveis; (2) reforço da ação comunitária; (3) desenvolvimento de habilidades pessoais; (4) reorientação do sistema de saúde; (5) criação de ambientes favoráveis à saúde34. Em outras palavras:
“A carta de Ottawa propõe trabalhar com a idéia de responsabilização múltipla, nos diferentes níveis de atuação: Estado, comunidade, indivíduos; seja pelos problemas, seja pelas soluções propostas para os mesmos”35 (P.16).
No campo da promoção da saúde as políticas públicas saudáveis incluem: legislação, medidas fiscais, taxações, mudanças organizacionais; e por ações coordenadas que apontam para a eqüidade em saúde, distribuição eqüitativa de renda e políticas sociais. Este conceito se opõe à idéia bastante difundida de ações baseadas na correção de comportamentos individuais, que, na concepção de prevenção “seriam os principais, senão únicos responsáveis pela saúde”35 (P. 27).
A idéia de promoção compreende a de fortalecimento da capacidade individual e coletiva para lidar com a multiplicidade dos condicionantes da saúde (desenvolvimento de habilidades pessoais e reforço da ação comunitária).
“Promoção, neste sentido, vai além de uma aplicação técnica e normativa, aceitando-se que não basta conhecer o funcionamento das doenças e encontrar mecanismos para o seu controle. Essa concepção diz respeito ao fortalecimento da saúde por meio da construção da capacidade de escolha, bem como à utilização do conhecimento com discernimento” 30 (P. 48).
Aqui também se inclui a garantia da participação popular no processo de tomada de decisões e na elaboração das intervenções.
Algumas diferenças entre Promoção de Saúde e Prevenção de Doenças estão sintetizadas no Quadro 1.
Inserir Quadro 1 aqui
A Escola Promotora de Saúde
A aplicação dos princípios da Carta de Otawa no âmbito escolar resultou no conceito de Escola Promotora de Saúde – EPS32, 36. Neste conceito, o foco muda gradativamente dos programas voltados a certos aspectos da saúde para uma abordagem integral da Promoção de Saúde32. A EPS pode ser definida como uma escola com políticas, procedimentos, atividades e estrutura que resultem na proteção e promoção à saúde e ao bem-estar de todos os membros da comunidade escolar37. O Conceito de EPS é endossado pela OMS e adotado como estratégia em muitos países. Na Austrália e na Europa, é operacionalizado na forma de redes regionais de escolas32, 38.
As EPS abordam os seguintes aspectos: natureza integral da saúde, eqüidade de gênero, envolvimento de toda a comunidade escolar, processo decisório participativo, sustentabilidade, adaptação cultural e inclusão de medidas que ampliem habilidades cognitivas e sociais que determinam a motivação e a possibilidade dos indivíduos terem acesso, compreenderem e usarem informações de forma a promover e manter a saúde36, 37, 39.
Uma EPS deve cobrir três áreas de intervenção na escola e em sua comunidade local: (1) educação em saúde (currículo escolar, ensinar e aprender); (2) ambiente escolar, entorno e organização; (3) comunidade escolar, parcerias e serviços32, 36, 39.
Educação em Saúde (currículo escolar, ensinar e aprender)
Segundo Silveira40, a Organização Pan-americana de Saúde indica que a Educação em Saúde se deva nortear pelas seguintes diretrizes:
· Abordar a saúde em termos globais, segundo a ótica de inter-relação entre os seus fatores individuais, ambientais, sócio-econômicos e coletivos;
· Esgotar todas as oportunidades educativas – formais e informais – para promover, melhorar, manter e recuperar a saúde;
· Analisar criticamente as diferentes mensagens de saúde que influenciam as crianças e os jovens;
· Comprometer-se com a conscientização de crianças e jovens para atuarem de maneira a favorecer a manutenção e a promoção da saúde integral e coletiva;
· Construir continuadamente uma convivência solidária em prol da vida e dos direitos humanos.
Ambiente Escolar, Entorno e Organização
Esta área de intervenção diz respeito às crenças, atitudes e normas que permeiam a escola e sua comunidade local, e compõem o seu “ethos”. Inclui a estrutura física, políticas e práticas que contribuem para um ambiente saudável39. Por exemplo: condições de saneamento, disponibilidade e condições de dispositivos de segurança e de prevenção de acidentes, qualidade nutricional da merenda escolar, políticas escolares e as correspondentes atitudes e comportamentos cotidianos do corpo docente frente a diferentes assuntos e situações41.
Comunidade Escolar, Parcerias e Serviços
Parte da abordagem integral da EPS envolve o desenvolvimento de parcerias entre a escola, os familiares dos alunos e os dispositivos de atenção à saúde da comunidade, outras instituições de ensino e organizações governamentais e não-governamentais39. Os recursos da escola e da comunidade local podem ser utilizados de forma complementar para promover atitudes saudáveis. Desta forma, as atividades promovidas na escola teriam a participação e apoio da comunidade local e seriam reforçadas por atividades desenvolvidas na comunidade41.
Uma outra interpretação possível deste item é a oferta de serviços de saúde pela escola. Com relação a esta proposta, Silveira40 relata que:
“Esta posição ainda não é consensual no Brasil, pelo menos no atual estágio da saúde pública brasileira e dos níveis de cobertura dos serviços de saúde. Admite-se sim, que a escola deve estabelecer vínculos efetivos com os serviços de saúde instalados, universalizando o atendimento a todos os alunos, sem que se dupliquem os recursos humanos e materiais” 40 (P.14).
Política Educacional, Parâmetros Curriculares Nacionais e Temas Transversais
Se formos olhar o que diz a legislação da educação brasileira, veremos uma adequação total da política educacional oficial às propostas acima descritas. Pois, a concepção da educação como exercício de cidadania permeia os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), formulados a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Federal n. 9.394), aprovada em 20 de dezembro de 1996. Os PCN propõem uma série de modificações no ensino fundamental, e têm como premissas: a ética, a preparação dos alunos para o exercício da cidadania numa sociedade democrática, o respeito à diversidade cultural e a preocupação com a desigualdade social42.
Em relação à Educação em Saúde, os conteúdos selecionados foram organizados em blocos que lhes dão sentido e cumprem a função de indicar as dimensões individual e social da saúde. São eles: autoconhecimento para o autocuidado e vida coletiva. Entre os conteúdos a serem desenvolvidos dentro do bloco Vida Coletiva, está incluído: agravos ocasionados pelo uso de drogas (fumo, álcool e entorpecentes). Estes temas devem ser trabalhados transversalmente às cadeiras básicas, de forma multidisciplinar, e fazem parte dos chamados Temas Transversais42.
Quanto ao método didático, os manuais reforçam a necessidade de, no processo de ensino e aprendizagem, explorar o desenvolvimento de métodos capazes de priorizar a construção de estratégias de verificação e comprovação de hipóteses na construção do conhecimento; a construção de argumentação capaz de controlar os resultados desse processo; o desenvolvimento do espírito crítico capaz de favorecer a criatividade; e a compreensão dos limites e alcances lógicos das explicações propostas. Além disso, é necessário ter em conta uma dinâmica de ensino que favoreça o descobrimento das potencialidades do trabalho individual e coletivo. O que implica no estímulo à autonomia do sujeito, no desenvolvimento do sentimento de segurança em relação às suas próprias capacidades, e na capacidade de interação de modo integrado num trabalho de equipe42.
É ressaltada a importância da coerência entre as atitudes e comportamentos apresentados pela escola e os professores com os conteúdos a serem ministrados. Ou seja, propõe-se que a escola seja um espaço de aprendizado e desenvolvimento contínuo e integrado. Esta integração diz respeito aos diferentes espaços dentro e fora da sala de aula. Desta forma, é orientado estimular uma maior participação dos pais em atividades curriculares e extracurriculares. Assim como é estimulada a utilização dos recursos da comunidade nas atividades curriculares extra-classe e da promoção de ações conjuntas, trazendo a comunidade para dentro da escola.
“Verifica-se, portanto, que os Parâmetros Curriculares Nacionais assumiram basicamente os referenciais teóricos que foram estabelecidos pelas Organizações Mundial e Pan-americana de Saúde” 40 (P.20).
A Redução de Danos
Os valores até agora trabalhados: qualidade de vida, intervenções participativas, importância do contexto social, e valorização dos direitos humanos são valores comuns aos preceitos da estratégia de abordagem do uso indevido de drogas denominada de “Redução de Danos”41.
Com o aparecimento da epidemia da AIDS, em meados da década de 80, um novo olhar surge para a questão do uso indevido de drogas. A transmissão e disseminação do vírus entre usuários de drogas injetáveis passaram a ser uma ameaça a toda a sociedade, trazendo a necessidade de ações preventivas efetivas, cujos resultados não dependessem exclusivamente da aderência dos pacientes aos tratamentos para a abstinência. Surgem os primeiros centros de distribuição e troca de agulhas e seringas na Holanda e Inglaterra, entre 1986 e 198743. A criação dos centros de troca de seringa, juntamente com as terapias substitutivas de heroína por prazo indeterminado e a liberdade de prescrição de drogas, tais como opióides e cocaína, readquirida pelos médicos na Inglaterra, constituem o início de uma outra forma de abordagem do problema das drogas intitulada “Redução de Danos” 11.
“Redução de Danos é uma política de saúde que se propõe a reduzir os prejuízos de natureza biológica, social e econômica do uso de drogas, pautada no respeito ao indivíduo e no seu direito de consumir drogas” 44. (p.395)
A proposta de Redução de Danos surgiu, então, incentivando formas de auxílio cujo principal objetivo não era eliminar o uso de substâncias psicoativas, mas melhorar o bem-estar físico e social dos usuários, minimizando os prejuízos causados pelo uso das substâncias. Nessa fase, a impossibilidade (temporária ou não) de um dependente de abandonar o uso de drogas estava sendo aceita como fato45. Parte-se do princípio que “bem ou mal” as drogas lícitas e ilícitas fazem parte desse mundo e trabalha-se para minimizar seus efeitos danosos ao invés de simplesmente ignorá-los ou condená-los. O critério de sucesso de uma intervenção não segue a lei do “tudo ou nada”, são aceitos objetivos parciais. As alternativas não são impostas de “cima para baixo”, por leis ou decretos, mas são desenvolvidas com a participação ativa da população beneficiária da intervenção46.
A Redução de Danos pode ser sintetizada em 5 princípios45:
1. É uma alternativa de saúde pública aos modelos moral, criminal e de doença;
2. Reconhece a abstinência como resultado ideal, mas aceita alternativas que reduzam os danos;
3. Baseada na defesa do dependente;
4. Promove acesso a serviços de baixa exigência, ou seja, serviços que acolhem usuários de forma mais tolerante, como uma alternativa para as abordagens tradicionais de alta exigência, aquelas que, tipicamente, exigem a abstinência total como pré-requisito para a aceitação ou permanência do usuário;
5. Baseia-se nos princípios do pragmatismo empático versus idealismo moralista.
A partir das primeiras experiências bem sucedidas, esta nova forma de pensar o problema das drogas foi sendo ampliada para os diversos aspectos da questão. E porque não incluir a prevenção primária, ou seja, aquela desenvolvida antes do primeiro contato? Nesta, o foco deixa de ser a droga em si e passa a ser a qualidade de vida. As divulgações de informações ao público concentram-se menos nos perigos e mais na equação do uso racional e responsável de drogas, ou ainda, enfatizam as vantagens de um estilo de vida isento delas29.
Conforme Marllat45, Moreira et al.46, Reale47, e a proposta da Redução de Danos permeia todos os aspectos do trabalho no campo do uso e abuso de substâncias psicoativas, focando e indivíduo como um todo, a qualidade de vida e a promoção de um estilo de vida mais saudável, trabalhando com objetivos escalonados e intermediários:
• Evitar o envolvimento com o uso de drogas;
• Evitar o envolvimento precoce;
• Evitar que o uso se torne abuso;
• Ajudar a abandonar a dependência e
• Orientar para o uso menos prejudicial possível.
A prevenção primária, dentro da Redução de Danos, romperia com o pensamento maniqueísta de “caretas bonzinhos” e “drogados malvados”, desestimulando o preconceito e a segregação. Andrade et al.44 explicam:
“A cultura dominante vê os usuários de drogas situados no lado errado de uma linha social imaginária que separa não usuários (os bons) dos usuários (os maus). A visão geral do consumo de drogas de alguma maneira retoma o mito de Adão e Eva em que o fruto proibido que conduz o inocente à expulsão do paraíso, toma forma de uma droga ilícita, algumas vezes, justamente, a baga de um cigarro de maconha. As conseqüências do primeiro trago de cigarro de maconha não podem ser previstas, mas a maioria das vezes ou o iniciante encerra o uso após a primeira experiência ou ele pode continuar fumando temporariamente sem maiores prejuízos para sua vida. Naturalmente se apanhado usando qualquer droga ilícita, o mesmo bom menino, há pouco era protegido e valorizado, pode imediatamente personificar o demônio e ser privado de todo valor social” 44. (p.397)
Redução de Danos e Promoção de Saúde: uma proposta
A proposta da Redução de Danos na Escola Promotora de Saúde é a abordagem dos aspectos: natureza integral da saúde, eqüidade de gênero, envolvimento de toda a comunidade escolar, processo decisório participativo. Enfim, é a aplicação dos preceitos da Carta de Ottawa para a Promoção de Saúde e da Convenção de Jakarta em Promoção de Saúde a todos os alunos, independentemente se estes já experimentaram, já fizeram ou fazem algum uso de substâncias psicoativas. É tirar o maniqueísmo de usar ou não usar substâncias psicoativas do centro das discussões, para poder desenvolver ações de promoção de saúde com toda a população escolar, sem qualquer forma de discriminação. Assim, os conceitos e ações de promoção de saúde poderiam ser trabalhados de forma integral e sem o risco de cair em juízo de valor. Cada aluno, ao longo do seu desenvolvimento, passaria a ser livre e apto para elaborar a sua própria equação de vida saudável.
As ações de promoção de saúde, especialmente nas situações direta ou indiretamente relacionadas ao uso indevido de drogas, seriam pautadas por:
• Objetivos amplos e escalonados;
• Ruptura com o maniqueísmo;
• Ações inclusivas;
• Parcerias intersetoriais;
• Incentivo ao protagonismo e autonomia dos alunos;
• Abordagem do indivíduo em toda a sua complexidade, independente do uso.
Objetivos amplos e escalonados
Admitindo-se que uma vida “perfeitamente saudável” é uma utopia, as ações devem visar à promoção da saúde, à qualidade de vida e ao bem-estar. Com relação ao uso de substâncias psicoativas, deve-se abandonar o “tudo ou nada”, valorizando os resultados parciais, objetivando “uma vida cada vez mais saudável”.
Ruptura com o maniqueísmo
Propõe-se romper com a fórmula usuário de drogas = mal; não usuário de drogas = bem. Existem diferentes padrões de uso de substâncias psicoativas e nem todo uso significa ou leva à dependência. Em relação a qualquer substância psicoativa, podemos falar em uso recreativo, uso ocasional, uso abusivo e dependência. Se, por um lado, parte dos jovens que já tiveram um contato experimental com alguma droga ilícita nunca irá além deste contato inicial, não ‘migrando’ nem mesmo para o uso ocasional ou regular destas substâncias, outra parte destes jovens podem ser candidatos a se tornarem usuários regulares, usuários-problema ou mesmo dependentes47. O risco ao considerar todo uso com alarme é perder ou deixar de criar um laço de confiança com o jovem, o que impediria o seu acompanhamento. Isto poderia ser um problema, uma vez que o vínculo positivo com um adulto cuidador é um fator relacionado à proteção para o uso indevido de substâncias48.
Ações inclusivas
As ações devem visar ao desenvolvimento e à inclusão social de todos os alunos. Bem como à toda a comunidade escolar: corpo discente e docente, familiares e funcionários de apoio devem ser incluídos no objetivo de “uma vida cada vez mais saudável”. Aqui está incluído o incentivo às atividades artístico-culturais e esportivas, de forma adaptada e coerente com o contexto sócio-cultural da escola, e integrando toda a comunidade escolar. A exclusão e a má-adaptação social são fatores relacionados ao risco do uso indevido de substâncias48.
Parcerias intersetoriais
Desenvolvimento de parcerias entre a escola, os familiares dos alunos e os dispositivos de atenção à saúde da comunidade, as instituições de ensino e organizações governamentais e não-governamentais. Os estudos de avaliação apontam resultados superiores para as intervenções conjuntas, realizadas nas escolas e na comunidade6, 7.
Incentivo ao protagonismo e autonomia dos alunos.
O incentivo ao protagonismo e autonomia dos alunos perpassaria todas as atividades desenvolvidas na escola. As atividades de educação em saúde devem ser pautadas pela busca ativa do aprendizado, preferencialmente na forma de projetos multidisciplinares. Tobler6, em sua metanálise, aponta resultados duas a três vezes superiores na redução do uso de substâncias com os programas ditos interativos, ou seja, aqueles que utilizam o aprendizado ativo como técnica didática, em relação aos modelos clássicos de intervenção. Aqui também está incluído o incentivo às atividades de protagonismo dos alunos, por exemplo, o apoio ao grêmio escolar e a inclusão deste, bem como de toda a comunidade escolar no planejamento e organização de eventos e projetos de promoção de saúde.
Abordagem do indivíduo em toda a sua complexidade, independente do uso.
Os alunos devem ser atendidos dentro de suas particularidades bio-psico-sociais, independentemente se fazem ou não uso de substâncias psicoativas, sejam elas quais forem. Ou seja, todas estas propostas continuam válidas, mesmo se o aluno já experimentou ou faz uso de alguma droga. A atitude de um educador ou uma escola que consegue incluir, manter ou renovar o seu vínculo com um aluno que faz algum uso de substâncias psicoativas, lícita ou ilícita, pode ser o divisor de águas entre a parada na experimentação e a migração para outros usos incluindo uma futura dependência. Ou seja, diante de uma situação onde é evidenciado o uso de alguma droga por um aluno (exemplos: um aluno leva bebida alcoólica para um passeio do colégio; um aluno chega embriagado para a aula; um aluno é visto fumando maconha na esquina da escola no intervalo da aula)41, o limite pode ser dado de uma forma alternativa à exclusão (temporária ou permanente) do aluno, mas a chamada para a reflexão, por exemplo, através de textos sobre o assunto a serem trabalhados com toda a classe. Concomitantemente, outras ações visando à ampliação da compreensão da situação global do aluno em questão e suas necessidades podem ser necessárias: acompanhamento mais atento do cotidiano do aluno, que pode até incluir reunião com os pais e visitas domiciliares, se a situação se agrava ou perpetua. Em paralelo, este aluno, assim como todos os outros, devem continuar a serem estimulados a participar de atividades que ampliem seu leque de opções e incentivem sua autonomia, ao invés de do aluno ser excluído de tais atividades como possível punição. Enfim, o objetivo final das intervenções deve ser a compreensão do que está acontecendo com o aluno e o reforço dos vínculos saudáveis deste41.
Desta forma, a estrutura de funcionamento da escola Promotora de Saúde, dentro dos princípios da Redução de Danos já teria uma ação preventiva com relação aos transtornos relacionados ao uso de substâncias.










