0233/2006 - PERCEPÇÕES E ATITUDES DE RESPONSÁVEIS POR CRIANÇAS FRENTE AO USO DE MEDICAMENTOS INFANTIS E SUA RELAÇÃO COM CÁRIE E EROSÃO DENTÁRIA
GUARDIANS’ PERCEPTIONS AND ATTITUDES ABOUT THE USE OF PEDIATRIC MEDICINES AND THEIR CARIOGENIC AND EROSIVE POTENTIALS
Autor:
• Beatriz Gonçalves Neves - Beatriz Gonçalves Neves - Rio de Janeiro, RJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro - <beatriz_gneves@yahoo.com.br>Área Temática:
Não CategorizadoResumo:
Este estudo avaliou as percepções e atitudes de responsáveis por crianças sobre os potenciais cariogênico e erosivo de medicamentos infantis. Foram realizadas entrevistas sobre a associação do uso de medicamentos infantis com cárie e erosão dentária, bem como os cuidados com a higiene bucal após sua ingestão. Do total de responsáveis com entrevista completa (n=86), 24 (27,9%) consideraram os medicamentos infantis ácidos, 51 (59,3%) amargos e 56 (65,1%) doces, porém, apenas 16 (28,6%) destes últimos realizavam higiene bucal das crianças após sua utilização (Exato de Fisher; p>0,05). Além disso, apenas 18 (20,9%) responsáveis realizavam esta prática, dos quais 8 (44,4%) haviam recebido orientação prévia sobre higiene bucal (Exato de Fisher; p<0,05). A associação entre o uso de medicamentos e a cárie dental ou defeitos na estrutura dos dentes foi apontada por 61 (70,9%) entrevistados, dos quais 24 (39,3%) justificaram tal associação em função da presença de açúcar nas formulações. Apesar dos responsáveis considerarem os medicamentos doces e relacionarem seu uso com a presença de cárie e defeitos na estrutura dental, grande parte destes não realiza higiene bucal em seus filhos após o uso desses fármacos e não consegue estabelecer claramente a relação de causa e efeito existente em tal associação.Palavras-chave: cárie dental, erosão de dente, uso de medicamentos, percepção, atitude
Abstract:
This study evaluated guardians’ perception about the use of pediatric medicines and their cariogenic and erosive potentials. Guardians were interviewed about the relationship between the use of pediatric medicines with dental caries and dental erosion, as well as about oral hygiene procedures after medicine’s intake. Among all the guardians with complete interviews (n=86), 24 (27.9%) recognized pediatric medicines’ sour taste, 51 (59.3%) their bitter taste, and 56 (65.1%) considered them sweet, although only 16 (28.6%) of these guardians brushed their children’s teeth after medicines’ intake (Fisher’s Exact; p>0.05). Moreover, only 18 (20.9%) guardians performed oral hygiene practices after this intake, of which 8 (44.4%) received previous instructions (Fisher’s Exact; p<0.05). The association between the use of medicines and dental caries or dental structural defects was pointed out by 61 (70.9%) of the guardians, and among those, 24 (39.3%) justified this association because of the sugar presence in the formulations. Although guardians consider medicines sweet substances and relate their use to dental caries and defects of tooth structure, most of them do not brush their children’s teeth after medicines’ intake and can not clearly establish a cause-effect relationship presented in this association.Key words: dental caries, tooth erosion, drug utilization, perception, attitude
Conteúdo:
Muitos medicamentos líquidos pediátricos apresentam açúcares em sua composição a fim de mascarar o gosto desagradável de alguns ingredientes ativos (Bradley et al. 1). Dentre esses açúcares, destaca-se a utilização da sacarose, o que constitui uma preocupação para a saúde bucal de crianças, uma vez que vários estudos (Shaw et al. 2; Mackie et al. 3; Mackie et al. 4; Maguire et al. 5; Maguire et al.6; Duward et al. 7; Bigeard 8) demonstraram o aumento da prevalência da doença cárie, relacionando-o com a ingestão freqüente desses medicamentos líquidos infantis.
Tal relação deve-se, provavelmente, à capacidade da sacarose de promover grande atividade acidogênica com conseqüente queda do pH da placa dental, uma vez que este açúcar funciona como substrato para fermentação da microbiota bucal (Rekola 9). Além disso, como muitos medicamentos líquidos infantis possuem baixo pH endógeno, estes podem também favorecer a erosão dental, principalmente se permanecerem em contato por tempo prolongado com a superfície dentária (Moss 10).
Em geral, os responsáveis desconhecem os açúcares adicionados a muitos alimentos ou bebidas, incluindo medicamentos líquidos infantis (Mentes 11), e, quando reconhecem a existência do açúcar, não identificam o tipo utilizado para adoçar as formulações pediátricas, e nem mesmo a sua concentração (Pierro et al.12), fatos que podem induzir a comportamentos que contribuam para o desenvolvimento da doença cárie (Bigeard 8).
Considerando-se que os pais atuam como responsáveis pela administração e cuidados relacionados ao uso de medicamentos infantis, o presente estudo pretende avaliar as percepções e atitudes de responsáveis quanto aos potenciais cariogênico e erosivo de medicamentos líquidos pediátricos.
MATERIAIS E MÉTODOS
Este estudo preliminar foi baseado no modelo epidemiológico observacional do tipo seccional, tendo sido utilizado como instrumento de coleta de dados um roteiro de entrevista individual semi-estruturado. Houve aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa Local (protocolo 074/05) e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
A amostra inicial consistiu de 108 responsáveis por crianças entre 0 e 12 anos de idade que procuraram por atendimento na Clínica de Odontopediatria de uma Instituição Pública de Ensino Superior do Estado do Rio de Janeiro no período de fevereiro a março de 2005.
Todos os responsáveis foram entrevistados por um único examinador, em uma sala reservada, após a finalização do exame odontológico de triagem das crianças. O roteiro de entrevista consistiu de 18 questões abertas e fechadas, a fim de avaliar as percepções dos responsáveis em relação às características dos medicamentos líquidos pediátricos que estejam diretamente vinculadas com o seu potencial cariogênico e erosivo. Além disso, procurou-se verificar o comportamento destes responsáveis mediante o uso de medicamentos por seus filhos, principalmente no que diz respeito à execução de métodos de higiene bucal após a ingestão destes pelas crianças e, ainda, constatar se estes responsáveis haviam recebido orientações prévias em relação à realização de higiene bucal após a administração destes fármacos.
Todas as respostas das questões abertas foram reorganizadas em categorias de análise (Minayo 13), sendo posteriormente inseridas e analisadas, juntamente com as respostas das questões fechadas, no programa SPSS (versão 11.0). Os resultados foram apresentados de forma descritiva, a partir de suas freqüências absolutas e relativas, e quando possível, utilizou-se o teste estatístico Exato de Fisher, com nível de significância de 5%.
RESULTADOS
Do total de roteiros de entrevista aplicados (n=108), 22 destes foram excluídos por não se enquadrarem aos critérios de inclusão do presente estudo, uma vez que apresentavam dados incompletos ou ausência de algumas respostas Assim, um total de 86 responsáveis, sendo 81 (94,2%) do sexo feminino e 05 (5,8%) do sexo masculino, foi incluído no presente estudo. Deste total, 47 (54,7%) afirmaram que suas crianças apresentavam ou já haviam apresentado problemas de saúde crônicos ou recorrentes, sendo necessária, assim, a utilização de medicamentos líquidos infantis freqüentemente. Dentre as classes terapêuticas mais citadas, destacaram-se os analgésicos e antitérmicos (98,8%), antibacterianos (88,4%) e antitussígenos (67,4%), os quais atendem em sua maioria, pela apresentação comercial sob a forma de gotas (76,7%), suspensão (66,3%) e xarope (66,3%), respectivamente.
Vinte (23,3%) responsáveis relataram que as crianças têm dificuldade em aceitar os medicamentos líquidos e, 67 (77,9%) entrevistados mencionaram que seus filhos reclamavam do gosto dos medicamentos, os quais foram considerados ácidos por 27,9%, e amargos por 59,3% do total da amostra.
A maioria (n=61; 70,9%) relacionou o uso de medicamentos pediátricos com o desenvolvimento de cárie dental ou defeitos na estrutura dos dentes e 24 (39,3%) destes últimos justificaram tal associação em função da presença de açúcar nas formulações infantis, embora, 09 dos 61 (14,8%) tenham relatado ainda adoçar os medicamentos para melhor aceitação das crianças. Vale ressaltar ainda que nenhum desses 61 responsáveis justificou essa associação com a acidez presente em medicamentos.
Embora 56 (65,1%) do total de responsáveis tenham reconhecido o sabor adocicado dos medicamentos líquidos infantis, apenas 16 (28,6%) destes realizavam higiene bucal de suas crianças após a ingestão dos medicamentos (Teste Exato de Fisher; p>0,05) (Tabela 1). Além disso, esta prática era realizada por somente 13 (21,3%) dos 61 (70,9%) responsáveis que relacionaram o uso de medicamentos líquidos infantis com o desenvolvimento de cárie dental e defeitos nas estruturas dos dentes (Teste Exato de Fisher; p>0,05) (Tabela 2).
Ainda quanto às práticas de higiene bucal, 73 (84,9%) responsáveis nunca haviam recebido orientação de médicos pediatras ou cirurgiões-dentistas para realizar a higiene bucal de seus filhos após a administração de medicamentos, sendo esta prática executada por somente 18 (20,9%) do total de entrevistados, dos quais apenas 08 (44,4%) haviam recebido orientação profissional prévia (Teste Exato de Fisher; p<0,05) (Tabela 3).
E ainda, dos 61 responsáveis que acreditavam na associação existente entre o uso de medicamentos pediátricos e o desenvolvimento de cárie dentária e defeitos na estrutura dos dentes, 42 (68,8%) destes consideraram os medicamentos infantis doces (p>0,05; Teste Exato de Fischer) (Tabela 4).










