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0462/2007 - As bases filosóficas e históricas do cuidado e a convocação de parceiros sexuais em HIV/AIDS como forma de cuidar
The philosophical and historical bases of the care and the calling of sexual partners in HIV/AIDS as a form to look after

Autor:

• Priscilla Mesquita Luz - Luz, P.M. - Fortaleza, CE - Acadêmica do Curso de Enfermagem, Centro de Ciência da Saúde da Universidade Estadual do Ceará - UECE. - <priscillamluz@gmail.com>


Área Temática:

Não Categorizado

Resumo:

Trata-se de um artigo no qual discutimos o conceito do cuidado na perspectiva da filosofia, articulando-o com a prática do enfermeiro, que se apropria desse conceito para fundamentar sua prática profissional. Defendemos que uma maneira de cuidar com ética pode ser realizada na convocação dos parceiros de portadores do HIV/AIDS. Acreditamos que esse momento é de grande delicadeza e merece ser discutido e institucionalizado pela equipe interdisciplinar que realiza atendimento especializado em HIV/AIDS.
Palavras-Chave: Filosofia; Cuidado; Parceiros Sexuais; HIV/Aids.

Abstract:

This is an article in which we discuss the concept of the care according to the perspective of the philosophy, join it with the practice of the nurse, who appropriates himself of this concept to substantiate his professional practice. We defend that a way to look after with ethics can be carried out when the professional call upon the partners of the HIV/AIDS infected patients. We believe that this moment is very delicate and deserves to be argued and to be institutionalized by the professional team that carries out the specialized attendance in HIV/AIDS.
Key words: Philosophy; Care; Sexual partners; HIV/Aids.

Conteúdo:

As Bases Filosóficas do Cuidado
A palavra cuidado, segundo os clássicos dicionários de filologia, deriva do latim cura (coera) e era usada em contextos de relações de amor e amizade. Expressava a atitude de cuidado, de desvelo, de preocupação e de inquietação pela pessoa ou objeto estimados. (Aluisio Gomes da Silva Júnior et al 1)
Outros filólogos pensam na origem da palavra em cogitare-cogitatus e suas derivações coeydar, coidar, cuidar. O sentido é similar ao de cura: ter atenção, interesse, atitude de desvelo e preocupação. Logo, o cuidado se apresenta quando algo ou alguém tem importância para nós. A dedicação e a disponibilidade de participação, o sentimento de zelo e a responsabilidade realizam o cuidado. (Aluisio Gomes da Silva Júnior et al 1)
Nesse sentido, cuidado é um modo de ser-no-mundo que fundamenta as relações que se estabelecem com todas as coisas. No jogo de relações, na co-existência e con-vivência, o ser humano edifica seu próprio ser, sua autoconsciência e sua própria identidade2.
Segundo Boff 2, existem duas maneiras básicas de existir: pelo trabalho e pelo cuidado. Logo, a construção da realidade passa a ter seu processo emergente a partir dessas dimensões. Para a humanidade, o trabalho se transforma em modo-de-ser consciente e assume a marca de um projeto, com suas manobras de modelagem de si mesmo e da natureza. Entretanto, a busca pela superação dos desafios impostos pela natureza levou o ser humano a aprofundar sua capacidade de interpretação e intervenção. Essa racionalidade leva o ser humano a uma objetividade cada vez mais imediata por uma tecnologia que acaba por robotizar e fragmentar a ação humana, distanciando-o da natureza.
Para Boff 2
“cuidar das coisas implica em: ter intimidade, senti-las dentro, acolhê-las, respeitá-las, dar-lhes sossego e repouso. Cuidar é entrar em sintonia com, auscutar-lhes o ritmo e afinar-se com ele. A razão analítico-instrumental abre caminho para a razão cordial, o espírito da delicadeza, o sentimento profundo. A centralidade não é mais ocupada pelo logos-razão, mas pelo pathos-sentimento”.

Do ponto de vista existencial de Heidegger, o cuidado acontece antes de qualquer comportamento humano, significando dizer que é encontrado em toda atitude e situação de fato. O cuidado é o modo-de-ser essencial da humanidade. Está presente em tudo, logo, é o fenômeno ontológico-existencial básico, quer dizer, fundamental para a interpretação do sujeito3.
Para explicar o cuidado como essência da existência humana, Heidegger utilizou uma fábula de origem grega e base latina, escrita por Higino. Na fábula, Cuidado ou Cura passeia próximo a um rio. Vê um pedaço de barro, que para outros passaria despercebido. Cuidado deu forma ao que antes era barro, lama, terra. E admirou o que havia feito. Mas, a sua obra faltava-lhe vida. Júpiter, deus criador, apareceu e Cuidado pediu-lhe que incutisse espírito na sua obra. E ele insuflou nas narinas o hálito da vida e a obra feita de barro se tornou viva. Mas faltava um nome à nova criatura. Logo, criou-se o impasse. Cuidado queria dar o nome, Júpiter queria que lhe fosse dado o seu nome, a deusa Terra desejava o mesmo, pois fora de quem originalmente surgira à nova identidade. Foi chamado Saturno, o deus do tempo da abundância, para resolver as divergências. Saturno julgou e decidiu3:

A Júpiter foi prometido o espírito após a morte da criatura, já que ele tinha lhe dado a vida; à Terra, que forneceu o material do corpo, o receberá quando desta ocorrência; e a Cuidado, porque foi quem por primeiro o moldou, caberá a responsabilidade dos cuidados com a criatura durante toda sua existência no mundo. O nome daquele ser foi decisão de Saturno, que lhe chamou Homem, porque veio do húmus, isto é, terra fértil, e a ela voltará.
Essa fábula é a tentativa humana em revelar a realidade imaterial ontológica desvelando a gênese e finitude humanas3.
Heidegger percebeu que, na imaginação de Higino, o Cuidado ou Cura representava a primeira manifestação de uma característica fundamental do existir humano. O ser-no-mundo é muito mais do que simplesmente estar-no-mundo. Este é ôntico, aquele é ontológico. O ôntico ocupa, o ontológico se preocupa, cuida, e é percebido como algo intuído, que se constitui, de fato, um referencial de sentido para todas as ações humanas: a preocupação. E foi dessa preocupação que surgiu o homem3.
Enquanto Boff 2 compreende o cuidado como atitude fundamental de um modo de ser, no qual a pessoa sai de si e centra-se no outro com carinho; Heidegger aponta que a origem humana está no cuidado e que esse cuidado possui uma anterioridade que imprime, mantém e domina o ser-no-mundo. O cuidado é a primeira marca humana.
Logo, o cuidado pensado aqui, é entendido como ocupação e preocupação para fora de si. Essa ocupação tem o sentido primeiro de preservação de um outro, que se caracteriza pela ação: ação de cuidar. Nessa perspectiva, cuidar é tarefa de todos, como cuidar do planeta, do país, da cidade, do outro, do familiar ou não familiar, da criança, do idoso, do que sofre, do que chora, do que pede e do que não pode pedir.
Compreender a realidade do outro saindo de sua própria referência estrutural é o principal aspecto da dimensão ética do cuidado referido por Noddings 4. No qual, a realidade do outro nos chega de forma empática, onde a tolerância se torna fundamental. O cuidado aqui representa um acordo, pois existe envolvimento entre as pessoas, promove o bem estar do outro, logo, é uma atitude relacional4.
Foucault 5 ao escavar, com seu método arqueológico, a cultura grego-romana nos séculos II e III, revela uma tecnologia do cuidado de si, como uma técnica ética e estética da existência. As técnicas de si revelam que quem se governa pode governar os outros, havendo assim a necessidade de cuidar de si mesmo, dos outros e da cidade. Mas, para isso seria necessário se conhecer, conhecer o corpo e seus limites, enfocando a questão primordial da moderação.
Foucault 5 também refere que um dos estatutos do sujeito era o sujeito do cuidado de si, que se tratava de uma prática da liberdade que implica a criação e invenção de si mesmo como sujeito. Logo, a partir do conhecimento de si, as pessoas poderiam auto prescrever dietas, exercícios, sexo, banhos, sem a necessidade de recorrer a especialistas, já que a pessoa mais indicada para este cuidado é o próprio sujeito. O cuidado de si implica na relação de si consigo, um trabalho incansável de construção de si mesmo. Para o grego a questão era: você é senhor ou escravo dos seus desejos?
Dessa forma não existia a figura do especialista, que ditava para o outro a melhor forma de se cuidar e viver melhor. Mas, com a modernidade, a inversão desse pensamento se tornará uma construção e invenção proposta pela ciência.

História do cuidado no contexto da Enfermagem
A Enfermagem no Brasil, como em outros países, iniciou seu percurso desvalorizando o cuidado atendendo apenas uma ideologia de cura. As ações curativas ocupavam a maior parte das atividades, utilizando tecnologias mais sofisticadas6.
Neste momento, houve um distanciamento das enfermeiras em relação aos pacientes, pois devido à formação universitária, passaram a valorizar a liderança, o planejamento, o controle e a gerência, no sentido de se tornarem eficientes, além de controlar gastos. O cuidado direto passou a ser exercido pelas demais categorias de enfermagem, ratificando que o cuidado era algo de menor valor6.
Em relação ao ensino, os livros de fundamentos de enfermagem eram as bíblias dos alunos. A habilidade manual, a capacidade de memorização, a postura e a mecânica corporal na realização de técnicas eram aspectos imprescindíveis, além do capricho, da organização e da perfeição. O objeto da enfermagem não estava centrado no cuidado ao paciente, mas na maneira da tarefa ser executada6.
A década de 1950 é caracterizada pela introdução dos princípios científicos, guias norteadores de todas as ações de enfermagem, prevalecendo os aspectos biológicos, os princípios de anatomia, fisiologia, microbiologia, física e química. Agora, o cuidado de enfermagem tinha respaldo científico, uma aproximação com o saber das profissões hegemônicas. Nas escolas de enfermagem, o ensino continua priorizando o conhecimento médico, acrescido de uma ênfase nas teorias administrativas de Taylor 7, cujos princípios eram orientados para as ações de planejamento, organização, supervisão do cuidado administrado pelas demais categorias6.
Em meados da década de 1960 e 1970, as teorias de enfermagem passam a ter um papel fundamental no desenvolvimento da profissão. Várias tentativas são realizadas no sentido de humanizar o cuidado, buscando o status de ciência e sua identidade6.
Na década de 1970, no Brasil, as teorias passam a se tornar fonte de interesse. A maioria desenvolvida por enfermeiras americanas, com ênfase em aspectos biomédicos: adaptação, homeostase, necessidades humanas básicas, buscando apoio em outras áreas do conhecimento social e psicológico6.
A metodologia do processo de enfermagem, introduzida no Brasil em meados de 1970, sofistica-se e passa a ser implantada em algumas instituições hospitalares, apesar de algumas resistências iniciais quanto à sua efetivação6.
Muitas teorias, que são norteadoras da prática do enfermeiro, têm sido atualizadas e várias propõem o cuidar como foco central. Nelas são teorizados conceitos de homem, saúde, enfermagem, cuidado, cada qual dentro do seu fundamento epistemológico, viés teórico e corrente filosófica eleita pelo seu pensador: fenomenologia, existencialismo, marxismo, humanismo.
Vale ressaltar também que a enfermagem além de elaborar, está sempre discutindo e avaliando o processo de enfermagem. Uma das etapas desse processo é o diagnóstico de enfermagem como um instrumento de grande importância na estruturação do conhecimento, para definição do papel e do domínio próprios do enfermeiro, logo, o desenvolvimento de uma taxonomia serve para descrever e desenvolver um fundamento científico confiável8.
Portanto, podemos perceber que os profissionais de enfermagem, durante a construção da sua história e identidade, apropriaram-se do cuidado para se dizer e existir cientificamente. Faz-se necessário que esses profissionais retomem e reflitam sobre o conceito filosófico do cuidado e a história de sua profissão, capturando ou sendo capturado por este conceito.

A Perspectiva do Cuidado em ambulatório especializado em HIV/AIDS
Em meados de 1981 cientistas descobriram uma doença que gerava um quadro de imunodeficiência grave nos pacientes, chegando ao ponto de deixá-los vulneráveis a doenças oportunistas, levando-os à morte. Denominaram-na de Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) causada pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV). Essa pandemia resultou em medo, perda e sofrimento para as pessoas, tornando-se um desafio para a comunidade científica mundial (Charles F Farthing et al 9). No Brasil, os primeiros casos de Aids surgiram em 1982, a sua disseminação se iniciou a partir da região Sudeste do país e atualmente ela alcança escala nacional10.
Mas frente à complexidade e à diversidade de problemas que surgiram pela epidemia da Aids, foram colocados mundialmente como uma das importantes estratégias de controle da transmissão do vírus HIV os testes sorológicos, que eram feitos em centros, que receberam a denominação de Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA). Eles caracterizavam-se pela oferta do teste sorológico anti-HIV acompanhado de aconselhamento pré e pós-exame, assegurando gratuidade, voluntariedade e confidencialidade (Margarete PS Ferreira et al 11). No ano de 2000, mais de 150 CTAs estavam funcionando no Brasil12.
A revelação do resultado do exame ao paciente é feita frente a um profissional de saúde, que é capacitado para tal, sendo ideal que após a abertura do exame, o profissional por meio de uma escuta presentificada permita que o paciente expresse seus sentimentos, dúvidas e angústias.
Os sentimentos dos pacientes durante a descoberta da soropositividade pelo HIV, são de dor e sofrimento, tornando esse atendimento bastante difícil tanto para eles quanto para o profissional, pois o diagnóstico de soropositividade está interligado aos sentimentos de morte, perda, abandono, preconceito, rejeição pelas outras pessoas, rompimento das relações e medo do desconhecido13.
De acordo com Luzia Aparecida Oliveira et al 14, presencia-se cotidianamente situações nas quais a busca do controle da doença, questões relativas à adesão, ao tratamento e dificuldade de revelação do diagnóstico, que muitas vezes vão de encontro aos projetos pessoais dos usuários.
Desse modo o profissional pode se envolver diretamente com a situação, passando a ficar paralizado com os sentimentos do paciente e desenvolver mecanismos de proteção, passando a considerar o portador de HIV/AIDS como um usuário social, econômico e culturalmente menos favorecido e que deve ser amparado, conseqüentemente, os próprios profissionais, que de certa maneira se comovem com a situação, assumem esse amparo. Isso facilita a criação de um vínculo entre eles, mas abre espaço de maneira informal para dependência de juízos e vontades pessoais, sobretudo por parte dos profissionais (Luzia Aparecida Oliveira et al 14). Essa criação de juízo de valores a respeito do usuário é prejudicial para a relação profissional-paciente, e é nesse momento de interação de todos esses sentimentos que há uma dificuldade do profissional, podendo impedir que ele faça uma abordagem problematizadora na qual o outro também faça parte das discussões.
Portanto, é importante haver uma abordagem multidisciplinar e interdisciplinar entre os profissionais, pois no momento em que um tiver dificuldades em conduzir determinadas situações se sinta à vontade para encaminhar o paciente a outro profissional permitindo assim que o paciente fale sobre seus sentimentos, sobre suas dúvidas, obtenha orientações e informações sobre o assunto, pois é principalmente no aconselhamento que o profissional consegue desempenhar essas atividades.
O cuidado ao paciente soropositivo exige que o profissional o veja como um ser humano, com demandas específicas, encontrando-se fragilizado, portanto, merecendo respeito e atenção, que muitas vezes é negado em seu ambiente familiar e do trabalho. É fundamental que os profissionais trabalhem o autocuidado desses pacientes com o objetivo de incentivarem sua autonomia e auto-estima.
O cuidado também está relacionado com a saúde de terceiros que se relacionam sexualmente com pacientes soropositivos. Uma forma de estar eticamente comprometido com o cuidado é atuando e promovendo a convocação dos parceiros sexuais, para que assim eles possam procurar assistência institucional para investigação de sua condição sorológica, quebrando uma possível cadeia de transmissão do HIV. Esses parceiros poderão assim ser beneficiados com relação ao acesso ao serviço de saúde e suas condutas de promoção da saúde, tendo a possibilidade de um atendimento e acompanhamento especializado, favorecendo uma sobrevida do parceiro sexual.
Dessa forma, a convocação de parceiro sexual ao portador do HIV/AIDS pelo profissional de saúde deve ser um momento de destreza e delicadeza, pois ele se torna bastante doloroso para ambas as partes. É um momento de cuidado para com o cliente e seu parceiro sexual.
Dessa forma, de acordo com estudo feito por Juliana MC Teixeira 15, o momento ideal para se abordar essa temática seria na consulta para entrega de preservativos, pois além da condição sorológica já ter sido compreendida pelo paciente, o profissional utilizando a educação em saúde, após abordar os aspectos relacionados ao uso ou não do preservativo, passa a questionar a revelação da sua soropositividade para o parceiro. O profissional pode investigar se o parceiro chegou a fazer a testagem, caso não, amadurecer a idéia de que seria o ideal, contra-argumentar com o paciente fazendo com que ele se coloque no lugar do outro, explicar os mecanismos de transmissão das DST, a possibilidade de ocorrência de casos assintomáticos e de complicações graves, e assim motivá-lo trazer o seu parceiro para a testagem.
A convocação dos parceiros sexuais é de extrema importância para que eles possam buscar atendimento especializado o mais breve possível. Todos têm direito de saber sobre sua condição de saúde como também de ter acompanhamento e tratamento pelo serviço. A pessoa soropositiva tem dever de proteger seus parceiros sexuais, comunicando sua condição sorológica e usando preservativo em todas as relações sexuais.
Não se pode proteger um sujeito e deixar o outro desamparado. Então surge um questionamento: até que ponto pode-se manter a privacidade e sigilo do portador do vírus da AIDS e omitir sua soropositividade colocando em risco outras pessoas?
Não basta que o profissional tenha o domínio técnico. É fundamental que ele tenha um cuidar ético, levar em conta a vida e defendê-la, considerando a necessidade do cliente, mas sem julgá-lo, discriminá-lo ou estigmatizá-lo, sem perder de vista o cuidado ao outro. É articular liberdade e responsabilidade, liberdade no sentido da ação assumindo a responsabilidade frente a seus atos.
É importante que o profissional não se deixe tomar por sentimentos de penalização, muitas vezes paralisante frente ao cliente e à gama de sofrimentos por que ele passa, pois no momento que isso ocorre o profissional se despotencializa, minimizando sua capacidade ética e desconsiderando o cuidado ao outro. Trabalhar com convocação de parceiros não é fácil, pois essa abordagem é permeada de dilemas éticos que podem nos barrar, nos paralisar.
Para que a convocação de parceiros seja bem sucedida, Juliana MC Teixeira 15 concluiu através do seu estudo em um Serviço Ambulatorial Especializado (SAE) onde os profissionais fazem o aconselhamento que a instituição não oferece estrutura física e organizacional para a realização da convocação dos parceiros sexuais HIV/AIDS.
Surge assim, a necessidade de planejamento de um serviço ou protocolo que facilite o processo de convocação de parceiros, possibilitando que o profissional tenha um melhor manejo desse paciente em relação à adesão ao tratamento e principalmente comunicação dos parceiros sexuais. Sendo necessária a criação de um protocolo que permita que o profissional faça a convocação dos parceiros, tendo como dar continuidade as suas condutas e tenha uma avaliação se esse paciente está voltando ao serviço com seu parceiro sexual.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O cuidado, que “a priori” é essência do existir humano ou uma responsabilidade com o outro, não deve ser restrito ao portador do HIV/AIDS, mas sim expandido para os seus parceiros com quem mantém relações e que estão vulneráveis à contaminação pelo HIV.
É interessante que a equipe profissional do aconselhamento seja mais coesa, colocando em prática conceitos de: interdisciplinaridade, multidisciplinaridade, referência, contra-referência e cuidado ético, utilizando-se sempre da delicadeza, que é um modo sutil e suave de contornar situações difíceis, de fragilidade frente à revelação do resultado do exame anti-HIV e à revelação da soropositividade para os parceiros sexuais.
Defendemos que o atendimento realizado no SAE destinado à entrega de preservativos realizada pela equipe interdisciplinar seja o momento ideal para reforçar o tema da convocação do parceiro sexual. Acreditamos ser esse momento a chance que o profissional de saúde tem de manter um vínculo com o paciente, fazendo questionamentos sobre sua sexualidade, adesão ao tratamento, como também sobre a comunicação da sua soropositividade para a sua parceria sexual. Além de que nesse atendimento já se disponibiliza o nome e o número do prontuário do paciente, desse modo é possível fazer um diagnóstico da sua condição dentro do serviço. Assim, é possível fazer o registro de informações importantes no prontuário, possibilitando uma sistematização da convocação, além de tornar essas informações disponíveis para os outros profissionais, permitindo que estes atuem de modo a ajudar o paciente a enfrentar as dificuldades descritas por ele. Dessa forma, é necessária a criação de um protocolo eticamente legal que formalize a convocação do parceiro sexual dando segurança aos profissionais em suas decisões.
Defendemos que o cuidado deve ser resgatado tanto nas relações cotidianas, como no pensar e fazer enfermagem, utilizando-se sempre da delicadeza. No momento atual em que a humanidade defronta-se com violência, pobreza, maus tratos por parte do outro, seja ele, Estado ou pessoa, agressividade, brutalidade, ira, destrato com o corpo e com as idéias, é necessário, por parte de todos, o resgate mais do que nunca da delicadeza nas relações pessoais e profissionais. Acreditamos que a atividade do profissional de saúde na convocação de parceiros sexuais em HIV/AIDS é delicada, pois esse profissional se encontra entre dois pólos antagônicos, que são o direito do paciente em preservar o sigilo de sua condição sorológica, e o direito do parceiro em conhecer as vulnerabilidades do outro. Logo, o profissional se encontra em um dilema que necessita ser trabalhado com delicadeza e ética.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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12. Ministério da Saúde (MS). Diretrizes dos Centros de Testagem e Aconselhamento CTA: Manual. Brasília: Coordenação Nacional de DST e Aids; 1999.
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14. Oliveira LA, Landroni MAS, Kurokawa e Silva NE, Ayres JRCM. Humanização e cuidado: a experiência da equipe de um serviço de DST/Aids no município de São Paulo. Cien Saude Colet 2005; 10(3):689-98.
15. Teixeira JMC. Convocação de parceiros sexuais em serviço ambulatorial especializado em HIV/AIDS: reflexões e desafios [monografia]. Fortaleza (CE): Universidade Estadual do Ceará; 2006.


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Luz, P.M.. As bases filosóficas e históricas do cuidado e a convocação de parceiros sexuais em HIV/AIDS como forma de cuidar. Cien Saude Colet [periódico na internet] (2007/nov). [Citado em 08/12/2025]. Está disponível em: http://cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/as-bases-filosoficas-e-historicas-do-cuidado-e-a-convocacao-de-parceiros-sexuais-em-hivaids-como-forma-de-cuidar/1400

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