0335/2024 - Sobre a Farma e a Big Pharma
About Pharma and Big Pharma
Autor:
• Reinaldo Guimarães - Guimarães, R. - <reinaldo.guimaraes47@gmail.com>ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0138-9594
Resumo:
O texto discute a trajetória da indústria farmacêutica global na direção de tornar-se o que se denomina atualmente de Big Pharma. Apresenta a configuração do Complexo Industrial da Saúde e expõe suas dimensões econômicas e políticas. Sugere como determinantes essenciais da transformação da indústria farmacêutica global na Big Pharma o processo de financeirização da economia política mundial e a harmonização do regime de propriedade intelectual realizado pela Organização Mundial do Comércio através do acordo TRIPS. Além disso discute as mudanças microeconômicas ocorridas no processo produtivo das empresas. Finalmente aponta que essa trajetória se inscreve no processo de fragilização da representação multilateral construída no pós Segunda Guerra Mundial durante a década de 1990.Palavras-chave:
Política de Ciência e Tecnologia, Prioridades de Pesquisa em Saúde, Sistema Único de Saúde, Indústria Farmacêutica, Poder e Saúde.Abstract:
The text discusses the trajectory of the global pharmaceutical industry towards becoming what is currently called Big Pharma. Also presents the configuration of the Health Industrial Complex and exposes its economic and political dimensions. It suggests as essential determinants of the transformation of the global pharmaceutical industry into Big Pharma the processes of financialization of the global political economy and the harmonization of the intelectual property regime carried out by the World Trade Organization through the TRIPS agreement. Furthermore, it discusses the microeconomic changes that have occurred in the companies\' production process. Finally, it points out that this trajectory is part of the process of weakening multilateral representation built after the Second World War during the 1990s.Keywords:
Policy of Science and Technology, Priorities in Health Research, Unified Health System, Pharmaceutical Industry, Power and Health.Conteúdo:
1. Introdução
Em 1952, o Presidente do Conselho da Merck - George W. Merck – fez a seguinte declaração a respeito dos valores da empresa: “Tentamos nunca esquecer que o medicamento é para o paciente. Não é pelos lucros. Os lucros vêm depois e, se nos lembrarmos disso, eles nunca deixaram de aparecer. Quanto melhor nos lembramos, maiores eles são”(1). Já, em 2009, negando um pedido de doação de vacinas contra a gripe H1N1 (suína) feita pela então diretora-geral da Organização Mundial da Saúde, Margareth Chan, o CEO da Novartis Daniel Vasella declarou ao jornal Financial Times: “Países em desenvolvimento e doadores devem cobrir os custos. É preciso haver estímulos financeiros para que a produção seja sustentável” (2). E em 2013, o CEO da Bayer, Marijn Dekkers, em um evento promovido também pela Financial Times a respeito do licenciamento compulsório do medicamento oncológico Nexavar reivindicado pela Índia, declarou: "Não desenvolvemos este medicamento para os indianos. Nós o desenvolvemos para pacientes ocidentais que podem pagar, honestamente"(3).
Essas três declarações abrem este texto, não para avaliar a postura ética dos empresários que as fizeram nem mesmo das empresas farmacêuticas que eles representavam ao fazê-las. Eu suspeito que, atualmente, mesmo a Merck tenha valores distintos daqueles de 1952. As três declarações são reveladoras de um deslocamento, de uma transformação do modo de ser, de se organizar e de atuar das grandes empresas farmacêuticas ocorridas nesse interregno temporal. As falas são um indicador, ainda que retórico, desse deslocamento que, de resto, não incidiu apenas nas grandes farmacêuticas, mas no mundo das grandes empresas em outros campos de atuação. Mas, ficando nas farmacêuticas, este texto pretende analisar a transformação da Farma em Big Pharma, que é como essa indústria é conhecida atualmente.
2. O Complexo Industrial da Saúde
A Big Pharma é um dos componentes do Complexo Industrial da Saúde que, por sua vez é parte de um complexo econômico e industrial que inclui os serviços de saúde, o segmento de comunicação e informação e os incumbentes que formulam as políticas no campo da saúde humana. Aqui vamos nos restringir ao seu componente industrial e, quase sempre, ao seu braço econômico, financeiro e político mais importante – o seu “carro-chefe” – que é a indústria farmacêutica, representada pelo segmento de medicamentos e vacinas que, como se verá mais adiante, são cada vez mais interpenetrados.
Dentre as características dessa indústria, destacamos as cinco que entendo serem essenciais para analisar o desenvolvimento da Big Pharma. São elas a sua dimensão, a sua distribuição geográfica, a sua concentração empresarial, a dimensão dos seus investimentos em pesquisa/desenvolvimento e o seu poder político.
Estabelecer uma dimensão global desse complexo industrial não é simples, e ela poderia ser medida por mais de uma vertente. A mais utilizada pela literatura é uma estimativa do tamanho de seu mercado, habitualmente medido pelo valor financeiro de suas vendas. Outra dificuldade diz respeito à precisão dos valores anunciados, pois como são informações que as empresas, de modo geral, gostariam de não serem obrigadas a divulgar, os números disponíveis derivam muitas vezes de empresas de consultoria que os consolidam e vendem para seus clientes, que são as empresas do complexo. Mais ainda, como seus clientes preferem ter boas notícias, os números costumam ser levemente superestimados, em particular quando se referem a previsões de comportamento futuro do mercado. Outra observação necessária é a variação permanente do lugar relativo das empresas dependendo do lançamento de medicamentos de grande sucesso comercial (blockbusters). Por exemplo, as empresas Novo Nordisk, dinamarquesa e a norte-americana Eli Lilly, ausentes da lista de dez líderes em 2023 certamente subiram no ranking com o lançamento de novos medicamentos para tratar diabetes.
Em 2023, o mercado de medicamentos atingiu 1,56 trilhão de dólares. (IQVIA Institute for Human Data Science). Esse mercado é liderado por seis empresas norte-americanas, duas britânicas, uma francesa e uma suíça. Em 2022 o mercado de vacinas atingiu 124 bilhões de dólares (78 bilhões anti Covid). Em 2021, foi de 144 bilhões ($101 bilhões anti Covid). (WHO Global Vaccine Market Report 2023 Update https://www.who.int/publications/i/item/B09022). Notar a diminuição das vendas entre 2022 e 2021, muito provavelmente derivada da queda das campanhas de vacinação contra as demais doenças e do negacionismo vacinal durante a pandemia ocorrido em vários países.
Em 2022, o mercado mundial de equipamentos médicos (imagem, diagnósticos e outros) atingiu 570 bilhões de dólares. As matrizes de seis das 10 empresas que lideram esse mercado são, também, norte-americanas; as demais quatro são, uma alemã, uma francesa, uma holandesa e uma suíça. (Precedence Request - https://www.precedenceresearch.com/medical-devices-market)
Observa-se, pois, que a ideia de um carro-chefe das indústrias de saúde é justificada, com 69% do mercado total ficando com os medicamentos, chegando a 75% do mercado do complexo quando as vacinas são somadas.
A distribuição geográfica do mercado de medicamentos é altamente concentrada. Em 2022, dez países respondiam por 72% do mercado mundial, sendo 42,6% deste localizados nos Estados Unidos da América. (https://www.statista.com/statistics/245473/market-share-of-the-leading-10-global-pharmaceutical-markets/)
A indústria farmacêutica é fortemente oligopolizada, com tendência a concentrar-se ainda mais, como se verá adiante. Em 2021 as 10 maiores farmacêuticas responderam por 32,7% do mercado mundial. As 20 maiores, por 47,5%. Dentre as dez, seis são norte-americanas, duas britânicas, uma francesa e uma suíça. (https://www.pharmexec.com/view/2022-pharm-exec-top-50-companies)
O oligopólio entre as vacinas é, de longe o mais concentrado e em 2022 as 10 maiores empresas (sem levar em conta as vacinas contra a COVID-19) responderam por 86% do mercado global, sendo 76% cobertos por cinco empresas, sendo três norte-americanas, uma francesa e uma britânica. Os 11% restantes são cobertos por seis empresas, sendo três chinesas, uma australiana, uma indiana e uma norte-americana. (https://cdn.who.int/media/docs/default-source/immunization/mi4a/who_gat_008_global_vaccine_market_report_march_12.pdf?sfvrsn=a61f4733_1&download=true)
No mercado de equipamentos de saúde em 2021, as 10 maiores empresas responderam por 38,4% do mercado mundial, sendo seis empresas norte-americanas e as quatro restantes são, alemã, francesa, holandesa e suíça. (https://www.statista.com/statistics/329035/global-medtech-market-share-of-top-20-companies/).
O valor dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) segundo setores industriais são bastante enviesados, pois aqueles relativos às indústrias de defesa e aeroespacial são, em sua grande maioria, subestimados, por serem classificados, isto é, ocultos por razões de Estado. Levando em conta essa ressalva, em 2022 o complexo industrial da saúde foi o segundo setor industrial em investimentos em P&D, estando atrás apenas do setor das tecnologias de comunicação e informação (TICs). Segundo os dados disponíveis, este último responde por 43,7% desses investimentos e a indústria da saúde responde por 20,9%. https://www.statista.com/statistics/270233/percentage-of-global-rundd-spending-by-industry/
Finalizando esse perfil sumário do complexo de indústrias da saúde, vale apontar o lugar do mesmo enquanto sua capacidade de lobby, essencial para conferir poder político capaz de sustentar seus interesses. Da leitura do perfil do complexo, fica claro o papel hegemônico nele jogado pelos Estados Unidos da América. Nesse país, onde a atividade é não somente legalizada, mas valorizada, em 2023 o complexo industrial da saúde foi o primeiro nas despesas com lobby dentre os dez setores que mais despenderam recursos financeiros nessa atividade. Naquele ano foram despendidos 378 milhões de dólares, particularmente junto ao Congresso, para sustentar seus interesses e sua liderança global nesse terreno. https://www.statista.com/statistics/257364/top-lobbying-industries-in-the-us/
3. A Financeirização na Indústria Farmacêutica
Como observei no início deste texto o deslocamento da indústria farmacêutica em direção a tornar-se uma Big Pharma não foi um movimento nem exclusivo nem nela teve origem. Na minha análise, a compreensão desse deslocamento tem como dimensão essencial o aprofundamento do processo de financeirização das relações econômicas mundiais operado sob a liderança dos Estados Unidos da América, em particular a partir da instituição do unilateralismo na década de 1990, após a derrocada da União Soviética. Belluzzo sugere que nesse processo “alterou-se a relação entre os recursos destinados ao investimento e aqueles utilizados para propiciar a elevação ‘solidária’ dos ganhos dos acionistas e da remuneração dos administradores...” (4) Não cabe aqui debater mais profundamente os fundamentos econômicos da financeirização nem os desbordamentos políticos e geopolíticos da mesma. A partir de uma constatação quase tautológica de que a financeirização é um processo onde as dimensões financeiras passam a governar de modo predominante iniciativas micro e macroeconômicas, o que importa aqui é analisar os aspectos específicos com que esse processo impactou e orientou a indústria farmacêutica em nível mundial.
No terreno microeconômico há um elemento comum sobre esse impacto, que é a proeminência de atores fora do corpo dirigente das empresas, acima desses executivos, e cujo interesse não tem ligação direta com os objetivos específicos e com os eventuais valores éticos de alguma forma vinculados àqueles objetivos. Em outros termos, são atores que governam os que deveriam governar. No caso da indústria farmacêutica, esses personagens, de modo geral, não estão comprometidos com os impactos biológico, psíquico, sanitário e social envolvidos nos produtos que são lançados no mercado pelas empresas. Esses personagens são os grandes acionistas, investidores detentores de quantidades significativas de ações de companhias negociadas em algumas (poucas) bolsas de valores. E, vale ressaltar, eles não estão cumprindo seu papel como pessoas físicas, mas como representantes de grandes conglomerados financeiros – bancos, fundos de investimento, patrimônios de famílias muito ricas, etc.
As informações que seguem sobre o impacto desse modelo do que poderíamos chamar “supra governança” na indústria farmacêutica foi estudado por dois autores, que pesquisaram 27 grandes empresas farmacêuticas entre 2000 e 2018 a partir do exame de seus balanços, do valor dos dividendos e recompras de ações pagos aos acionistas e do tamanho dos ativos intangíveis (patentes e ágio sobre ações) como proporção do ativo total (5). Em resumo, Fernandez e Klinge mostraram:
• Um crescimento das reservas financeiras de US$ 83 bilhões em 2000 para US$ 219 bilhões em 2018. Dentre as 27, as 10 maiores empresas tinham US$ 135 bilhões de ativos líquidos em 2018.
• Um aumento do pagamento a acionistas, que foi de 88% dos investimentos em P&D para 123% entre 2000 e 2018. Portanto, relativamente mais pagamentos de dividendos do que recursos para P&D.
• O endividamento com baixo investimento em novas instalações e máquinas resultando em aumentos nas despesas com P&D menores do que os esperados
• Uma mudança no modelo de negócios, do desenvolvimento e produção de novos produtos para a compra de concorrentes e de pequenas empresas, objetivando a diminuição da concorrência e a aquisição de direitos de propriedade intelectual.
• O significado mais geral da investigação de Fernandez e Klinge é que a Big Pharma funciona cada vez menos como uma produtora de novos e potencialmente úteis produtos voltados à melhoria da saúde e mais como um fundo privado de investimentos, mediante os mecanismos expostos acima. A compra de outras empresas será vista mais adiante, assim como a explosão dos preços dos medicamentos.
Esse modelo de gestão que comporta uma instância de governança externa ao metabolismo produtivo da empresa e cujas decisões estão acima das de seus dirigentes executivos, vem provocando algumas repercussões que são, se não exclusivas e originais da Big Pharma, bastante frequentes. A primeira delas é o crescimento da taxa de rotatividade entre CEOs e outros altos executivos nas empresas em função de resultados abaixo dos esperados pelos investidores. Outra repercussão diz respeito à radicalização de práticas comerciais, em particular na área de marketing, que vem provocando o crescimento de ações judiciais contra empresas da Big Pharma por delitos de variados tipos. Neste século, os principais acordos para o encerramento de litigâncias entre empresas farmacêuticas e a justiça norte-americana atingiram US$ 32,8 bilhões e envolveram quase todas as grandes empresas farmacêuticas. A maior delas (~US$ 10 bilhões) envolve a farmacêutica Purdue e está relacionada à comercialização da Oxycontina e o surto de suicídios e outras doenças provocados por ela. Com a exceção desse caso, que resultou na falência da empresa, todos os demais acordos (Merck, Wyeth, GSK, Pfizer, Takeda, Johnson&Johnson, Abbott e Eli Lilly), foram absorvidos com facilidade pelas empresas quando se compara o valor das multas com os lucros pelas vendas anteriores dos produtos que foram objeto dos acordos judiciais (6).
4. A Mudança do Padrão Tecnológico
Outro elemento associado ao desenvolvimento da Big Pharma foi a introdução e rápido desenvolvimento de um novo padrão tecnológico na indústria farmacêutica. As mudanças de padrão são graduais e aspectos do modelo anterior permanecem no subsequente. Grosso modo até a década de 1960, o padrão tecnológico prevalente na indústria farmacêutica foi chamado de ‘Random screening’, baseado no beneficiamento de produtos naturais e no desenvolvimento de moléculas por rota de síntese química, muitas vezes baseada em tentativas do tipo ensaio e erro. Nos anos 1970, ainda explorando a síntese química, o padrão passa a ser o chamado ‘Rational Drug Design’, com o desenvolvimento do conceito de receptores no organismo humano. Então, o processo de síntese química de moléculas passa a ser orientado para receptores especificados. Nessa etapa, a estrutura organizacional das empresas era baseada em intensa verticalização com atividades internas de P&D, tendo com um dos objetivos mais importantes a garantia do segredo industrial, em um ambiente de propriedade intelectual ainda não “harmonizado” internacionalmente. Na década seguinte, com o avanço da biologia e da genética moleculares, o padrão tecnológico sofre uma alteração radical com a introdução da biotecnologia no desenvolvimento e na produção farmacêuticas e este vem sendo um elemento essencial na formação do ambiente da Big Pharma. Atualmente, estima-se que o mercado de medicamentos biológicos represente cerca de 1/3 do mercado farmacêutico mundial. Mas é o segmento que cresce mais rapidamente, é o mais exigente em termos de recursos de P&D e o que lança produtos e terapias mais caras (7).
5. Fusões e Aquisições
A introdução da biotecnologia no processo de desenvolvimento e produção da indústria farmacêutica colocou um problema crucial que foi o de vislumbrar uma muito promissora nova rota tecnológica a partir de um mundo quase desconhecido para empresários e técnicos formados no ambiente da química fina. Rapidamente, a fonte do novo conhecimento em bases industriais foi identificada e estava nas indústrias de vacinas. Isso gerou um movimento de compra de Know-How mediante a absorção de mão de obra especializada e mesmo de empresas fabricantes de vacinas. Atualmente, várias dentre as maiores fabricantes mundiais de vacinas (Johnson&Johnson, AstraZeneca, GSK, Merck, Pfizer, entre outras) são propriedade dessas grandes farmacêuticas. Mais tarde, com a explosão na criação de start-ups, muitas possuidoras de produtos promissores embora ainda em fase de desenvolvimento, a estratégia da Big Pharma passou ser absorve-las. Por exemplo, em 2018, a desenvolvedora do medicamento Zolgensma (AveXis), para o tratamento da Atrofia Muscular Espinhal foi comprada pela Novartis por 8,7 bilhões de dólares.
Esse movimento de fusões e aquisições, conhecido no jargão pelo acrônimo (M&A), pelo aumento de sua intensidade tornou-se também um elemento definidor das estratégias da Big Pharma. Em verdade, teve início já nas últimas décadas do século passado, quando ocorreu um conjunto de fusões e aquisições entre grandes empresas, mas neste século acelerou consistentemente, com a exceção do período imediatamente posterior à crise global de 2008. A despeito de algum debate, a concentração no mercado, aumentando a oligopolização, tende a diminuir a concorrência e a competitividade na busca por novos produtos na ponta da invenção. E, na outra ponta, induzir a maiores aumentos de preço dos medicamentos (8). Atualmente, atividades de M&A entre grandes empresas parecem estar em declínio, mas as compras de pequenas empresas com produtos promissores em seus portfolios pela Big Pharma, permanece intensa e é a principal modalidade de M&A atualmente. E há evidências de que essa estratégia produz melhores resultados para as empresas quando comparadas com o desenvolvimento interno de produtos (9). De acordo com os autores desta referência, “Em 2020, ocorreram 895 negócios de fusões e aquisições em todo o mundo no setor biotecnológico e farmacêutico com um valor superior a 173 bilhões de dólares dos Estados Unidos (USD)”.
6. Desverticalização
Em contraponto radical com o modelo empresarial verticalizado, a Big Pharma foi em sentido oposto, cultivando crescentemente uma radical desverticalização de suas empresas. Essa estratégia, chamada de Business Process Outsourcing, começou com a terceirização de etapas rotineiras e atualmente envolve praticamente todas as etapas desde a invenção, o desenvolvimento, a produção, a pesquisa clínica, o registro, o marketing e as vendas de produtos. O sentido mais geral desse movimento é o compartilhamento de riscos visando a economia de custos, providência necessária a qualquer empresa, mas muito mais necessária em um ambiente de negócios onde a remuneração aos grandes acionistas é o principal objetivo do negócio. A pergunta que fica é: se todas as etapas são terceirizadas, o que fica com a empresa que terceiriza? O modelo é funcional por duas razões, sendo a primeira o compartilhamento de responsabilidades em vista de eventuais atritos judiciais. A segunda é a garantia absoluta da propriedade do produto final, na medida em que a empresa que terceiriza detém o principal bem que garante a sua propriedade, um bem intangível, que são as patentes que protegem a sua propriedade intelectual. Aqui, vale observar que essa garantia de propriedade exigiu um movimento articulado internacionalmente, sob a liderança dos Estados Unidos da América em associação com vários países produtores de medicamentos – a criação da Organização Mundial do Comércio no âmbito do sistema ONU e a assinatura dos acordos TRIPS. Veremos isso adiante.
7. Inflação nos Preços
Outra dimensão cada vez mais presente nas estratégias da Big Pharma é a inflação nos preços de medicamentos. Em países sem controle de preços de medicamentos, essa inflação vem atingindo níveis muito altos. Para mencionar a situação mais grave, nos Estados Unidos da América o presidente Joe Biden precisou fazer apelos aos fabricantes para que não aumentassem seus preços. Ao lado de alguns fatores objetivos em relação ao aumento de custos, há certamente elementos derivados dos mecanismos de financeirização, em particular o procedimento de subsídios cruzados, como incluir os custos dos insucessos no desenvolvimento de produtos que fracassaram no caminho de seu desenvolvimento na precificação de um produto que chega ao mercado.
As doenças raras entram cada vez mais no negócio da Big Pharma. São doenças com baixas incidência e prevalência, habitualmente com alta letalidade e para as quais não existem medicamentos eficazes. Novas terapias para essas doenças são, em sua maioria, medicamentos biológicos ou terapias gênicas que lançam mão de células modificadas do próprio paciente. O alto risco tecnológico embutido na transformação de candidatos a medicamentos ou terapias em produtos no mercado e a gravidade das doenças às quais se destinam faz com que eles sejam lançados a preços não sustentáveis para pacientes, suas famílias e sistemas de saúde. Estes últimos vêm sendo cada vez mais pressionados com relação à incorporação de novos medicamentos no rol de produtos que devem oferecer às populações sob sua responsabilidade.
8. A Harmonização Global da Propriedade Intelectual
Nos dias de hoje, está absolutamente claro que os acordos TRIPS resultaram em uma harmonização mundial do regime de propriedade intelectual em benefício dos detentores de patentes, praticamente todos localizados no Hemisfério Norte, em particular Estados Unidos, Grã Bretanha, França, Alemanha, Suíça e Japão. E mais recentemente, a China. E que um dos setores industriais mais afetados, quando esse impacto é medido pela intensidade da litigância jurídica em torno a patentes, é o complexo industrial da saúde, com os medicamentos/vacinas e equipamentos médicos atrás apenas da indústria de TICS (10).
O processo que levou ao TRIPS teve início ainda na conjuntura anterior à Guerra Fria, em 1947, quando foi criado, no âmbito da ONU, o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT, no acrônimo em inglês). Como o nome do organismo sugere, ele foi criado para tratar de bens tangíveis – regras sobre tarifas e comércio – e entre sua criação e o início da conjuntura mundial unilateral (anos 1990), ele tratou disso. Em 1994, decidiu regulamentar um bem intangível, que é a propriedade intelectual, aprovando um Acordo Sobre Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio (TRIPS no acrônimo em inglês) e no ano seguinte criou a Organização Mundial do Comércio (OMC), vinculando o ingresso na mesma à assinatura do Acordo. O TRIPS foi levemente suavizado em 2003, com a assinatura, por pressão da Índia, África do Sul e Brasil e impulsionada pela pandemia de HIV/AIDS, da Declaração de Doha sobre o TRIPS e Saúde Pública.
Resumidamente, as disposições do TRIPS, incluídas as poucas exceções quanto à saúde pública, determinam que as disposições do acordo que protegem a propriedade intelectual são específicas, obrigatórias e passiveis de judicialização; que incluem todos os produtos e processos de todas as tecnologias; que a duração da proteção das patentes será de vinte anos; que o alcance das exceções permitidas são limitadas a casos muito específicos (por exemplo, o licenciamento compulsório em situações de crise sanitária); que o cumprimento de seus dispositivos pelos países devem ser garantidos por leis específicas; e que o descumprimento desses dispositivos deve ser questionado nos termos do mecanismo de solução de controvérsias da própria OMC.
Ora, no plano da indústria da saúde, as patentes são de propriedade da Big Pharma. No Instituto Nacional de Propriedade Industrial, que é o órgão brasileiro que cuida da propriedade intelectual, cerca de 80% das patentes depositadas pertencem a não residentes no Brasil. No ponto de vista do jurista brasileiro Denis Borges Barbosa, grande pensador nesse campo, há duas questões a serem discutidas no terreno da diplomacia e do poder. O primeiro deles já comentei brevemente acima, que é o patenteamento de bens intangíveis sendo realizado por um órgão criado para tratar de bens tangíveis (tarifas e comércio). Em outros termos, tratou-se de criar um comércio de intangíveis, o que é muito passível de debate - será razoável estabelecer monopólio sobre ideias, mesmo que estas sejam potencialmente transformáveis em produtos ou processos? Além disso, considerando que a própria ONU havia criado em 1967 uma Organização Mundial de Propriedade Intelectual, por que ela não foi acionada para tratar do tema? (11).
9. Epilogo
Essas notas sobre o desenvolvimento da Big Pharma devem ser entendidas como um caso particular de um modo de relacionamento entre as nações que tem sido chamada de “década neoliberal” ou “década da globalização”. Foi esse ambiente que sobredeterminou, tanto a financeirização das empresas do complexo industrial da saúde, quanto a instituição de um padrão mundial harmonizado de propriedade intelectual, que vêm sendo os dois principais pilares do atual modo de funcionamento desse complexo. E por ser considerada desnecessária ou ultrapassada, a arquitetura multilateral criada em conjunturas anteriores entrou em declínio, como é o caso do sistema das Nações Unidas. Entretanto, a financeirização e a política harmonizada de propriedade intelectual vão permanecer, mesmo com a atrofia e irrelevância das duas instituições do sistema ONU que mais interessam no tema deste texto: a OMS e a (tão jovem) OMC. Aquela, hoje dominada direta ou indiretamente pela Big Pharma mediante o garrote financeiro provocado por um orçamento no qual cerca de 80% dos recursos são oriundos de doadores e cuja aplicação é decidida por estes e não pela direção da OMS. Já, a OMC, desde sua criação, rapidamente se transformou em trincheira dos países do Hemisfério Norte detentores de patentes. Confirma essas afirmações o papel lamentável das duas agências durante a pandemia de COVID-19. No caso da OMS, o fracasso quase completo da iniciativa COVAX, criada para promover uma distribuição minimamente equitativa de vacinas contra o Sars-CoV-2 pelos países. No que toca a OMC, a reiterada e vergonhosa recusa em patrocinar um waiver na proteção patentária relacionada a vacinas anti COVID, proposta por África do Sul e Índia. E a respeito dessa irrelevância, encerro este texto com uma citação de José Luís Fiori sobre o tema, numa clave ampliada.
“’..... E na década seguinte [1990], os EUA se aproveitaram de sua nova posição de poder e assestaram um último e definitivo golpe na “ordem multilateral” que eles haviam criado...E foi assim que se encerrou, de forma definitiva e melancólica, a primeira “ordem mundial hegemônica” do pós-II Guerra Mundial; e foi nesse momento, e não mais tarde, que o Conselho de Segurança da ONU perdeu toda e qualquer eficácia e legitimidade, por obra de seus próprios criadores...’”(12).
Referências
(1) "We try to remember that medicine is for the patient. We try never to forget that medicine is for the people. It is not for the profits. The profits follow, and if we have remembered that, they have never failed to appear“. https://www.merck.com/company-overview/history/
(2) https://www.swissinfo.ch/por/sociedade/novartis-n%C3%A3o-planeja-vacina-gratuita-contra-a-h1n1/7460746
(3) "We did not develop this medicine for Indians. We developed it for western patients who can afford it, quite honestly". https://www.techdirt.com/2014/01/27/big-pharma-ceo-we-develop-drugs-rich-westerners-not-poor/
(4) Belluzzo LG. Os vândalos e as Americanas. Carta Capital. 2023. [acessado em 02/2023] Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/economia/os-vandalos-e-as-americanas
(5) Fernandez, R; Klinge, TJ - Private gains we can ill afford -The financialisation of Big Pharma. Amsterdam, April 2020. https://www.somo.nl/wp-content/uploads/2020/04/Rapport-The-financialisation-of-Big-Pharma-def.pdf
(6) Blankenship K. -Fierce Pharma. Who joins Purdue on pharma's top 10 settlements list? Merck, GSK and Pfizer, for starters. September 12, 2019. https://www.fiercepharma.com/pharma/merck-gsk-pfizer-j-j-among-top-10-u-s-pharma-settlements-all-time
(7) Essa breve descrição histórica da indústria farmacêutica foi retirada do trabalho clássico de Luigi Orsenigo e Franco Malerba.
Orsenigo, L.; Malerba, F. -Innovation and market structure in the dynamics of the pharmaceutical industry and biotechnology: Towards a history-friendly model. August 2002. Industrial and Corporate Change 11(4):667-703 https://www.researchgate.net/publication/5212410_Innovation_and_market_structure_in_the_dynamics_of_the_pharmaceutical_industry_and_biotechnology_Towards_a_history-friendly_model
(8) Richman, B et al. - Pharmaceutical M&A Activity: Effects on Prices, Innovation, and Competition. Loyola University Chicago Law Journal. Volume 48, Issue 3 Spring 2017. https://lawecommons.luc.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=2605&context=luclj
(9) Büssgen, M; Stargardt, T. - To merge or not to merge? The impact of mergers and acquisitions on corporate success in the pharmaceutical industry. February 2024 Managerial and Decision Economics 45(2). https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1002/mde.4129
(10) How Current IP Patent Litigation Trends are Changing Risk Exposures https://www.aon.com/en/insights/articles/how-current-ip-patent-litigation-trends-are-changing-risk-exposures
(11) Barbosa, DB – A TRIPS e a experiência brasileira. https://www.dbba.com.br/wp-content/uploads/trips-e-a-experincia-brasileira.pdf
(12) Fiori, JL - A crise aguda e o declínio crônico do Ocidente. https://outraspalavras.net/geopoliticaeguerra/a-crise-aguda-e-o-declinio-cronico-do-ocidente/
https://sul21.com.br/opiniao/2024/05/a-crise-aguda-e-o-declinio-cronico-do-ocidente-por-jose-luis-fiori/
Em 1952, o Presidente do Conselho da Merck - George W. Merck – fez a seguinte declaração a respeito dos valores da empresa: “Tentamos nunca esquecer que o medicamento é para o paciente. Não é pelos lucros. Os lucros vêm depois e, se nos lembrarmos disso, eles nunca deixaram de aparecer. Quanto melhor nos lembramos, maiores eles são”(1). Já, em 2009, negando um pedido de doação de vacinas contra a gripe H1N1 (suína) feita pela então diretora-geral da Organização Mundial da Saúde, Margareth Chan, o CEO da Novartis Daniel Vasella declarou ao jornal Financial Times: “Países em desenvolvimento e doadores devem cobrir os custos. É preciso haver estímulos financeiros para que a produção seja sustentável” (2). E em 2013, o CEO da Bayer, Marijn Dekkers, em um evento promovido também pela Financial Times a respeito do licenciamento compulsório do medicamento oncológico Nexavar reivindicado pela Índia, declarou: "Não desenvolvemos este medicamento para os indianos. Nós o desenvolvemos para pacientes ocidentais que podem pagar, honestamente"(3).
Essas três declarações abrem este texto, não para avaliar a postura ética dos empresários que as fizeram nem mesmo das empresas farmacêuticas que eles representavam ao fazê-las. Eu suspeito que, atualmente, mesmo a Merck tenha valores distintos daqueles de 1952. As três declarações são reveladoras de um deslocamento, de uma transformação do modo de ser, de se organizar e de atuar das grandes empresas farmacêuticas ocorridas nesse interregno temporal. As falas são um indicador, ainda que retórico, desse deslocamento que, de resto, não incidiu apenas nas grandes farmacêuticas, mas no mundo das grandes empresas em outros campos de atuação. Mas, ficando nas farmacêuticas, este texto pretende analisar a transformação da Farma em Big Pharma, que é como essa indústria é conhecida atualmente.
2. O Complexo Industrial da Saúde
A Big Pharma é um dos componentes do Complexo Industrial da Saúde que, por sua vez é parte de um complexo econômico e industrial que inclui os serviços de saúde, o segmento de comunicação e informação e os incumbentes que formulam as políticas no campo da saúde humana. Aqui vamos nos restringir ao seu componente industrial e, quase sempre, ao seu braço econômico, financeiro e político mais importante – o seu “carro-chefe” – que é a indústria farmacêutica, representada pelo segmento de medicamentos e vacinas que, como se verá mais adiante, são cada vez mais interpenetrados.
Dentre as características dessa indústria, destacamos as cinco que entendo serem essenciais para analisar o desenvolvimento da Big Pharma. São elas a sua dimensão, a sua distribuição geográfica, a sua concentração empresarial, a dimensão dos seus investimentos em pesquisa/desenvolvimento e o seu poder político.
Estabelecer uma dimensão global desse complexo industrial não é simples, e ela poderia ser medida por mais de uma vertente. A mais utilizada pela literatura é uma estimativa do tamanho de seu mercado, habitualmente medido pelo valor financeiro de suas vendas. Outra dificuldade diz respeito à precisão dos valores anunciados, pois como são informações que as empresas, de modo geral, gostariam de não serem obrigadas a divulgar, os números disponíveis derivam muitas vezes de empresas de consultoria que os consolidam e vendem para seus clientes, que são as empresas do complexo. Mais ainda, como seus clientes preferem ter boas notícias, os números costumam ser levemente superestimados, em particular quando se referem a previsões de comportamento futuro do mercado. Outra observação necessária é a variação permanente do lugar relativo das empresas dependendo do lançamento de medicamentos de grande sucesso comercial (blockbusters). Por exemplo, as empresas Novo Nordisk, dinamarquesa e a norte-americana Eli Lilly, ausentes da lista de dez líderes em 2023 certamente subiram no ranking com o lançamento de novos medicamentos para tratar diabetes.
Em 2023, o mercado de medicamentos atingiu 1,56 trilhão de dólares. (IQVIA Institute for Human Data Science). Esse mercado é liderado por seis empresas norte-americanas, duas britânicas, uma francesa e uma suíça. Em 2022 o mercado de vacinas atingiu 124 bilhões de dólares (78 bilhões anti Covid). Em 2021, foi de 144 bilhões ($101 bilhões anti Covid). (WHO Global Vaccine Market Report 2023 Update https://www.who.int/publications/i/item/B09022). Notar a diminuição das vendas entre 2022 e 2021, muito provavelmente derivada da queda das campanhas de vacinação contra as demais doenças e do negacionismo vacinal durante a pandemia ocorrido em vários países.
Em 2022, o mercado mundial de equipamentos médicos (imagem, diagnósticos e outros) atingiu 570 bilhões de dólares. As matrizes de seis das 10 empresas que lideram esse mercado são, também, norte-americanas; as demais quatro são, uma alemã, uma francesa, uma holandesa e uma suíça. (Precedence Request - https://www.precedenceresearch.com/medical-devices-market)
Observa-se, pois, que a ideia de um carro-chefe das indústrias de saúde é justificada, com 69% do mercado total ficando com os medicamentos, chegando a 75% do mercado do complexo quando as vacinas são somadas.
A distribuição geográfica do mercado de medicamentos é altamente concentrada. Em 2022, dez países respondiam por 72% do mercado mundial, sendo 42,6% deste localizados nos Estados Unidos da América. (https://www.statista.com/statistics/245473/market-share-of-the-leading-10-global-pharmaceutical-markets/)
A indústria farmacêutica é fortemente oligopolizada, com tendência a concentrar-se ainda mais, como se verá adiante. Em 2021 as 10 maiores farmacêuticas responderam por 32,7% do mercado mundial. As 20 maiores, por 47,5%. Dentre as dez, seis são norte-americanas, duas britânicas, uma francesa e uma suíça. (https://www.pharmexec.com/view/2022-pharm-exec-top-50-companies)
O oligopólio entre as vacinas é, de longe o mais concentrado e em 2022 as 10 maiores empresas (sem levar em conta as vacinas contra a COVID-19) responderam por 86% do mercado global, sendo 76% cobertos por cinco empresas, sendo três norte-americanas, uma francesa e uma britânica. Os 11% restantes são cobertos por seis empresas, sendo três chinesas, uma australiana, uma indiana e uma norte-americana. (https://cdn.who.int/media/docs/default-source/immunization/mi4a/who_gat_008_global_vaccine_market_report_march_12.pdf?sfvrsn=a61f4733_1&download=true)
No mercado de equipamentos de saúde em 2021, as 10 maiores empresas responderam por 38,4% do mercado mundial, sendo seis empresas norte-americanas e as quatro restantes são, alemã, francesa, holandesa e suíça. (https://www.statista.com/statistics/329035/global-medtech-market-share-of-top-20-companies/).
O valor dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) segundo setores industriais são bastante enviesados, pois aqueles relativos às indústrias de defesa e aeroespacial são, em sua grande maioria, subestimados, por serem classificados, isto é, ocultos por razões de Estado. Levando em conta essa ressalva, em 2022 o complexo industrial da saúde foi o segundo setor industrial em investimentos em P&D, estando atrás apenas do setor das tecnologias de comunicação e informação (TICs). Segundo os dados disponíveis, este último responde por 43,7% desses investimentos e a indústria da saúde responde por 20,9%. https://www.statista.com/statistics/270233/percentage-of-global-rundd-spending-by-industry/
Finalizando esse perfil sumário do complexo de indústrias da saúde, vale apontar o lugar do mesmo enquanto sua capacidade de lobby, essencial para conferir poder político capaz de sustentar seus interesses. Da leitura do perfil do complexo, fica claro o papel hegemônico nele jogado pelos Estados Unidos da América. Nesse país, onde a atividade é não somente legalizada, mas valorizada, em 2023 o complexo industrial da saúde foi o primeiro nas despesas com lobby dentre os dez setores que mais despenderam recursos financeiros nessa atividade. Naquele ano foram despendidos 378 milhões de dólares, particularmente junto ao Congresso, para sustentar seus interesses e sua liderança global nesse terreno. https://www.statista.com/statistics/257364/top-lobbying-industries-in-the-us/
3. A Financeirização na Indústria Farmacêutica
Como observei no início deste texto o deslocamento da indústria farmacêutica em direção a tornar-se uma Big Pharma não foi um movimento nem exclusivo nem nela teve origem. Na minha análise, a compreensão desse deslocamento tem como dimensão essencial o aprofundamento do processo de financeirização das relações econômicas mundiais operado sob a liderança dos Estados Unidos da América, em particular a partir da instituição do unilateralismo na década de 1990, após a derrocada da União Soviética. Belluzzo sugere que nesse processo “alterou-se a relação entre os recursos destinados ao investimento e aqueles utilizados para propiciar a elevação ‘solidária’ dos ganhos dos acionistas e da remuneração dos administradores...” (4) Não cabe aqui debater mais profundamente os fundamentos econômicos da financeirização nem os desbordamentos políticos e geopolíticos da mesma. A partir de uma constatação quase tautológica de que a financeirização é um processo onde as dimensões financeiras passam a governar de modo predominante iniciativas micro e macroeconômicas, o que importa aqui é analisar os aspectos específicos com que esse processo impactou e orientou a indústria farmacêutica em nível mundial.
No terreno microeconômico há um elemento comum sobre esse impacto, que é a proeminência de atores fora do corpo dirigente das empresas, acima desses executivos, e cujo interesse não tem ligação direta com os objetivos específicos e com os eventuais valores éticos de alguma forma vinculados àqueles objetivos. Em outros termos, são atores que governam os que deveriam governar. No caso da indústria farmacêutica, esses personagens, de modo geral, não estão comprometidos com os impactos biológico, psíquico, sanitário e social envolvidos nos produtos que são lançados no mercado pelas empresas. Esses personagens são os grandes acionistas, investidores detentores de quantidades significativas de ações de companhias negociadas em algumas (poucas) bolsas de valores. E, vale ressaltar, eles não estão cumprindo seu papel como pessoas físicas, mas como representantes de grandes conglomerados financeiros – bancos, fundos de investimento, patrimônios de famílias muito ricas, etc.
As informações que seguem sobre o impacto desse modelo do que poderíamos chamar “supra governança” na indústria farmacêutica foi estudado por dois autores, que pesquisaram 27 grandes empresas farmacêuticas entre 2000 e 2018 a partir do exame de seus balanços, do valor dos dividendos e recompras de ações pagos aos acionistas e do tamanho dos ativos intangíveis (patentes e ágio sobre ações) como proporção do ativo total (5). Em resumo, Fernandez e Klinge mostraram:
• Um crescimento das reservas financeiras de US$ 83 bilhões em 2000 para US$ 219 bilhões em 2018. Dentre as 27, as 10 maiores empresas tinham US$ 135 bilhões de ativos líquidos em 2018.
• Um aumento do pagamento a acionistas, que foi de 88% dos investimentos em P&D para 123% entre 2000 e 2018. Portanto, relativamente mais pagamentos de dividendos do que recursos para P&D.
• O endividamento com baixo investimento em novas instalações e máquinas resultando em aumentos nas despesas com P&D menores do que os esperados
• Uma mudança no modelo de negócios, do desenvolvimento e produção de novos produtos para a compra de concorrentes e de pequenas empresas, objetivando a diminuição da concorrência e a aquisição de direitos de propriedade intelectual.
• O significado mais geral da investigação de Fernandez e Klinge é que a Big Pharma funciona cada vez menos como uma produtora de novos e potencialmente úteis produtos voltados à melhoria da saúde e mais como um fundo privado de investimentos, mediante os mecanismos expostos acima. A compra de outras empresas será vista mais adiante, assim como a explosão dos preços dos medicamentos.
Esse modelo de gestão que comporta uma instância de governança externa ao metabolismo produtivo da empresa e cujas decisões estão acima das de seus dirigentes executivos, vem provocando algumas repercussões que são, se não exclusivas e originais da Big Pharma, bastante frequentes. A primeira delas é o crescimento da taxa de rotatividade entre CEOs e outros altos executivos nas empresas em função de resultados abaixo dos esperados pelos investidores. Outra repercussão diz respeito à radicalização de práticas comerciais, em particular na área de marketing, que vem provocando o crescimento de ações judiciais contra empresas da Big Pharma por delitos de variados tipos. Neste século, os principais acordos para o encerramento de litigâncias entre empresas farmacêuticas e a justiça norte-americana atingiram US$ 32,8 bilhões e envolveram quase todas as grandes empresas farmacêuticas. A maior delas (~US$ 10 bilhões) envolve a farmacêutica Purdue e está relacionada à comercialização da Oxycontina e o surto de suicídios e outras doenças provocados por ela. Com a exceção desse caso, que resultou na falência da empresa, todos os demais acordos (Merck, Wyeth, GSK, Pfizer, Takeda, Johnson&Johnson, Abbott e Eli Lilly), foram absorvidos com facilidade pelas empresas quando se compara o valor das multas com os lucros pelas vendas anteriores dos produtos que foram objeto dos acordos judiciais (6).
4. A Mudança do Padrão Tecnológico
Outro elemento associado ao desenvolvimento da Big Pharma foi a introdução e rápido desenvolvimento de um novo padrão tecnológico na indústria farmacêutica. As mudanças de padrão são graduais e aspectos do modelo anterior permanecem no subsequente. Grosso modo até a década de 1960, o padrão tecnológico prevalente na indústria farmacêutica foi chamado de ‘Random screening’, baseado no beneficiamento de produtos naturais e no desenvolvimento de moléculas por rota de síntese química, muitas vezes baseada em tentativas do tipo ensaio e erro. Nos anos 1970, ainda explorando a síntese química, o padrão passa a ser o chamado ‘Rational Drug Design’, com o desenvolvimento do conceito de receptores no organismo humano. Então, o processo de síntese química de moléculas passa a ser orientado para receptores especificados. Nessa etapa, a estrutura organizacional das empresas era baseada em intensa verticalização com atividades internas de P&D, tendo com um dos objetivos mais importantes a garantia do segredo industrial, em um ambiente de propriedade intelectual ainda não “harmonizado” internacionalmente. Na década seguinte, com o avanço da biologia e da genética moleculares, o padrão tecnológico sofre uma alteração radical com a introdução da biotecnologia no desenvolvimento e na produção farmacêuticas e este vem sendo um elemento essencial na formação do ambiente da Big Pharma. Atualmente, estima-se que o mercado de medicamentos biológicos represente cerca de 1/3 do mercado farmacêutico mundial. Mas é o segmento que cresce mais rapidamente, é o mais exigente em termos de recursos de P&D e o que lança produtos e terapias mais caras (7).
5. Fusões e Aquisições
A introdução da biotecnologia no processo de desenvolvimento e produção da indústria farmacêutica colocou um problema crucial que foi o de vislumbrar uma muito promissora nova rota tecnológica a partir de um mundo quase desconhecido para empresários e técnicos formados no ambiente da química fina. Rapidamente, a fonte do novo conhecimento em bases industriais foi identificada e estava nas indústrias de vacinas. Isso gerou um movimento de compra de Know-How mediante a absorção de mão de obra especializada e mesmo de empresas fabricantes de vacinas. Atualmente, várias dentre as maiores fabricantes mundiais de vacinas (Johnson&Johnson, AstraZeneca, GSK, Merck, Pfizer, entre outras) são propriedade dessas grandes farmacêuticas. Mais tarde, com a explosão na criação de start-ups, muitas possuidoras de produtos promissores embora ainda em fase de desenvolvimento, a estratégia da Big Pharma passou ser absorve-las. Por exemplo, em 2018, a desenvolvedora do medicamento Zolgensma (AveXis), para o tratamento da Atrofia Muscular Espinhal foi comprada pela Novartis por 8,7 bilhões de dólares.
Esse movimento de fusões e aquisições, conhecido no jargão pelo acrônimo (M&A), pelo aumento de sua intensidade tornou-se também um elemento definidor das estratégias da Big Pharma. Em verdade, teve início já nas últimas décadas do século passado, quando ocorreu um conjunto de fusões e aquisições entre grandes empresas, mas neste século acelerou consistentemente, com a exceção do período imediatamente posterior à crise global de 2008. A despeito de algum debate, a concentração no mercado, aumentando a oligopolização, tende a diminuir a concorrência e a competitividade na busca por novos produtos na ponta da invenção. E, na outra ponta, induzir a maiores aumentos de preço dos medicamentos (8). Atualmente, atividades de M&A entre grandes empresas parecem estar em declínio, mas as compras de pequenas empresas com produtos promissores em seus portfolios pela Big Pharma, permanece intensa e é a principal modalidade de M&A atualmente. E há evidências de que essa estratégia produz melhores resultados para as empresas quando comparadas com o desenvolvimento interno de produtos (9). De acordo com os autores desta referência, “Em 2020, ocorreram 895 negócios de fusões e aquisições em todo o mundo no setor biotecnológico e farmacêutico com um valor superior a 173 bilhões de dólares dos Estados Unidos (USD)”.
6. Desverticalização
Em contraponto radical com o modelo empresarial verticalizado, a Big Pharma foi em sentido oposto, cultivando crescentemente uma radical desverticalização de suas empresas. Essa estratégia, chamada de Business Process Outsourcing, começou com a terceirização de etapas rotineiras e atualmente envolve praticamente todas as etapas desde a invenção, o desenvolvimento, a produção, a pesquisa clínica, o registro, o marketing e as vendas de produtos. O sentido mais geral desse movimento é o compartilhamento de riscos visando a economia de custos, providência necessária a qualquer empresa, mas muito mais necessária em um ambiente de negócios onde a remuneração aos grandes acionistas é o principal objetivo do negócio. A pergunta que fica é: se todas as etapas são terceirizadas, o que fica com a empresa que terceiriza? O modelo é funcional por duas razões, sendo a primeira o compartilhamento de responsabilidades em vista de eventuais atritos judiciais. A segunda é a garantia absoluta da propriedade do produto final, na medida em que a empresa que terceiriza detém o principal bem que garante a sua propriedade, um bem intangível, que são as patentes que protegem a sua propriedade intelectual. Aqui, vale observar que essa garantia de propriedade exigiu um movimento articulado internacionalmente, sob a liderança dos Estados Unidos da América em associação com vários países produtores de medicamentos – a criação da Organização Mundial do Comércio no âmbito do sistema ONU e a assinatura dos acordos TRIPS. Veremos isso adiante.
7. Inflação nos Preços
Outra dimensão cada vez mais presente nas estratégias da Big Pharma é a inflação nos preços de medicamentos. Em países sem controle de preços de medicamentos, essa inflação vem atingindo níveis muito altos. Para mencionar a situação mais grave, nos Estados Unidos da América o presidente Joe Biden precisou fazer apelos aos fabricantes para que não aumentassem seus preços. Ao lado de alguns fatores objetivos em relação ao aumento de custos, há certamente elementos derivados dos mecanismos de financeirização, em particular o procedimento de subsídios cruzados, como incluir os custos dos insucessos no desenvolvimento de produtos que fracassaram no caminho de seu desenvolvimento na precificação de um produto que chega ao mercado.
As doenças raras entram cada vez mais no negócio da Big Pharma. São doenças com baixas incidência e prevalência, habitualmente com alta letalidade e para as quais não existem medicamentos eficazes. Novas terapias para essas doenças são, em sua maioria, medicamentos biológicos ou terapias gênicas que lançam mão de células modificadas do próprio paciente. O alto risco tecnológico embutido na transformação de candidatos a medicamentos ou terapias em produtos no mercado e a gravidade das doenças às quais se destinam faz com que eles sejam lançados a preços não sustentáveis para pacientes, suas famílias e sistemas de saúde. Estes últimos vêm sendo cada vez mais pressionados com relação à incorporação de novos medicamentos no rol de produtos que devem oferecer às populações sob sua responsabilidade.
8. A Harmonização Global da Propriedade Intelectual
Nos dias de hoje, está absolutamente claro que os acordos TRIPS resultaram em uma harmonização mundial do regime de propriedade intelectual em benefício dos detentores de patentes, praticamente todos localizados no Hemisfério Norte, em particular Estados Unidos, Grã Bretanha, França, Alemanha, Suíça e Japão. E mais recentemente, a China. E que um dos setores industriais mais afetados, quando esse impacto é medido pela intensidade da litigância jurídica em torno a patentes, é o complexo industrial da saúde, com os medicamentos/vacinas e equipamentos médicos atrás apenas da indústria de TICS (10).
O processo que levou ao TRIPS teve início ainda na conjuntura anterior à Guerra Fria, em 1947, quando foi criado, no âmbito da ONU, o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT, no acrônimo em inglês). Como o nome do organismo sugere, ele foi criado para tratar de bens tangíveis – regras sobre tarifas e comércio – e entre sua criação e o início da conjuntura mundial unilateral (anos 1990), ele tratou disso. Em 1994, decidiu regulamentar um bem intangível, que é a propriedade intelectual, aprovando um Acordo Sobre Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio (TRIPS no acrônimo em inglês) e no ano seguinte criou a Organização Mundial do Comércio (OMC), vinculando o ingresso na mesma à assinatura do Acordo. O TRIPS foi levemente suavizado em 2003, com a assinatura, por pressão da Índia, África do Sul e Brasil e impulsionada pela pandemia de HIV/AIDS, da Declaração de Doha sobre o TRIPS e Saúde Pública.
Resumidamente, as disposições do TRIPS, incluídas as poucas exceções quanto à saúde pública, determinam que as disposições do acordo que protegem a propriedade intelectual são específicas, obrigatórias e passiveis de judicialização; que incluem todos os produtos e processos de todas as tecnologias; que a duração da proteção das patentes será de vinte anos; que o alcance das exceções permitidas são limitadas a casos muito específicos (por exemplo, o licenciamento compulsório em situações de crise sanitária); que o cumprimento de seus dispositivos pelos países devem ser garantidos por leis específicas; e que o descumprimento desses dispositivos deve ser questionado nos termos do mecanismo de solução de controvérsias da própria OMC.
Ora, no plano da indústria da saúde, as patentes são de propriedade da Big Pharma. No Instituto Nacional de Propriedade Industrial, que é o órgão brasileiro que cuida da propriedade intelectual, cerca de 80% das patentes depositadas pertencem a não residentes no Brasil. No ponto de vista do jurista brasileiro Denis Borges Barbosa, grande pensador nesse campo, há duas questões a serem discutidas no terreno da diplomacia e do poder. O primeiro deles já comentei brevemente acima, que é o patenteamento de bens intangíveis sendo realizado por um órgão criado para tratar de bens tangíveis (tarifas e comércio). Em outros termos, tratou-se de criar um comércio de intangíveis, o que é muito passível de debate - será razoável estabelecer monopólio sobre ideias, mesmo que estas sejam potencialmente transformáveis em produtos ou processos? Além disso, considerando que a própria ONU havia criado em 1967 uma Organização Mundial de Propriedade Intelectual, por que ela não foi acionada para tratar do tema? (11).
9. Epilogo
Essas notas sobre o desenvolvimento da Big Pharma devem ser entendidas como um caso particular de um modo de relacionamento entre as nações que tem sido chamada de “década neoliberal” ou “década da globalização”. Foi esse ambiente que sobredeterminou, tanto a financeirização das empresas do complexo industrial da saúde, quanto a instituição de um padrão mundial harmonizado de propriedade intelectual, que vêm sendo os dois principais pilares do atual modo de funcionamento desse complexo. E por ser considerada desnecessária ou ultrapassada, a arquitetura multilateral criada em conjunturas anteriores entrou em declínio, como é o caso do sistema das Nações Unidas. Entretanto, a financeirização e a política harmonizada de propriedade intelectual vão permanecer, mesmo com a atrofia e irrelevância das duas instituições do sistema ONU que mais interessam no tema deste texto: a OMS e a (tão jovem) OMC. Aquela, hoje dominada direta ou indiretamente pela Big Pharma mediante o garrote financeiro provocado por um orçamento no qual cerca de 80% dos recursos são oriundos de doadores e cuja aplicação é decidida por estes e não pela direção da OMS. Já, a OMC, desde sua criação, rapidamente se transformou em trincheira dos países do Hemisfério Norte detentores de patentes. Confirma essas afirmações o papel lamentável das duas agências durante a pandemia de COVID-19. No caso da OMS, o fracasso quase completo da iniciativa COVAX, criada para promover uma distribuição minimamente equitativa de vacinas contra o Sars-CoV-2 pelos países. No que toca a OMC, a reiterada e vergonhosa recusa em patrocinar um waiver na proteção patentária relacionada a vacinas anti COVID, proposta por África do Sul e Índia. E a respeito dessa irrelevância, encerro este texto com uma citação de José Luís Fiori sobre o tema, numa clave ampliada.
“’..... E na década seguinte [1990], os EUA se aproveitaram de sua nova posição de poder e assestaram um último e definitivo golpe na “ordem multilateral” que eles haviam criado...E foi assim que se encerrou, de forma definitiva e melancólica, a primeira “ordem mundial hegemônica” do pós-II Guerra Mundial; e foi nesse momento, e não mais tarde, que o Conselho de Segurança da ONU perdeu toda e qualquer eficácia e legitimidade, por obra de seus próprios criadores...’”(12).
Referências
(1) "We try to remember that medicine is for the patient. We try never to forget that medicine is for the people. It is not for the profits. The profits follow, and if we have remembered that, they have never failed to appear“. https://www.merck.com/company-overview/history/
(2) https://www.swissinfo.ch/por/sociedade/novartis-n%C3%A3o-planeja-vacina-gratuita-contra-a-h1n1/7460746
(3) "We did not develop this medicine for Indians. We developed it for western patients who can afford it, quite honestly". https://www.techdirt.com/2014/01/27/big-pharma-ceo-we-develop-drugs-rich-westerners-not-poor/
(4) Belluzzo LG. Os vândalos e as Americanas. Carta Capital. 2023. [acessado em 02/2023] Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/economia/os-vandalos-e-as-americanas
(5) Fernandez, R; Klinge, TJ - Private gains we can ill afford -The financialisation of Big Pharma. Amsterdam, April 2020. https://www.somo.nl/wp-content/uploads/2020/04/Rapport-The-financialisation-of-Big-Pharma-def.pdf
(6) Blankenship K. -Fierce Pharma. Who joins Purdue on pharma's top 10 settlements list? Merck, GSK and Pfizer, for starters. September 12, 2019. https://www.fiercepharma.com/pharma/merck-gsk-pfizer-j-j-among-top-10-u-s-pharma-settlements-all-time
(7) Essa breve descrição histórica da indústria farmacêutica foi retirada do trabalho clássico de Luigi Orsenigo e Franco Malerba.
Orsenigo, L.; Malerba, F. -Innovation and market structure in the dynamics of the pharmaceutical industry and biotechnology: Towards a history-friendly model. August 2002. Industrial and Corporate Change 11(4):667-703 https://www.researchgate.net/publication/5212410_Innovation_and_market_structure_in_the_dynamics_of_the_pharmaceutical_industry_and_biotechnology_Towards_a_history-friendly_model
(8) Richman, B et al. - Pharmaceutical M&A Activity: Effects on Prices, Innovation, and Competition. Loyola University Chicago Law Journal. Volume 48, Issue 3 Spring 2017. https://lawecommons.luc.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=2605&context=luclj
(9) Büssgen, M; Stargardt, T. - To merge or not to merge? The impact of mergers and acquisitions on corporate success in the pharmaceutical industry. February 2024 Managerial and Decision Economics 45(2). https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1002/mde.4129
(10) How Current IP Patent Litigation Trends are Changing Risk Exposures https://www.aon.com/en/insights/articles/how-current-ip-patent-litigation-trends-are-changing-risk-exposures
(11) Barbosa, DB – A TRIPS e a experiência brasileira. https://www.dbba.com.br/wp-content/uploads/trips-e-a-experincia-brasileira.pdf
(12) Fiori, JL - A crise aguda e o declínio crônico do Ocidente. https://outraspalavras.net/geopoliticaeguerra/a-crise-aguda-e-o-declinio-cronico-do-ocidente/
https://sul21.com.br/opiniao/2024/05/a-crise-aguda-e-o-declinio-cronico-do-ocidente-por-jose-luis-fiori/