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0250/2025 - Death from post-COVID-19 conditions in Brazil: a descriptive study, 2020-2023.
Óbito por condições posteriores à covid-19 no Brasil: um estudo descritivo, 2020-2023.

Author:

• Rodrigo de Macedo Couto - Couto, RM - <rodrigoscouto@hotmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2598-5830

Co-author(s):

• Alexandra Crispim Boing - Boing, AC - <acboing@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7792-4824


Abstract:

Little is known about the magnitude of deaths and which comorbidities may contribute to the occurrence of outcomes among individuals with post-covid conditions. This study aimed to identify deaths due to post-covid conditions in Brazil from 2020 to 2023 and describe the consequential and contributing causes. A descriptive study was conducted using ICD-10 codes B94.8 and U09.9. Between 2020 and 2023, Brazil reported 6,911,833 deaths. Of these, 5,017 (0.7%) were related to post-covid conditions. The peak occurred in the 2nd quarter of 2021, with an average decline of 28% in the subsequent quarters. The highest mortality rate was in the Central-West region, except in 2020, when the highest rate was in the North region. Tocantins had the highest annual mortality rates, except in 2021, when Espírito Santo recorded the highest number. Most deaths occurred among white individuals, the elderly, and those with higher education levels. The most common consequential causes were septicemia (42.9%) and respiratory events (52.8%). Among the contributing causes, diabetes mellitus was notable (20.5%). The study reveals a significant number of deaths due to post-covid-19 conditions in Brazil, highlighting regional variations and marked sociodemographic differences.

Keywords:

SARS-CoV-2; Condiciones Post-Covid; Fallecimiento.

Content:

INTRODUÇÃO
A doença coronavírus 2019 (covid-19) causada pelo SARSCoV-2 tem demonstrado um amplo espectro de manifestações clínicas, desde infecções assintomáticas até a síndrome respiratória aguda grave (SRAG), podendo levar à morte (1). Este tema tem sido amplamente discutido, e diversos estudos têm descrito e identificado vulnerabilidades relacionadas à infecção, bem como fatores associados com desfechos mais graves (2).
Por outro lado, pouca atenção tem sido dada às condições pós-covid, também conhecida como covid longa. Essas condições se referem à persistência de sintomas ou surgimento de manifestações novas após a fase aguda da infecção, que não podem ser explicadas por outra condição prévia (3). Esses sintomas podem durar semanas ou meses, podendo afetar várias áreas do corpo. Já foram descritas mais de 50 sequelas de curto, médio e longo prazo (4).
A variedade e a inespecificidade dos sintomas dificultam a compreensão de seus mecanismos fisiopatológicos. Hipóteses incluem desregulação imunológica, persistência prolongada do vírus, estado inflamatório crônico ou ainda lesões em órgãos como coração/vasos sanguíneos e rins (5).Embora as condições pós-covid-19 sejam mais frequentes em pacientes que desenvolveram formas graves da doença, especialmente aqueles que necessitaram de internação em unidade de tratamento intensivo (UTI), há evidências de que podem ocorrer independentemente da gravidade inicial da infecção (6, 7).
Desde 2020 até março de 2024, o Brasil notificou mais de 38 milhões de casos e ultrapassou 700 mil óbitos por covid-19 (8), caracterizando o país como um dos mais acometidos pela covid-19 no mundo. Estimativas internacionais indicam que, cerca de 30 a 45% dos casos são afetados pelas condições pós-covid (9, 10). Assim, presume-se que o Brasil tenha uma carga importante desta condição, apesar de não haver dados nacionais robustos, sobretudo os referentes aos óbitos.
Neste contexto além da carga de doença, a mortalidade por condições pós-covid precisa ser uma preocupação crescente entre os profissionais de saúde e pesquisadores. Uma revisão sistemática recente com metanálise consolidou diferentes taxas de mortalidade em vários países no mundo, encontrando que 7,4% (variação de 4,9 a 11,2%) dos casos que desenvolvem sequelas da covid-19 culminam com o óbito (11).
No Brasil até julho de 2024 existia um estudo publicado, que revelou importante registro de número de óbitos causados por condições posteriores à covid-19 em 2021. Essa pesquisa apontou a importância de se considerar a mortalidade por essa causa ao avaliar o impacto da covid-19 na saúde da população, transcendendo a mera estimativa da mortalidade na fase aguda (12). Entretanto, este estudo abrangeu um período curto de tempo, além de não avançar no detalhamento dos casos. Com base nesse cenário, compreender a mortalidade atribuída às condições pós-covid é relevante não apenas pela escassez de estudos, mas sobretudo pela necessidade de qualificar os registros de mortalidade e compreender o impacto não conhecido da pandemia. Além disso, a relevância científica do tema está na sua originalidade de produzir evidências que permitam melhorar a vigilância epidemiológica diante de futuras pandemias. Assim, o presente estudo objetivou identificar os óbitos por condições pós-covid no Brasil no período de 2020 a 2023, comparar com os óbitos por todas as causas e descrever as causas consequenciais e contribuintes.

MATERIAIS E MÉTODOS
Trata-se de estudo descritivo dos óbitos por condições pós-covid no Brasil entre 2020 e 2023. Foram utilizados os registros individualizados do Sistema de Informações de Mortalidade do Sistema Único de Saúde (SIM/DATASUS), pelo acesso público do arquivo disponibilizado por meio da plataforma OPENDATASUS (13). A data da exportação foi 01/06/2024. Foram excluídos do estudo casos de óbitos fetais.
A partir do arquivo contendo os registros de mortes notificados ao Ministério da Saúde, os óbitos foram classificados segundo as causas (condições pós-covid e outras causas). Para identificação das causas de óbito por condições pós-covid considerou-se o código da Classificação Internacional das Doenças (CID-10) B94.8 (sequelas de outras doenças infecciosas e parasitárias especificadas) como causa básica e que apresentavam na linha A, B, C, D ou linha II o marcador CID-10 U09.9 (condição de saúde posterior à COVID-19 não especificada) (14).
Previamente à análise descritiva dos óbitos foi realizada a análise de consistência dos dados. Também foram efetuadas as transformações e categorizações das variáveis. A análise descritiva foi realizada para o Brasil, regiões e suas unidades federativas. A análise considerou características relativas ao espaço, pessoa e tempo, utilizando o software SPSS versão 20®. Para a análise comparativa foi utilizado o teste do Qui-quadrado. Os testes foram considerados significativos quando p<0,05. O gráfico foi gerado pelo software Excel®.
As variáveis utilizadas foram sexo (masculino/feminino); raça/cor (branca, preta, parda e indígena), idade categorizada em faixas etárias (0 a 5 anos, 6 a 11 anos, 12 a 17 anos, 18 a 39 anos, 40 a 59 anos e 60 e mais anos), escolaridade (sem escolaridade, ensino fundamental completo ou incompleto, ensino médio completo ou incompleto e ensino superior completo ou incompleto) e local de residência (unidade federativa). Visando conhecer as distribuições de óbitos segundo estratificações temporais, a frequência de óbitos foi acumulada em trimestres (data do óbito).
Para o cálculo da taxa de mortalidade por unidade federativa, foram acessados os dados populacionais para os anos intercensitários no Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus), empregando-se o estudo de estimativas populacionais (2000-2030), elaborado pelo Departamento de Análise Epidemiológica e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis (Daent), do Ministério da Saúde (15). A taxa de mortalidade por condições posteriores à covid-19 foi calculada da seguinte forma: número de óbitos por condição posterior à covid-19 dividido pela população residente multiplicado por 100.000.
Adicionalmente, foram identificadas as causas consequenciais e contribuintes para o óbito. Na declaração de óbito, a causa básica é definida como a doença ou lesão que iniciou a cadeia de acontecimentos patológicos que conduziram diretamente à morte. As causas da morte são preenchidas pelo médico e posteriormente recebem um código segundo a CID-10. Na parte I destina-se às doenças relacionadas com a cadeia de acontecimentos patológicos que levaram diretamente à morte, conhecida como causas consequenciais. Já na Parte II devem constar as afecções não relacionadas à cadeia de eventos que resultou na morte, ou seja, as causas contribuintes (16).
Por se tratarem de estudos com dados provenientes de um sistema público de informação, sem identificação nominal, dispensa-se apreciação de Comitê de Ética em Pesquisa. Entretanto, foram observadas e respeitadas as normas e diretrizes preconizadas pela Resolução nº 466, de 2012, do Conselho Nacional de Saúde, bem como as disposições da Lei nº 12.527, de 2011, do Governo Federal e da Declaração de Helsinque da Associação Médica Mundial (1964, reformulada em 1975,1983, 1989, 1989, 1996 e 2000).

RESULTADOS
Foram identificados 6.911.833 óbitos por todas as causas no Brasil entre 2020 e 2023. Após a exclusão de 10.336 óbitos fetais, restaram 6.901.497. Desses, 5.017 (0,7%) tinham como registro na causa básica B94.9 e marcador U09.9. A análise de completitude revelou que 2.128 (0,0%) casos não possuíam informação quanto ao sexo; 35.669 (0,5%) não tinham informação da idade; 169.266 (2,5%) não tinham informação da raça/cor; 1.234.616 (17,9%) não tinham informação sobre escolaridade. Todos os casos tinham registrado causa básica e local de residência. O pico de registros ocorreu no 2° trimestre de 2021, quando foram notificados 1.186 óbitos. Nos trimestres seguintes, ocorreu uma queda média de 28% até serem observados somente 39 óbitos no 4° trimestre de 2023 (figura 1).
Estratificando os dados para regiões do Brasil, observou-se que a região Centro-oeste apresentou a maior taxa de mortalidade em todo o período de estudo (31,2 óbitos para cada 100.000 habitantes em 2021; 9,9 óbitos para cada 100.000 habitantes em 2022; e 3,7 óbitos para cada 100.000 habitantes em 2023), com exceção do ano de 2020, onde a maior taxa de mortalidade foi observada na região Norte (0,5 óbitos para cada 100.000 habitantes).
Por outro lado, estratificando por unidades da federação, observou-se que o estado de Tocantins, localizado na região Norte, obteve a maior taxa de mortalidade em todos os anos (5,0 óbitos para cada 100.000 habitantes em 2020; 44,3 óbitos para cada 100.000 habitantes em 2022; e 15,8 óbitos para cada 100.000 habitantes em 2023), com exceção do ano de 2021, quando o estado de Espírito Santo notificou 275,8 óbitos por 100.000 habitantes. Em números absolutos, isso correspondeu a 1.133, aproximadamente 1/3 do total de óbitos registrados no Brasil (tabela 1).
Não foi observada diferença segundo sexo entre óbitos por pós-covid e todas as causas de mortalidade. Entretanto, observaram-se diferenças estatisticamente significativas quanto a raça/cor, na qual encontrou-se maior proporção de óbitos por pós-covid em brancos (57,3% versus 51,6%, p<0,001), maior proporção também significativa nas faixas etárias com mais idade, 40 a 59 anos (22,5% versus 18,8%, p<0,001) e 60 e mais (72,3% versus 69,8%, p<0,001). Em relação a escolaridade, também foi encontrada diferença significativa dos óbitos por condições pós-covid em pessoas com mais escolaridade como ensino médio completo (21,6% versus 17,7%, p<0,001) e ensino superior incompleto ou completo (14,6% versus 7,9%, p<0,001) (Tabela 2).
A análise descritiva das causas consequenciais, ou seja, aquelas relacionadas a cadeia de eventos que levaram ao óbito, revelou que quase metade dos óbitos (42,9%) foram devido a um quadro de septicemia não especificada. A outra metade (52,8%) apresentaram óbito em decorrência de algum evento envolvendo o sistema respiratório (insuficiência respiratória aguda ou pneumonia não especificada ou insuficiência respiratória não especificada ou parada respiratória) (Tabela 3).
Por outro lado, na avaliação das causas contribuintes, ou seja, aquelas que não contribuíram diretamente para a causa do óbito, mas estavam associadas, observou-se grande variação, onde quase metade delas (42,1%) consistiam em combinações de diferentes comorbidades, o que impediu o agrupamento em categorias específicas. A causa contribuinte mais frequente entre os óbitos foi a diabetes mellitus (20,5%), seguida da hipertensão (18,1%), da insuficiência renal aguda (10,0%) e da obesidade (9,3%) (Tabela 3).

DISCUSSÃO
O presente estudo revela importante registro de número de óbitos causados por condições posteriores à covid-19 entre 2020 e 2023 no Brasil, com diferenças nas taxas de mortalidade entre regiões e unidades federativas brasileiras. Evidenciaram-se ainda diferenças em relação às características sociodemográficas quando comparada a todas as causas de mortalidade. Além disso, a análise das causas consequenciais e contribuintes da cadeia do óbito, revelam achados inéditos que podem contribuir para explicar mortalidade por condições posteriores à covid-19 no Brasil.
Os óbitos por condições pós-covid-19 no Brasil foram relativamente pequenos quando comparado às outras causas, representando apenas 0,7% do total de óbitos no período analisado. Entretanto, considerando que entre 2020 e 2023, foram notificados 38.210.864 casos de síndrome gripal e 2.197.946 casos de síndrome respiratória aguda grave (8), que pelo menos 45% das pessoas infectadas pela covid-19 desenvolvem as condições pós-covid (10) e que a mortalidade por essas condições pode chegar a 20% (17), acredita-se que esses dados possam estar subnotificados.
Corrobora-se a esta hipótese o fato de que os resultados das tabulações regionais e estaduais de óbito por pós-covid mostraram variações significativas. Os estados de Tocantins e Espírito Santo apresentaram as maiores taxas de mortalidade com grandes diferenças quando comparados a outros estados, além de que em números absolutos, o estado de Espírito Santo superou até mesmo São Paulo, apesar de sua menor população.
Neste ponto, é crucial rememorarmos as publicações de orientações voltadas à vigilância epidemiológica durante o período da pandemia no Brasil e no mundo. Por ser uma doença nova, as adoções de novas definições foram sendo tomadas na medida em que eram identificadas novas condições clínicas. Em 30 de agosto de 2021, o Ministério da Saúde do Brasil lançou orientações preliminares sobre condições pós-covid-19, definindo a síndrome e suas codificações para morbidade e mortalidade (18). No entanto, essa iniciativa veio um ano e meio após o início da pandemia, o que pode ter contribuído para a subnotificação inicial e a inconsistência nos registros.
Desde então, observou-se uma escassez de atualizações substanciais quanto às diretrizes específicas para a vigilância de condições pós-covid-19, especialmente no que se refere ao aprimoramento da notificação e ao monitoramento sistemático dos desfechos de longo prazo. A ausência de normativas consolidadas e contínuas, aliada à fragilidade na integração entre sistemas de informação em saúde, pode ter impactado negativamente os indicadores de mortalidade pelas condições pós-covid-19.
Por ser um país com dimensões continentais, a capilaridade das informações pode ser um desafio, especialmente em locais de acesso remoto ou áreas carenciais de serviços de saúde. Para o aumento da sensibilidade de toda a rede de serviços de saúde e incorporação das orientações do registro adequado das causas de morte na rotina, são necessárias capacitações contínuas, sensibilizando profissionais de saúde. Os resultados observados com alguns estados, pode refletir estratégias implantadas em seus territórios com melhor êxito.
Observou-se que o pico das notificações de óbito por pós-covid ocorreu no segundo trimestre de 2021. Na sequência, há expressiva queda ao longo do tempo, o que pode estar relacionado ao início da vacinação. Apesar das primeiras doses terem sido iniciadas em janeiro de 2021, o quantitativo era pequeno (6,2 milhões). O maior volume de doses (27,5 milhões) chega ao país a partir do segundo trimestre de 2021 (19).
Um estudo realizado nos Estados Unidos identificou queda de casos de condições pós-covid entre 2022 e 2023, caindo de 18,9% a 11,0% entre adultos maiores que 18 anos com infecção prévia por covid-19. O estudo relacionou o declínio à diminuição da prevalência da infecção por SARS-CoV-2, menor gravidade da infecção aguda, intervenções oferecidas (por exemplo, antivirais) e cobertura vacinal (20).
Uma revisão sistemática com metanálise publicada em 2022 demonstrou que o grupo vacinado teve um risco 29% menor de desenvolver condições pós-covid quando comparado ao grupo não vacinado. Entretanto, o trabalho destaca que o efeito protetor só foi observado em pacientes vacinados com duas doses. Não houve significância estatística do efeito protetor da vacina em pacientes vacinado com somente uma dose (21).
O perfil dos óbitos por condições pós-covid-19 revelou que a maioria dos casos ocorreu em indivíduos de idade mais avançada, com uma alta incidência entre brancos e pessoas com maior escolaridade. A idade avançada tem sido relatada como um fator de risco para o óbito por condições pós-covid, aumentando o risco em até 113% (22-26). A maior mortalidade entre brancos e pessoas com maior escolaridade pode estar relacionada ao acesso desigual aos serviços de saúde e à subnotificação em grupos com menor escolaridade. Outros estudos internacionais mostram que erros na certificação de óbitos são mais frequentes em populações vulneráveis, incluindo aquelas com menor escolaridade, devido a fatores como falta de treinamentos dos profissionais e acesso a históricos médicos menos precisos (27,28).
As causas consequenciais de óbito indicam que apesar das manifestações da pós-covid serem muito amplas, em vários sistemas, quase metade dos casos de pós-covid-19 resultaram em septicemia não especificada, enquanto a outra metade envolveu complicações respiratórias, como insuficiência respiratória aguda e pneumonia. As septicemias são frequentes em ambientes hospitalares em todo o mundo, refletindo em maior probabilidade de óbito (29). Cabe salientar que pessoas infectadas com covid-19 enfrentam longos períodos de internação, podendo chegar até 20 dias (30). Assim, acredita-se que a alta incidência de septicemia pode ser reflexo de longas internações hospitalares.
Em relação as causas respiratórias de óbito observadas, um estudo de revisão indica que as sequelas de longo prazo de covid-19 nos pulmões resultam da inflamação crônica com produção sustentada de citocinas pró-inflamatórias. O dano endotelial desencadeia a ativação de fibroblastos, que depositam colágeno e fibronectina resultando em fibrose. Além disso, a ativação do complemento, ativação plaquetária e interações plaquetas-leucócitos, podem resultar no desenvolvimento de estado de hipercoagulabilidade, aumentando o risco de trombose (31). Outras investigações relataram uma alta incidência de comprometimento da função pulmonar e lesão pulmonar pela tomografia computadorizada realizada 3 meses após a alta de sobreviventes de covid-19 (32, 33).
Entre as causas contribuintes de óbito, as comorbidades mais comuns foram diabetes mellitus, hipertensão, insuficiência renal aguda e obesidade. Esses fatores de risco são frequentemente relatados na literatura como associados a piores desfechos em pacientes com condições pós-covid-19 (22, 34-37). Essa associação pode refletir uma sinergia entre a inflamação sistêmica prolongada e o agravamento de condições metabólicas e cardiovasculares, especialmente em indivíduos com múltiplos fatores de risco
Embora o estudo considere fatores como raça/cor, idade e escolaridade, outras variáveis socioeconômicas e demográficas que podem influenciar a mortalidade por condições pós-covid-19 não foram exploradas em profundidade como renda e acesso a serviços de saúde, implicando em limitações ao presente estudo. Cabe destacar ainda que a elevada proporção de dados ignorados na variável escolaridade (19,9%) constitui uma limitação adicional do estudo. Além disso, o banco utilizado de mortalidade não possui informações clínicas da doença como sinais e sintomas que poderiam ser importantes para entendimento dos casos.
Para superar essa limitação, futuras pesquisas poderiam explorar a integração com outras bases de dados. No Brasil, os sistemas e-SUS Notifica e o Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-gripe), que registram casos de síndrome gripal e síndrome respiratória aguda grave, respectivamente, possuem uma ampla gama de informações, incluindo sintomas, comorbidades, dados de vacinação, confirmações laboratoriais e exames de imagem. A integração desses sistemas com o banco de mortalidade permitiria não apenas a qualificação dos dados, mas também a criação de grupos de comparação para os casos de óbito. Essa abordagem possibilitaria a análise de casos registrados que não resultaram em óbito, oferecendo uma perspectiva mais completa e robusta para a compreensão dos fatores associados à mortalidade. Portanto, o relacionamento (linkage) entre diferentes sistemas de informação de saúde é crucial para aprimorar a qualidade dos dados e fornecer uma base mais sólida para análises epidemiológicas futuras.
A COVID-19 continua a circular na comunidade, e embora as taxas de mortalidade e morbidade tenham diminuído devido às vacinas e às variantes menos virulentas, é crucial identificar grupos de pacientes com maior risco de óbito e gerenciar os fatores de risco associados. Assim, recomenda-se que em futuras emergências sanitárias, o sistema de vigilância considere a oportunidade de publicação de guias e definições de caso, assim como o meio de divulgação, que deve incluir a capacitação das equipes em todo o território nacional de forma oportuna. Ferramentas de reuniões remotas podem ser úteis para o alcance desses objetivos.

CONCLUSÃO
A análise dos óbitos no Brasil entre 2020 e 2023 revelou 5.017 óbitos com causa básica relacionada a condições pós-covid-19. O pico ocorreu no 2° trimestre de 2021, com uma queda média de 28% nos trimestres subsequentes. A região Centro-Oeste apresentou a maior taxa de mortalidade por condições pós-covid-19 durante o período estudado, exceto em 2020, quando a maior taxa foi na região Norte. O estado de Tocantins teve as maiores taxas anuais de mortalidade, exceto em 2021, quando o Espírito Santo registrou o maior número. Observou-se maior proporção de óbitos em brancos, idosos e pessoas com maior escolaridade. As causas consequenciais mais comuns foram septicemia não especificada (42,9%) e eventos respiratórios (52,8%). Entre as causas contribuintes, prevaleceu a diabetes mellitus (20,5%).

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Couto, RM, Boing, AC. Death from post-COVID-19 conditions in Brazil: a descriptive study, 2020-2023.. Cien Saude Colet [periódico na internet] (2025/Jul). [Citado em 05/12/2025]. Está disponível em: http://cienciaesaudecoletiva.com.br/en/articles/death-from-postcovid19-conditions-in-brazil-a-descriptive-study-20202023/19726?id=19726



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