EN PT

Artigos

0145/2025 - ANÁLISE DA COBERTURA DA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA DAS CIDADES GÊMEAS DO BRASIL 2016-2020
ANALYSIS OF COVERAGE OF THE FAMILY HEALTH STRATEGY OF THE TWIN CITIES OF BRAZIL 2016-2020

Autor:

• Olga Lucía Mosquera Conde - Conde, OLM - <olgalum09@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4988-1764

Coautor(es):

• Yury Lizeth Cardozo Prada - Prada, YLC - <jujulizeth@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9059-9798

• Giuliano Silveira Derrosso - Derrosso, GS - <Giuliano.derrosso@unila.edu.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2360-411X

• Carmen Justina Gamarra. - Gamarra, CJ - <Carmen.gamarra@unila.edu.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4029-3859

• Ehidee Isabel Gomez la Rotta - la Rotta, EIG - <Ehidee.rotta@unila.edu.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1194-9898

• Gustavo Cezar Wagner Leandro - Leandro, GCW - <gustavocezarwl@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5014-2387

• Andrea del Pilar Trujillo Rodríguez - Rodríguez, A del PT - <ad.trujillo66@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6950-9716

• Larissa Djanilda Parra da Luz - Luz, LDP - <Lariparra.luz@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1172-9492



Resumo:

Objetivo: analisar a tendência temporal da cobertura da Estratégia Saúde da Família e os seus fatores associados nas cidades gêmeas brasileiras entre 2016 e 2020. Métodos: trata-se de um estudo ecológico retrospectivo de análise temporal sobre as 33 cidades gêmeas do Brasil. Os dados secundários foram coletados do e-Gestor Atenção Básica, e utilizadas as variáveis sobre a cobertura da Estratégia Saúde da Família, porte populacional, arcos de fronteiras e a temporalidade. Na análise estatística foram utilizadas medidas descritivas, arquivados, tabulados e analisados por meio do programa Excel® 2019. Resultados: observou-se que o arco norte apresenta a maior cobertura, seguido pelo arco sul e centro-oeste, respectivamente, destacando-se as cidades gêmeas de pequeno porte em termos de porte populacional. Na evolução da cobertura, o arco sul se destaca por uma tendência crescente, enquanto os arcos norte e centro-oeste mostraram um decréscimo no último ano de estudo. Conclusão: a cobertura da Estratégia Saúde da Família nas cidades gêmeas variou entre os três arcos, possivelmente devido às características sociodemográficas de cada arco e às particularidades na gestão dos serviços de atenção básica dos municípios.

Palavras-chave:

Áreas de Fronteira. Estratégia Saúde da Família. Cobertura de Serviços de Saúde. Estudos Ecológicos.

Abstract:

Objective: To analyze the temporal trend of Family Health Strategy (FHS) coverage and its associated factors in Brazilian twin cities between 2016 and 2020. Methods: This is a retrospective ecological study of a temporal analysis conducted on the 33 twin cities of Brazil. Secondary data were collected from e-Gestor AB, and variables regarding FHS coverage, population size, border arcs, and temporality were used. Descriptive measures were used in the statistical analysis, which were arcived, tabulated, and analyzed using Microsoft Excel® 2019. Results: It was observed that the Northern arc had the highest coverage, followed by the Southern and Midwestern arcs, respectively, with small twin cities standing out in terms of population size. As regards coverage evolution, the Southern arc stood out with a growing trend, while the Northern and Midwestern arcs showed a decrease in the last year of the study. Conclusion: FHS coverage in twin cities varied among the three arcs, likely due to the sociodemographic characteristics of each arc and the particularities in the management of basic care services in municipalities.

Keywords:

Border Areas; National Health Strategies; Health Service Coverage; Ecological Studies.

Conteúdo:

INTRODUÇÃO
Os sistemas de saúde são compreendidos como o conjunto dos serviços e programas sob a direção de um órgão governamental que inclui serviços de saúde e ações de saúde públicas, constituído pelo conjunto de elementos que determinam o estado de saúde de uma população, tendo como alvo a sociedade, e como ponto de partida a identificação das suas necessidades, surgindo como uma resposta aos problemas de saúde, atendendo sempre os seus determinantes na comunidade, levando em consideração os constrangimentos sociais, incluindo os aspectos demográficos e culturais que moldam a sua evolução e a sua capacidade de mudança. E para alcançar esses objetivos se faz necessário recursos financeiros, físicos e humanos e fluxos de serviços adequados a cada realidade1.
Para dar resposta a essas necessidades os países desenvolvem sistemas de saúde baseados nos diferentes modelos, no caso do Brasil, fundamentou o sistema por meio da lei 8080/90, um sistema de saúde universal, o Sistema Único de Saúde (SUS), que tem como princípios, a integralidade, a universalidade e a equidade, além de outros como a participação comunitária a hierarquização e a territorialização, garantidos por meio da Atenção Primária à Saúde como coordenadora do cuidado e porta de entrada ao sistema, para cumprir com o direito à saúde estipulado na Constituição Federal (CF) de 19882.
A Atenção Primária à Saúde (APS), considerado no Brasil como termos equivalentes da Atenção Básica (AB), tem seu marco histórico na conferência de Alma-Ata, afirmando a responsabilidade dos governos com o povo no âmbito da saúde e seus determinantes, esta, constitui se como o pilar fundamental para garantir o direito à saúde da população por meio de ações de saúde individuais e coletivas integradas e resolutivas, envolvendo a promoção da saúde, prevenção da doença, reabilitação, proteção, diagnóstico, tratamento, redução de danos, cuidados paliativos e vigilância em saúde, inserindo a Estratégia Saúde da Família (ESF), que tem como uma de suas características o acompanhamento mais perto da comunidade e organização da APS2,3.
A ESF surge como uma estratégia prioritária para o fortalecimento e organização da APS e do SUS, tendo como características principais a territorialização e a abordagem multiprofissional, que favorece a reorientação do processo de trabalho com maior potencial de ampliar a resolutividade e impactar na situação de saúde dos indivíduos, famílias e comunidade. São conformadas equipes da ESF (eESF) considerando-se um parâmetro populacional de responsabilidade da equipe de 2.000 a 3.500 pessoas, a depender da vulnerabilidade e necessidade do território3.
As equipes ESF disponíveis num território representam a capacidade que se tem para acompanhar a população, com recursos humanos-profissionais, de acordo com o número de população adscrita ao território. Quanto maior a cobertura, ou seja, equipes completas, maior é o acesso e qualidade para a prestação de serviços de saúde considerando as necessidades e demandas de saúde das populações em cada localidade, a partir de suas especificidades locorregionais4.
A cobertura populacional estimada de equipes de saúde da família (ESF) é utilizada para monitorar o acesso aos serviços de saúde da APS, visando fortalecer a gestão e o planejamento das ações do SUS5. A APS tem criado programas que fortalecem e incentivam para a ampliação, melhoria e a qualidade na atenção da ESF, como o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade na Atenção Básica (PMAQAB), o programa mais médico, Programa de Requalificação das Unidades Básicas de Saúde, Programas de Valorização da Atenção Básica6.
O monitoramento das ações de saúde para a gestão dos sistemas locais de saúde encontra-se permeados por diversas situações que podem dificultar a gestão em saúde, um desses entraves pode ser vivenciado na gestão em saúde das regiões de fronteira, que segundo Hortelan7, o fato de ter populações flutuantes dificulta as ações para prevenção de risco, controle de doenças e o usufruto do sistema de saúde SUS por população não residente no município fronteiriço, sendo estes nacionais ou não nacionais.
As cidades fronteiriças do Brasil são classificadas em três tipos: cidades de faixa de fronteira, sendo aquelas que se encontram na faixa de 150 quilômetros da linha divisória internacional para o interior do território brasileiro; as cidades gêmeas são aquelas que estão separadas pela linha de fronteira internacional, sendo ela seca ou fluvial, podendo estar articuladas ou não por obras de infraestrutura, ademais, com população individual maior a 2.000 habitantes, e as cidades conurbadas de fronteira consideradas aquelas que compartilham a mesma malha urbana com a cidade lindeira estrangeira, sem interrupção territorial ou acidentes geográficos entre elas (montanhas, rios). Destaca-se que toda cidade conurbada é gêmea, enquanto, nem toda cidade gêmea é conurbada8.
As fronteiras internacionais são consideradas espaços físicos e geográficos, que permitem a distinção e interação de identidades coletivas localizadas nas margens da linha limítrofe de dois ou mais países, tornando lhe uma região com constante fluxo de pessoas, comércios e culturas entre as populações transfronteiriças, sem embargo, se destaca que a intensidade de ditos fluxos depende das especificidades de cada região fronteiriça8. De acordo com Pinto et al.9, cada uma das regiões de fronteiras tem sua própria identidade, no entanto, na maioria delas evidencia-se carências sociais, exclusão e deterioração ambiental.
O Brasil possui 16.885,7 quilômetros de fronteira internacional, sendo o país do continente americano com maior número de fronteiras terrestres, compartilhando fronteira com dez países da América do Sul. Geograficamente, a extensão de fronteira do Brasil se divide em três arcos: norte, central e sul. O arco norte destaca-se por ter a presença da floresta Amazônica, enquanto, o central possui vínculo com a grande extensão da fronteira agrícola e o sul se caracteriza pela produção de milho, trigo, soja e a agroindústria10. A fronteira internacional envolve onze estados e 588 municípios, dos quais trinta e três são consideradas cidades gêmeas, caracterizadas pelas intensas relações transfronteiriças11.
É relevante destacar as complexas e intensas interações que acontecem nas cidades gêmeas, tornando-se um espaço no qual existe uma dependência mútua entre dois ou mais países, especialmente entre as populações transfronteiriças, aspectos culturais, socioeconômicos e sanitários das nações envolvidas facilita um processo particular de construção e reconstrução de identidades, além de propiciar um espaço idôneo para integração formal e informal dos países vizinhos12. Ademais, ressalta-se que a maioria dos arranjos fronteiriços no Brasil se caracterizam pelo escasso povoamento e considerável isolamento geográfico, como resultado das precárias condições das estruturas viárias, de comunicação e das dificuldades de acesso às grandes cidades do país9.
De acordo com Neves et al.6, municípios que apresentam maior cobertura de ESF apresentam melhorias nas condições de saúde da população, tais como, diminuição da mortalidade infantil, aumento da cobertura vacinal, redução da desnutrição e aumento de consultas de pré-natal. Porém, destaca-se que a localização periférica das cidades gêmeas, normalmente influencia na presença do Estado para suprir as necessidades sociais básicas das populações fronteiriças9, o que possivelmente pode afetar na oferta dos serviços públicos de saúde.
Nesse sentido, considerou-se importante analisar a cobertura da ESF nas cidades gêmeas brasileiras, sendo que o indicador da cobertura populacional estimada na Atenção Básica (AB) tem sua relevância pelo fato da Atenção Básica ser considerada a coordenadora do cuidado, com capacidade resolutiva nos processos de territorialização e regionalização como características principais, além de ser a norteadora na estruturação de programas e projetos para o cuidado em saúde5.
Por tanto, a presente pesquisa tem como objetivo geral analisar a cobertura da Estratégia Saúde da Família nas cidades gêmeas do Brasil de 2016 a 2020, e ainda como objetivos específicos: identificar a cobertura da ESF das cidades gêmeas brasileiras e comparar a cobertura da ESF considerando os três arcos: norte, central e sul e o porte populacional.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo ecológico retrospectivo, utilizando como unidade de análise as cidades gêmeas brasileiras. Segundo Bonita et al.13, os estudos ecológicos são utilizados para comparar populações em diferentes lugares, podendo ser ao mesmo tempo ou em uma série temporal. A descrição da pesquisa seguiu as diretrizes do Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE)14.
Foram consideradas um total de trinta e três cidades brasileiras, caracterizadas como cidades gêmeas por terem fronteira internacional com intensas relações transfronteiriças11, foram incluídas para a análise da cobertura da ESF nos arcos de fronteira do Norte, Central e Sul do país (Figura 1).
As variáveis analisadas foram: ano; população; porcentual de cobertura da ESF. Ainda foram caracterizadas as cidades por arcos segundo o porte populacional. Para o estudo, a fonte de dados utilizada foi a plataforma e-Gestor AB5, que fornece informações da Atenção Primária (APS) para apoio na gestão. Foi acessada por meio do ambiente acesso público, os dados foram selecionados no período de dezembro de cada ano estudado, sendo escolhidos os últimos cinco anos disponíveis na plataforma. Os arcos de fronteira foram considerados segundo a macrorregionalização definida pelo Ministério da Integração Nacional. O porte populacional foi estratificado em três grupos segundo o proposto por Calvo et al.15: municípios com menos de 25 mil habitantes (pequeno porte), municípios com 25 a 100 mil habitantes (médio porte) e municípios com mais de 100 mil habitantes (grande porte).
Figura 1 – Cidades gêmeas e arcos de fronteira, Brasil 2024

Fig.1

Para a análise descritiva dos dados utilizou-se o software Excel® (versão 2019). Seguidamente, foi realizada a análise da série temporal anual da cobertura da ESF por município e arco de fronteira entre 2016 e 2020, seguida da aplicação do teste de tendência temporal de Mann-Kendall, com um nível de significância de 5%, de forma bicaudal. Posteriormente, comparou-se a cobertura municipal média da ESF segundo arco de fronteira (Norte, Central e Sul) e porte populacional (Pequeno, Médio e Grande). Para analisar a diferença entre as médias da cobertura da ESF (variável dependente) nas cidades gêmeas e arco de fronteira e porte populacional (variáveis independentes), empregou-se a regressão de Poisson-Tweedie. As variáveis consideradas como diferentes foram as que apresentaram significância estatística (p<0,05) em procedimento backward. Todas as análises estatísticas foram feitas por meio do R (versão 4.4.0). Os mapas cloropléticos foram criados com base na cartografia dos municípios brasileiros no sistema de referência SIRGAS2000, fornecido pelo IBGE, utilizando o software QGIS (versão 3.34.4).
Em virtude de os dados analisados serem provenientes de fontes secundárias de acesso público, estão dispensados da apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos.

RESULTADOS

Na Tabela 1 são apresentadas as informações das 33 cidades gêmeas segundo arco de fronteira, 48,4% estão localizadas no Arco Sul (n=16), seguidos do Arco Norte (n=9) e Arco Central (n=8), nesta ordem. Em relação ao porte populacional das cidades gêmeas, observou-se uma concentração de municípios de pequeno porte; de 66,6% no Arco Norte, 62,5% no Arco Central e 56,2% no Arco Sul. Foram identificados três municípios de grande porte, dois no Arco Sul (Foz do Iguaçu e Uruguaiana) e um no Arco Central (Corumbá) (Tabela 1).

Tab.1

Notou-se que a média das coberturas da ESF entre cidades gêmeas localizadas no Arco Norte foram superiores aos municípios dos demais arcos de fronteira (Tabela 1). Em 2016, os três arcos de fronteira apresentavam uma média de cobertura superior a 70%, sendo o Norte com 91,8%; o Central com 75,5% e o Sul com 73,4%.
Ao analisar a tendência temporal da cobertura da ESF entre os arcos de fronteira no período considerado, observa-se que o Arco Norte apresentou um decréscimo no indicador, com valores superiores a 90% até 2019, reduzindo para 88,7% em 2020. O Arco Central apresentou resultados similares, com cobertura da ESF de 75,5% em 2016 e 69,0% em 2020, mostrando um comportamento instável de declínios e aumentos, sendo classificado como decrescente no período analisado. Em contraste, o Arco Sul demonstrou um crescimento na cobertura da ESF durante o período, iniciando com 73,4% e atingindo 79,1% em 2020 (Tabela 1).
Em relação às 9 cidades gêmeas do Arco Norte, cinco alcançaram a cobertura completa da população residente, com uma notável queda do indicador de 2019 para 2020, principalmente em Santa Rosa do Purus (pequeno porte) e Epitaciolândia (médio porte), com tendência temporal decrescente (Tabela 1).
No Arco Central, a maioria dos municípios registrou queda no indicador, com reduções significativas na tendência temporal em Bela Vista, Coronel Sapucaia e Paranhos, enquanto Ponta Porã foi o único local com estabilidade ao longo dos anos analisados. Além disso, o município de Mundo Novo (pequeno porte) manteve uma cobertura superior a 93% durante todo o período, enquanto Cáceres (médio porte) apresentou uma cobertura inferior a 50% ao longo do estudo (Tabela 1).
No Arco Sul, a maior parte das cidades gêmeas de pequeno porte mantiveram cobertura com valores entre 96% e 100%. Observou-se significância estatística na tendência crescente em Quaraí, e tendência decrescente em Aceguá. Chuí iniciou sem cobertura (0,0%) e atingiu 100% em 2018, apresentando oscilações entre 50% e 52%. Municípios de médio porte como Guaíra e Jaguarão tiveram tendência crescente, iniciando com cobertura acima de 70%, atingindo mais de 90% em 2020. Destaca-se a variação nos municípios de grande porte: Foz de Iguaçu teve uma tendência crescente, de 45,8% em 2016 para 71,2% em 2020, enquanto Uruguaiana decresceu de 53,2% em 2016 para 35,3% em 2020 (Tabela 1).

Fig.2

Na Figura 2 são apresentadas as médias das coberturas de ESF entre as cidades gêmeas segundo o arco de fronteira e o porte populacional. As cidades de pequeno porte localizadas no Arco Norte apresentam uma média de cobertura de ESF (96,1%) superior às de médio porte (82,3%). Enquanto no Arco Central, os municípios de grande porte demonstram uma média de cobertura (80.3%) maior quando comparados aos de médio (54.9%) e pequeno porte (79.1%). No Arco Sul, as cidades de pequeno porte representam maior cobertura populacional (89.2%) frente às de médio (64.4%) e grande porte (52.5%) (Figura 2).
A Tabela 2 apresenta os resultados da regressão de Poisson-Tweedie sobre a diferença das médias da cobertura da ESF (variável dependente) nas cidades gêmeas segundo arco, porte populacional e ano (variáveis independentes), a partir da qual encontrou-se diferença estatisticamente significativa entre o arco Central e o Norte (p=0,013) e uma possível diferença entre o Sul e Norte (p=0,051). Entre os arcos Central e Sul não se encontrou diferença (p=0,353). Entre os anos não foram encontradas diferenças, mas ao comparar os portes encontrou-se diferença estatisticamente significativa.

Tab.2

DISCUSSÃO

O estudo revelou que quando comparadas as médias de cobertura da Estratégia Saúde da Família nas cidades gêmeas do Brasil segundo o porte populacional: pequeno, médio e grande porte, destacam-se as cidades gêmeas de pequeno porte, com maior cobertura. Segundo a comparação por arcos: norte, centro-oeste e sul, a maior cobertura encontra-se no arco norte. Enquanto a evolução da cobertura, destaca-se o arco sul, que manteve uma tendência crescente, contrário dos arcos norte e centro-oeste com um decréscimo no último ano de estudo por baixo da média no primeiro ano de estudo.
Considerando o porte populacional das cidades gêmeas, se evidencia que com frequência as cidades de pequeno porte concentram as maiores coberturas de ESF, porém, a maioria dessas cidades se caracteriza por terem déficit de recursos econômicos e estruturais. Sem embargo, nas cidades de grande porte a implantação e implementação da ESF ocorre em um contexto complexo, o qual dificulta a prestação dos serviços da AB16,17.
Assim, o presente estudo mostrou que a cobertura da ESF em municípios de grande porte no arco sul apresentou coberturas mais baixas, concordando com o estudo feito por Cecílio e Reis18, considerando que gestores dos municípios de médio e grande porte das regiões Sul e Sudeste, que apresentam baixa cobertura da ESF resistem-se à mudança do modelo tradicional da atenção básica para o modelo da ESF.
No entanto, o Ministério da Saúde com o intuito de ampliar e melhorar o acesso e a qualidade da atenção em saúde da APS, tem se esforçado por desenvolver incentivos ao longo do tempo, contribuindo com a adesão espontânea, sem retrocessos significativos, especialmente em cidades mais vulneráveis, dentre esses incentivos ressalta-se o programa PMAQ e Mais Médicos por contribuir significativamente na cobertura da ESF6. Isso foi evidenciado no presente estudo, mostrando que ainda alguns municípios apresentam baixa cobertura, poucos tiveram um retrocesso que impactará na média de cobertura do arco.
De acordo com Pêgo et al.19, durante os anos 2013 a 2018 o Programa Mais Médicos (PMM), procurou atender a demanda de serviços de saúde básicos dos municípios fronteiriços, os quais são considerados pouco atrativos para os profissionais brasileiros. porém, no final de 2018 a interrupção da participação dos médicos cubanos no PMM, foi refletido no decréscimo de 10% na cobertura da ESF comparado a 2017, ademais, estudos mostram que para agosto de 2019 o quantitativo de ditos profissionais não foi recomposto, mesmo diante das estratégias implementadas pelo governo do momento20. Nesse contexto, considera-se que o decréscimo na cobertura da ESF nos arcos norte e centro-oeste possivelmente esteja associado à interrupção do PMM no território.
O mesmo estudo identificou que existe uma disparidade regional na distribuição dos Recursos Humanos em Saúde, principalmente na categoria de médicos, tendo uma maior concentração nas regiões Sudeste e Nordeste do país, concordando com o resultado do estudo, que mostra uma maior cobertura nesses dois arcos, sendo o arco centro-oeste o de menor média na cobertura da ESF20.
Estudo realizado por Monteiro21, aponta que as cidades gêmeas apresentam maior Taxa de Mortalidade Infantil (TMI) que suas Unidades Federativas (UF), decorrentes das condições de vida destas regiões, sendo o arco norte o que apresenta a maior TMI, seguida do arco centro-oeste e o arco sul, pelo qual o investimento na ESF é maior, considerando a importância que esse indicador revela em nível de saúde da população em uma determinada região.
Essas iniciativas para melhorar a oferta de serviços de saúde, e consequentemente a adesão à ESF, por meio de programas e incentivos, considera que os municípios, ainda que a PNAB sugere a ESF como a melhor forma para alcançar o objetivo da APS, são autônomos na priorização do investimento em saúde, que no caso da ESF, o principal recurso são os profissionais de saúde que conformam a equipe, pela qual pode se calcular a porcentagem da população coberta segundo o número de equipes completas. Cabe a gestão implementar ações para manter o equilíbrio entre a oferta e a demanda de seu município3,20.
Salientando que pode existir a percepção de que o investimento em Recursos Humanos (RH) de saúde constitui um gasto e não um investimento para melhorar a saúde e o desenvolvimento do município; os escassos RH em saúde, e os fatores que promovem ou dificultam a permanência ou adesão ao programa22,23.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao analisar a cobertura da Estratégia Saúde da Família nas cidades gêmeas do Brasil de 2016 a 2020, constatou-se que os três arcos se comportaram de formas diferentes, mesmo com as especificidades das cidades gêmeas, estas não divergem da realidade quando são comparadas as Unidades Federadas do país nesses arcos, porém, quando comparadas as cidades por porte populacional, existem diferenças significativas em cada arco.
Considera-se como limitação do presente estudo, a realidade da pandemia iniciada em março do 2020, que pode ter influenciado na priorização dos profissionais na APS, por tanto, se sugerem estudos que contemplem recortes temporais mais amplos antes e depois da pandemia, também se sugerem estudos que possam analisar de forma mais aprofundada as características das cidades gêmeas de forma individual que consigam desvelar outras questões que podem influenciar na cobertura de ESF, tais como o IDH, a participação desses municípios em programas que incentivam a aderência a ESF, a implementação de estratégias para a permanência de profissionais. Ademais, sugere-se a realização de pesquisas que avaliem o desempenho e qualidade do programa nos arranjos fronteiriços.
No entanto, a presente pesquisa é relevante sendo que analisa a cobertura da APS em todas as cidades gêmeas dos Brasil, permitindo ter um olhar holístico sobre a realidade destas cidades, como também pela qualidade dos dados, ainda que sendo dados secundários são dados oficiais do Ministério da Saúde, por tanto, se considera que não causam viés na cobertura da ESF, tornando os resultados importantes para a descrição da situação temporal da ESF nas cidades gêmeas brasileiras. Por último, é importante mencionar que a pesquisa pretende contribuir com a produção de evidências científicas sobre a realidade da saúde nas regiões fronteiriças, especialmente na Atenção Básica.

AUTORIA

OLMC, YLCP: elaboração, coleta, análise e interpretação dos dados, revisão crítica do manuscrito. GSD, CJG: revisão crítica a e aprovação do manuscrito. GCWL, EIGL: análise e interpretação dos dados, revisão crítica do manuscrito, a e aprovação do manuscrito. APTR: revisão crítica do manuscrito a e aprovação do manuscrito

REFERÊNCIAS
1.Pineault R. Compreendendo o sistema de saúde para uma melhor gestão. 1ª ed. Brasília: LEIASS; 2016.
2.Gonçalves MA. Organização e funcionamento do SUS. Brasilia: CAPES; 2014.
3.Brasil. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Politica Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União 2017; 21 set.
4.Giovanella L, Bousquat A, Schenkman S, Almeida PF, Sardinha LMV, Vieira MLFP. Cobertura da Estratégia Saúde da Família no Brasil: o que nos mostram as Pesquisas Nacionais de Saúde 2013 e 2019. Ciência & Saúde Coletiva 2021; 26(Supl. 1):2543-2556.
5.Brasil. Cobertura da Atenção Básica. eGestor Atenção Básica, informação e gestão da Atenção Básica. Ministério da saúde Secretaria de Atenção Primária à Saúde (SAPS). 2021 [acessado 2023 Abr 27] Disponível em: https://egestorab.saude.gov.br/paginas/acessoPublico/relatorios/relHistoricoCoberturaAB.xhtml
6.Neves RG, Flores TR, Duro SMS, Nunes BP, Tomasi E. Tendência temporal da cobertura da Estratégia Saúde da Família no Brasil, regiões e unidades da federação, 2006-2016. Epidemiol. Serv. Saúde 2018, 27(3).
7.Hortelan, MS. Mapeamento de competências de gestores da atenção em municípios de região de fronteira [dissertação]. Foz do Iguaçu (PR): Universidade Estadual do Oeste do Paraná; 2019.
8.Bento, FR. O papel das cidades-gêmeas de fronteira na integração regional sul-americana. Conjuntura Austral 2015; 6(27):40-53.
9.Pinto CVS, Oliveira S, Marguti BO. Um estudo sobre as situações de vulnerabilidade social nos arcos da fronteira do Brasil. In: Pegô, B, Moura R, organizadores. Fronteiras do Brasil: uma avaliação de política pública. Rio de Janeiro: Ipea; 2018. p. 197-242.
10.Pego B, Moura R, Krüger C, Nunes M, Oliveira S, organizadores. Fronteiras do Brasil: diagnóstico e agenda de pesquisa para política pública. Brasilia: Ipea; 2017.
11.Brasil. Portaria nº 2.507, de 5 de outubro de 2021. Estabelece o conceito de cidades gêmeas nacionais, os critérios adotados para essa definição e lista todas as cidades brasileiras por estado que se enquadram nesta condição. Diario Oficial da União 2021; 05 out.
12.Santos-Melo GZ, Andrade SR, Meirelles BHS, Ortiga AMB. Integração em saúde: cooperação na tríplice fronteira internacional amazônica. Revista de Saúde Pública 2020,54(5):1-11, 2020.
13.Bonita R, Beaglehole, R, Kjellström T. Epidemiologia Básica. São Paulo: Grupo Editorial Nacional; 2010.
14.Malta M, Cardoso LO, Bastos FI, Magnanini MMF, Da Silva CMF. Iniciativa STROBE: subsídios para a comunicação de estudos observacionais. Rev. Saúde Publica 2010; 44(3): 559-565.
15.Calvo MCM, Lacerda JT, Colussi CF, Schneider IJC, Rocha TAHR. Estratificação de municípios brasileiros para avaliação de desempenho em saúde. Epidemiol. Serv. Saude 2016, 25(4):767-776.
16.Kessler M, Thume E, Duro SMS, Tomasi E, Siqueira FCV, Silveira DS, Nunes BP, Volz PM, Santos AA, França SM, Bender JD, Piccinini T, Facchini LA. Ações educativas e promoção da saúde em equipes do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica, Rio Grande do Sul, Brasil. Epidemiol. Serv. Saúde 2018, 27(2): 1-12.
17.Garnelo L, Lima JG, Rocha ESC, Herkrath FJ. Acesso e cobertura da Atenção Primária à Saúde para populações rurais e urbanas na região norte do Brasil. Saúde e Debate 2018, 42: 81-99.
18.Cecilio LCO, Reis AAC. Apontamentos sobre os desafios (ainda) atuais da atenção básica à saúde. Cad. Saúde Pública 2018; 34(8).
19.Pego B, Moura R, Nunes M, Krüger C, Nagamine L, Ferreira G; Moreira P. Fronteiras do Brasil: referências para a formulação de políticas públicas. Brasília: Ipea, 2021.
20.Gomes CBS, Gutiérrez AC, Soranz D. Política Nacional de Atenção Básica de 2017: análise da composição das equipes e cobertura nacional da Saúde da Família. Ciência & Saúde Coletiva 2020; 25(4):1327-1337.
21.Monteiro OH. Mortalidade Infantil em Cidades Gêmeas do Brasil [dissertação]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, 2021.
22.Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Estratégia de recursos humanos para o acesso universal à saúde e a cobertura universal de saúde. Washington: OPAS; 2017.
23.Soares CSA, Fonseca CLR, Nascimento JGS, Barbosa ACQ. Atração e retenção de profissionais de saúde na estratégia de saúde da família: uma revisão bibliográfica. Pista: Periódico Interdisciplinar 2020, 2(1): 8-26.






Outros idiomas:







Como

Citar

Conde, OLM, Prada, YLC, Derrosso, GS, Gamarra, CJ, la Rotta, EIG, Leandro, GCW, Rodríguez, A del PT, Luz, LDP. ANÁLISE DA COBERTURA DA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA DAS CIDADES GÊMEAS DO BRASIL 2016-2020. Cien Saude Colet [periódico na internet] (2025/mai). [Citado em 03/07/2025]. Está disponível em: http://cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/analise-da-cobertura-da-estrategia-saude-da-familia-das-cidades-gemeas-do-brasil-20162020/19621?id=19621

Últimos

Artigos



Realização



Patrocínio