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0567/2007 - Ampliação do acesso à atenção oftalmológica:um estudo sobre a avaliabilidade da campanha “De Olho na Visão”. Goiás, 2004
Evaluability assessment of a health care campagne to Improve accessibility to oftalmological care in a central region of Brazil. 2004.

Autor:

• Lazara Ribeiro Ferreira Lima - Lazara Ribeiro Ferreira Lima - Goiânia, Goiás - Secretaria de Estado da Saúde de Goiás - <lazara.lima@gmail.com>


Área Temática:

Não Categorizado

Resumo:

Com o objetivo de identificar as áreas prioritárias para avaliação sistemática da Campanha “De Olho na Visão”, voltada para ampliação do acesso à atenção oftalmológica ocorrida no Estado de Goiás em 2004, realizou-se um estudo sobre sua avaliabilidade por intermédio da realização de entrevistas com informantes-chave e de análise documental. Elaborou-se um modelo lógico do qual foram derivados dimensões e critérios para avaliação. Submeteram-se esses critérios a um comitê de especialistas através da técnica de Delphi. Os resultados revelaram que a Campanha encontrava-se estruturada o suficiente de modo a permitir a realização de avaliações sistemáticas a seu respeito. Verificou-se diversidade na compreensão acerca dos objetivos e da população alvo, entre diferentes profissionais. Problemas relacionados com acessibilidade e efetividade indicam essas dimensões como áreas prioritárias para avaliação. O estudo também funcionou como uma pré-avaliação, gerando recomendações relacionadas com a logística. Os autores discutem a relevância da realização de estudos de avaliabilidade como etapa preliminar para a realização de avaliação de programas.

Palavras Chave:
Avaliabilidade, Avaliação, Campanha

Abstract:

In order to identify the systematic evaluation on priority areas of a campaign created to improve the accessibility of ophthalmologic attention – “Keep an eye on vision”, occurred in the state of Goiás in 2004, it was accomplished a research about its evaluability assessment by conducting interviews with key stakeholders and reviewing documentation. A logical model was developed in this campaign providing dimensions and criteria for evaluation. This framework was submitted to a panel of experts that used “Delphi” technique to do it. The results brings out the campaign is sufficiently structured to make the systematic evaluation feasible. Between many experts, it was identified a variety point of views to define the goals and target audience of the campaign. Problems linked with accessibility and effectiveness points out these components as priority areas of evaluation. Concluding by the relevance, the evaluability assessment is a preliminary stage for the evaluation programs accomplishment.

Key words
Evaluability, Evaluation, Campagne

Conteúdo:

A exemplo de outros estados brasileiros, Goiás vem assistindo, a partir da década de 60, ao processo de envelhecimento de sua população relacionado entre outras causas, ao aumento da expectativa de vida, à redução das taxas de fecundidade e de mortalidade. Em 2002 a população de 60 anos e mais do estado de Goiás apresentou crescimento de 65,2%, em relação a 1993, superior àquele verificado na população total, que foi de 24% no período1. Esse fenômeno tem gerado novas demandas assistenciais quer seja pela maior prevalência das doenças crônico-degenerativas no grupo de idosos ou pelas dificuldades de acesso dessa população às ações e serviços de saúde em decorrência das desigualdades regionais, sociais e de geração.

A catarata é considerada a maior causa de cegueira no mundo atingindo em torno de 16 milhões de pessoas2. No Brasil existem aproximadamente 24,5 milhões de pessoas que apresentam algum tipo de incapacidade ou deficiência, ou seja, 14,5% da população. Estão incluídas nessa categoria pessoas com dificuldades de enxergar, de locomover ou que portam algum tipo de deficiência física ou mental. A incapacidade de enxergar em seus diversos graus de severidade responde por 48,1%, do total mencionado e ocupa o primeiro lugar. Da população portadora de algum tipo de dificuldade de enxergar, registrado na região Centro-Oeste, Goiás destaca-se concentrando mais de 40% da referida população1.

A catarata pode ser corrigida cirurgicamente. Relatos de cirurgias oculares bem sucedidas têm sido relacionadas com a melhoria da qualidade de vida de indivíduos de reduzido nível sócio-econômico, entre 50 e 97 anos. A expectativa dos pacientes em relação à retomada de atividades após a cirurgia foi manifestada por 59,8% dos pacientes atendidos pelo Projeto Catarata3, em São Paulo, em 1999. No âmbito federal, desde 1999, a Campanha Nacional de Cirurgias de Catarata foi desenvolvida pelo Ministério da Saúde em parceria com o Conselho Brasileiro de Oftalmologia tendo como objetivo eliminar a fila de pessoas cegas ou incapacitadas por catarata, no menor prazo possível4.

A rede assistencial do SUS, em Goiás, exibe baixa cobertura na oferta de serviços oftalmológicos – presentes em apenas 16 dos 246 municípios do Estado – acarretando, conseqüentemente, uma significativa demanda reprimida. Em 2001, o estado de Goiás possuía 230 oftalmologistas para uma população de 3.093.171 habitantes, correspondente a densidade de um profissional para cada 18.412 habitantes5, oferta considerada ainda insuficiente para atendimento das necessidades populacionais. Havia uma concentração dos mesmos na cidade de Goiânia, em 2001, que contava então com 170 profissionais correspondentes a 74% do total dos oftalmologistas existentes no estado, estando os 60 profissionais restantes distribuídos em 20 municípios5. Naquele contexto, a saúde ocular de pessoas idosas em Goiás vinha se constituindo em importante problema de saúde pública. Além disso a grande extensão territorial do Estado (340.086.698 km2), ao lado da elevada proporção da população com renda menor que 2 salários mínimos (60%), constituíam-se em obstáculos adicionais ao acesso.

Para enfrentar esse quadro a Secretaria de Estado da Saúde de Goiás realizou no ano de 2004 a segunda edição da Campanha “De Olho na Visão”, em parceria com o Centro de Referência em Oftalmologia do Hospital das Clínicas, da Universidade Federal de Goiás - CEROF/HC/UFG – com objetivo geral de ampliar o acesso a atenção oftalmológica no Estado de Goiás.

Com a finalidade de subsidiar os gestores no processo de avaliação da Campanha e visando reunir informações para a tomada de decisões acerca da sua continuidade, algumas questões de avaliação impunham-se. A primeira, dizia respeito à avaliabilidade dessa Campanha. Em que medida a intervenção realizada permite a realização de uma avaliação? Que problemas surgiram e quais as áreas críticas que requeriam avaliação? O presente estudo foi desenvolvido para buscar responder a algumas dessas questões visando contribuir para formulação subseqüente de políticas na área de saúde ocular e apresenta parte dos resultados do referido estudo. O objetivo geral foi aferir a avaliabilidade da Campanha "De Olho na Visão" voltada para a ampliação do acesso à atenção oftalmológica no Estado de Goiás em 2004. Os específicos foram: identificar problemas prioritários para avaliação da Campanha e delimitar melhor os seus objetivos.

METODOLOGIA
ESTRATÉGIA DO ESTUDO
Realizou-se um estudo de caso da Campanha. Os níveis de análise selecionados foram a gestão e as práticas assistenciais. Para cada nível de análise foram selecionados dimensões, critérios e indicadores a partir da elaboração da versão preliminar do modelo lógico da intervenção.

A avaliabilidade, anglicismo referente ao termo evaluability que pode ser traduzido como “em que medida o programa pode ser avaliado” é o exame sistemático e preliminar de um programa, em sua teoria e em sua prática, a fim de determinar se há justificativa para uma avaliação extensa e (ou) para melhor delimitar os objetivos do programa bem como, identificar áreas críticas a serem priorizadas na avaliação6. Para merecer uma avaliação extensa o programa deve operar como previsto, ser relativamente estável ao longo do tempo e indicar estar alcançando algum resultado positivo. Por outro lado, freqüentemente, os diversos gestores e profissionais responsáveis pela implementação do programa têm concepções distintas acerca dos objetivos do programa assim como, sobre aspectos mais frágeis que requerem avaliação6.

MODELO LÓGICO, DIMENSÕES, CRITÉRIOS E INDICADORES
Com a finalidade de selecionar dimensões, critérios e indicadores para a pré-avaliação dois modelos lógicos foram elaborados: um causal e outro relacionado com a intervenção propriamente dita (figuras 1, 3 e 4). Para os dois níveis de análise escolhidos derivaram-se do modelo preliminar as seguintes dimensões e critérios: para o nível da gestão, as dimensões analisadas foram o planejamento e a avaliação. Em relação ao planejamento os critérios propostos foram: a) Existência de plano (clareza dos objetivos, coerência, factibilidade e estratégias); b) Características do planejamento (estratégico, normativo); c) Implementação e Operacionalização do plano; d) Coordenação (controle gerencial); e) Supervisão e Acompanhamento das ações (controle técnico). Já em relação a avaliação os critérios selecionados, foram: a) Existência de sistema de informação (uso das informações, qualidade dos registros e das informações, banco de dados); b) Logística (organização, triagem, encaminhamento, motivos das perdas e acessibilidade) (Figura 2).

Submeteu-se a matriz contendo dimensões, critérios e indicadores à apreciação do comitê de especialistas formado por quatro profissionais tanto da área acadêmica, quanto vinculados aos serviços de saúde. Para obtenção de consenso utilizou-se a técnica de Delfos (Delphi)7. Solicitou-se a cada membro do comitê que atribuísse uma nota de zero a dez, a cada um dos critérios (Figura 5). Esclareceu-se que a nota zero corresponderia ao julgamento de que o critério deveria ser excluído e a nota dez significaria que o especialista estaria atribuindo prioridade máxima ao mesmo. Os membros do painel poderiam sugerir novos critérios ou modificações àqueles apresentados. Encaminhou-se a matriz a cada membro do comitê via correio eletrônico acompanhada de uma carta explicativa sobre o nome do pesquisador, sua instituição de trabalho, o objetivo do estudo, a garantia do anonimato e do retorno dos resultados. Fez-se a consolidação dos dados por meio do cálculo das médias e desvios-padrão. Devido ao elevado consenso só foi efetuada uma rodada.

TÉCNICAS DE COLETA E FONTES DE INFORMAÇÃO
As informações foram obtidas a partir de análise documental (fichas de inscrição, ficha de atendimento médico, fichas de encaminhamento do cliente para outras especialidades ou para retorno e manual de orientação para aplicação do teste de acuidade visual) e entrevista com informantes-chave.

Foram informantes-chave, num total de nove entrevistados: a) técnicos de nível superior (médico, enfermeira, estatístico e coordenador da Campanha); b) gestor municipal; c) usuários contemplados e não contemplados pela Campanha; d) Agente Comunitário de Saúde - ACS. Obteve-se o consentimento, informado por escrito, dos entrevistados tendo sido assegurado aos mesmos o sigilo e confidencialidade das informações por meio de protocolo previamente submetido a um comitê de ética. As entrevistas foram gravadas e em seguida foram transcritas na íntegra.

O roteiro das entrevistas variou conforme as categorias de informantes. Os critérios ou variáveis adicionais indagados foram: objetivos; população-alvo; adequação das estratégias utilizadas para o alcance dos objetivos propostos; aspectos já avaliados; organização do sistema de informação; problemas prioritários para a avaliação na opinião do entrevistado; usos dos resultados da avaliação; e, problemas encontrados pelo entrevistado que merecem correção.

As respostas do comitê de especialistas foram consolidadas e as médias e o desvio-padrão, calculados. A partir dos critérios selecionados as entrevistas foram analisadas, manualmente. Desta primeira leitura os modelos lógicos foram reelaborados e aperfeiçoados. Fez-se a triangulação das informações obtidas por meio de uma comparação, critério a critério entre as respostas dos diferentes informantes e entre estes e os documentos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
No que diz respeito tanto à definição dos objetivos da Campanha, quanto ao que concerne à delimitação da população alvo, verificou-se que, embora os mesmos estivessem claros para o coordenador da Campanha, houve diversidade de opiniões entre informantes-chave entrevistados:

“Os principais objetivos da campanha é o de levar atendimento oftalmológico a todas as cidades do Estado [...]”.

“O Objetivo é detectar pessoas com problemas visuais, principalmente a catarata”.

Contudo pode-se deduzir, por meio do que foi efetivamente referido pelo Agente Comunitário de Saúde-ACD e da entrevista com o coordenador, que o objetivo ampliou-se e passou a ser “atender às deficiências visuais detectadas na população com idade igual ou maior de 50 anos cadastradas pelas equipes do Programa de Saúde da Família-ESF”. Porém não fica claro em que medida essa falta de consenso implicou na operacionalização da campanha, indicando ser esta uma área problema a ser avaliada.

Quanto à logística, o processo de triagem da população pelos ACS mostrou-se uma estratégia adequada, pois, os mesmos conhecem as necessidades de saúde da população do território que se encontra sob seu domínio. No entanto, os próprios ACS entrevistados referem ao pouco tempo para divulgar a Campanha o que pode ter resultado nas baixas coberturas encontradas. Aqui se indaga: será que toda a população que necessita do atendimento foi contatada? Soube da Campanha? Em relação ao encaminhamento do paciente para o reexame observa-se que o fluxo está bem definido, porém, problemas relacionados com a acessibilidade foram apontados:
“ [...] É do tumulto [..], da espera, porque as pessoas idosas não sabem da dificuldade né [...] então eles não esperam [...] acabam desistindo. E as vezes assim [...] eu tenho caso na minha área de pessoas que fizeram a triagem [...] detectamos o problemas, aí eles demoraram e essa pessoa procurou outro atendimento [...] outro lugar”.

“[...] uma coisa que desestimula agente é o desinteresse de alguns prefeitos e secretários de saúde. Isso aí, foi o que desestimulou muito. A gente chega lá para atender [...] tem uma cidade que é 12000 pacientes, ele não leva um paciente e a gente vê [...] e ta bem claro que é política [...] problemas políticos, que são adversários políticos, [...] sei lá... alguma coisa ta interferindo naquilo ali”.

As entrevistas revelam, portanto, uma perda de pacientes tria dos que não compareceram para o reexame, cabendo indagar: Qual a magnitude deste não comparecimento? Quais as razões? Estes problemas de acessibilidade foram generalizados? Qual a cobertura real da Campanha?

A partir das entrevistas e análise documental, foram aperfeiçoados os diagramas representados nas Figuras 3 e 4 correspondendo ao modelo lógico, ou seja, a relação que existe entre os objetivos, atividades e metas exprimindo a forma de sua implementação no âmbito da sua gestão e prática.

Quatro áreas, visualizadas na figura 3, comportam necessidades de avaliação da Campanha em nível de suas práticas: a) no processo de triagem pelos ACS; b) no atendimento clínico (reexame); c) na seleção para recebimento de óculos; d) na recuperação da visão dos usuários.

O resultado da pontuação atribuída pelo comitê de especialistas aos critérios prioritários para avaliação, com base no cálculo das médias e do desvio-padrão, encontra-se expresso na figura 5. Os dados encontrados mostram que a existência de plano foi considerada pelos especialistas como um dos principais critérios para avaliação da Campanha (9,7); verificou-se ainda elevado consenso em relação à cobertura e eqüidade (9,5). As características do planejamento, implementação, coordenação e a logística da Campanha ocupam o terceiro lugar (9,0); o sistema de informação (8,7) e por último o critério com menor pontuação foi a existência de supervisão/ acompanhamento (8,2).

Em síntese, o presente estudo revelou que a campanha “De Olho na Visão” encontra-se estruturada o suficiente de forma e viabilizar a realização de avaliações sistemáticas a seu respeito.


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Citar

Lazara Ribeiro Ferreira Lima. Ampliação do acesso à atenção oftalmológica:um estudo sobre a avaliabilidade da campanha “De Olho na Visão”. Goiás, 2004. Cien Saude Colet [periódico na internet] (2007/set). [Citado em 07/08/2025]. Está disponível em: http://cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/ampliacao-do-acesso-a-atencao-oftalmologicaum-estudo-sobre-a-avaliabilidade-da-campanha-de-olho-na-visao-goias-2004/1111?id=1111

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