0216/2006 - Medicamentos Genéricos no Brasil: Impactos das Políticas Públicas sobre a Indústria Nacional
Generic Medicines in Brazil: Impact of Public Policies over Nacional Industry
Autor:
• Jussanã Cristina de Abreu - Abreu, J.C. - Rio de Janeiro, Rio de Janeiro - Agência Nacional de Vigilância Sanitária - <jussana.abreu@anvisa.gov.br>Área Temática:
Não CategorizadoResumo:
ResumoO presente artigo faz eco a trabalhos recentes da Abrasco1, Gadelha2 e Guimarães3 que enfatizam a necessidade de uma maior integração entre as políticas voltadas para o desenvolvimento do sistema de saúde e aquelas voltadas para a promoção do desenvolvimento industrial e da inovação, como forma de garantir para o país os benefícios econômicos gerados pelos gastos em saúde, assegurando a continuidade da política social, num círculo virtuoso.
Embora apresente o caso dos medicamentos genéricos como uma experiência de sucesso na integração das políticas sociais voltadas para um maior acesso da população a medicamentos com qualidade garantida, com as políticas econômicas voltadas para o desenvolvimento industrial, discute os impactos e as limitações da política dialogando com a análise da competitividade da indústria de medicamentos genéricos brasileira realizada por Abreu4.
Palavras-chave: Políticas Públicas, Política de Medicamentos, Medicamentos Genéricos
Abstract:
This paper echoes recent work by Abrasco1, Gadelha2 and Guimarães3 which emphasize the need for a better integration between health policies and industrial development and innovation policies as the only way to keep in the country the economic benefits generated by health expenditures,instead of letting them go away through imports. Besides, growing tradedeficits may threaten the continuity of the social policy.
Although presenting the generic drug policy as a successful case in integrating social policies aiming better population access to assurance drugs with economic policies aiming industrial development, it discusses impact and limitations of the refered policy in a dialog with Abreu´s4
analysis of industrial competitiveness in the generic segment.
Key words: Public Policies, Medicine Policy, Generic Medicines
Conteúdo:
O presente artigo faz eco a trabalhos recentes da Abrasco1, Gadelha2, Guimarães3 que enfatizam a necessidade de uma maior integração entre as políticas voltadas para o desenvolvimento do sistema de saúde e aquelas voltadas para a promoção do desenvolvimento industrial e da inovação, como forma de garantir para o país os benefícios econômicos gerados pelos gastos em saúde.
As políticas de saúde e as políticas industriais enfrentam claros conflitos, já em seus objetivos primeiros: o governo, ao mesmo tempo em que busca a contenção dos custos para fazer frente aos orçamentos crescentes da saúde, é responsável pelo apoio à indústria, dentre elas as da saúde, como apontam Vandergrift et al5. Sua integração, entretanto, é tão delicada como necessária, dado que o segmento de assistência à saúde e os segmentos industriais que o abastecem são elos de uma mesma cadeia produtiva. A favor desta integração está ainda o fato de o governo desempenhar papel forte na dinâmica desses setores, através da prestação de serviços assistenciais, da compra de bens e serviços e das atividades regulatórias, que delimitam as estratégias dos agentes econômicos, como observa Gadelha2.
Alguns países conseguiram avançar na elaboração de políticas integradas, potencializando os benefícios econômicos e sociais advindos das ações empreendidas. No Brasil, entretanto, estas duas dimensões não são articuladas e a demanda originada dos avanços na área da saúde tem sido atendida por produtores estrangeiros, traduzindo-se em crescentes déficits comerciais que ameaçam o avanço do próprio sistema de saúde conforme observou Gadelha2.
Este artigo apresenta o caso dos medicamentos genéricos como uma experiência de sucesso na integração das políticas sociais voltadas para um maior acesso da população a medicamentos, e a medicamentos com qualidade garantida, com as políticas econômicas voltadas para o desenvolvimento industrial. Chama atenção, entretanto, para suas limitações, ao dialogar com a análise da competitividade da indústria de medicamentos genéricos brasileira realizada por Abreu4. Esta análise é desenvolvida segundo duas dimensões: uma relativa à estrutura industrial e outra relativa ao perfil das empresas que a compõe.
A partir da identificação dos fatores de competitividade nestas duas dimensões, discute-se os impactos e as limitações das políticas públicas para o desenvolvimento da indústria nacional.
Os medicamentos genéricos
Até o final da década de 1990, o mercado brasileiro oferecia dois tipos de medicamentos:
a - os medicamentos lançados originalmente pelas empresas líderes da indústria mundial, com marca própria e de conhecimento disseminado, registrados junto ao órgão federal responsável pela vigilância sanitária, cuja eficácia, segurança e qualidade foram comprovados cientificamente. No Brasil estes medicamentos são denominados de “inovadores”, se bem que esta denominação seja errônea e pouco precisa, uma vez que a maioria se encontra fora do período de proteção patentária, sendo, portanto, fruto de esforços de inovação já explorados num passado remoto; e
b - cópias destes medicamentos, chamados “similares”, contendo os mesmos princípios ativos, na mesma concentração e forma farmacêutica que o medicamento inovador, sendo normalmente lançados por empresas de porte médio e pequeno, com alta predominância de capital nacional, firmas marginais do ponto de vista da liderança e da estrutura empresarial, que lançam marcas próprias e que competem nas “franjas” do mercado farmacêutico.
Com o intuito de assegurar a oferta de medicamentos de qualidade e baixo custo no mercado e de fomentar o acesso da população a estes medicamentos, são estabelecidos, por Lei6, os medicamentos genéricos. Sua intercambialidade com o medicamento de referência é assegurada por testes de equivalência farmacêutica e bioequivalência realizados por laboratórios credenciados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa e sua qualidade pelo monitoramento das unidades produtivas quanto ao atendimento das Boas Práticas de Fabricação – BPF, de acordo com ANVISA7.
A lei dos genéricos obriga que as aquisições de medicamentos e as prescrições médicas, no âmbito do SUS, adotem a denominação do princípio ativo; que, nas compras do SUS, se dê preferência ao medicamento genérico quando houver igualdade de preço e demais condições de aquisição; obriga a Anvisa a editar, periodicamente, a relação dos genéricos já registrados no país.
Ao lado disso, o apoio do governo aos medicamentos genéricos, através do esclarecimento da população e da sua promoção junto aos seus diversos públicos e junto às farmácias, levou a seu sucesso no mercado. O varejista, pressionado pela demanda, abriu espaço para os medicamentos genéricos fato abordado por Abreu4.
De forma a facilitar a identificação destes medicamentos, adotou-se embalagem externa personalizada, criando-se um padrão para as embalagens de todos os medicamentos genéricos comercializados no mercado brasileiro. Segundo ANVISA8), na embalagem externa deve constar uma tarja amarela com a grafia da mensagem “Medicamento Genérico” e a letra “G” em destaque.
No que tange aos medicamentos similares, a Anvisa vetou por instrumento legal9, a partir de setembro de 2002, a comercialização daqueles cujas embalagens apresentassem apenas o nome do principio ativo.
Além disso, o apoio à indústria nacional permitiu que empresas brasileiras ganhassem competitividade e, pela primeira vez em décadas, aumentassem sua participação neste mercado, mantendo no país os empregos e a renda gerados. Entre outras ações, foram abertos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES, a partir de 2001, dois programas de apoio às atividades da indústria farmacêutica de medicamentos genéricos, a saber: apoio à produção e registro de medicamentos e apoio à importação de equipamentos. As empresas nacionais foram as principais beneficiadas com as linhas de financiamento do BNDES, dentre elas a líderes de mercado de medicamentos genéricos: Medley, EMS Sigma Pharma, Eurofarma e Biosintética, que modernizaram suas plantas industriais e incrementaram a capacitação tecnológica, fazendo frente às empresas de grupos multinacionais instaladas no país, como verificado por Abreu4.
Do ponto de vista da política tecnológica, a iniciativa mais relevante se refere à montagem de toda uma infra-estrutura de pesquisa e serviços tecnológicos para apoiar esta indústria através, da capacitação de instituições públicas e privadas para a realização de ensaios de equivalência farmacêutica e bioequivalência, embora esta estrutura ainda seja frágil em algumas áreas.
Ampliação da oferta de genéricos: benefícios para o consumidor e desafios para a saúde pública
Na análise econômica convencional, a regulação do mercado, seja por instrumentos diretos (por exemplo, pela ação de agências reguladoras) ou por medidas que incidem na estrutura industrial e nas estratégias competitivas, como é o caso do estímulo à produção de genéricos, pode beneficiar os consumidores em termos da redução de preços e na quantidade consumida. Assim sendo, “o objetivo da política seria obter ganhos para a população em dois níveis. Por um lado, o oferecimento de medicamentos mais baratos, com garantia de qualidade ampliaria o excedente do consumidor. Por outro, na medida em que a elasticidade-preço da demanda fosse elevada, haveria ampliação do consumo e, por conseqüência, do conjunto da população que tem acesso a tratamento por intermédio de medicamentos.” Hasenclever10.
Efetivamente, os preços dos medicamentos genéricos mantiveram-se cerca de 40% inferiores aos preços dos medicamentos de referência entre os anos de 2000 e 2003 conforme ANVISA11. Tal parâmetro como preço de entrada foi induzido pelo governo quando da inserção desses produtos no mercado fato apontado por Hasenclever10. Para alguns casos, os resultados seriam significativamente mais positivos segundo análise da ANVISA11.
A evolução da produção de medicamentos genéricos foi expressiva, partindo de 2,7 milhões de unidades em junho de 2000 para 200 milhões de unidades em dezembro de 2005 de acordo com Abreu4 e PróGenéricos12. Embora grande parte deste crescimento tenha se dado às expensas dos medicamentos de referência (Figura 1), segundo Hasenclever10, haveria ainda correlação positiva e estatisticamente significativa entre a introdução de genéricos e a taxa de crescimento da quantidade de medicamentos vendida, observada dentro de cada conjunto de medicamentos com princípios ativos iguais e formas de apresentação semelhantes. Em conclusão, teria havido não só redução de preços, como também aumento do consumo.
Figura 1: Evolução da Participação dos Medicamentos Genéricos – M US$ (2001 – 2005)
Todavia, em se tratando de uma atividade industrial que está inserida no Sistema Nacional de Inovação e no Sistema de Saúde proposto por Albuquerque et al14 e Gadelha et al2, torna-se necessário inserir outras dimensões relacionadas ao seu impacto nas condições de saúde e na capacitação dinâmica dos agentes locais. Em relação ao sistema de saúde, isto requer uma análise da forma como os produtos estão sendo priorizados para sua introdução no sistema, público ou privado. Ou seja, a simples expansão do consumo e a redução de preços pode ter pouco impacto nas condições de saúde se estiverem ausentes critérios cientificamente baseados de avaliação tecnológica. Do ponto de vista do Sistema de Inovação, é necessário pensar se as atividades industriais que estão sendo desenvolvidas trazem benefícios para o aprendizado e para as estratégias locais de inovação, uma vez que a maior fragilidade do complexo industrial da saúde é a reduzida base local e empresarial de inovação.
Feitas estas qualificações, uma análise que se restrinja apenas às dimensões econômicas convecionais, mostra uma situação que está evoluindo de modo favorável e que pode ser a base para ações mais abrangentes relacionadas aos objetivos constitucionais de universalização do acesso e de equidade na estruturação do Sistema Único de Saúde no Brasil e à competitividade local em termos dinâmicos e com foco na inovação.
Fortalecimento da indústria nacional
A mobilização da indústria aos incentivos governamentais foi rápida. A Figura 2 apresenta a evolução do número de registros de medicamentos genéricos e das empresas atuantes na indústria. O número de empresas passou de 16 em dezembro de 2000 para 66 em maio de 2006 e as apresentações comercializadas, de 563 para 10126 no mesmo período.
Figura 2: Evolução do Mercado de Medicamentos Genéricos (Fev/2000 - Mai/2006): Empresas x Apresentações
As empresas pioneiras na indústria de genéricos no Brasil foram empresas nacionais e se consolidaram rapidamente. Segundo a Tabela 1, dentre as 5 empresas que lideravam a posição no mercado no período de agosto de 2002 a agosto de 2005, quatro eram nacionais: Medley, Ems Sigma Pharma, Biossintética e Eurofarma, respondendo por cerca de 73% de participação do mercado brasileiro de medicamentos genéricos em valor no período. As 10 maiores empresas concentravam 96% do mercado.
O sucesso dos medicamentos genéricos no Brasil levou, inclusive, a empresa EMS Sigma Pharma a figurar entre as dez empresas líderes da indústria farmacêutica total brasileira, dominado por multinacionais, ao lado da Aché (Tabela 2).
Tabela 1: Participação das Empresas no Mercado de Medicamentos Genéricos (Vendas: Ago/02 – Ago/05)
Tabela 2: Principais Empresas da Indústria Farmacêutica Brasileira, Mercado Total, Ano 2003 –Faturamento (US$ mil)
A exigência dos estudos de equivalência farmacêutica (onde é verificado se o medicamento genérico contém o mesmo fármaco, na mesma quantidade e forma farmacêutica que o medicamento de referência) e bioequivalência (onde é verificado se o medicamento genérico e o medicamento de referência, ao serem administrados na mesma dose e nas mesmas condições experimentais, não apresentam diferenças estatisticamente significativas em relação à biodisponibilidade, avaliada a partir da velocidade e extensão de absorção do princípio ativo, a partir de sua circulação sistêmica ou sua excreção na urina) levou à criação de toda uma infra-estrutura de serviços tecnológicos para apoio a esta indústria.
Os centros de equivalência farmacêutica fazem parte da Rede Brasileira de Laboratórios Analíticos em Saúde - Reblas, rede de laboratórios públicos e privados credenciados pela Anvisa para apoio ao controle de produtos sujeitos à vigilância sanitária, que demonstram competência técnica para realizar os estudos e análises a que se propõem e atendem aos princípios fundamentais da gestão da qualidade analítica e as Boas Práticas de Laboratórios – BPL. Os centros de equivalência farmacêutica certificados em junho de 2006 chegavam a 39, em sua maioria pertencentes a empresas farmacêuticas segundo dados da ANVISA15.
No que diz respeito à bioequivalência, em junho de 2006 eram 26 os centros nacionais certificados e 3 aqueles em processo de certificação. Em virtude dos gargalos ainda existentes nessa área no Brasil, a Anvisa certifica também centros estrangeiros, contando com 7 centros estrangeiros certificados e 3 em processo de certificação no mesmo período (metade deles localizados na Índia). Os centros são certificados a partir da comprovação de cumprimento das normais nacionais e internacionais de pesquisa clínica e dos regulamentos técnicos vigentes pertinentes aos ensaios de biodisponibilidade / bioequivalência emitidos pela ANVISA16. A participação dos centros públicos - localizados em universidades ou hospitais universitários – é maior neste segmento, chegando quase a 50% do número total de centros nacionais credenciados.
A consolidação desta infra-estrutura técnica de apoio à indústria já está permitindo a extensão aos medicamentos similares da exigência quanto à realização de testes de equivalência farmacêutica e biodisponibilidade relativa, até então só cabíveis para os medicamentos genéricos. Com isso amplia-se o controle da qualidade a todos os medicamentos comercializados no Brasil.
Alcance e Limites da Política de Genéricos
Do ponto de vista da política industrial, o impacto da política de genéricos foi positivo, tendo representado um nicho ou “janela de oportunidade” para a promoção da competitividade das empresas brasileiras.
Promover a competitividade das empresas significa, segundo Ferraz et al.17, ajudá-las a antecipar e se adaptar aos fatores críticos de sucesso em seu mercado, obtendo, assim, maior lucratividade e recursos para crescer.
“A capacidade de as firmas competirem nos mercados pode ser fortalecida se o regime de incentivos e regulação a que estão sujeitas for eficaz. Os incentivos visam aumentar a capacidade de resposta das empresas diante dos desafios impostos pela economia e as regulações buscam condicionar as suas condutas em direções socialmente desejáveis. ... Tomadores de decisão públicos e privados devem, então, entender quais fatores, devidamente incentivados ou controlados, resultarão em maior capacidade de resposta aos desafios competitivos.” Ferraz et al17
A análise do caso dos medicamentos genéricos empreendida por Abreu4 mostra que as empresas nacionais analisadas tiveram plenas condições de responder aos desafios que lhes foram colocados:
 A competição é fortemente baseada em preço, sendo importante a capacitação em produção, para alcançar os menores custos. As empresas líderes na produção de medicamentos genéricos dominam as tecnologias de formulação, dispõem de equipamentos novos e utilizam a capacidade produtiva de forma racional.
 o acesso aos canais de distribuição é uma das mais fortes barreiras à entrada de novos competidores, por serem bastante concentrados (de acordo com Langshwager18, os 20 maiores distribuidores concentram 89% do negócio). O fato de as empresas líderes na indústria de medicamentos genéricos terem entrado na indústria através da produção e comercialização de medicamentos similares facilitou o acesso aos canais de distribuição de seus medicamentos genéricos.
 O pioneirismo no lançamento de um novo medicamento genérico no mercado também é considerado um fator de competitividade empresarial. As empresas acreditam que aquelas que chegam primeiro ao mercado obtêm lucros superiores às demais. As próprias empresas nacionais atribuem sua posição de liderança no mercado brasileiro à vanguarda de atuação no segmento no ano de 2000.
Limites
O sucesso, entretanto, parece levar a uma acomodação.
Um ponto comum em todas as empresas analisadas é a perspectiva positiva quanto à expansão da indústria de medicamentos genéricos no Brasil e ao aumento da participação desta no mercado total da indústria de medicamentos. Em linhas gerais, pretendem aproveitar o boom do mercado com a configuração atual e não vislumbram modificações no modo de encarar o desenvolvimento deste mercado no Brasil, embora acreditem que a competição deverá se acirrar devido à entrada de novos competidores de atuação global, tais como a Apotex, Ranbaxy, Cinfa, Hexal e Rathiophama, e à estabilização do número de competidores para os próximos anos. Colocam-se como o grande desafio para se manterem na liderança com a entrada desses competidores, a construção de estratégias empresariais cada vez mais agressivas, como as deles.
Ressalte-se que o porte das empresas nacionais é marginal face àquele das empresas de atuação global. Como exemplo: as vendas da empresa israelense Teva Pharmaceutical no ano de 2002 que foram de US$ 2,5 bilhões segundo SEC19, comparando-se com os US$ 61 milhões da empresa que mais vendeu no mercado nacional no período, a Medley. Além disso, tem ficado patente nos últimos anos um processo de mudança estrutural na indústria mundial de genéricos, que tem levado a um aumento expressivo do porte dos competidores. Os movimentos de aquisição têm sido freqüentes e passaram a incluir iniciativas dos competidores líderes da indústria farmacêutica. Cite-se a consolidação pela Novartis da sua divisão de genéricos Sandoz, que incorporou competidores importantes como Hexal e Eon Labs, tornando-se, ao lado da Teva Pharmaceutical (que também realizou aquisições importantes recentemente) as duas maiores empresas da indústria com vendas, cada uma delas da ordem de US$ 5 bilhões20,21. Faz-se necessário, uma revisão das suas estratégias de negócio para impedir que as empresas de atuação global não invertam o jogo até agora dominado pelas empresas nacionais.
Ainda assim, as empresas analisadas não pretendem mudar seu padrão de atuação:
 Com exceção das duas maiores empresas nacionais, a Medley e a EMS Sigma Pharma, as empresas entrevistadas não pretendem exportar medicamentos genéricos e tal fato foi atribuído à falta de um estímulo para a exportação, devido ao grande número de tributos que as empresas nacionais precisam desembolsar, ao risco envolvido em uma estratégia internacional e às barreiras sanitárias existentes entre os países. Medley e EMS Sigma Pharma iniciaram sua inserção no mercado europeu, que responde por US$10 bilhões/ ano de medicamentos genéricos, através de Portugal. Para isto, as empresas precisam adequar os produtos e as instalações produtivas dentro dos requisitos dos órgãos de vigilância sanitária dos países que pretender comercializar. Na EMS Sigma Pharma o processo encontra-se na fase de certificação da planta pela Infarmed, órgão de vigilância sanitária português, mas a empresa já distribui produtos em Portugal através da divisão Germed Ltda. desde setembro de 2004. A Medley já possui contratos para exportação de genéricos para a Venezuela, México, Argentina e Chile conforme publicado na Folha de São Paulo22.
 Não pretendem verticalizar a produção, produzindo matérias-primas e intermediários de síntese (indústria farmoquímica), um contraste com as empresas especializadas em medicamentos genéricos de atuação global, como por exemplo, a Ranbaxy e a Teva. A verticalização é vista com receio pelas empresas, que alegam que o investimento para competir em porte com as empresas já atuantes no segmento farmoquímico é proibitivo para as empresas líderes da indústria de medicamentos genéricos no Brasil.
 Poucas das empresas analisadas possuem ações efetivas para atuar e ser reconhecidas como empresas produtoras de medicamentos inovadores. As demais pretendem continuar como produtoras de genéricos. Porém todas as empresas buscam ser pioneiras no lançamento de medicamentos genéricos de maior valor agregado.
Os limites da política ficam, assim,claros:
 O jogo competitivo pode virar dentro da indústria: os produtores de atuação global podem passar a se beneficiar mais do crescimento do mercado brasileiro. Para que tenha efeito contínuo, o estímulo tem que ser contínuo. Deve, dessa forma, adequar-se à fase de desenvolvimento e ao momento competitivo da indústria. Talvez neste momento, o apoio às empresas do segmento pudesse estar voltado para as exportações, por exemplo. Mas a falta de apoio adequado pode levar a uma situação vantajosa para os competidores globais que ora se instalam no Brasil na apropriação dos benefícios gerados pelo crescimento do mercado brasileiro.
 Uma indústria de genéricos consolidada pode ser uma condição para o estabelecimento de uma produção nacional de fármacos, segmento priorizado pela atual política industrial. “O genérico estimula a produção do fármaco e diminui as importações. A empresa multinacional vai trazer o fármaco da sua matriz ou de alguma filial. A nacional é que vai comprar o fármaco do produtor brasileiro” UNICAMP23.
Mas, embora necessário, o incentivo aos genéricos, por si só, não incentiva os fármacos, uma vez que as empresas nacionais de genéricos não se dispõem a entrar nesse segmento, bastante diferente daquele em que atuam até o momento.
 O incentivo aos genéricos também não toca na questão da inovação, do desenvolvimento de novas moléculas, o cerne da competição na arena mais nobre e lucrativa da indústria farmacêutica. Ao contrário, não há nem mesmo a possibilidade de inovação incremental em genérico, pois ele deixaria de ser “cópia idêntica” do medicamento de referência, se bem que a própria produção do genérico constitua uma inovação para a empresa produtora.
Não se pode apostar que se incentivando os medicamentos e as empresas de genéricos estas se engajariam no desenvolvimento de atividades de P&D voltadas para o desenvolvimento de novas moléculas – poucas têm essa intenção. A arena competitiva é outra, os fatores críticos de sucesso são outros e as empresas de genéricos não se sentem nem capacitadas nem atraídas a atuar nessa outra arena. Os incentivos para a inovação têm que ser específicos.
Mas essas poucas que estão começando a investir em P&D buscando a inovação merecem ser incentivadas, pois são os casos mais promissores.










