0027/2025 - Long-stay Institution for the Elderly: potentials and challenges of integration with Primary Health Care
Instituição de Longa Permanência para Idosos: potencialidades e desafios da integração com a Atenção Primária à Saúde
Author:
• Luiz Fernando de Andrade Silva - Silva, L.F.A - <luizfas91@gmail.com>ORCID: https://orcid.org/ 0000-0002-1632-1410
Co-author(s):
• Fabiana Veronez Martelato Gimenez - Gimenez, F.V.M - <fabiveronez@hotmail.com>ORCID: https://orcid.org/ 0000-0003-3768-5288
• Danielle Abdel Massih Pio - Pio, D.A.M - <daniellepio228@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/ 0000-0003-0738-4601
• Vanessa Clivelaro Bertassi Panes - Panes, V.C.B - <bertassi@hotmail.com>
ORCID: https://orcid.org/ 0000-0002-6407-5509
• Daniel Augusto da Silva - Silva, D.A - <daniel.silva@fema.edu.br>
ORCID: https://orcid.org/ 0000-0002-2716-6700
• Cristina Rosa Soares Lavareda Baixinho - Baixinho, C.R.S.L - <crbaixinho@esel.pt>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7417-1732
• Mara Quaglio Chirelli - Chirelli, M.Q - <marachirelli@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/ 0000-0002-7417-4439
Abstract:
The weak training to understand the demands of elderly people in Long-Term Care Facilities raises questions about the supply and challenges for comprehensive care in Primary Health Care. The aim was to analyze the perception of professionals about the potentialities and challenges of integration between Long-Term Care Facilities for the Elderly and Primary Health Care (PHC) in providing care to the elderly. This is an exploratory and qualitative research with 18 professionalsthe PHC health team. Semi-structured interviews were conducted and analyzed using the Collective Subject Discourse. The work process presents challenges: reception, problem solving, procedures offered, gaps in the organization. The potentialities are highlighted: priority in care and institutional monitoring. The challenges contradict the potentialities: lack of priority, difficulty in care and interaction between teams. The organization and coordination of care is suggested, based on the needs identified, considering the principles and guidelines of the SUS and the Statute of the Elderly. Understanding this integration can be explored by expanding the study to other scenarios and subjects.Keywords:
Homes for the Aged; Primary Health Care; Aged.Content:
Há um intenso e significativo aumento do número de pessoas idosas no mundo, o que ocasiona um rápido envelhecimento populacional. Este fato tem se tornado um dos maiores desafios da sociedade e está diretamente relacionado ao desenvolvimento e condições de vida das pessoas. Estudos evidenciam idosos chegando aos 83 anos, em países desenvolvidos e aos 74 anos, em países em desenvolvimento, entre os anos de 2045 e 20501. Inclusive com um acréscimo de quase um ano na expectativa global de vida saudável ao nascer, saindo de 61,3 anos em 2010, para 62,2 anos em 2021, mesmo com uma acentuada perda em 2019 decorrente do COVID 192.
O processo de envelhecer está diretamente relacionado à questões socioeconômicas e socioculturais de inserção na sociedade, ou seja, o envelhecimento está estritamente concernente com a forma de vida do idoso, constituída no cotidiano do modo de produção desta sociedade e de como cada idoso a traduz na sua subjetividade3.
Como o processo de envelhecer é singular, existem aqueles que, por inúmeros motivos como a genética, as condições de vida, a raça, os problemas sociodemográficos, dentre outros, apresentam declínios cognitivos funcionais mais intensos, tornando-se dependentes de cuidados. Na realidade brasileira, muitos desses idosos ficam em Casas de Repouso, Asilos ou Instituição de Longa Permanência (ILPI), que cuidam dessa parcela da população, com os mais variados graus de necessidades, requerendo maior cuidado e atenção por parte do Sistema Único de Saúde (SUS)4.
No entanto, mesmo com alterações físicas e cognitivas, o processo de envelhecimento se tornou mais ativo, sendo imprescindível a adoção do cuidado na perspectiva da integralidade, para que se construa a autonomia do usuário, considerando suas necessidades, no contexto da família e da comunidade5.
Contudo, percebe-se que os profissionais não têm atendido as expectativas dos usuários dos serviços, que esperam ser bem tratados por um profissional de saúde comprometido e responsivo, que atenda suas necessidades de forma séria, e com abordagem respeitosa, tendo acesso aos cuidados e ter suas dúvidas sanadas, para que tenham melhores resultados na atenção a sua saúde6.
Somada à falta de planos específicos e a aplicabilidade das ações voltadas à população idosa, existe a falta de conhecimento das equipes de saúde, que não sabem a melhor forma de ofertar serviço com qualidade, tanto para idosos dependentes, quanto para os independentes, indo na contramão dos princípios da organização do cuidado do SUS, pautados na universalidade, equidade e integralidade. Há limites na operacionalização da Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI), a saber: despreparo e pouca apropriação dos profissionais e gestores sobre a política; as ações existentes são incipientes; o planejamento tem sido insuficiente, além do que foi planejado nem sempre ocorre na perspectiva da cogestão com as equipes Saúde da Família (eSF) e a partir das necessidades do território, gerando uma política com pouco impacto nas práticas das equipes5.
Quando abordada a saúde do idoso institucionalizado, existem serviços e ações que devem e podem ser desenvolvidos inter-relacionando-os a todos os setores da sociedade. Porém, a relação das ILPIs e os serviços da Atenção Primária à Saúde (APS) não é facilmente operacionalizada na prática. Os gestores reconhecem que as ILPI são importantes e de responsabilidade da Secretaria Municipal da Saúde (SMS). No entanto, há desconhecimento por parte dos gestores sobre quais são as políticas a serem implementadas. Ao mencionar o que realizam na atenção à saúde dos idosos, há um enfoque restritivo aos cuidados gerais para hipertensos e diabéticos, não abordando especificidades7.
Assim, há grandes desafios a serem vencidos para uma real operacionalização das políticas, o que pode nos mostrar inaptidão e desinteresse de alguns gestores e profissionais8.
Portanto, objetiva-se analisar a percepção dos profissionais sobre as potencialidades e os desafios da integração entre Instituição de Longa Permanência para Idosos e Atenção Primária à Saúde, na realização do cuidado aos idosos.
Métodos
Trata-se de pesquisa com finalidade exploratória e abordagem qualitativa. Por ser um tema pouco compreendido e pesquisado, o estudo exploratório auxiliou no entendimento das potencialidades e dos desafios da integração da ILPI e APS, na realização do cuidado com o idoso9.
Nesta investigação, foi relevante compreender a visão dos profissionais da saúde sobre o cuidado realizado aos idosos da ILPI por meio da abordagem qualitativa, pois revelou as concepções e os processos de cuidado desenvolvidos, além de captar as possibilidades e limites desse cuidado.
De acordo com a Resolução nº 196/96, Resoluções nº 466, de 12 de dezembro de 2012 e nº 510, de 07 de abril de 2016, o projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de Medicina de Marília. Foi aprovado com parecer nº 5.625.596, CAAE: 59716722.8.1001.5413, em 05 de setembro de 2022.
As informações coletadas foram armazenadas em espaço físico e digital restrito aos pesquisadores. Com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o participante teve amplo conhecimento sobre a pesquisa realizada, quais riscos e benefícios para si e para os outros, para que desta forma aceitasse ou não participar da pesquisa. Foram mantidos o sigilo e a confidencialidade conforme os aspectos éticos, bem como, foram observados os checks lists do Reporting Qualitive Research (COREQ) como ferramenta de apoio10.
O Estudo foi realizado no Centro de Saúde (Centro de Especialidades Médicas) responsável pela ILPI de um Município de Pequeno Porte do Centro-Oeste Paulista Brasileiro, que conta com 14.069 habitantes, fazendo parte do Departamento Regional de Saúde (DRS) IX, composto por 62 Municípios.
O SUS do Município é formado pelo Centro de Saúde Central (SC), local de realização do estudo, duas equipes de Estratégia de Saúde da Família (ESF), e por uma Unidade Básica de Saúde (UBS), que funciona como um núcleo de apoio para uma das ESF, uma vez que as populações dos distritos foram unificadas para formação da ESF. Além disso, conta com um Centro de Atenção Psicossocial (Caps I); um Centro de Especialidades; um Centro de Diagnósticos; uma Secretaria de Saúde, além de sete estabelecimentos privados. A UBS Central é o contato preferencial dos usuários, a principal porta de entrada e centro de comunicação com toda a Rede de Atenção à Saúde (RAS), instalada no centro da cidade, garantindo à população o acesso e a atenção a uma saúde de qualidade.
O Município tem uma ILPI, que está localizada no território de responsabilidade do Centro de Saúde. Atualmente, a Instituição encontra-se com lotação máxima de dezoito idosos, sendo dez mulheres e oito homens, destes, quatro são totalmente dependentes para suas atividades diárias.
Foram convidados para participar da pesquisa os profissionais, que compõem a equipe da APS responsável pelo território de inserção da ILPI do Município pesquisado.
Como critérios de inclusão, foram considerados profissionais da equipe de saúde, que estivessem na mesma função há pelo menos seis meses, e que pertencessem ao mesmo território da ILPI, tendo, no mínimo, um representante de cada categoria profissional.
Como critério de exclusão, foi considerado o profissional, que estivesse em férias ou afastado por problemas de saúde, no momento da coleta de dados.
A Equipe da APS convidada a participar da pesquisa estava constituída de três clínicos gerais; um neurologista; um cardiologista; um ortopedista; um psiquiatra; uma nutricionista; uma psicóloga; uma fonoaudióloga; uma dentista; dois auxiliares de enfermagem, responsáveis pela Sala de Curativo e Central de Materiais; uma auxiliar de enfermagem, responsável pela Sala de Exames; quatro auxiliares de enfermagem para a Sala de Vacina; seis auxiliares de enfermagem para realizar triagem dos pacientes; dois enfermeiros responsáveis; um enfermeiro responsável pela Vigilância Sanitária e dois assistentes sociais. Além disso, havia quatro responsáveis pela Vigilância Epidemiológica; uma telefonista; duas funcionárias para liberação de prontuário; três para agendamento de consultas; duas para agendamento de ambulância; três do setor administrativo; seis motoristas e quatro funcionários para serviços gerais, totalizando cinquenta e quatro profissionais.
Após a abordagem da Equipe de Saúde e os esclarecimentos acerca da temática e importância da pesquisa para o Município, houve o aceite em participar da coleta de dados, por parte de dezoito profissionais. Os demais não aceitaram participar por problemas como: local da realização de coleta de dados, conhecer a ILPI e os profissionais que trabalham na instituição, grande envolvimento político com a gestão, falta de conhecimento no assunto e insegurança, além da falta de interesse por assuntos relacionados à APS do município.
Conforme havia o aceite dos profissionais, era agendado o melhor dia e horário para a entrevista. Neste momento, foi escolhido um local mais afastado do grande fluxo de pessoas ou naquele em que o entrevistado se sentisse mais confortável para responder aos questionamentos, geralmente o próprio local onde ele trabalhava.
A coleta de dados ocorreu por meio de entrevista semiestruturada11, com um roteiro contendo questões relacionadas ao processo de trabalho, junto a ILPI, o cuidado, as potencialidades e os desafios entre a APS e ILPI, solicitando exemplo dessa prática.
Entrevistas foram iniciadas, preliminarmente como piloto, com profissionais do mesmo serviço a ser pesquisado, para verificação do instrumento e capacitação do entrevistador, não havendo necessidade de modificações no instrumento, com posterior continuidade das entrevistas com os participantes. O primeiro autor realizou as entrevistas com a supervisão de um pesquisador com doutorado e experiência em pesquisa qualitativa.
As entrevistas audiogravadas, transcorreram entre 21 de setembro de 2022 a 23 de fevereiro de 2023. Tiveram, em média, 17 minutos de duração, com tempo mínimo de 11 minutos e no máximo de 40 minutos.
A análise dos dados foi realizada por meio do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), com fundamentação pela Teoria das Representações Sociais (TRS)12,13. Após a realização das entrevistas, os áudios foram transcritos para posterior identificação das Expressões Chave (ECH) e Ideias Centrais (IC) de cada segmento das mesmas. Em seguida, as IC foram agrupadas e classificadas de acordo com os sentidos e objetivo da pesquisa, sendo esta o processo de trabalho entre APS e ILPI.
Feito o agrupamento e a classificação das IC, foram elaborados os DSC, que serviram para fomentar a discussão e a hipótese da pesquisa. Os DSC foram numerados de acordo com as suas respectivas IC.
Resultados
Os participantes da pesquisa consideram que o idoso da ILPI é bem cuidado pelos profissionais do Centro de Saúde (CS), em geral, recebendo prioridade no fluxo do cuidado, sem precisar de agendamento quando procuram o serviço, tendo, geralmente, atendimento médico e vacinação. Mas, quando o atendimento era feito na ILPI, consideram que era mais positivo para os idosos. Destacam que a Odontologia tem elaborado projetos para cuidados com prótese e saúde bucal geral. Mencionam como mais positivo no cuidado dos profissionais o carinho e a conversa com os idosos (Quadro 1).
Quadro 1
Quanto aos desafios (Quadro 2), os participantes discorrem sobre a falta de procura pelos serviços de saúde por parte dos profissionais da ILPI, uma vez que, na Instituição, há uma equipe própria para ofertar cuidados básicos aos idosos. Descrevem que a baixa procura pelo apoio do CS está focada na escolha da ILPI por desenvolverem os cuidados na própria instituição, buscando o atendimento no CS apenas em casos de urgências.
No geral, a relação de trabalho entre a ILPI e CS é, muitas vezes, complexa e confusa. Percebe-se a dificuldade dos profissionais da ILPI em relatar, no momento do atendimento, sobre o estado de saúde dos idosos. Ainda mencionam a falta de vontade dos trabalhadores do CS, em geral, em oferecer cuidado mais específico e mais humano aos idosos institucionalizados, não sendo prioridade quando chegam ao CS.
Entretanto, identifica-se também a representação de que são os profissionais do CS que não demonstram preocupação com os idosos da ILPI e não realizam cuidados regularmente na institução, focando mais na rotina e menos nas ações de prevenção aos agravos. A pouca aproximação com a ILPI também é vista como falta de empatia, paciência, comodismo e resistência às mudanças, levando ao desconhecimento das necessidades dos idosos.
Na representação dos profissionais os idosos são pessoas “esquecidas” pelas famílias, sendo uma populaçãoe invisível, permanecendo na instituição até morrerem.
Descrevem que não têm capacitação para desenvolver o cuidado aos idosos, necessitando-se de formação.
Quadro 2 – Discurso do Sujeito Coletivo a respeito dos desafios encontrados no cuidado ao idoso e integração entre CS e ILPI.
Quadro 2
Discussão
Como potencialidades destacou-se a realização do cuidado por parte da equipe de enfermagem e a prioridade de atendimento durante as consultas médicas, o controle clínico, que os profissionais da ILPI realizam e a importância do trabalho em si.
Porém, ao analisar as potencialidades e desafios, há contradições entre os discursos, ao ter como representação a realização do cuidado pelos profissionais do CS de forma qualificada, mas ao mesmo tempo, há a contraposição da representação de que eles não se responsabilizam com os idosos da ILPI.
Percebe-se que os profissionais da ILPI buscam pelo acesso ao cuidado na unidade de saúde, porém, não ocorre corresponsabilização no desenvolvimento do cuidado por parte dos profissionais do CS. Além disso, há alternância de gestores na ILPI, o que também pode dificultar a construção de uma integração.
Esta pouca aproximação dos profissionais do CS a ILPI é vista como falta de empatia, comodismo e resistência, ou seja, os trabalhadores de ambas as instituições teriam que compreender e estruturar o cuidado a partir das necessidades constituídas, com o compromisso de cuidar, criando vínculo com os usuários do serviço da APS.
A representação acerca dos idosos sendo vistos como pessoas “esquecidas” pelas famílias, sendo uma populaçãoe invisível, “permanecendo na instituição até morrerem” também pode determinar esta pouca corresponsabilização.
Compreender a velhice como sinônimo de incapacidade e/ou doença é um dos maiores estigmas sociais relacionados ao envelhecimento. Essa visão a respeito do ser idoso causa vários danos em nível emocional, já que o idoso acaba sendo excluído, além de perder sua autonomia, tanto pela sociedade de maneira geral como pelos próprios familiares, que entendem a perda da capacidade do indivíduo de responder por si só após determinada idade, e isso não pode ser generalizado14.
Atualmente, um dos grandes desafios para o setor público é o cuidado com os idosos. O idoso não deve ficar apenas sob cuidados de seus familiares. As novas configurações familiares e novas demandas do cuidado ao idoso nos obrigam a pensar na oferta de cuidado domiciliar, apoio para realização de atividades, promoção de autonomia, prevenção de doenças e qualidade de vida15.
No Brasil, as ILPIs são as modalidades mais comuns para atender às necessidades da população idosa, que não dispõe de auxílio de terceiros para manter suas atividades rotineiras ou não tem condições econômicas para custear um profissional para auxiliar nas atividades. Diante disso, é preciso avaliar e discutir propostas para melhorar a qualidade na oferta desses serviços, de forma gratuita, ou que seja, minimamente, mais acessível a todos16.
Ao analisar como é desenvolvida a oferta de cuidado aos idosos entre os países do oriente e do ocidente, percebe-se que em alguns países da Europa, como a Inglaterra e a Dinamarca, por exemplo, o foco é reabilitação, qualidade de vida, menos tempo de tratamento e menos institucionalização, já que existem diferentes maneiras do idoso receber os cuidados necessários na própria residência, desfocando da ILPI. Inclusive esse tipo de cuidado ao idoso é, muitas vezes, dispensado. O Estado e município se responsabilizam pelo cuidado, dando todo suporte financeiro que a família precisa para ofertar o melhor e mais digno cuidado17.
No Município da investigação, os idosos da ILPI são atendidos por um CS, que tem como característica o cuidado realizado por médicos especialistas, sendo denominado de UBS Central, quando, de acordo com o apresentado nas políticas da APS, deveria acontecer por uma equipe de Saúde da Família (eSF). Esse cuidado oferecido pelo Município poderia ser organizado considerando a lógica do cuidado em rede. Ou seja, o acesso inicial e preferencial seria pela ESF, sendo encaminhado as especialidades quando necessário, causando até mesmo confusão na equipe em relação ao que deve ser o cuidado ofertado, a partir de quais necessidades de saúde, se deveria ou não ter prioridades aos idosos, como e em quais situações fazer encaminhamentos.
Outros aspectos identificados foram o cuidado ao idoso sem captar suas especificidades, enquanto adulto e idoso, bem como o modelo de cuidado centrado no atendimento médico curativista, sem promoção de saúde, prevenção de doenças e com dificuldades de acompanhamento do estado de saúde dos idosos. Ou seja, o modelo de cuidado é biomédico e fragmentado, não se constituindo na integralidade junto aos usuários e na organização do sistema de saúde.
Refletindo sobre este contexto é preciso também pensar nas políticas públicas e as formas de o Município implementá-las, para melhorar a qualidade da atenção à população idosa, estruturando o serviço para acolher as necessidades no território e na RAS. Existe a falta de operacionalização do sistema de acordo com a regionalização e a territorialização, sendo que a APS deveria ser a porta de entrada preferencial para o SUS, com a priorização de atendimento e funcionamento da RAS, a partir das necessidades com ampliação diagnóstica e de tratamento.
A organização do cuidado em rede à pessoa idosa constitui-se em um desafio, articulando os diversos serviços e equipamentos sociais existentes, nos territórios de saúde para atender as suas necessidades18.
A transição do cuidado entre diferentes pontos de atenção da RAS também é um problema tanto no Brasil como em outros países, para que se possa atender as necessidades das pessoas. Em Portugal identificou-se que há desafios quanto ao cuidado de longo prazo, com reabilitação e mudanças de estilo de vida, uma vez que, após a pandemia, os serviços estão com dificuldade de se organizar por falta de profissionais e recursos, além da desmotivação, sendo imperativo a formação dos profissionais para executar as ações necessárias frente à complexidade das necessidades sociais e de saúde, sendo uma prática multidimensional19.
Na investigação desenvolvida menciona-se a falta de capacitação dos profissionais de saúde; dificuldade de deslocar os idosos até o CS; falta de organização, que permita aos profissionais do CS irem até a ILPI, em razão da grande demanda de atendimento no CS; falta de equipe multiprofissional na própria ILPI e até mesmo a falta de abertura para atuação do CS.
A forma de abordagem do idoso veio se modificando ao longo dos tempos, de acordo com as mudanças nas políticas públicas de trabalho e saúde. Existiram importantes alterações relacionadas ao envelhecimento na atualização da Política Nacional da Atenção Básica (PNAB), em 2017, ficando claro a obrigatoriedade do cuidado com a pessoa idosa dentro do território da equipe Saúde da Família (eSF), incluindo os domiciliados e institucionalizados, seja em instituição privada ou não. Por isso, a ESF deve desenvolver atividades junto à instituição. Porém, não existe reconhecimento das ILPIs nos territórios das ESF e as atividades são insuficientes para as necessidades de saúde desses idosos20.
Na investigação sobre a implementação da PNSPI em um município de médio porte, do interior paulista, no Brasil, verificou-se a inexistência de plano municipal específico para a pessoa idosa. Encontrou-se no Plano Municipal de Saúde a meta para “Implantar o Programa Saúde do Idoso” e implantar PNSPI no Relatório de Gestão Anual. No entanto, identificou-se ações como consulta médica, mas sem especificidade ao idoso e pouco envolvimento da equipe5.
Gestores municipais, estaduais e federais precisam discutir a aplicabilidade e adequação dessas políticas para que sejam retiradas do papel, ou seja, aplicá-las na prática, a fim de proporcionar uma velhice mais digna e saudável, proporcionando acesso e resolução das necessidades, superando o modelo biomédico de cuidado. Também é necessário desenvolver ações para a promoção da saúde, prevenção de doenças comuns, tendo em mente a obrigação do Estado perante a saúde do idoso, como apresentado de forma clara no Estatuto da Pessoa Idosa21.
Nos resultados da pesquisa captou-se que a comunicação e integração entre a equipe da ILPI e CS estão interferindo no cuidado realizado. Desta forma, destaca-se a importância dos profissionais se apropriarem das reais necessidades e que possam construir estratégias que atendam a ambos os serviços e, principalmente, as pesssoas a serem cuidadas.
Na Espanha, país com logevidade elevada, detecta-se que também há dificuldades no processo de comunicação entre as residências de idosos e o serviço da APS. Os profissionais da APS desconhecem o fucionamento das residências, a situação clínica e as necessidades dos idosos, levando somente a executam as prescrições dos médicos das residências, centrando-se muito em situações burocráticas. Percebe-se a necessidade de se ter uma melhor interação entre os dois serviços para planejamento integrado das intervenções, com reuniões periódicas, e formação dos profissionais para homogenização dos critérios de cuidado22.
Dentro de um contexto de desafios, na organização do cuidado em rede, articulando os diversos serviços e equipamentos sociais existentes, nos territórios de saúde, destaca-se a ideia de necessidades de saúde, as quais são de caráter social, trabalhadas de forma individual e coletiva. São organizadas em taxonomia, com o objetivo de organizar e operacionalizar o cuidado ofertado, identificando o quanto essas necessidades são realmente escutadas e compreendidas pelos profissionais dos serviços de saúde23.
Busca-se a construção do cuidado na perspectiva da integralidade nas diferentes esferas de saúde. A equipe de saúde constroi o cuidado por meio da escuta qualificada, preparando-se da melhor forma possível para perceber as necessidades trazidas, individualmente, pelos usuários. Compreende-se que essa integralidade não será totalmente contemplada nos serviços de saúde, mas poderá ser articulada nos diferentes setores, melhorando as condições de vida e de cuidado passando a ser pensada de maneira mais ampla (“macro”), nas redes de serviços de saúde23.
Diante do cenário brasileiro de atenção à saúde do idoso, há uma proposta de modelo de cuidado focado nas necessidades e características especiais e particulares. O modelo é estruturado em cinco níveis. O nível um representa o acolhimento, estabelecimento de vínculo e confiança. No nível dois, existem ações de educação, promoção de saúde, prevenção de doenças e recuperação de saúde, para famílias de idosos com baixo risco, centro de convivências, serviços de reabilitação, de apoio ao cuidado e autocuidado e apoio à familiares. No nível três, é realizada a avaliação multidisciplinar (médico, enfermeiro e assistente social) da pessoa idosa, para que as intervenções específicas sejam executadas com atendimento domiciliar e ambulatorial. Os níveis quatro e cinco representam as unidades de cuidado de curta duração (atenção domiciliar, emergência, hospitais, etc) e longa duração (unidade de reabilitação, residência assistida e ILPI), respectivamente. Um ponto importante do modelo de cuidado é o registro correto de todas as etapas, não só da evolução clínica, mas também da participação do idoso nas atividades propostas24.
É relevante articular esse modelo de cuidado ao idoso24 considerando o contexto da RAS, sendo que, na sua implantação, busca-se a continuidade de cuidado àqueles com doenças crônicas, por exemplo, para obter melhores resultados frente a epidemiologia e a integralidade no cuidado. Diferentes pontos da APS, da média e alta complexida precisam se interligar sem barreiras no acesso aos serviços, sendo coordenados pela APS, de acordo com o que seria mais importante para as pessoas, oferecendo cuidado e tecnologia, que possam solucionar os problemas em determinado espaço25.
A atenção à saúde da população idosa pode ser reestruturada, estando ancorda na superação do modelo focado somente na doença em direção à construção da integralidade no cuidado em rede de atenção à saúde, permitindo que se tenha qualidade no cuidado e com custo sustentável. Contudo, todos os atores sociais envolvidos no processo devem compreender a importância das mudanças, além de se perceberem como parte dele. Ou seja, conta-se com o protagonismo dos profissionais das equipes, idosos, outros setores além da saúde e a sociedade civíl organizada para que se possa fazer gestão não da doença, mas dos indivíduos, com uso adequado das tecnologias disponíveis. Para tanto, mostra-se necessária a formação dos profissionais para atuar nos cuidados sutentando nestas tecnologias e centrado na pessoa, nas informações de qualidade e monitoramento frequente26.
Considerações Finais
O estudo possibilitou a comprrensão na perspectiva dos profissionais sobre a integração, seus desafios e potencialidades entre APS e ILPI. As representações sociais que surgiram ao longo dos discursos revelaram como o cuidado ocorre, mas também as limitações de cuidados ofertadas pelos profissionais na instituição, justificada pela grande demanda de atendimentos no CS, que impossibilitam os profissionais de se deslocarem até a ILPI.
Ainda com relação aos desafios, os discursos revelam alguns estigmas relacionados a representação dos idosos institucionalizados no sentido de não haver muitas perspectivas de qualidade de vida, e como desenvolver os cuidados, a partir de suas necessidades. também há falta de conhecimento pelos profissionais do CS, em atender a demanda dos idosos institucionalizados, além da falta de interesse, que alguns demonstram em relação às capacitações. No geral, o processo de trabalho não prioriza os idosos institucionalizados, tampouco aos domiciliados, sendo necessário rever a proposta de cuidado, a relação da ILPI e o processo de trabalho em saúde, na perspectiva do cuidado no contexto da RAS.
Em relação as potencialidades, percebe-se que há prioridade quando os idosos procuram atividades no CS e, em determinadas situações não precisam agendar o serviço, sendo positivo o cuidado por parte da enfermagem e dos ACS com esses idosos. No setor de Odontologia, existe projeto para executar prótese e prevenção à saúde bucal.
O processo relacionado com o desenvolvimento da pesquisa, possibilitou a elaboração de um produto técnico que incluiu apresentação dos achados com a Gestão Municipal para a construção de estratégias de cuidado a serem ofertadas à pessoa idosa da ILPI, com a intenção de organizar o cuidado em rede, a partir das necessidades identificadas, considerando os princípios e diretrizes do SUS e do Estatuto da pessoa idosa.
Identifica-se como limite da investigação a possibilidade de se trabalhar com um Município, sendo necessária a expansão da pesquisa com outros sujeitos que participam da implementação da política nos municípios e em outros locais, de forma que se possa compreender como a integração entre ILPI e APS tem ocorrido.
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Contribuições: LFAS - trabalhou em todas as etapas de produção, desde a concepção até a revisão final. FVMG - redação do artigo e a sua revisão crítica. DAMP - redação do artigo e a sua revisão crítica. VCBP - redação do artigo e a sua revisão crítica. DAS - redação do artigo e a sua revisão crítica. CRLB – revisão critica do artigo. MQC - trabalhou em todas as etapas de produção, desde a concepção até a revisão final.