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Artigos

0283/2024 - O efeito das redistribuições dos códigos garbage na evolução da mortalidade por Doenças Crônicas no Brasil, 2010 a 2019
The effect of redistributions of garbage codes on the evolution of mortalityChronic Diseases in Brazil, 2010 to 2019

Autor:

• Deborah Carvalho Malta - Malta, D.C - <dcmalta@uol.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8214-5734

Coautor(es):

• Renato Azeredo Teixeira - Teixeira, R. A. - <renato115@yahoo.com>
ORCID: http://orcid.org/0000-0002-1259-6812

• Juliana Bottoni de Souza - Souza, J.B - <juliana_bottoni@yahoo.com.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9308-7445

• Érika Carvalho de Aquino - Aquino, E.C - <erikaaquino345@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5659-0308

• Ademar Barbosa Dantas Júnior - Dantas Júnior, A. B. - <abarbosadantasjunior@gmail.com.>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9632-6432

• Adauto Martins Soares Filho - Soares Filho, A. M. - <afilho_2006@hotmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0917-7473

• Elisabeth Barboza França - França, E. B. - <efranca.med@gmail.com.>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6984-0233

• Ana Maria Nogales Vasconcelos - Vasconcelos, A. M. N. - <nogales@unb.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7589-107X

• Maria de Fátima Marinho de Souza - Souza, M. F. M. - <mfmsouza@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3287-9163

• Lenice Harumi Ishitani - Ishitani, L. H. - <lenice.ishi@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7165-4736

• Crizian Saar Gomes - Gomes, C. S. - <criziansaar@gmail.com, criziansaar@hotmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6586-4561

• Marli de Mesquita Silva Montenegro - Montenegro, M. M. S. - <marlimontenegro@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6390-0901

• Valdelaine Etelvina Miranda de Araújo - Araújo, V. E. M. - <valdelaine.miranda@gmail.com.>
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1263-1646

• Shirlei Moreira da Costa Faria - Faria, S. M. C. - <shirleidacosta16@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7901-4098

• Bruce Bartholow Duncan - Duncan, B. D. - <bbduncan@ufrgs.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7491-2630

• Antonio Luiz Pinho Ribeiro - Ribeiro, A. L. P. - <tom1963br@yahoo.com.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2740-0042



Resumo:

O estudo objetivou estimar a mortalidade prematura (30 a 69 anos) por quatro grupos prioritários de DCNT no Brasil, no período de 2010 a 2019, comparando dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) brutos, sem correção, dados do SIM corrigidos pela redistribuição dos CG e sub-registro e dados extraídos do estudo Carga Global de Doenças (GBD). As taxas de mortalidade prematura por DCNT mostraram redução no período analisado. Embora os métodos de correção tenham modificado pouco as tendências temporais, foi observado as taxas de mortalidade calculadas com os dados corrigidos foram expressivamente maiores que as sem correção. Essa variação foi heterogênea entre as Unidades Federadas. As taxas estimadas pelo método do SIM bruto variaram de 322,0 a 276,1 óbitos por 100 mil habitantes, enquanto as taxas do SIM redistribuído foram de 340,4 a 296,8 óbitos por 100 mil habitantes. As taxas estimadas para o GDB variaram de 371,6 a 323,0 óbitos por 100 mil habitantes. Em conclusão o presente estudo destaca a importância de se adotar métodos que possam ser aplicados para que tenhamos estatísticas relacionadas à mortalidade mais fidedignas, o que contribui para a melhoria contínua da definição das causas de morte no SIM.

Palavras-chave:

Doenças Crônicas Não Transmissíveis; Estatísticas vitais; Causa da morte; Precisão de dados; Sistemas de informação em Saúde

Abstract:

The study aimed to estimate premature mortality (30 to 69 years) for four priority groups of NCDs in Brazil,2010 to 2019, comparing datathe Mortality Information System (SIM) raw, uncorrected, SIM data corrected by GC redistribution and under-registration and data extractedthe Global Burden of Disease (GBD) study. Premature mortality rates due to NCDs showed a reduction in the period analyzed. Although the correction methods changed temporal trends little, it was observed that mortality rates calculated with corrected data were significantly higher than those without correction. This variation was heterogeneous among the Federated Units. The rates estimated by the raw SIM method ranged322.0 to 276.1 deaths per 100 thousand inhabitants, while the redistributed SIM rates ranged340.4 to 296.8 deaths per 100 thousand inhabitants. The estimated rates for the GDB ranged371.6 to 323.0 deaths per 100 thousand inhabitants. In conclusion, this study highlights the importance of adopting methods that can be applied so that we have more reliable statistics related to mortality, which contributes to the continuous improvement of the definition of causes of death in the SIM.

Keywords:

Noncommunicable Diseases; Vital statistics; Cause of death; Data accuracy; Health Information Systems

Conteúdo:

INTRODUÇÃO
As estatísticas de mortalidade têm importância fundamental e bem estabelecida para a compreensão da situação de saúde de uma população, em especial para a vigilância de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT)1,2. A análise das causas de morte permite que se mensure os principais problemas que afetam a saúde de uma população. Por meio da estimativa das taxas de mortalidade, é possível mensurar os riscos de morte a que estão expostos diferentes grupos populacionais, além de possíveis desigualdades entre os grupos, períodos, gerações ou localidades3. Tais taxas podem subsidiar, ainda, o direcionamento de prioridades em políticas relacionadas aos serviços de saúde, bem como análises de situação, planejamento e avaliação das ações e programas na área4,5.
Criado em 1975, o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) permite o armazenamento e monitoramento contínuo dos dados sobre óbitos no Brasil, constituindo uma importante ferramenta para a vigilância em saúde no país6. Apesar de ser considerado um sistema consolidado, o SIM ainda apresenta desigualdades regionais no que se refere à cobertura e qualidade dos dados7. É consenso que, para que o SIM tenha um desempenho adequado, as declarações de óbito e as fichas de investigação (documentos base do sistema) devem apresentar informações precisas sobre a causa básica dos óbitos8.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define causa básica de óbito como (a) a doença ou lesão que iniciou uma sucessão de eventos que culminaram na morte ou (b) nos casos de acidentes ou violências, as circunstâncias que produziram a lesão ou lesões fatais9. Embora as causas básicas de óbito sejam codificadas por meio da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, 10ª Revisão (CID-10), esta não fornece apenas códigos adequados para declarar a causa subjacente da morte. Também há códigos para doenças não fatais, além de sinais, sintomas e complicações10. Estes códigos, chamados de Códigos Garbage (CG) não são adequados para o preenchimento da causa básica de óbito, posto que fornecem informações pouco úteis ao direcionamento de ações em saúde pública11, dificultando a identificação das reais doenças e agravos que desencadearam o óbito12,13.
Uma alta proporção de CG limita a utilidade das estatísticas de mortalidade, minando a sua importância como fonte primária de informação para o planejamento e avaliação de políticas e intervenções de saúde6,14. Nesse sentido, diferentes abordagens têm sido utilizadas para classificar e reduzir o impacto dos CG, geralmente envolvendo sua redistribuição para códigos de causas de óbito plausíveis15, com consulta aos especialistas, redistribuição proporcional fixa e redistribuição proporcional computada com base nas informações da cadeia de causa de morte e modelos de regressão16. No estudo Global Burden of Disease (GBD) 2019, a redistribuição dos CG foi feita com base em pesos gerados por modelos estatísticos e redistribuídos por algoritmos nos grupos das causas definidas17,18. Embora tal estudo seja considerado como o padrão-ouro no que se refere à redistribuição de CG, é necessário que os países avancem na implementação e melhoria de metodologias próprias, adequadas à realidade local19.
As doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) representam a maior causa de morbimortalidade no Brasil e no mundo, resultando em mortes, incapacidades, perda da qualidade de vida e importantes impactos econômicos20,21. Estima-se que, anualmente, as DCNT sejam responsáveis por 41 milhões de mortes no mundo (71% de todas as mortes). Dessas, 15 milhões são óbitos prematuros (30 a 69 anos de idade) e cerca de 12 milhões ocorrem em países de baixa e média renda 20.
Devido à magnitude e impacto das DCNT na população, sua vigilância e monitoramento contínuos são primordiais para a saúde pública22. Tanto que este grupo de doenças foi incluído na Meta 3.4 dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), cuja proposta é reduzir em um terço a mortalidade prematura por DCNT23.
No Brasil, as DCNT constituem as causas mais frequentes de óbito, correspondendo a 76% das mortes em 201724. Estudo realizado por Malta e colaboradores apontou que, com a redistribuição dos CG, as taxas de mortalidade prematura por DCNT aumentaram entre 8% e 12% nas capitais brasileiras. Esta variação foi maior nas capitais com maiores índices de privação social 25. Não há estudos semelhantes que abranjam as Unidades Federadas brasileiras.
Assim, este trabalho tem por objetivo estimar a mortalidade prematura por DCNT no Brasil e Unidades Federadas (UF), no período de 2010 a 2019, comparando os dados obtidos a partir do SIM bruto, SIM corrigido pela redistribuição do CG e GBD, bem como sua tendência temporal. Será analisada, ainda, a associação entre o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) das UF e o impacto da correção nas taxas de mortalidade destas.

MÉTODOS
Trata-se de um estudo das séries temporais de mortalidade por DCNT, no período de 2010 a 2019, comparando três metodologias distintas de cálculo: usando dados do SIM brutos, dados do SIM corrigidos pela redistribuição dos CG e sub-registro e os dados extraídos diretamente do estudo GBD18.
Variáveis - Dados de mortalidade
As taxas de mortalidade prematura (30 a 60 anos) foram calculadas tanto para o total de óbitos por DCNT quanto para categorias que compõem esse grupo de doenças (diabetes, doenças cardiovasculares, doenças respiratórias e neoplasias), considerando o período de estudo. As taxas de mortalidade pelo total de DCNT foram calculadas, ainda, desagregadas por UF de residência da vítima para os anos de 2010 e 2019.
Para o cálculo das taxas de mortalidade, foram considerados, no numerador, os óbitos cuja causa básica tenha sido codificada como neoplasias malignas (códigos C00-C97), diabetes mellitus (E10-E14), doenças cardiovasculares (I00-I99) e doenças respiratórias crônicas (J30-J98, exceto J36). O denominador foi composto pela população da mesma localidade e período, obtida a partir do estudo GBD, e que estão disponíveis publicamente no site do Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME). Esta mesma população foi considerada para todas as metodologias em estudo, bem como a constante das taxas (100 mil habitantes). A utilização das estimativas populacionais do estudo GBD para compor o denominador das taxas de mortalidade nas três metodologias de cálculo utilizadas faz com estas sejam comparáveis entre si, embora torne os valores diferentes daqueles observados em outros estudos, que utilizam estimativas populacionais distintas.
As taxas de mortalidade prematura por DCNT foram mensuradas por meio de três métodos diferentes:
a) Taxa de mortalidade considerando dados do SIM bruto: Os dados de óbitos foram obtidos diretamente do SIM, disponibilizados publicamente pelo Ministério da Saúde no site do DataSUS.
b) Taxa de mortalidade considerando dados do SIM corrigido: Os dados de óbitos foram obtidos a partir do SIM e a eles foi aplicado o método de correção brasileira desenvolvida por Teixeira e colaboradores em 2021 22. A primeira etapa desta consistiu no tratamento dos “dados faltantes”, por meio da redistribuição proporcional dos dados segundo ano, idade, sexo e local de residência ignorados e em branco26. Posteriormente, foi feita a redistribuição dos CG, considerando os CG listados no estudo GBD 201727,28. Foi feita uma análise dos códigos dessa lista para identificar quais eram os CG relacionadas especificamente aos 4 grupos de DCNT em estudo. Posteriormente, foram feitas as redistribuições de acordo com os níveis de CG e seus respectivos alvos GBD29. Para tanto, foram considerados os 4 níveis de gravidade do CG, descritos pelo estudo GBD, de acordo com a magnitude de suas implicações para a Saúde Pública30: (i) muito alto (nível 1), para causas com implicações graves; (ii) alto (nível 2), para CG com implicações substanciais; (iii) médio (nível 3), contendo CG com implicações importantes; e (iv) baixo (nível 4), em que os GC têm implicações limitadas. Segundo o GBD, os níveis 1 e 2 são os mais importantes devido ao seu maior impacto nas análises de mortalidade30.
Além do processo de redistribuição proporcional, o estudo considerou os resultados das investigações de CG iniciado em 2016 para atribuir pesos à redistribuição31. As causas-alvo foram definidos através dos resultados das investigações de óbitos do projeto que investigou os principais CG em 60 cidades do Brasil32. Após a análise dos principais grupos de CG, os que mostraram maiores diferenças para os códigos-alvo analisados foram: pneumonias, X59 e Y3429,33,34.
c) Taxa de mortalidade usando dados do GBD: Os óbitos foram estimados pelo Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME), da Washington University, no âmbito do estudo Carga Global de Doenças (Global Burden of Disease - GBD), produzida em parceria com a Rede GBD Brasil. Tal estudo utiliza como principal fonte de informação, no Brasil, o SIM35, com ajuste por outras fontes nacionais e internacionais. Para todos os estados brasileiros, a qualidade dos dados é considerada alta e próxima aos países de alta renda36. Algoritmos de redistribuição específicos definidos pelo IHME são aplicados em cada idade-sexo-ano,. Detalhes sobre a metodologia e resultados do estudo GBD podem ser consultados em diversas publicações22,37,38.
Os três métodos utilizaram taxas de mortalidade padronizadas pelo método direto, considerando apenas a morte prematura de 30 a 69 anos, usando a população padrão mundial GBD 2019.
Análise dos dados
Inicialmente foi analisada a tendência do número de óbitos e das taxas de mortalidade prematura por DCNT de 2010 a 2019 calculadas pelos três métodos, para o Brasil.
Para estimar as tendências, foi utilizado método de regressão linear de Prais-Winsten. Este é um método delineado para dados que possam ser influenciados pela auto correlação serial, o que frequentemente ocorre em medidas de dados populacionais. Foi adotado como valor crítico para determinar se a tendência foi significativa, P = 0,05. A variação percentual anual (VPA) foi calculada utilizando a seguinte fórmula39:
Variação Percentual Anual= -1+10^b
Onde b corresponde ao coeficiente de inclinação da reta obtida na análise de regressão relacionando o logaritmo em base decimal do indicador em análise com o ano de ocorrência. O intervalo de 95% de confiança da taxa de incremento médio anual percentual no período foi calculado a partir da seguinte fórmula39:
IC95%=-1+10^((b±t*EP))
Onde t é o valor em que a distribuição t de Student apresenta 9 graus de liberdade a um nível de confiança de 95% bicaudal e EP é o erro padrão da estimativa de b fornecido pela análise de regressão.
Foram calculadas as variações percentuais das taxas de mortalidade prematura por DCNT pelos métodos SIM bruto e SIM corrigido para Brasil e UF nos anos de 2010 e 2019, bem como os percentuais de correção, calculados a partir da variação percentual das taxas de mortalidade prematura por DCNT entre os métodos. Por se tratar de valores menores, as séries temporais dos indicadores de UF apresentam bastante variabilidade, dificultando a implementação da análise de regressão. Por isso, optou-se por analisar apenas as variações percentuais.
Adicionalmente, foi realizada análise de correlação de Pearson entre o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e a variação percentual das taxas de mortalidade prematura por DCNT estimadas a partir do SIM bruto e do SIM corrigido, segundo as UF de 2010 a 2019. O IDH constitui-se em um índice composto por três indicadores, longevidade, renda e educação. Pode variar de 0 a 1 e quanto mais próximo de 1 melhor o desenvolvimento humano. Tem sido amplamente utilizado em estudos, gerando comparabilidade40. A magnitude das correlações foi categorizada de acordo com a classificação proposta por Shimakura41 para valores do coeficiente de correlação (r) positivos ou negativos: (i) Correlação bem fraca (r = 0,00 a 0,19); (ii) Correlação fraca (r = 0,20 a 0,39); (iii) Correlação moderada (r= 0,40 a 0,69); (iv) Correlação forte (r = 0,70 a 0,89); (v) Correlação muito forte (r = 0,90 a 1,00). Foram consideradas correlações significativas aquelas em que o P-valor foi menor que 0,05.
As análises estatíticas foram executadas utilizando o software R (R Core Team 2024. R: A language and environment for statistical computing. R Foundation for Statistical Computing, Vienna, Austria. URL https://www.R-project.org/).
Aspectos éticos
Esta pesquisa obedece à Resolução Nº 466, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos da UFMG sob parecer de número 3.258.076.

RESULTADOS
A Figura 1A mostra o número absoluto de óbitos estimados segundo os três métodos de cálculo. Foi observado aumento similar entre os três métodos, sendo os maiores valores estimados pelo método GBD. Foram registrados aproximadamente 253 mil óbitos em 2010 no SIM bruto, chegando a 288 mil óbitos em 2019 (VPA = 1,55%; IC95% = 1,28%; 1,81%). Considerando o SIM corrigido, este número variou de 267 mil a 310 mil óbitos no mesmo período (VPA = 1,74%; IC95% = 1,44%; 2,03%). Pelo método GBD, foram estimados 292 mil óbitos em 2010, atingindo 337 mil em 2019 (VPA = 1,59%; IC95% = 1,42%; 1,77%).
As taxas de mortalidade prematura por DCNT apresentaram redução no período analisado (Figura 1B). As taxas estimadas pelo método do SIM bruto reduziram de 322,0 a 276,1 óbitos por 100 mil habitantes (VPA = -1,64%; IC95% = -1,96%; -1,32%), enquanto as taxas do SIM corrigido variaram de 340,4 a 296,8 óbitos por 100 mil habitantes (VPA = -1,47%; IC95% = -1,88%; 1,06%). Já as estimadas pelo GDB variaram de 371,6 a 323,0 óbitos por 100 mil habitantes (VPA = -1,58%; IC95% = -1,83%; 1,33%).
A Figura 2 apresenta as taxas de mortalidade por cada um dos quatro grupos de DCNT estudados no período. Também foram observadas reduções na magnitude dessas taxas. As mortes por doenças cardiovasculares apresentaram padrão semelhante de redução entre os três métodos estudados. Para os demais grupos, embora todos os métodos tenham apontado redução na magnitude da taxa de mortalidade, houve variação no comportamento desta no decorrer da série histórica, de acordo com o método de cálculo analisado. Para todos os grupos de doenças estudados, as estimativas calculadas a partir do método GBD foram as maiores, seguidas do SIM corrigido e SIM bruto, durante todo o período analisado.
A Tabela 1 apresenta os valores e a variação percentual das taxas de mortalidade prematura por DCNT calculadas segundo os métodos SIM bruto e SIM corrigido, nas UF e no Brasil, para os períodos de 2010 e 2019. Considerando os dois métodos, em 2010, a maior taxa de mortalidade foi observada no Rio de Janeiro (384,0 óbitos/100 mil habitantes de acordo com o SIM bruto e 392,3 de acordo com o SIM corrigido) e a menor no Amapá (189,1 óbitos / 100 mil habitantes pelo SIM bruto e 218,3 pelo SIM corrigido). Em 2019, de acordo com o SIM bruto, a maior taxa ocorreu em Pernambuco (314,8 óbitos / 100 mil habitantes). Já de acordo com o SIM corrigido, a maior magnitude da taxa foi observada em Alagoas (376,4 óbitos / 100 mil habitantes). Ainda em 2019, a menor taxa de mortalidade prematura por DCNT ocorreu no Distrito Federal (222,9 óbitos / 100 mil habitantes pelo SIM bruto e 232,9 pelo SIM corrigido). A maior variação percentual positiva entre as taxas de mortalidade dos anos de 2010 e 2019 foi observada no Amapá (40,5% pelo SIM bruto e 30,0% pelo SIM corrigido). A maior variação percentual negativa ocorreu no Mato Grosso do Sul (-20,6% pelo SIM bruto e -19,6% pelo SIM corrigido).
A Tabela 2 apresenta o percentual de correção das taxas de mortalidade prematura por DCNT calculadas a partir dos métodos SIM bruto e SIM corrigido, para os anos de 2010 e 2019. No Brasil, o percentual de correção foi de 5,7% em 2010 e 7,5% em 2019. Dentre as UF, o Maranhão apresentou maior percentual de correção (26,7% em 2010 e 33,9% em 2019). O menor percentual de correção foi observado no Rio Grande do Sul em 2010 (1,5%) e em São Paulo e Mato Grosso em 2019 (2,7% para ambas).
A Figura 3 apresenta os resultados da análise de correlação entre as variações percentuais das taxas de mortalidade prematura por DCNT nas UF e o IDH destas. Houve correlação moderada considerando ambas as metodologias (SIM bruto: r =-0,46; P=0,015 e SIM corrigido: r=-0,54; P-valor=0,004), o que significa que as UF com maiores IDH apresentaram menores variações.
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DISCUSSÃO
O estudo mostrou o impacto da correção de dados de óbito na estimativa do número de óbitos e das taxas de mortalidade prematura por DCNT. Para todas as desagregações estudadas, observou-se que as taxas aumentaram após a redistribuição de CG, com tendências temporais bastante semelhantes entre taxas corrigidas e não corrigidas. O percentual de correção variou entre as UF brasileiras, e a variação percentual das taxas entre 2010 e 2019 foi inversamente proporcional ao IDH destas.
Este estudo mostra a importância da utilização de métodos de correção para os dados de mortalidade por DCNT no Brasil e, em especial, nas UF da Regiões Norte e Nordeste do país. O percentual de correção de até 33,9% (observado no Maranhão, em 2019) mostra a necessidade de cautela na utilização de estimativas de mortalidade calculadas a partir de dados brutos do SIM. Outros estudos têm apontado para esta necessidade no intuito de produzir estimativas de mortalidade com magnitudes mais verossímeis, favorecendo as vigilância epidemiológica 22,27,31,38.
O SIM tem apresentado importantes avanços na cobertura e qualificação dos registros nos últimos anos42. No entanto, entre 30 a 40% das causas de mortes constituem CG.31. Os resultados deste estudo mostraram que há grande diferença entre UF brasileiras, com maiores percentuais de correção naquelas pertencentes às Regiões Norte e Nordeste. Esta desigualdade regional também foi observada por diversos outros autores12,27,38. Em que pese os esforços do Ministério da Saúde brasileiro em parceria com as estados e municípios para a melhoria da captação dos óbitos pelo SIM (como o projeto de redução das causas mal definidas e o projeto de redução das desigualdades regionais e redução da mortalidade infantil nos estados da Região Nordeste e Amazônia Legal)33, estas desigualdades se mantêm, reforçando a necessidade de emprego de métodos de tratamentos na base do SIM, em especial a correção para sub-registro de óbitos e a redistribuição dos CG22,33,38.
Analisando-se as estimativas de mortalidade, foi possível observar redução das taxas de mortalidade por DCNT no Brasil, considerando os três métodos de cálculo. Da mesma forma, Malta e colaboradores, ao analisarem dados do GBD referentes ao período de 1990 a 2017, identificaram declínio de 35,9% na mortalidade prematura por DCNT, sendo que as doenças cardiovasculares tiveram a redução mais expressiva, de 47,9%43. Esses avanços podem ser explicados por fatores como a melhoria das condições de vida e saúde, redução da pobreza, melhoria do acesso a bens e serviços e expansão do Sistema Único de Saúde (SUS), além de avanços nas políticas de saúde43.
Além do maior percentual de correção das taxas de mortalidade por DCNT, as UF das Regiões Norte e Nordeste apresentaram, majoritariamente, menores reduções ou até mesmo aumento das taxas de mortalidade por DCNT, tanto na análise dos dados do SIM bruto quanto do SIM corrigido. Essas UF têm os menores IDH do país, ocasionado uma correlação negativa entra este e a variação percentual das taxas de mortalidade entre 2010 e 2019. Estudo conduzido por Malta e colaboradores, em 2023, apresentou resultados semelhantes, com decréscimos mais expressivos nas taxas de mortalidade por DCNT sendo observados nas capitais brasileiras incluídas nos estratos de menor vulnerabilidade38.
Esses resultados podem ser explicados pelo processo de transição epidemiológica polarizada prolongada experimentado pelo país a partir dos anos 1950. Além da superposição da carga de doenças infecciosas e doenças crônicas e agravos não transmissíveis, este processo é caracterizado pela polarização epidemiológica, com níveis diferenciados de transição entre e intrapaíses, de acordo com o nível socioeconômico44. Assim, é provável que as UF das Regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste estivessem em estágios mais avançados da transição epidemiológica, durante o período de estudo, com elevadas taxas de mortalidade por DCNT. Em contrapartida, as UF das Regiões Norte e Nordeste, no mesmo período, ainda apresentavam desafios residuais de uma sociedade originalmente rural e tradicional, com alta mortalidade por doenças infecciosas e risco de morte na infância elevado, e em processo de transição para uma sociedade predominantemente urbana, com risco de morte na infância reduzido e maior mortalidade por DCNT45.
O estudo inova ao apresentar os efeitos da aplicação do método revisado proposto por Teixeira e colaboradores 22. Tal método aplicou a correção das bases do SIM utilizando dados empíricos brasileiros, como o resultado do projeto de investigação do óbito em 60 cidades34 e as investigações realizadas nas secretarias estaduais de saúde, sendo mais aderida ao contexto nacional27,33. Um dos pontos fortes do estudo atual é o aprimoramento do método de Teixeira et al, com revisão dos CG e códigos-alvo e utilização de dados empíricos de investigação de óbitos32. O uso de mais de 20 mil óbitos com causas básicas definidas alteradas após a investigação fortalece o resultado das causas consideradas por se tratar de um projeto que considerou a realidade brasileira, o que fortalece a riqueza desses dados. Esses dados devem ser mais explorados para que outros tratamentos de qualidade das causas de morte possam ser aplicados aos dados brutos nacionais. Outro ponto forte consiste na utilização de estimativas populacionais semelhantes para os diferentes métodos de cálculo, garantindo comparabilidade aos indicadores em estudo
Apesar dos avanços metodológicos ao tratar dados faltantes e redistribuir os CG, o estudo apresenta limitações, dentre eles os algoritmos foram analisados conforme dados empíricos em estudos realizados em 60 cidades, mas não abrangem todo o território nacional, podendo haver particularidade locais, os dados podem não ter sido completamente ajustados segundo sub-registro, em especial não regiões Norte e Nordeste, foram aplicadas correções até o nível 2 de severidade, classificado segundo o estudo GBD30, devendo ainda aprofundar as metodologias de redistribuição para causas básicas mais desagregadas. Além disto, não foram incluídos na analise os anos de 2020 e 2021, em função da pandemia, quando ocorreu piora dos dados do SIM, necessitando de outra proposta de redistribuição dos CG, que ainda está em desenvolvimento.
O uso de metodologia para tratamento dos dados de mortalidade está em constante desenvolvimento, espera-se com estas análises e com a disponibilização futura destes algoritmos de redistribuição de GC apoiar gestores locais na adequada análise de situação de saúde. Torna-se importante por avançar na vigilância das causas mal definidas, na formação de médicos para o correto preenchimento das declarações de óbito.
Em conclusão o presente estudo destaca que houve redução das taxas de mortalidade prematura por DCNT, no período de 2010 a 2019, sobretudo nas UF de maior IDH. A redistribuição de CG representou aumento dos valores das taxas de mortalidade por DCNT, e o incremento foi maior nas UF das Regiões Norte e Nordeste. Verifica-se, assim, a importância de se adotar métodos que possam ser aplicados para que tenhamos estatísticas relacionadas à mortalidade mais fidedignas, o que contribui para a melhoria contínua da definição das causas de morte no SIM.
Agradecimentos: Os autores agradecem à Fapemig – 2021 - Chamada Universal - Desigualdades nos indicadores de mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis e COVID-19 no Brasil e em Minas Gerais”. À Secretaria de Vigilância em Saúde/ Ministério da Saúde pelo financiamento do projeto GBD, inquéritos IA/2023; ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela bolsa de produtividade de Malta DC; à OPAS /SVSA pelo apoio na carta acordo.

REFERÊNCIAS
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Malta, D.C, Teixeira, R. A., Souza, J.B, Aquino, E.C, Dantas Júnior, A. B., Soares Filho, A. M., França, E. B., Vasconcelos, A. M. N., Souza, M. F. M., Ishitani, L. H., Gomes, C. S., Montenegro, M. M. S., Araújo, V. E. M., Faria, S. M. C., Duncan, B. D., Ribeiro, A. L. P.. O efeito das redistribuições dos códigos garbage na evolução da mortalidade por Doenças Crônicas no Brasil, 2010 a 2019. Cien Saude Colet [periódico na internet] (2024/ago). [Citado em 25/12/2024]. Está disponível em: http://cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/o-efeito-das-redistribuicoes-dos-codigos-garbage-na-evolucao-da-mortalidade-por-doencas-cronicas-no-brasil-2010-a-2019/19331?id=19331

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