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0087/2007 - Análise de fatores associados à não aceitação da vacina contra hepatite B em adolescentes escolares de baixa renda
Analysis of factors associated with no compliance to hepatitis B vaccine in low income scholar adolescents

Autor:

• sheila araujo teles - sheila araujo teles - Goiânia, Goiás - Universidade Federal de Goiás - <sheila@fen.ufg.br>


Área Temática:

Não Categorizado

Resumo:

Para avaliar os fatores de predição da não adesão à vacina contra o vírus da hepatite B (VHB) em adolescentes escolares de baixa renda da Região Metropolitana de Goiânia, Goiás, 304 indivíduos suscetíveis ao VHB, matriculados em duas escolas, foram entrevistados e a vacina contra hepatite foi oferecida. Somente 195 (64%) adolescentes aceitaram a primeira dose da vacina. Por outro lado, 182/195 (93,3%) receberam o esquema completo. Verificou-se que fatores escolares exerceram um papel na aceitação da vacina, uma vez que a escola B e turno noturno foram independentemente associados à não adesão à vacina. Os achados deste estudo ratificam a baixa aceitação da vacina contra hepatite B em adolescentes e evidencia a necessidade de programas de educação em saúde para sensibilização desse grupo em relação à vacinação, e reforçam a importância de estratégias de imunização na escola para o cumprimento do esquema completo da vacina contra o VHB nesta população-alvo.
Palavras chave: adolescentes, escolares, vacina contra hepatite B, adesão

Abstract:

To evaluate the predictor factors of no compliance with the vaccine against hepatitis B virus in low income scholar adolescents of Goiânia Metropolitan Region, Goiás, 304 VHB susceptible individuals matriculated in two schools were interviewed, and the HBV vaccine offered. Only 195 (64%) adolescents accepted the first vaccine dose. Otherwise 182/195 (93.3%) received the full HBV vaccine scheme. School factors played a role in vaccine acceptance since school B and evening shift were independently associated with no compliance with hepatitis B vaccination. The findings of this study ratify the low compliance with hepatitis B vaccine in adolescents, and highlight the necessity of health education programs to move this group concerning the hepatitis B vaccination, and reinforce the importance of school-based vaccination strategy to achieve full HBV immunization of this target population.
Key words: adolescents, scholar, hepatitis B vaccine, compliance with

Conteúdo:

Introdução

A infecção pelo vírus da hepatite B (VHB) é uma das principais causas de doença aguda e crônica do fígado, podendo evoluir ainda para cirrose e carcinoma hepatocelular, sendo considerada um importante problema de saúde pública em todo o mundo. Acredita-se que existam mais de 350 milhões de portadores crônicos do VHB, e que mais de 500 mil morram, anualmente, vítimas desta enfermidade1. No Brasil, o Ministério da Saúde estima que 15% da população já foram expostos ao vírus da hepatite B, e que 1% sofra de hepatite B crônica 2.
O vírus da hepatite B pode ser transmitido pelo contato com sangue ou outros fluidos corporais por meio das vias parenteral, sexual e vertical1. Assim, alguns grupos são particularmente suscetíveis a este agente, sejam pela adoção de comportamentos de risco como uso de drogas injetáveis ilícitas, múltiplos parceiros sexuais e relações sexuais desprotegidas, seja por condições de saúde que impliquem em transfusões sanguíneas freqüentes como doença renal crônica terminal ou pela atividade profissional como trabalhadores da saúde3. Ainda, estudos têm mostrado uma maior freqüência de positividade ao vírus da hepatite B em populações de baixa renda4,5.
Adolescentes têm sido considerados um grupo com risco elevado de exposição ao VHB, pois apresentam tendência a relações sexuais sem proteção e com múltiplos parceiros, experiências com drogas ilícitas e uso abusivo de álcool6,7. Além disso, os adolescentes são suscetíveis à pressão negativa de seus pares, sensação de invulnerabilidade e imortalidade, e apresentam dificuldades em associar comportamentos de risco atual e conseqüências futuras6. Assim, estudos têm mostrado um aumento da positividade para o VHB na adolescência que se estende até a idade adulta4,5.
A vacina contra o VHB é a forma mais eficaz para a prevenção da hepatite B e, tem proporcionado um grande avanço no controle desta enfermidade8. Assim, desde 1991, a Organização Mundial de Saúde tem recomendado a vacinação universal contra hepatite B, e mais de uma centena de países já incluíram esta vacina em seus Programas de Imunização 9. No Brasil, a mesma tem sido oferecida gratuitamente a grupos de risco desde o início da década de 90 e, mais recentemente, estendida a indivíduos com idade inferior ou igual a 20 anos em todas as regiões 10.
Estudos têm mostrado uma baixa cobertura vacinal contra hepatite B na população de adolescentes11,12. Segundo Schimidt & Middleman13, os jovens são resistentes à vacinação contra hepatite B, apesar do conhecimento do próprio risco de infecção pelo VHB. Contudo, indivíduos de baixa condição financeira têm sido mais suscetíveis a não vacinação14,15. Ainda, a baixa adesão à vacina tem sido atribuída ao longo período necessário para completar o esquema vacinal (três doses nos meses 0, 1 e 6)16,17 e o custo da vacina18. Ao contrário, programas de imunização em escolas parecem aumentar à adesão desse grupo a vacina contra o VHB, garantindo a administração do esquema vacinal completo16,19.
Em novembro de 2003, iniciou-se um estudo sobre a infecção pelo VHB em adolescentes escolares de uma região de baixa renda de Aparecida de Goiânia, uma cidade que compõe a Região Metropolitana de Goiânia. Após a identificação dos adolescentes suscetíveis, foi oferecida a vacina contra hepatite B no ambiente escolar. Nessa ocasião, investigou-se a aceitação da vacina contra hepatite B, bem como fatores de predição de não aceitação. Para o nosso conhecimento, este é o primeiro estudo sobre a adesão da vacina contra hepatite B em adolescentes de baixa renda em nossa região. Portanto, os resultados desta investigação poderão contribuir para implementação de estratégias que maximizem a cobertura vacinal nesta população-alvo.

Métodos
O presente estudo foi realizado de novembro de 2003 a novembro de 2004, em uma região de baixa renda de Aparecida de Goiânia, que compõe a Região Metropolitana de Goiânia, Goiás. A população de estudo constituiu-se de 304 adolescentes escolares de 12 a 19 anos, matriculados nas duas maiores escolas públicas da região do estudo, previamente identificados como suscetíveis ao VHB 20.
A autorização (idade igual ou superior a 18 anos) para entrevista e vacinação foi obtida por meio do termo de consentimento livre e esclarecido, após apresentação e esclarecimento de todo o projeto aos adolescentes escolares, pais ou responsáveis legais pelos mesmos.
Inicialmente, realizou-se a entrevista para coleta de dados sócio-demográficos (idade, gênero, naturalidade e renda familiar) e escolares (escola, turno e série escolar), utilizando-se um questionário pré-codificado. A seguir, foi oferecida a primeira dose da vacina contra hepatite B. Um mês e cinco meses após, os indivíduos foram contactados para receberem a segunda e terceira dose, respectivamente. Os mesmos procedimentos de abordagem e a mesma equipe de entrevistadores e aplicadores da vacina foram utilizados nas duas escolas e turnos.
Utilizou-se a vacina Butang®, produzida pelo Instituto Butantan, São Paulo, sendo a mesma administrada por via intramuscular nos meses: 0, 1 e 6. Esta vacina foi obtida por meio da Secretaria Municipal de Saúde de Aparecida de Goiânia-Goiás. Todos os procedimentos necessários para manutenção da rede de frio durante o transporte e administração do imunógeno foram respeitados, bem como os de biossegurança para a aplicação da vacina e descarte do material utilizado.
Os dados das entrevistas e os resultados da aceitação da vacina foram digitados em microcomputador e analisados nos programa estatísticos “epi info 6.04d” e SPSS versão 11.0. Foram consideradas como variável de desfecho a não aceitação da primeira dose da vacina contra hepatite B e, como variáveis de predição, as características sócio-demográficas dos adolescentes (gênero, idade e nível de escolaridade), bem como escola e turno. Inicialmente, foi realizada a análise univariada, estimando-se a chance (odds ratio) de não adesão à vacina contra hepatite B associada as variáveis investigadas. Posteriormente, as variáveis que mostraram associação estatística foram incluídas no modelo de regressão logística, passo a passo (Backward Likelihood). O teste de &#967;2 e o teste de t de Student foram utilizados para testar a significância de diferenças entre proporções e médias, respectivamente. Valores de p < 0.05 foram considerados estatisticamente significantes.
Este trabalho foi avaliado e aprovado pela Comissão de Bioética da Santa Casa de Misericórdia de Goiânia, protocolo 011/03.

Resultados
A média de idade do grupo estudado foi de 15,2 anos (desvio padrão de 2,0). Cento e sessenta e nove possuíam de 12 a 15 anos, e 135 de 16 a 19 anos. Houve uma distribuição homogênea entre os gêneros feminino e masculino. Ainda, a maioria era natural do Estado de Goiás, e somente 39/304 adolescentes pertenciam a famílias com renda superior a três salários mínimos. Com relação às escolas investigadas, 216 pertenciam à escola A e 88 à escola B, sendo que do total dos adolescentes matriculados em ambas as escolas, 241 freqüentavam o turno diurno (matutino ou vespertino). Quanto à escolaridade, 241/304 freqüentavam o ensino fundamental, e o restante o ensino médio (Tabela 1).
Dos 304 adolescentes previamente identificados como suscetíveis ao VHB, 105 (36%) não aceitaram a primeira dose da vacina contra hepatite B. Dos 195 (64%) que aderiram à vacinação contra hepatite B, 182 receberam as três doses da vacina, ou seja, 93,3% dos que iniciaram o esquema vacinal. O restante recebeu somente duas doses (10/13) ou apenas uma única dose (3/13). Dor no local da aplicação foi a única queixa referida pelos participantes.
Verificou-se diferença entre as proporções de adolescentes que aceitaram a vacina contra hepatite B e os que não aceitaram em relação ao gênero, nível escolar, turno e escola (P<0,05) (Tabela 1). Essas e idade foram incluídas em um modelo de regressão logística. Assim, após controle das variáveis de confusão, somente turno e escola mostraram-se como fatores independentemente associados à não adesão à vacina contra hepatite B. Dessa forma, a chance de não aceitar a vacina foi 2,23 (IC 95%: 1,14-4,35) vezes maior em indivíduos que estudavam no período noturno quando comparados aos do período diurno. Ainda, alunos que freqüentavam a escola B apresentaram 1,78 (IC 95%: 1,05-3,02) vezes mais chance de não aderirem à vacina do que aqueles da escola A.

Discussão
Estudos têm mostrado os adolescentes como um grupo de risco elevado para infecção pelo VHB, principalmente os de menor poder aquisitivo4,5,7. Em regiões de endemicidade baixa, como Goiânia 21, os casos de hepatite B aguda ocorrem geralmente em adolescentes e jovens adultos7. Assim, programas de prevenção contra esta infecção, incluindo a vacinação contra o VHB devem ser prioritários para essa população.
Trezentos e quatro adolescentes escolares foram identificados previamente como suscetíveis à hepatite B20 sendo, então, oferecida a vacina contra o VHB. Contudo, somente 195 (64%) aceitaram receber a primeira dose do imunógeno. Outros autores também têm mostrado uma baixa adesão à vacina contra hepatite B em adolescentes, principalmente, nos de baixa renda14,22, evidenciando, assim, a necessidade de políticas públicas que garanta a vacinação dessa população-alvo.
Além da baixa participação, um outro problema enfrentado na vacinação contra hepatite B em adolescentes tem sido a conclusão do esquema vacinal. O longo período entre a segunda e terceira dose tem sido apontado como um obstáculo para o alcance deste objetivo17,23. Contudo, nesta investigação, dos 195 estudantes que aceitaram a primeira dose, 182 (93,3%) completaram o esquema vacinal, ratificando, assim, estudos prévios conduzidos em países desenvolvidos aonde a escola tem sido apontada como um local que facilita o cumprimento das três doses da vacina16,23. De fato, a concentração de adolescentes num mesmo local e período (ano escolar) facilitam o seguimento e controle dos alunos, garantindo assim, a administração da série completa de doses requeridas para imunização contra o VHB.
Nesta investigação, idade e gênero não tiveram impacto na aceitação da vacina contra hepatite, embora o gênero feminino mostrasse uma tendência à não aceitação. Um questionário aplicado em 17.603 adolescentes em Michigan, E.U.A., para avaliar fatores de risco associados à não aceitação da vacina, revelou que os homens foram significativamente mais prováveis do que as mulheres (43,2%) em aceitar a vacina contra hepatite B (&#967;2 = 175,16; p < 0,01)17. Contudo, estudos têm mostrado que, a partir do momento que a adolescente inicia o esquema vacinal, ela tem mais probabilidade de concluí-lo quando comparadas aos rapazes15,22. Na presente investigação, dos 13 adolescentes que não concluíram o esquema, nove eram homens. Portanto, mais estudos são necessários para avaliar a real participação do gênero na aceitação da vacina contra o VHB em nossa região.
Fatores como escola e turno foram independentemente associados à não adesão à vacina contra hepatite B. A escola é o local onde o adolescente adquire informações e conhecimentos necessários à sua vida social e pessoal, bem como estabelecem relações interpessoais, que influenciarão no seu comportamento. Segundo o Modelo Ecológico Comportamental (BEM), influências culturais e de amigos, história de punição, família, mídia e o próprio ambiente escolar podem influenciar na probabilidade do indivíduo adotar um comportamento de risco em particular24, neste caso, a não aceitação da vacina contra hepatite B. De fato, durante o desenvolvimento do estudo, verificou-se um envolvimento menor dos professores e supervisores pedagógicos da escola B com relação à vacinação contra hepatite B, e isso pode ter influenciado os resultados encontrados nessa unidade de ensino.
Em relação aos achados do turno escolar, estudos têm mostrado uma freqüência maior de comportamentos de risco como uso de drogas ilícitas e outras substâncias psicoativas em indivíduos que freqüentam a escola no período noturno quando comparados aos que estudam no período diurno 25-28. Isso talvez possa explicar os resultados deste estudo, uma vez que esses comportamentos têm sido associados a uma menor aceitação da vacina contra hepatite B6. Portanto, o desafio é a criação de estratégias de educação em saúde, que promovam a mudança de comportamento do adolescente, superando, modificando e moldando positivamente a influência do ambiente.


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Citar

sheila araujo teles. Análise de fatores associados à não aceitação da vacina contra hepatite B em adolescentes escolares de baixa renda. Cien Saude Colet [periódico na internet] (2007/fev). [Citado em 19/07/2025]. Está disponível em: http://cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/analise-de-fatores-associados-a-nao-aceitacao-da-vacina-contra-hepatite-b-em-adolescentes-escolares-de-baixa-renda/525?id=525

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