0288/2006 - PERFIL SOCIOSSANITÁRIO E ESTILO DE VIDA DE HIPERTENSOS E/OU DIABÉTICOS, USUÁRIOS DO PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA - MUNICÍPIO DE TEIXEIRAS, MG.
SOCIAL-SANITARY AND LIFESTYLE PROFILE OF HIPERTENSIVE AND/OR DIABETES PEOPLE, USUARY OF THE FAMILY HEALTH PROGRAM OF - TEIXEIRAS, MG
Autor:
• Rosângela Minardi Mitre Cotta - Cotta, Minardi,R.M. - Viçosa, Minas Gerais - Universidade Federal de Viçosa/Departamento de Nutrição e Saúde - <rmmitre@ufv.br>Área Temática:
Não CategorizadoResumo:
ObjetivoO objetivo deste estudo foi traçar o perfil sociossanitário e estilo de vida da população hipertensa e/ ou diabética do município de Teixeiras-MG.
Métodos
Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas nos domicílios de hipertensos e/ou diabéticos cadastrados no Programa de Saúde da Família de Teixeiras-MG, selecionados aleatoriamente.
Resultados
Foram entrevistados 150 hipertensos (10,33% da população hipertensa) e 30 diabéticos (15% da população diabética), havendo uma predominância de indivíduos idosos (idade média=63,59 + 13,12 anos), do sexo feminino (74,4%), de baixa escolaridade (40,9% de analfabetismo) e de baixa renda (mediana de 0,5 salários mínimos). O tratamento destas morbidades foi basicamente medicamentoso (96,6%); houve uma elevada prevalência do sedentarismo (67,4%). Além disso, houve um grande consumo per capita diário de açúcar (153g + 110,66g), sal (18g + 21,26g) e óleo (60g + 43,23g).
Conclusão
Os resultados obtidos apontam para a importância de intervenções multiprofissionais, por meio do Programa de Saúde da Família, com o objetivo de promover a adoção de hábitos e estilos de vida saudáveis, prevenir complicações dessas doenças, e proporcionar melhoria da qualidade de vida.
Termos de Indexação: estilo de vida, hipertensão e diabetes, saúde da família.
Abstract:
ObjectiveThe objective of this study was to delineate the social-sanitary profile and the lifestyle of the hypertensive and/or diabetic people from Texeiras city – MG.
Methods
Semi-structured interviews were conducted in the home of hypertensive and/or diabetic people randomly selected from the Family Health Program of Teixeiras – MG.
Results
A total of 150 hypertensive (10% of the hypertensive population) and 30 diabetics (12,98% of the diabetic population) people were interviewed. These were a predominance of elderly individuals (average age=63,59 + 13,12 years old), mostly women (74,4%), with low literacy (40,9% of illiterates) and low income (average=0,5 minimum wage). These morbidities were treated basically through the use of medication (96,6%), and there was a high prevalence of sedentary people (67,4%). Besides that, there was a daily high intake per capita of sugar (153g + 110,66g), salt (18 g + 21,26g) and oil (60 g + 43,23g) per capita.
Conclusion
The results obtained in this study showed the importance of multi-professional intervention, through Family Health Program with the objective to promote the adoption of healthy life habits and healthy life style in order to prevent complications of these morbidities, and to provide a better quality of life to these people.
Index Terms: lifestyle, hypertension and diabetes, family health
Conteúdo:
As principais causas de óbito no mundo ocidental são atribuídas às complicações decorrentes dos processos ateroscleróticos nos vasos sanguíneos. Dados do DATASUS (1999) informam que os acidentes vasculares cerebrais isquêmicos e hemorrágicos representam as principais causas para a mortalidade no Brasil. O mesmo aconteceu em 2002, visto que as doenças do aparelho circulatório figuram como as principais causas de morte (31,5%) no país. Neste mesmo ano, o coeficiente de mortalidade por doenças cerebrovasculares por 100.000 habitantes, foi igual a 50 seguido de 35,2 por infarto agudo do miocárdio. Deve-se considerar, porém, que as primeiras manifestações dessas doenças cardiovasculares são o infarto agudo do miocárdio ou morte súbita, daí a importância de prevenir a doença, o que se tem fundamentado no controle dos fatores de risco 1,2,3.
A American Heart Association e o American College of Cardiology, em 1999, determinaram como os principais fatores de risco, ou seja, fatores relacionados de forma independente, o tabagismo, a elevação do colesterol e de LDL, redução de lipoproteínas de alta densidade (HDL), idade avançada, a hipertensão arterial (HA) e o diabetes mellitus do tipo 1 ou 2 (DM1 ou DM2). Aspectos como escolaridade, renda e ocupação, também devem ser considerados, por influenciarem diretamente o perfil das doenças crônico não-transmissíveis 1,4.
Em relação à hipertensão arterial sistêmica, foi demonstrado que a redução de 5 a 6 mmHg da pressão arterial reduz o risco de doenças ateroscleróticas, acidente vascular cerebral e insuficiência cardíaca em até 15%, 40% e 50%, respectivamente, dentro de um período de 5 anos1.
O objetivo primordial do tratamento da hipertensão é a redução do risco da doença cardiovascular – minimizando as mortes prematuras e os eventos altamente incapacitantes, como os quadros de acidente vascular cerebral (AVC), independente se o médico optar por um tratamento medicamentoso e/ou por orientações e outros tipos de tratamentos multiprofissionais. Torna-se importante ainda que o hipertenso seja abordado de forma a considerar todos os fatores de risco presentes, minimizando-os, e não só a pressão arterial isolada 2,5.
A realidade é que poucos hipertensos têm a sua pressão arterial controlada de forma efetiva, o que pode ser explicado pela baixa aderência ao tratamento. Cerca de 35% a 83% dos portadores de hipertensão sequer conhecem sua condição de portadores da doença. Entre pacientes que estão em tratamento, de 75% a 92% não conseguem manter seus níveis pressóricos controlados 6.
Já em pacientes diabéticos tipo 2, as doenças cardiovasculares são responsáveis por até 80% das mortes, sendo que essa população tem o risco relativo desse tipo de morte três vezes maior que da população em geral. A associação de uma alimentação rica em frutas e vegetais e a prevenção das complicações do diabetes se dão não só pelo controle da obesidade quanto pelo efeito dos fitonutrientes presentes nestes alimentos. É comprovado ainda que a prática regular de atividade física e a redução do peso podem reduzir a incidência de DM tipo 2 em indivíduos com intolerância a glicose 7,8.
Deve-se destacar que a precoce identificação, a assistência oferecida e o acompanhamento adequado aos portadores de hipertensão e diabetes, e o estabelecimento do vínculo com as unidades básicas de saúde, são essenciais para o sucesso do controle desses agravos, prevenindo as complicações, reduzindo o número de internações hospitalares e a mortalidade das doenças cardiovasculares, além de reduzir o custo social e o custo que incorre ao SUS associado às doenças crônicas 9.
De acordo com o Ministério da Saúde e Organização Pan-Americana da Saúde, custos diretos para o atendimento ao diabetes mundialmente variam de 2,5% a 15% dos gastos nacionais em saúde, dependendo da prevalência local de diabetes e da complexidade do tratamento disponível. Além dos custos financeiros, o diabetes acarreta também outros custos associados à dor, ansiedade, e menor qualidade de vida que afeta doentes e suas famílias. A Hipertensão é responsável por complicações cardiovasculares, encefálicas, coronarianas, renais e vasculares periféricas. Reduzindo o acidente vascular encefálico e a doença coronariana, por meio da identificação dos portadores de hipertensão e do controle adequado dos níveis pressóricos, poderá ter grande impacto no SUS, em termos de redução de morbimortalidade e de diminuição dos custos sociais e financeiros 9.
As medidas de intervenção comunitária para mudanças no estilo de vida e adoção de hábitos mais saudáveis devem ser sustentáveis ao longo prazo e devem incluir todos os grupos sociais, especialmente aqueles com menores possibilidades de escolha em razão da pobreza e da exclusão social. No entanto, alguns aspectos devem ser considerados para o desenvolvimento de estratégias efetivas de promoção da saúde na população geral 8.
O Programa de Saúde da Família (PSF) implantado pelo Ministério da Saúde (MS) em 1994, centrado na atenção básica à saúde, com enfoque na família, surge como um modelo democrático, universal e integral. Este modelo objetiva reorganizar a prática assistencial em novas bases e critérios, em substituição ao modelo tradicional de assistência, individualista, curativista, biologicista, hospitalar, ou seja, dar um salto qualitativo de um modelo procedimento-centrado para um modelo usuário-centrado 10.
A atenção centrada na família, entendida e percebida a partir do seu ambiente físico e social, possibilita às equipes de saúde da família uma compreensão ampliada do processo saúde-doença e da necessidade de intervenções. É inquestionável o papel da família nesse processo, considerada como Unidade Básica da Sociedade, pois é por meio desta que se adquirem condutas, hábitos e valores, aspectos fundamentais para o desenvolvimento de ações de prevenção de doenças e promoção da saúde 11.
Convém ressaltar ainda os princípios do PSF de territorialização, intersetorialidade, descentralização, hierarquização, regionalização, co-responsabilização e priorização de grupos populacionais de risco. O programa apresenta características como: área de abrangência e adscrição de famílias; equipe multiprofissional; ação preventiva e de promoção à saúde a partir de prioridades epidemiológicas da área adstrita; participação comunitária e controle social (por meio dos Conselhos Municipais de Saúde) e ênfase em ações programáticas, que reduzam a demanda sobre centros de saúde e hospitais; tudo isto respaldado nos princípios de humanização das práticas de saúde, democratização do conhecimento sobre processo saúde e doença, acolhimento e cuidado à saúde 10,12,13.
Nos países em desenvolvimento, atualmente há um consenso sobre a importância na adoção precoce de hábitos de vida saudáveis para prevenção de problemas de saúde. Todos os países concordam em colocar em prática, programas de educação sanitária, com objetivo de prevenir doenças e complicações mediante modificações nos comportamentos humanos, destacando-se o PSF enquanto importante estratégia de atenção à saúde 14.
Neste sentido, vários estudos têm sido realizados para identificar conhecimentos, atitudes e práticas da população para diversas doenças, a fim de nortear as estratégias de educação em saúde. Por meio deles, verificou-se que a existência de estilos de vida que tendem a ser estáveis com o tempo, o que inclui crenças, atitudes e hábitos comuns a todos, além dos prazeres individuais. Tais fatores exercem grande influência para que as pessoas não se motivem a adotarem comportamentos saudáveis como a prática de atividade física regular, moderação do sal, do álcool, de calorias e abstinência do fumo 15.
Diante desta perspectiva, este trabalho vê como objetivo traçar o perfil sociossanitário e estilo de vida da população com hipertensão e/ ou diabetes usuária do PSF do município de Teixeiras, MG, e identificar nesta comunidade as principais dificuldades ou fatores que realmente interferem no tratamento destas doenças.
Metodologia:
Trata-se de um estudo observacional de corte transversal, no qual foram realizadas entrevistas semi-estruturadas, em visitas domiciliares, que ocorreram entre os meses de maio a setembro de 2005. As entrevistas diretas foram realizadas por uma equipe de entrevistadores, devidamente treinados, sendo os entrevistadores acompanhados e apresentados aos usuários pelos Agentes Comunitários de Saúde (ACS).
Foi criado um formulário especificamente para este estudo, contendo questões relacionadas à escolaridade, renda, principais cuidados tomados em relação às doenças, realização de exames, administração de medicamentos, prática de atividade física, acompanhamento profissional e participação da família.
Realizou-se previamente um estudo piloto em população com características semelhantes às de Teixeiras, porém em município distinto do estudado (Viçosa, MG), com o objetivo de revisar o formulário proposto e direcionar aspectos da investigação 16,17.
O estudo foi realizado com uma amostra representativa (aleatória) da população hipertensa e/ ou diabética cadastrada no PSF de Teixeiras, MG. Assim, foram entrevistadas 180 usuários, representando 10,33% da população de Teixeiras com hipertensão e 15% da população com diabetes 18. Dado que vários estudos presentes na literatura indicam a hipertensão como uma complicação freqüente do diabetes, os usuários que apresentam ambas as patologias foram categorizados como pertencentes à amostra do diabetes 19. Neste sentido, participaram do presente estudo 150 usuários diagnosticados somente como hipertensos e 30 como diabéticos (25 com hipertensão e diabetes e 5 somente com diabetes). Para obtenção desta amostra foi realizado um sorteio com os nomes de todos os usuários hipertensos e/ ou diabéticos, obtidos através dos prontuários médicos do PSF.
A pesquisa foi realizada no município de Teixeiras, localizado na Zona da Mata de Minas Gerais. Este município apresentou no ano de 2000, uma população residente de 11.149 habitantes 20. De acordo com as condições socioeconômicas, observa-se que a taxa de analfabetismo deste município é de aproximadamente 4% na população com 18 a 24 anos e de 17% na população adulta com mais de 25 anos no ano de 2000 21, destaca-se que internacionalmente níveis de analfabetismo acima de 5% são considerados inaceitáveis 22.
As principais atividades econômicas do município são: agricultura, pecuária, silvicultura e exploração florestal. A renda per capita média é de R$171,89 (cento e setenta e um reais e oitenta e nove centavos), sendo que o número de pessoas que vivem a baixo da linha da pobreza, neste caso definida como pessoas que vivem com renda per capita domiciliar inferior a R$75,50 (setenta e cinco reais e cinqüenta centavos) o equivalente a meio salário mínimo vigente no período de 2000 é de 46,1% 21.
Diante destes dados, acredita-se que a realidade estudada possa ser extrapolada para muitos municípios brasileiros que apresentam as mesmas características socioeconômicas e demográficas.
A realização da pesquisa no município de Teixeiras, justifica-se pelo fato deste atender aos requisitos, orientações e diretrizes determinadas pelo Ministério da Saúde em relação ao PSF, e por contar com o apoio da prefeitura, Secretaria Municipal de Saúde e equipe do PSF para a realização da pesquisa e posteriores atividades de extensão a serem realizadas segundo as necessidades diagnosticadas, além do PSF cobrir 100% da população. O PSF de Teixeiras possui quatro Equipes de Saúde da Família (ESF), cada equipe composta por um médico, um enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e seis ACSs (equipe mínima do PSF), além de um nutricionista e dentista que atuam em todas as equipes 23.
Segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a população total deste município, estimada em 2005, é de 11.854. Dentre esses indivíduos, dados do Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB), demonstram que em abril do mesmo ano, têm-se 1.451 hipertensos (12,24%) e 200 diabéticos (1,69%) cadastrados no PSF 20,24.
Os dados coletados foram digitados e analisados no software Epiinfo 6.0, com auxílio do programa Microsoft Excel 2000. O protocolo de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal de Viçosa, Minas Gerais, Brasil. Todos os indivíduos que aceitaram participar do estudo assinaram um Termo de Consentimento Livre Esclarecido.
Resultados:
Em relação à distribuição das doenças, conforme está demonstrado na Figura 1, 83,30% (150) dos usuários amostrados apresentavam apenas hipertensão, 13,90% (25) hipertensão e diabetes e 2,80% (5) somente diabetes. Verificou-se entre os entrevistados, uma predominância do sexo feminino, com uma prevalência de 74,4%. O mesmo ocorreu quando os entrevistados foram avaliados separadamente por doença. A idade dos entrevistados estudados oscilou entre 14 e 93 anos, com uma média de 63,59 + 13,12 anos e uma mediana de 63,5 anos. Um dado relevante em relação à população estudada se refere à baixa escolaridade da mesma, sendo que 40,9% dos usuários eram analfabetos, 14,0% apenas liam e escreviam e 34,5% tinham o ensino fundamental incompleto. Ao considerar a renda total da família e o número de dependentes, verificou-se que a renda per capita teve uma mediana de 0,50 salários mínimos; com o mínimo de 0,08 e máximo de 2,43 salários mínimos.
Em relação à freqüência de realização de exames, foi observado que a mediana de exames de sangue (glicemia) realizados foi igual a um por ano, enquanto a mediana de aferição de pressão arterial foi igual a uma por mês. A maioria dos entrevistados (77,5%) não relatou qualquer dificuldade para realizar esses exames. Para os 22,5% que afirmaram ter dificuldades na realização dos exames, os principais motivos foram: falta de transporte (44%), fatores econômicos (20%), demora para marcação do exame e consultas (16,0%), falta de solicitação de exames pelo médico (8,0%) além de questões familiares (8,0%) – pessoas que são cuidadoras de outros familiares.
Dos entrevistados, 96,6% faziam uso de algum medicamento, normalmente mais de um, sendo que destes apenas 5,8% não o(s) utilizavam regularmente, geralmente por motivos econômicos. Os principais medicamentos utilizados foram captopril (58,1%), hidroclorotiazida (46,4%), nifedipina (22,9%) e metildopa (12.8%), anti - hipertensivos; AAS (14,5%), usado para evitar a agregação plaquetária; cloridrato de propranolol (11,7%) e hipoglicemiantes (57,0%). Dentre os hipoglicemiantes foram mais citados sulfoniluréias (glibenclamida e glimepirida) e biguanidas (metiformina).
Alguns hábitos considerados como fatores de risco para as doenças crônicas foram abordados na entrevista. Verificou-se que o percentual de indivíduos que afirmaram praticar alguma atividade física regular, ou seja, exercícios dinâmicos, como andar, correr, pedalar, nadar; com freqüência de três a cinco vezes por semana, com duração entre 15 e 60 minutos 25 foi baixo (32,6%), sendo predominante a caminhada (87,9%). Apenas 8,6% tiveram a orientação de um educador físico para tal prática. Dos usuários que praticavam atividade física, 31,9% tinham alguma dificuldade para fazer exercícios, sendo as principais queixas: dor nas pernas, articulações ou coluna (54,2%) e o cansaço (16,7%) (Figura 2).
Outros fatores de risco importantes, que podem acarretar em um prejuízo do controle das doenças, foram os elevados consumos per capita diários médios de açúcar (153g + 110,66), óleo (60g + 43,23g) e sal (18g + 21,26g). Estes valores per capita foram calculados a partir da disponibilidade da lista de compras mensal, o que, indiretamente reflete o consumo per capita destes alimentos. Mais especificamente, foi perguntado aos entrevistados a respeito da quantidade mensal adquirida e consumida destes alimentos pela família, por exemplo, número de latas de óleos, quilos de açúcar e sal... No entanto, um dado relevante foi que 97,2% dos entrevistados afirmaram não adicionar sal à comida já preparada e 74,9% utilizavam somente o óleo vegetal para o preparo das refeições, embora houvesse uma prevalência de 25,2% do uso de banha de porco.
Houve uma baixa prevalência do consumo de bebida alcoólica na população (8,4%), com a mediana da freqüência igual a uma vez por semana, sendo mais consumidos cerveja e vinho. Porém, 19,6% fumavam até o momento da entrevista e 27,9% já fumaram, por um período cuja mediana foi igual a 20 anos (Figura 2).
Em relação aos cuidados específicos com o diabetes, de acordo com a Figura 3, observou-se que entre os diabéticos, apenas 30% utilizavam insulina, sendo que destes 62,5% sabiam aplicá-la. Além disso, um dado relevante é que a maior parte dos entrevistados com diabetes (56,7%) não examinava seus pés. Não obstante, 43,3% examinavam diariamente os pés, sendo este exame realizado pelo próprio usuário. Um outro dado importante é que, segundo os entrevistados, a família cooperava com os cuidados da doença em 73,4% dos casos. Por fim, foi questionado se os portadores de diabetes e/ou hipertensão tiveram alguma dificuldade ocasionada por mudanças no estilo de vida decorrentes das doenças, sendo que 73,9% afirmaram não ter encontrado qualquer problema. Dos 26,1% restantes, as dificuldades foram relacionadas principalmente às mudanças de hábitos no que diz respeito à alimentação (71,7%), às limitações de trabalho e de prática de exercícios (15,2%) e à redução do consumo de bebida alcoólica (13,0%).
Discussão:
Os resultados do presente estudo apontaram para uma predominância do sexo feminino (74,4%), mesmo quando avaliado separadamente por doença. Dados semelhantes foram encontrados em estudo realizado com diabéticos atendidos em nível de atenção primária em Belo Horizonte - MG, no período de 1993 a 2000, no qual se observou uma prevalência de mulheres em acompanhamento nas Unidades de Saúde 26. Da mesma forma, em estudo realizado com hipertensos atendidos na USB em São Paulo, a maioria dos pacientes foi do sexo feminino (68,8%). Essa predominância pode sugerir uma maior preocupação das mulheres com sua própria saúde, ou ainda uma maior acessibilidade destas aos serviços de saúde, acessibilidade esta, que pode estar relacionada à existência de um maior número de programas de saúde nas UBSs direcionados às mulheres quando comparado aos homens; ao fato de que na maioria das vezes são as mulheres que acompanham as crianças aos serviços de saúde, facilitando assim o acesso às atividades e às equipes de saúde, entre outros 27.
A média da idade dos entrevistados foi de 63,59 anos, superior à encontrada em estudo com diabéticos realizado no Rio Grande do Sul, entre 1999 e 2000, no qual a média de idade dos indivíduos participantes foi de 44 anos 7. Nas Américas, dentre os países desenvolvidos, haverá um aumento da prevalência de diabetes, principalmente nas faixas etárias mais avançadas, o que é explicado pelo aumento da expectativa de vida. Já nos países em desenvolvimento, este crescimento será observado em todas as faixas etárias, mas principalmente no grupo de 45 a 64 anos, grupo que deverá ter sua prevalência triplicada nos próximos 20 anos. Isto acarreta um custo maior para os serviços de saúde, além do impacto negativo sobre a qualidade de vida 28.
Os usuários estudados são na maioria de baixa escolaridade. Observa-se que 54,9% têm menos de quatro anos de estudo e podem ser considerados, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, como analfabetos funcionais 29; quando se associa a estes os 34,5% que tinham o ensino fundamental incompleto, tem-se que 89,4% dos usuários entrevistados com uma baixa escolaridade. Este fato irá influenciar na adesão ao tratamento, seja pelas menores condições financeiras, seja pela falta de conhecimento, como será avaliado posteriormente.
Dados similares foram encontrados em estudo realizado em Ribeirão Preto com indivíduos portadores de Diabetes Melito Tipo 2 no ano de 1999, no qual 82,7% dos entrevistados tinham o primeiro grau incompleto. Também em estudo realizado no Rio Grande do Sul, cerca de 42% dos indivíduos não completaram o ensino 30,7. Essa baixa escolaridade, comum às diferentes regiões do país, pode representar dificuldades no entendimento das orientações realizadas pela equipe multiprofissional, assim como, no seguimento do tratamento, sendo portanto, um importante indicador a ser observado tanto pelos gestores, como pela equipe no planejamento de estratégias, programas, propostas e ações destinadas a este grupo populacional.
O tratamento destas doenças era primordialmente medicamentoso. Para o tratamento da hipertensão arterial, grande parte dos indivíduos faziam uso de medicamentos anti-hipertensivos, sendo os principais utilizados o captopril, hidroclorotiazida e nifedipina, embora não avaliado neste estudo, é importante destacar que esses medicamentos podem causar efeitos colaterais em seus usuários.
O captopril, inibidor da enzima conversora da angiotensina, pode provocar tosse, paladar metálico, anorexia, diarréia e obstipação. Deve-se ter precaução com diabéticos, pois o fármaco pode provocar redução na glicemia. Além disso, ele retarda o declínio da função renal em indivíduos com nefropatia diabética. Juntamente com o uso de hidroclorotiazida (diurético), pode ser necessária a suplementação da dieta com o potássio. Outras possíveis reações adversas do hidroclorotiazida são vertigens, tremores, cefaléias, náuseas, vômitos, hiperuricemia etc. Deve-se ter precaução em diabetes, regulando a dose de insulina e de hipoglicemiantes orais, já que aumenta a glicemia, sendo que também pode potencializar desajustes no metabolismo lipídico 31,32.
No caso, do fármaco nifedipina, antagonista dos canais de cálcio, os efeitos colaterais mais comuns são náuseas, dispepsia, flatulência, obstipação. Este medicamento não provoca alterações no metabolismo lipídico e no de carboidratos 31,32.
Em relação à escolha dos anti-hipertensivos, aspectos como o impacto dessas drogas na qualidade de vida dos pacientes devem ser considerados, assim como a eficácia, condições socioeconômicas, uso combinado de outros anti-hipertensivos, tolerabilidade dos mesmos, entre outros. Alguns estudos informam que os efeitos colaterais destes medicamentos têm comprometido a qualidade de vida dos indivíduos, principalmente quando administrados em doses maiores 33. Daí a importância de serem incorporados hábitos de vida saudáveis, como a atividade física, associados aos medicamentos, a fim de reduzir a quantidade ministrada no mesmo. O elevado nível de atividade física diária correlaciona-se com menores níveis de pressão arterial em repouso. Além disso, o exercício físico aeróbio reduz cerca de 3,8 mmHg da pressão sistólica, e 2mmHg da pressão diastólica 34.
Quanto aos fatores de risco, menos de um terço da população entrevistada (32.6%), do município de Teixeiras, pratica alguma atividade física. Porém, esta prevalência ainda é superior à encontrada pelo inquérito realizado pelo IBGE em 1996-1997 nas regiões Sudeste e Nordeste, que foi igual a 13%. Atualmente, as evidências quanto aos padrões de atividade física da população em geral apontam para um baixo gasto energético e para o crescimento do sedentarismo. O risco relativo para hipertensão e para doenças cardiovasculares causadas por este fator de risco é estimado em 2,1 e 1,9, respectivamente. Assim, o estímulo para a prática de atividade física, realizada de forma moderada e regular, por um tempo mínimo de 30 minutos, torna-se benéfico para redução da incidência das doenças crônicas não transmissíveis, sendo, portanto importante o estímulo destas práticas de atividades físicas pela equipe multiprofissional 1,8.
Apesar do baixo percentual de indivíduos que tiveram orientação de um educador físico (apenas 8,6%) neste estudo, deve-se destacar a importância da prescrição individualizada dos exercícios físicos, sendo estes planejados segundo as necessidades, metas, capacidades iniciais e história clínica do paciente. Desta forma, os benefícios e a segurança dos exercícios físicos podem ser potencializados, promovendo o desenvolvimento da capacidade cardiovascular, força e resistência muscular, além da flexibilidade muscular 34.
Em relação às práticas alimentares, a situação é bastante preocupante já que os consumos per capitas diários de açúcar (153g), de sal (18g) e de óleo (60g), foram muito superiores às quantidades recomendadas pela Pirâmide Alimentar Adaptada 35. De acordo com tal recomendação a ingestão de açúcar deve variar de 27,5 g a 55g de açúcar e de óleo de 8,11g a 16,22g. Quanto ao consumo de sal, a Sociedade Brasileira de Hipertensão (SBH) recomenda a ingestão de 6 g per capita diários 36. Vale ressaltar a importância da integração da equipe multiprofissional do PSF no desenvolvimento de atividades interdisciplinares em grupo, além de orientações individuais e familiares relacionadas à reeducação nutricional, assim como, o desenvolvimento de estratégias que estimulem à mudança de hábitos alimentares e estilo de vida da população em geral.
A baixa prevalência do consumo de cerveja e vinho pode ser considerada como um fator positivo nesta população. Apesar dos efeitos favoráveis dos flavonóides presentes no vinho tinto, com diminuição da formação da placa aterosclerótica, o consumo elevado de álcool associa-se a maior mortalidade total, morte súbita arrítmica, hipertensão arterial, cardiomiopatia, acidente vascular cerebral hemorrágico, doença hepática e pancreática, e diversas formas de câncer 1. Uma das dificuldades de ter o controle do uso de bebidas alcoólicas é o fato de existir a aceitação social da bebida. Os prejuízos apontados pelas pessoas à bebida alcoólica estão mais associados à forma e a freqüência como ela é usada, do que ao seu uso em si 15.
Em relação ao tabagismo, quase metade dos entrevistados fumam ou já fumaram (47,5%). Deve-se destacar que este hábito, seja ativo ou passivo, é um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares, acelerando a progressão das lesões ateroscleróticas, além da ocorrência de fenômenos trombóticos. Diante disto, é necessário que sejam adotadas estratégias integradas e sustentáveis de prevenção e controle dessas doenças, visto que muitas vezes os indivíduos só se sentem motivados a se absterem deste hábito, após apresentarem algumas manifestações dessas doenças 1,8.
No grupo dos diabéticos, mais da metade dos entrevistados em uso de insulina sabiam aplicá-la, porém devem ser feitos trabalhos no sentido de treinar todos os pacientes para esta função. Pesquisadores relatam que 60% a 80% dos pacientes diabéticos em uso de seringas falham em algum aspecto na administração de insulina 37. O método mais tradicional e conhecido pela população é o das injeções subcutâneas, administradas três a cinco vezes por dia, em média, mas outras formas alternativas vêm sido utilizadas ou estão em fase de estudo, como as canetas de insulina, a insulina por via inalatória, a barra de insulina e a bomba de infusão contínua. O sucesso da terapia insulínica está associado não só à dosagem do hormônio, mas também à forma de administrá-lo. Até mesmo o local de aplicação pode acarretar quadros de hipoglicemia, caso a pessoa vá fazer um exercício depois utilizando grupamentos musculares de áreas que coincidam com o local onde o hormônio foi injetado 25.
Outro dado relevante observado neste estudo foi o grande número de pessoas que não examinavam seus pés. A neuropatia diabética periférica, a desinformação sobre os cuidados com os pés, a presença de pontos de pressão anormal que favorecem as calosidades, as deformidades, a doença vascular periférica e as dermatoses comuns (sobretudo entre os dedos) são fatores de risco importantes para o aparecimento de úlceras nos pés e amputação. O paciente diabético deve ser ensinado a observar o aparecimento de úlceras, rachaduras, alterações de cor, além de calos e unhas encravadas, sendo que estes só devem ser retirados por um profissional. Outros cuidados são: cortar as unhas de forma reta (horizontalmente); vestir meias limpas, preferencialmente de algodão e calçados macios que não apertem e lavar os pés diariamente com água morna e sabão, secando-os bem 38. Estes cuidados também devem ser tomados para a prática de exercícios físicos visando minimizar traumas 34.
É imprescindível a avaliação precoce dos sinais e sintomas das complicações crônicas, em doenças como o diabetes mellitus. Todavia, no país, alguns serviços não realizam com regularidade procedimentos simples como observar os pés dos pacientes portadores de diabetes. Com isto, eleva-se o risco de complicações da doença que poderiam ser evitadas, como por exemplo, amputação de membros inferiores, já que esta é uma das possíveis complicações do diabetes, devido muitas vezes à falta de orientações e cuidados que se devem ter com os pés 39.